Lei de Cultivares: Alteração na legislação pode prejudicar melhoramento genético

Publicado em 17/02/2016 10:03
Mudança proposta na cobrança de royalties de cultivares, que deve voltar a ser discutida na Câmara dos Deputados nos próximos dias, compromete o futuro das pesquisas e a evolução das tecnologias de controle das doenças na lavoura

O Projeto de Lei 827 de 2015 que altera a Lei de Proteção de Cultivares (nº 9.456, de abril de 1997) deve ser discutido novamente na Câmara dos Deputados com a volta do recesso. O texto do projeto é polêmico e vem gerando discussões desde sua apresentação, feita pelo deputado federal Dilceu Sperafico (PP/PR) em março do ano passado. Entre outras coisas, o projeto prevê a criação de Grupos Multidisciplinares de Cultivares – GMC, formados por representantes dos obtentores vegetais, produtores de sementes e agricultores. Esses grupos têm por objetivo, dentre outros, determinar o valor dos royalties que serão cobrados dos agricultores nos casos de uso próprio de sementes. Atualmente, cerca de 35% das sementes são salvas de uma safra para outra, volume esse que acaba não pagando pelo germoplasma utilizado em sua lavoura.

O pagamento de royalties pelo uso das cultivares é a forma de fazer com que o dinheiro volte para a pesquisa. Desde que passou a valer a Lei de Cultivares, em 1997, o Brasil deu um salto em produtividade, já que a pesquisa pela iniciativa privada foi incentivada. Com a Lei, depois de registrada uma nova cultivar, a empresa a pode explorar economicamente durante 15 anos. É esse valor que passou a gerar receita às empresas e alavancar a pesquisa na área. Para o presidente da Associação Brasileira de Obtentores Vegetais (Braspov), Ivo Carraro, antes disso, eram poucas empresas privadas que investiam em pesquisa, porque não tinham receita. “Todos passaram a ter um retorno na mesma proporção da aceitação do seu produto. Quem tem um produto melhor, vai ter mais volume no mercado e mais retorno. Assim, começou a se criar uma competição mais sadia e mais empresas entraram no mercado”, explica. Entretanto, com algumas mudanças na forma de pagamento desses royalties, a pesquisa na área pode estar comprometida. “Se as empresas passarem a receber menos pelo trabalho de melhoramento genético, podem deixar de atuar na área, prejudicando toda a cadeia tecnológica de desenvolvimento”, complementa.

O futuro

Para Carraro, o fato de hoje a agricultura contar com boas variedades de sementes no mercado não significa que no futuro outras doenças prejudiciais não possam aparecer. Por isso a importância de continuar com a pesquisa. “Tudo passa pelo melhoramento genético. Se você paralisar esse segmento, você paralisa o avanço na agricultura. Paralisar a pesquisa é retroceder, porque os problemas continuam aparecendo e as soluções ficam paradas”, afirma.

Até dez anos de pesquisa

Segundo o diretor de negócios da Biotrigo Genética, André Cunha Rosa, para desenvolver uma variedade convencional de trigo, por exemplo, são necessários entre oito a 12 anos de pesquisas. O processo de pesquisa parte dos cruzamentos e passa por seleção a campo e laboratório durante diversas safras. Inicialmente são parcelas pequenas e testes de laboratórios com alguns grãos de trigo, passando para ensaios preliminares em poucas localidades até chegar a uma grande rede de ensaios com repetições em diversas regiões do país. Em paralelo a estas etapas, também ocorre a multiplicação de sementes. "Este é o tempo para que sejam criadas novas ferramentas para que o produtor possa atingir maiores rendimentos; conseguir baixar custos de produção; ser mais competitivo e atingir os melhores mercados. Se não tivermos os royalties apropriados para gerar o estímulo às empresas privadas, não teremos qualidades nas sementes que chegam para o produtor”, defende.

Gato por lebre

Para o gerente da filial de Campo Mourão (PR) da Fundação Pró-Sementes, Jonas Farias Pinto, a legislação é muito importante para a pesquisa, mas também para os produtores de sementes. “Temos inúmeros casos em que o produtor comprou do vizinho semente salva e não encontrou nada daquilo que esperava no momento da compra”, conta. Valdir Fries é produtor de trigo e compartilha da mesma opinião. Para ele, é importante a alteração da Lei que defenda não somente o produtor, mas também a pesquisa. “Hoje nós parabenizamos a iniciativa privada que nos dá condição de plantar tecnologias avançadas e aumentar nossa produtividade. O produtor rural precisa ficar muito atento e responder aos investimentos das empresas particulares”, afirma.

Mercado pirata

O recurso para cobrir a pesquisa vem da semente legal. Um dos grandes problemas que afeta toda a cadeia produtiva é o mercado informal de sementes. A multiplicação ilegal de sementes reduz o esforço da pesquisa para resolver os problemas enfrentados pelo produtor na lavoura. “Se o agricultor faz isso está dando um tiro no pé. Está prejudicando ele mesmo e os seus companheiros. Não só para aumentar a produtividade, melhorar a qualidade industrial, mas também para resolver problemas que surgem ao longo da caminhada, como novas doenças”, finaliza Carraro. 

A próxima reunião da Comissão Especial acontece em Brasília no dia 23 de fevereiro.

Fonte: AI Dep. Dilceu Sperafico

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