Na FOLHA: A pedido de Lula, PT recua nas críticas a Levy e poupa Cunha
O PT aprovou nesta quinta-feira (29) documento em que, apesar das críticas à política econômica da presidente Dilma Rousseff e ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), suavizou os ataques ao peemedebista e ao ministro Joaquim Levy (Fazenda) que têm sido feitos nos bastidores do partido.
Embora siga a orientação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em poupar Cunha, a sigla manteve no texto final aprovado em reunião do diretório nacional do PT a avaliação de que o presidente da Câmara e "a ala conservadora" do PMDB "flertam com o impeachment presidencial".
Segundo a Folha apurou, a avaliação de vários dirigentes do partido que estiveram no encontro desta quinta é de que houve recuo no tom adotado tanto por Lula, quanto pelo presidente do PT, Rui Falcão, que fizeram discursos "conciliadores".
Em entrevista à Folha no último dia 18, Falcão foi taxativo ao afirmar que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, deveria deixar o cargo caso não estivesse disposto a mudar os rumos da economia. Os dirigentes acreditavam que esse discurso, considerado "mais agressivo", ditaria o tom da resolução aprovada nesta tarde, mas isso não aconteceu.
Os líderes petistas também notaram mudanças na manifestação de Lula, que sempre foi um dos maiores críticos a Levy e chegou a sugerir a substituição do ministro a Dilma, afirmando que ele tinha "prazo de validade". Lula, porém, recebeu da presidente a resposta de que não estava na hora de criar um novo "celeuma" em seu governo com a troca de Levy.
Nesta quinta, o ex-presidente foi mais brando, pediu paciência do partido e afirmou que não adianta trocar o ministro da Fazenda para fazer a economia melhorar.
A mesma avaliação dos dirigentes do PT ocorreu em relação ao presidente da Câmara. Para eles, citar que o peemedebista "flerta com o impeachment", sem mencionar que ele é suspeito de envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras ou tomar posição sobre seu processo no Conselho de Ética da Casa, serviu para "acenar à base" mas não para marcar posição.
No final da reunião, Rui Falcão destacou que chegou a haver uma proposta para que o PT apresentasse uma representação pela cassação de Cunha ao Conselho de Ética da Câmara. Contudo, a sugestão foi rejeitada pela maioria dos presentes.
"Ninguém tem dúvidas no PT de que quem tem acordo com ele [Cunha] é a oposição. Ele terá que responder sobre as denúncias que lhe fazem na Justiça, no STF e no Conselho de Ética", reafirmou o petista que, mais cedo, em seu discurso na abertura do encontro, já havia destacado que a sigla vai fechar questão sobre o posicionamento que irá adotar sobre o caso quando ele for a julgamento no Conselho de Ética.
Poupar Cunha é uma das prioridades de Lula. A estratégia faz parte de um acordo para proteger a presidente Dilma Rousseff, alvo de processos de impeachment na Câmara dos Deputados que dependem, num primeiro momento, de uma decisão monocrática do presidente da Câmara, a quem cabe deferir ou indeferir o pedido.
Cunha é acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro e também suspeito de esconder contas na Suíça em seu nome e de sua esposa. Já existe um processo que sugere a perda do mandato do deputado em andamento na Câmara, protocolado pelo PSOL e pela Rede. Para Falcão, no momento certo, o partido vai se posicionar sobre o tema.
DOCUMENTO
A redação final da resolução aprovada nesta quinta ainda não foi divulgada oficialmente. Segundo o texto ao qual a Folha teve acesso, o PT afirma que a queda de popularidade do governo Dilma "acabou por dificultar a manutenção da base parlamentar", mas a situação se agravou com a eleição de Cunha à presidência da Câmara.
Para os petistas, o deputado representa a "ala mais reacionária do PMDB", que precisa ser combatida.
"A situação congressual agravou-se também pela preponderância, dentro da bancada do PMDB na Câmara dos Deputados, de sua ala mais reacionária, capitaneada pelo deputado Eduardo Cunha. Depois de conquistada a presidência da Casa, o parlamentar rapidamente pactuou com o bloco PSDB-DEM e assumiu a liderança de uma agenda para contrarreformas, além de flertar com o impeachment presidencial".
Os dirigentes do partido defendem ainda a ideia de que há uma "ofensiva conservadora" contra o PT que envolve, inclusive, "manobras de criminalização, operando setores do aparato policial e judiciário, com o objetivo de desestabilizar o governo, deslegitimar o PT e desgastar lideranças históricas como o ex-presidente Lula".
Nesta segunda-feira (26), a o Polícia Federal cumpriu mandado de busca e apreensão nos escritórios de empresas de Luís Cláudio Lula da Silva, filho caçula do ex-presidente, no âmbito da Operação Zelotes, que investiga um esquema de pagamento de propina no Carf (Conselho de Administração de Recursos Fiscais), ligado ao Ministério da Fazenda.
Lula reclamou a amigos da falta de controle do ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) sobre a PF e pediu a substituição do ministro à presidente Dilma, que resiste.
O PT pede que a militância petista saia em defesa do PT e de Lula, "transformado em alvo prioritário de armações que se multiplicam em núcleos da Polícia Federal, do Ministério Público e do Judiciário, vinculados a operações supostamente anticorrupção", diz o texto.
"Vazamentos seletivos, prisões abusivas, investigações plenas de atropelo e denúncias baseadas em delações arrancadas a fórceps e sem provas comprobatórias entre outros eventos, revelam a apropriação de destacamentos repressivos e judiciais por grupos subordinados ao antipetismo que atuam com intuito de difamar o principal partido da classe trabalhadora, seus dirigentes e o maior líder popular da história brasileira", completa o documento.
ECONOMIA
Ainda segundo a resolução, o PT tem como "principal objetivo tático derrotar a escalada golpista, isolar a oposição de direita e recuperar condições plenas de governabilidade".
Para isso, pede mudanças na política econômica do governo, com expansão do mercado interno, ampliações de investimentos estatais e defesa do emprego.
O partido também apoia a proposta de recriação da CPMF como forma de salvar as contas públicas e "preservar os programas sociais".
'Indignado', Lula diz que intimação de filho após festa 'não foi coincidência
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se disse "indignado" com a intimação de seu filho pela Polícia Federal para depor no inquérito da Operação Zelotes.
Segundo afirmou a aliados nesta quinta-feira (29), nos bastidores da reunião do diretório nacional do PT, "não foi coincidência" que a PF tenha batido à porta do apartamento de Luis Cláudio Lula da Silva às 23h da terça-feira (27), dia em que o ex-presidente comemorou seus 70 anos.
Lula discursou por mais de uma hora diante da cúpula do PT e disse ser vítima de "muita porradaria", mas que vai "sobreviver" às investigações.
Quando o ex-presidente deixou a reunião, logo após sua fala de abertura, alguns dirigentes petistas comentaram reservadamente o assunto e se mostraram surpresos com a intimação de Luis Cláudio.
Ao final do encontro, o presidente do PT, Rui Falcão, disse que a intimação do filho do ex-presidente Lula foi "mais uma arbitrariedade" cometida pela Polícia Federal. Falcão disse inclusive que "intimar alguém às 23h é ilegal".
A cúpula do PT afirma, em documento aprovado e divulgado nesta quinta, que Lula é "alvo prioritário de armações que se multiplicam em núcleos da Polícia Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário vinculado a operações supostamente anticorrupção".
A amigos, Lula tem dito que está "revoltado" com a "falta de controle" do ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) diante das ações da PF. O ex-presidente já pediu a troca do ministro diretamente a Dilma Rousseff, mas ela resiste.
Sobre Cardozo, Falcão afirmou que quando quiser criticar "um companheiro de partido", vai fazê-lo pessoalmente "e não por meio da imprensa".
O cerco se fecha, editorial da FOLHA
Repete-se, sobretudo no contexto da Operação Lava Jato, a tese de que nenhum cidadão, no Brasil contemporâneo, está acima da lei. Uma figura, no entanto, parece ter-se mantido ainda preservada sob um manto de intangibilidade.
Não tanto por sua conduta, mas pelo significado político de que seu nome se cerca, o ex-presidente Lula (PT) permanecia, desde o mensalão, ao largo das diversas investigações, processos e condenações que atingiram personagens fundamentais de seu círculo de poder.
As últimas ações do Ministério Público e da Polícia Federal indicam, todavia, que nem mesmo o líder máximo do petismo está acima das atenções da Justiça. Casos muito suspeitos, aos quais não cabe reagir com sectarismo nem precipitação, vão corroendo a aura de intocabilidade que o protegia.
Seguindo ordens da Justiça Federal, a polícia realizou na última segunda-feira (26) uma operação de busca e apreensão na empresa de marketing esportivo LFT, de propriedade de um filho de Lula.
Não o fez por motivos descabidos. Investigava as ações de uma empresa, a Marconi e Mautoni, suspeita de ter dado propina a políticos para que se estendessem os benefícios fiscais concedidos a duas montadoras de automóveis.
A mesma empresa pagou R$ 1,5 milhão à firma de Luis Cláudio Lula da Silva, sem que fique claro que serviços de marketing esportivo seriam úteis às suas atividades.
Igualmente inexplicado é o empréstimo de R$ 1,5 milhão concedido por um lobista, Fernando Baiano, a um empresário do agronegócio, José Carlos Bumlai.
Segundo a delação premiada de Fernando Baiano, o dinheiro depois teria sido repassado a uma nora de Lula, em troca de um favor feito pelo ex-presidente a uma empresa envolvida na Lava Jato.
O estágio das investigações é ainda incipiente, mas não há dúvida de que o cerco em torno do líder petista começa a se estreitar.
Acuado, o lulismo reage nos bastidores num aparente inconformismo contra a atitude do Ministério da Justiça, que teria "perdido o controle" sobre a Polícia Federal.
Não fosse pela enormidade por trás desse inconformismo –a ideia de que a PF deveria agir a serviço do partido no poder, e não com autonomia–, cumpriria lembrar que a operação se deu em obediência à determinação de uma juíza cujo histórico mais a aproxima do que a afasta das tendências de esquerda.
Ao ex-presidente Lula e seus familiares, como a qualquer cidadão, está assegurado o direito de defesa e o de não ser perseguido arbitrariamente pela polícia. Seria omissão da parte desta, entretanto, recusar-se a investigar os indícios que se acumulam em torno dele.
A menos que admita tal desejo, só cabe ao lulismo defender-se às claras sobre todos os episódios que projetam suspeitas sobre seu líder.
Lula e Boulos na terra dos mortos
POR REINALDO AZEVEDO, na FOLHA
Converso com muita gente aqui e ali, profiro palestras, participo de colóquios... Impressiona-me o número de pessoas que ainda sentem certo receio da volta de Lula. Ou, então, alimentam tal expectativa, mas aí com sinal trocado e cantos de vitória: veem o vulto de Dom Sebastião se desenhando em meio à poeira da derrotada espada sarracena.
Bobagem. Recomendo que essa tolice não se repita nem no espaço desta coluna em outros dias da semana, mas não posso ser mais do que volitivo a respeito. Lula está morto. Sem nem ponto de exclamação. É como dizer que hoje é sexta-feira. Dom Sebastião não volta.
Oposição e situação fazem seus cálculos ainda pautados por essa variável. Não sou muito bobo e sei ler lógica elementar. Com efeito, se Dilma fica, o patrimônio do PT será ainda mais dilapidado, o que facilita apeá-lo do poder. Nos três anos que restam, a governanta arrastaria junto o antigo demiurgo. Faz sentido?
Faz, sim! Mas a melhor virtude dessa análise supõe que o contrário possa ser catastrófico, vale dizer: se a presidente sai, o PMDB assume, ou se realizam eleições a depender do tribunal que a coloque pra fora, e Lula migra para a oposição e se cacifa para 2018.
O Apedeuta como fantasma retornando eternamente para nos assombrar é leitura que só interessa ao petismo. É uma pena que setores da oposição não tenham lido Lênin. A literatura de esquerda como norte é um lixo. Como instrução, é uma necessidade. O PT não é apenas um ente de razão ao qual se filiam convertidos ideológicos; sua força ativa está no domínio da máquina do Estado.
Logo, não é verdade que a queda de Dilma possa ser do interesse do PT porque Lula, assim, se arma para 2018. Se Dilma sai, a despetização do Estado conduzirá ao caos uma das maiores máquinas de assalto à coisa pública erigidas no Ocidente –assuma Michel Temer, ou haja outra solução democrática qualquer.
Os petistas querem, sim, Dilma no comando para que esse ente das sombras continue a se alimentar da seiva do trabalho do povo brasileiro.
As oposições e quantos estejam ocupados da política não têm de temer Lula. Têm é de se preocupar com certa desesperança, revelada por brasileiros, na política. O Apedeuta, na condição de morto, é só um fantasma. Como fantasma, está necessariamente morto.
FASCISTAS
Tudo indica que Guilherme Boulos, líder do MTST, contratou mão de obra terceirizada na ação terrorista contra o Movimento Brasil Livre na quarta (28), em Brasília. Os fascistas que cercaram os manifestantes do MBL, no gramado do Congresso, exibiam a camiseta do movimento dos sem-teto, mas sua origem era um assentamento em Planaltina, comandado pelo MST, de João Pedro Stedile, outro coxinha vermelho.
O cerco de que o MBL foi vítima, com muita porrada e intimidação, é coisa de bandidos. E assim seus promotores devem ser vistos e tratados. Havia lá, diga-se, assessores de deputados do PSOL, como Jean Wyllys (RJ), e de Jandira Feghali (PCdoB-RJ). É claro que espécimes à moda Boulos e João Pedro Stedile existem desde, deixem-me ver, a República romana. Catilina era um Boulos que ao menos servia ao talento de Cícero.
Mas eu não quero ser o Cícero dessa turma. Acho que seu lugar é a Papuda. De resto, Boulos, o esquerdista promissor, como se isso fosse possível, já nasceu morto. E o MBL plantou o futuro sobre o seu túmulo.
Ah, sim: eu só escrevo. Não tenho milícia.
Brasil em dois tempos
POR VINICIUS TORRES FREIRE
O trabalho ainda vai melhor na média do Brasil do que nas maiores metrópoles do país. Era assim até agosto, soube-se ontem pelos dados da Pnad. No que diz respeito ao número de pessoas empregadas, a piora segue linhas paralelas, embora o buraco seja bem mais embaixo nas grandes cidades. Quanto aos rendimentos, porém, a vida de quem trabalha em São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife e Salvador em média piora bem mais.
No país, a baixa do número de empregos está concentrada na indústria e na construção civil (em outros setores, há crescimento). É evidente que a crise do emprego começou muito antes na construção, no segundo trimestre de 2014 e teve picos de drama de fevereiro a junho. Na indústria, ao menos nos dados nacionais da Pnad, a baixa do número de ocupados inicia um ano depois.
Sim, a crise das empreiteiras (Petrolão), do investimento do governo e do mercado imobiliário parece ter sido agravante maior da recessão.
O massacre do emprego na indústria pode explicar parte da vida mais dura nas metrópoles. Em parte: as montadoras de veículos demitem pelo interior; a Usiminas ontem anunciou demissões em Cubatão: 2.000 empregos diretos, 2.000 indiretos (ou até 5.000 indiretos, segundo sindicatos).
Pode ser ainda que, em regiões relativamente mais dependentes de transferências sociais e de empregos públicos, o impacto relativo da crise seja menor ou defasado.
Em suma, os números ainda causam certo desconcerto, em particular quanto à direção diferente dos salários.
É o que se depreende dos dados nacionais sobre o trabalho, da Pnad, coletados ao longo de um trimestre e divulgados mensalmente (a cada fim de trimestre móvel: num mês, os dados de maio-junho-julho; no mês seguinte, os de junho-julho-agosto etc.). Trata-se de pesquisa nova, com três anos, que será a única pesquisa de emprego do IBGE divulgada mensalmente. A pesquisa das metrópoles, PME, será interrompida em 2016.
A Pnad lida com um universo de 92,1 milhões de pessoas ocupadas em milhares de cidades. A PME, mensal, com 22,7 milhões em seis regiões metropolitanas. As metodologias são diferentes. Ainda assim, contrastes e coincidências chamam a atenção.
Feitas as contas em bases trimestrais, o rendimento médio caía em agosto quase 3% pela PME (ante agosto de 2014). Pela Pnad, o rendimento sobe 1% (voltou a subir desde junho. Na PME, está muito ruim desde abril. Em setembro, piorou mais). O total de rendimentos caía 4,4% em agosto, nas grandes metrópoles da PME; no Brasil da Pnad, subia 1,2%.
A piora tem-se acelerado do mesmo modo, nas duas pesquisas, quando os assuntos são taxa de desemprego e população ocupada e desocupada, embora, repita-se, a situação esteja em níveis diferentes. Em um ano, o número de desocupados cresceu 29,6% no Brasil inteiro e 51% nas seis metrópoles, até agosto.
Na Pnad, "no Brasil", o número de pessoas empregadas vinha crescendo cada vez menos desde meados de 2014 e, em agosto, estagnou. Na PME, nas seis metrópoles, vem caindo desde metade do ano passado e, em agosto, baixava 1,3%.
Na Pnad, a taxa de desemprego também aumentou muito, de 6,9% para 8,7%, em um ano. Aumentou a informalidade.