Petróleo: Sem piso para as baixas, impacto para produtores e consumidores ainda é incerto
Nesta última sessão da semana, as commodities voltaram a encontrar espaço para uma ligeira recuperação e os preços do petróleo parecem ter acompanhando este movimento. Em Nova York, as cotações subiam pouco mais de 1% nesta sexta-feira (22) e já retomavam o patamar dos US$ 30,00 por barril. Entre as cotações do brent os ganhos eram ainda mais expressivos, com alta de 6% em Londres, onde conseguiu retomar os US$ 31,00.
Notícias vindas da Europa de que o Banco Central vai trazer medidas de estímulo à economia local, amenizando o mau humor do mercado financeiro global dos últimos dias, favoreceu os ganhos, bem como uma procura dos investidores por "barganhas" depois de uma semana de intensa volatilidade. "A primeira 'luta semi-decente' para a cobertura de posições mais curtas nesse mercado, em dois meses, finalmente chegou", disseram analistas da corretora internacional PVM ao The Wall Street Journal.
E outro fator começa a ganhar a atenção deste mercado, segundo explicam analistas internacionais: o clima frio na Europa e nos Estados Unidos dos últimos dias. As condições, de acordo com os especialistas, poderiam favorecer a demanda, porém, com um impacto limitado sobre as cotações.
No entanto, analistas afirmam que essa movimentação pode ser limitada já que os fundamentos do petróleo ainda pressionam o mercado de forma bastante severa. Muitos analistas afirmam, inclusive, que o momento é tão conturbado que impede, até mesmo, a definição de um piso para os preços, afinal, os fundamentos permanecem negativos e o cenário futuro, portanto, incerto.
"O mercado do petróleo, às vezes, opera em caminhos misteriosos. Os fundamentos, no curto prazo, porém, não mudaram e a situação de pressão com o excesso de oferta continua", diz Michael Poulsen, analista de mercado da Global Risk à publicação norte-americana.
Nos Estados Unidos, importante produtor global, os estoques de petróleo e gasolina subiram e alcançaram seus maiores níveis desde 1990, segundo dados divulgados pela Administração de Informações de Energia (AIE). Na semana passada, o número chegou a 4 milhões de barris e ficou ainda acima das expectativas do mercado, que eram de 2,8 milhões. Por outro lado, a produção norte-americana apresentou estabilidade e ficou em 9,2 milhões de barris por dia, já refletindo as baixas nos preços que, somente desde o começo de 2016, já superam os 20%.
Um levantamento feito pelo economista André Bittencourt Lopes, do Notícias Agrícolas mostra que, no período de 31 de dezembro de 2012 a 20 de janeiro de 2016, o petróleo Brent acumula uma queda de 75,01%, enquanto, no mesmo intervalo, a baixa do WTI é de 68,90%.
O pessimismo sobre os preços do petróleo, que em 2008 chegaram a superar os US$ 145,00 por barril, é reflexo, principalmente, da produção mundial que ainda mantém a estabilida de seu ritmo elevado, sem dar sinais de uma possível redução nos principais países produtores. O Irã já prepara seu retorno ao mercado internacional e deve acrescentar à oferta mundial algo próximo de 500 mil barris por dia.
Consumo
Neste cenário, números da AIE mostram que aos estoques mundiais poderiam, ainda nesta primeira metade de 2016, ultrapassar a demanda em 1,5 milhão de barris/dia.
E o consumo não dá sinais de avanço muito significativos, segundo especialistas ouvidos pelo The Wall Street Journal. Ainda assim, a China se destaca mais uma vez entre os números. "Para a nação asiática, que ha tempos tem sido o motor do crescimento da demanda global, esperamos que o consumo exiba um aumento de 350 mil barris por dia", informou a agência, lembrando que este número é ligeiramente menor do que o esperado.
O outro lado
No entanto, enquanto os preços mais baixos criam oportunidades para os importadores, alguns países produtores e exportadores de petróleo podem sentir e carregar os efeitos dessa crise ainda por algum tempo. Nos Estados Unidos, por exemplo, as falências poderiam chegar a 45%, segundo mostrou uma matéria do jornal Valor Econômico com dados da CreditSights, uma companhia americana especializada em análise da dívida corporativa.
O recuo das cotações nos últimos 19 meses, ainda segundo reportou o The Wall Street Journal, têm impactado diretamente "nos cofres de pequenos produtores mundias de petróleo", os quais têm buscado uma posição urgente da OPEP (Organização dos Países Produtores de Petróleo) sobre medidas que poderiam trazer algum suporte aos preços, porém, ainda sem resposta.
Nesta quarta-feira (20), a Venezuela solicitou um encontro de emergência com a organização, mas representantes da mesma já afirmaram que uma reunião como esta, agora, é improvável. Países do Golfo Pérsico, entre eles a Arábia Saudita, se opuseram à reunião.
"Os preços deverão continuar caindo abaixo dos níveis, a menos que esses impasses sejam resolvidos, o que conta com pouca chance de acontecer já que os principais produtores preferem vender com esse desconto do que perderem seus cliente", disse GAO Jian, analista de commodities da SCI Internacional, em Shandong, na China, em entrevista ao The Wall Street Journal. "E nesse ritmo, é difícil ver um piso para os preços", completou.
"O preço do petróleo pressiona os exportadores da commodity (...) mas há um lado bom para os consumidores no mundo todo, então isso não é inteiramente negativo", disse o economista-chefe do FMI (Fundo Monetário Internacional), Maurice Obstfeld, no início da semana em Davos, na Suíça, durante o Fórum Mundial da Economia.
Entretanto, para Min Zhu, vice-gerente do fundo, é preciso tratar com cautela essa relação entre preços mais baixos, consumo maior e transferência de receita. "Em vez de gastar mais no varejo, as pessoas estão poupando. É uma grande mudança no comportamento dos consumidores", disse o economista também no fórum que acontece na Suíça, referindo-se aos impactos que ainda são sentidos pela população depois da crise de 2008.
Ainda de acordo com um levantamento da AIE, com os preços se mantendo na casa dos US$ 30,00 por barril ou abaixo desse patamar, os resultados poderiam ser, por exemplo, uma redução do PIB de perto de 10% na Rússia e 20% na Arábia Saudita.
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