Na Folha: Proposta de reforma fiscal eleva tensão entre Dilma e PT a nível inédito, por Mônica Bergamo

Publicado em 24/02/2016 11:19
mais Josias de Souza

A proposta de "reforma fiscal de longo prazo" de Dilma Rousseff, divulgada na sexta, elevou a níveis inéditos a tensão entre ela e o PT. O texto prevê, entre outras coisas, a "suspensão de aumento real do salário mínimo" em caso de elevação de gastos acima de limite ligado ao crescimento do PIB.

DE SAÍDA
"É quase um rompimento explícito dela com o partido", afirmou um senador petista à coluna, que colheu também as seguintes afirmações de diferentes lideranças: "Dilma atravessou o Rubicão"; "há um descasamento cada vez maior entre ela e o partido"; "a presidente está fazendo um movimento deliberado para sair do PT".

NO FRONT
Em artigo assinado com o economista João Sicsú, cujo título é "O que é isso, Dilma?", o senador Lindberg Farias (PT-RJ) diz que o governo cede cada vez mais a "elites adeptas do neoliberalismo" e cita frase de Winston Churchill ao então primeiro-ministro do Reino Unido, Neville Chamberlain, quando o país negociava territórios com Hitler em 1938 para evitar um confronto com a Alemanha: "Entre a guerra e a desonra, você escolheu a desonra. E terá a guerra".

Leia a análise na íntegra no site da Folha de S. Paulo.

 

O ralo do fundo do poço

Por VINICIUS TORRES FREIRE

No fundo do poço pode ter um alçapão, diz uma dessas metáforas sem graça a que o povo de finanças e economia recorre a fim de dizer que a coisa pode ser ainda mais feia, seria ingenuidade não notar.

O Brasil chegaria ao fundo do poço em breve, mas lá haveria um alçapão, uma passagem para as profundas do inferno de outra crise. Governo e Congresso atolados em suas lamas, incapazes de formular e tomar decisões, podem abrir as portas do buraco no buraco.

Essa possibilidade tornou-se tema vivo de conversas, dado o tumulto no Congresso, o novo ciclo de escândalos e o desnorteio do governo da economia.

O que haveria abaixo do fundo do poço? Aonde nos leva o alçapão? Há o temor de que se difunda a ideia de que a dívida pública crescerá sem controle. Quer dizer, que continuará a crescer sem controle.

Faz uns dois meses, apareceu a ideia de que a economia deixaria de encolher a partir de meados do ano. Não é grande coisa. Quer dizer apenas que o tamanho da produção não decresceria mais, que o PIB ficaria estagnado. Ainda assim, o desemprego continuaria subindo até 2017.

É um diagnóstico comum em grandes bancos brasileiros. Pelo menos em público. Nas internas, acredita-se que diminuem as possibilidades de que sejam tomadas providências que limitem o endividamento.

Em algum momento, dívida pública descontrolada dá em:

1) Calote da dívida, o que seria uma catástrofe quase terminal para o país. Os credores brasileiros, residentes, aliás, detêm uns 75% da dívida. No caso de o governo deixar de pagar parte da dívida, adiar pagamentos etc., podem quebrar bancos, seguradoras, fundos de pensão, o cidadão que poupou em títulos do governo, basicamente um mundão de gente, que nem sabe disso (fundos de investimento, previdência privada, seguradoras, mantém a maior parte do dinheiro em títulos do governo);

2) Inflação descontrolada. Em vez de quebrar o país inteiro, arranca-se o couro dos mais pobres.

A dívida bruta do setor público passou de uns 52% do PIB em 2013 para 66% do PIB no ano passado. Dado que o governo federal terá outro deficit, que a taxa de juros média da dívida não será muito diferente neste 2016 e que a recessão será tão grande quanto a do ano passado, a dívida pública deve chegar a uns 73% do PIB neste ano.

Quanto maior a dívida, maior o superávit primário necessário para conter aumentos adicionais dos papagaios do setor público. Isto é, o governo tem de gastar menos e menos, cortar cada vez mais. Maior teria de ser o crescimento econômico para manter o tamanho da dívida sob controle (que é medida como proporção do PIB) –mas vamos crescer pouco, se tanto, por muito tempo.

Qual o risco de que se difunda a percepção de que não haverá controle da dívida? Isto é, de que se difunda o medo que sobrevenha mais inflação e, mais remoto, mesmo algum tipo de calote indireto ou direto? Além de paralisia econômica (quem investirá em atividades produtivas?), o dinheiro tende a fugir, a procurar proteção: ativos reais, dólar, o que seja.

Para começar, isso apareceria para a maior parte das pessoas como uma desvalorização extra do real.

Não dá para dizer que é destino, que vá acontecer. Mas é essa a conversa por aí.

 

Filmes de terror

Por Bernardo de Mello Franco, de BRASÍLIA - 

É preciso estômago para enfrentar um programa eleitoral na tevê. Os políticos costumam se expressar mal. Os partidos têm pouca credibilidade. Os discursos não interessam a quase ninguém. Com a popularização da internet, a propaganda obrigatória ficou ainda mais obsoleta. Em pouco tempo será peça de museu, como as urnas de lona e as cédulas de papel.

Enquanto isso não acontece, o telespectador é submetido ao espetáculo dos marqueteiros. Nesta semana, em dose dupla. Na terça, foi ao ar o programa do PT. Hoje será a vez do PMDB. Os dois partidos tiveram direito a dez minutos em horário nobre, entre a novela e o telejornal.

Os petistas investiram no discurso motivacional. "Quem já viu o Brasil superar momentos muito piores sabe olhar o presente com coragem", diz uma locutora no estúdio. "Você tem que ser otimista, tem que ter esperança", emenda uma atriz no papel de vendedora de cachorro-quente. "A gente não pode entregar os pontos", complementa uma falsa vendedora de biscoitos.

Pela narrativa do PT, a crise se limita a um problema de baixa autoestima. Se o povo cantar o hino e recuperar o otimismo, o país voltará a crescer. Adeus, recessão.

Na propaganda do PMDB, que já está na rede, o clima é de filme de terror. "Enquanto a economia desanda, continuamos desiludidos", diz uma atriz vestida de preto. "O desemprego cresce sem parar, e vem de mãos dadas com a carestia. A combinação não poderia ser pior", continua.

Poderia sim. Na sequência, entram em cena os políticos do partido, num desfile macabro de investigados na Lava Jato e deputados de cabelo pintado de acaju.

Os dois programas são exagerados, um para cada lado. O do PT vende um mundo cor-de-rosa. O do PMDB fala de um país que não tem mais solução. Nem parece que os partidos são sócios do mesmo governo, disputaram a eleição juntos e ainda dividem verbas e ministérios. 

 

PT cutucou as panelas com vara muito curta, por Josias de Souza (UOL)

O grande problema do PT não é produzir comerciais. Isso o partido faz em cima da perna. Mesmo com o João Santana na cadeia. A questão é escolher o que dizer ao povo. Edinho Barbosa, o novo marqueteiro da legenda, se esforçou. Mas a propaganda levada ao ar na noite desta terça-feira mostrou que lhe faltou matéria-prima. Com o material de que dispunha, conseguiu apenas cutucar as panelas com vara curta. Vão abaixo sete provocações extraídas da peça do PT:

“Por que tanto ódio e intolerância contra um partido, nesse momento em que o país precisa tanto de união?”

(O que o PT quis dizer com este trecho de sua propaganda é que ele agora concorda com os críticos que avisaram que aquela história de ‘nós conta eles’ não ia acabar bem.)

“Você tem que ser otimista, tem que ter esperança, a gente vai passar por mais essa, com certeza!”

(O PT quis dizer que, se você reparar bem, verá que não há motivo para tanto pessimismo. A economia está totalmente destrambelhada, possibilidade ideal para ser consertada.)

“Em 2008, uma nova crise abalou o mundo. […] Essa crise ainda não acabou.”

( O PT quis dizer que Lula estava apenas sendo Lula quando declarou que a crise de 2008 era “só uma marolinha.”)

“Estamos trabalhando para o Brasil voltar a crescer, sem recuar nos direitos, na renda e no salário dos trabalhadores. Para nós, nenhuma medida econômica pode ser boa se deixar para trás as pessoas”, disse na propaganda Rui Falcão.

(O presidente do PT quis dizer que, não fosse por suas responsabilidades partidárias, também bateria panelas.)

“Meus amigos e minhas amigas, de um tempo pra cá parece que virou moda falar mal do Brasil. Olha, eu digo com toda certeza que hoje eu tenho muito mais confiança no Brasil do que quando eu tomei posse em 2003”, disse Lula.

(O ex-soberano quis dizer que, em terra de cego, quem tem um olho não diz a ninguém que a rainha que retirou do bolso do colete está nua.)

“É verdade que erramos, mas acertamos muito mais e podemos melhorar muito mais ainda”, acrescentou Lula.

(O morubixaba petista quis dizer o seguinte: entre o certo e o errado, há sempre espaço para mais erros.)

“Está na hora de mudar o enredo, vamos deixar de lado o pessimismo e alcançar novas vitórias”, declarou um locutor.

(O PT quis dizer que, assim que terminasse a propaganda partidária, iria aderir à oposição e apoiar o impeachment de Dilma.)

 

Dilma troca um investigado por outro no Senado

Com três meses de atraso, Dilma Rousseff escolheu um novo líder do governo no Senado, em substituição ao senador Delcídio Amaral. Escolheu o petista Humberto Costa. Exemplo de Delcídio, Humberto responde a inquérito no STF relacionado à Operação Lava Jato. Quer dizer: Dilma trocou um investigado por outro.

O inquérito contra Humberto foi aberto em março de 2015. Apura-se a suspeita de que o senador financiou parte de sua campanha eleitoral com verbas desviadas da Petrobras. Na época, Humberto defendeu-se da tribuna do Senado: “Todas as doações de campanha que recebi foram legais, registradas, auditadas, julgadas e aprovadas pela Justiça Eleitoral.”

Acrescentou: “O fato de parte dos recursos que recebi legalmente de empresas [encrencadas na Lava Jato] em 2010 não é por si só motivo de suspeição e muito menos de abertura de inquérito. Se fosse assim, a procuradoria tinha que abrir inquéritos para investigar 150 parlamentares federais que receberam recursos dessas empresas em 2010 e contra 250 deputados e senadores receberam recursos dessas empresas para suas campanhas.''

Hoje, Humberto (PE) é líder da bancada de senadores do PT. O partido terá de providenciar sua substituição.

 

Fonte: Folha de S. Paulo + Reuters

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