Ministro cansado, Levy fica, 572 mil demitidos, fim da ilusão... (na FOLHA)

Publicado em 20/10/2015 05:02
edição desta terça-feira (http://www1.folha.uol.com.br/)

O MINISTRO CANSADO, por Bernardo de Mello Franco (FOLHA)

BRASÍLIA - A foto se espalhou nas redes como um vírus na última sexta. Na imagem, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, dorme em um voo comercial de Brasília para o Rio.

A cena, clicada por outro passageiro, deve ter inspirado solidariedade até nos críticos mais severos do ajuste fiscal. Com 1,92 metro de altura, Levy descansa de pernas e cotovelos encolhidos para caber na poltrona. O paletó está amassado, e a cabeça pende sobre o ombro esquerdo.

O ministro devia estar tão exausto que apagou sem tirar os óculos ou guardar a revista que folheava. A foto atesta que os cortes já chegaram ao dono da tesoura. Até alguns meses, ele podia tirar sonecas mais confortáveis a bordo dos jatos da FAB.

Levy tinha razões para se sentir pregado na noite de sexta. À tarde, ele foi dado como um ex-ministro em exercício. O noticiário sobre sua eventual saída do governo assustou investidores e pressionou o dólar. No fim do dia, após reclamar da fritura à presidente Dilma Rousseff, ele divulgou uma nota para anunciar o "fico".

Não serviu de muita coisa, porque o presidente do PT logo voltaria a desafiar o seu sono. "É importante mudar a política econômica", disse Rui Falcão, em entrevista à Folha publicada no domingo. "Se o Levy não quiser seguir a orientação da presidente, deve ser substituído."

Em visita à Suécia, Dilma rebateu o colega de partido e saiu em defesa do auxiliar. "O presidente do PT pode ter a opinião que ele quiser, algo que não é a opinião do governo", disse ela. "O ministro Levy fica", afiançou.

A fala mostra que o ministro ainda tem prestígio com a chefe, mas não garante sua permanência por muito tempo. Por um lado, Levy não consegue apresentar melhora nos índices econômicos, apesar do arrocho, e começa a perder a confiança de setores empresariais. Por outro, o PT e o ex-presidente Lula pressionam cada vez mais para derrubá-lo.

Nesse ritmo, em breve o ministro pode se cansar de vez e cancelar o voo de volta na segunda-feira.

Levy fica, EDITORIAL DA FOLHA

A presidente Dilma Rousseff (PT) começou a semana com um rompante de assertividade que, de modo incomum quando se trata dela, a muitos pareceu bem colocado. Sob fogo de seu próprio partido, defendeu a política econômica do governo e assegurou com ênfase que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, continuará no cargo.

Além dos costumeiros boatos de sexta-feira, adicionara calorias à fritura de Levy a entrevista do presidente do PT, Rui Falcão, publicada domingo (18) nesta Folha.

Sem sutileza, Falcão advogou o abandono do esforço de austeridade orçamentária –de escasso efeito até aqui, admita-se– e prescreveu a demissão do ministro.

"Acho que ela [Dilma] vai determinar a liberação de crédito com responsabilidade", disse o petista. E foi entendido como entregador de um recado do próprio ex-presidente Lula: "Se o Levy não quiser seguir a orientação da presidente, deve ser substituído".

Num governo de coalizão tão ampla e descosida, não chega a suscitar surpresa que haja divergências entre a chefe do Executivo e uma agremiação que lhe dá apoio. Ainda que seja seu partido de filiação, compreende-se que persigam objetivos diversos.

Dilma e o PT defrontam-se com imperativos incongruentes, quando não conflitantes. No campo da economia, a presidente não tem como escapar de um ajuste profundo nas contas públicas para desmontar as armadilhas que as irresponsabilidades de seu primeiro mandato legaram ao segundo.

Na seara política, rendeu-se ao PMDB na expectativa incerta de reverter votos a favor de seu impeachment. Ocorre que este último objetivo contradiz o primeiro (equilibrar receitas e despesas), pois até o mármore do Planalto sabe que peemedebistas não batalham por cargos e verbas só por esporte.

Enquanto o PMDB alveja o ajuste fiscal em plenário e nos ministérios, o PT lulista lança-lhe granadas desde São Bernardo do Campo.

O cálculo do ex-presidente é eleitoral: sabe que seu partido caminha para um revés no pleito municipal de 2016 e que só um novo saque a descoberto no Tesouro, para tentar aquecer artificialmente a atividade econômica, traria algum alento em 2018.

Em meio a tanta artilharia, a permanência de Levy no ministério se converteu numa das poucas âncoras a distanciar Dilma e a economia de uma queda livre.

Por instinto de sobrevivência ou raro lampejo de perspicácia política, a presidente abraçou-se a ele e ao tímido aperto nas contas logrado até aqui, ainda que não rezem pelo mesmo credo.

Dilma Rousseff, ao menos por ora, repeliu a tutela que o PT de Lula quer lhe impor. Joaquim Levy fica. Para a sorte de todos, desta vez seu vezo autocrático coincide com o que é melhor para o país.

– Via Nani.

Falsa ilusão, por BENJAMIN STEINBRUCH

São assustadores os dados sobre o avanço do desemprego no país. Não é preciso entrar em detalhes. Basta dizer que de janeiro a agosto o país perdeu 572 mil vagas de trabalho.

Vale lembrar quão devastador é o desemprego para um chefe de família. No ritmo atual, teremos uma perda de pelo menos 2 milhões de vagas em dois anos.

É óbvio que essa tendência precisa ser interrompida com urgência, mas quase nada se faz para mudá-la. Tudo se passa como se um incêndio avançasse num grande edifício sem que ninguém tivesse a iniciativa de chamar os bombeiros. Mais do que isso: alguns continuam acendendo fósforos, acreditando que o fogo possa talvez purificar o ambiente.

A despeito de conflitos políticos, combates à corrupção e outros desdobramentos do triste cenário atual brasileiro, todos os homens de bem deste país deveriam dar prioridade ao combate à recessão e ao estímulo à criação de empregos.

A retomada do crescimento constitui, de longe, a principal providência a ser tomada e a condição básica para buscar o bem-estar e a convivência pacífica entre as pessoas.

Por que não começar a apagar o incêndio? Com o persistente desaquecimento da China, a estagnação da Europa e a incerta continuidade da retomada americana, parece óbvio que o Brasil precisa apostar em seu enorme mercado interno. E isso se faz cuidando da oferta de crédito, baixando taxas de juros e estimulando investimentos.

Por que elevar seguidamente os juros e mantê-los em um nível escandaloso se a demanda está fraquíssima e a economia em recessão? Por que manter juros abusivos se isso custa centenas de bilhões de reais a mais por ano aos cofres públicos? Por que aumentar impostos se é sabido que os ajustes fiscais que dão certo são os que cortam despesas correntes?

De nada adiantam ajustes que elevam a carga de impostos porque eles aprofundam a recessão e contribuem para que os brasileiros continuem sob tensão, sem perspectivas de melhoria na oferta de emprego e nas condições gerais de vida. Política nenhuma sobrevive a uma economia agonizante, com desemprego elevado, desmotivação, falta de credibilidade e nenhum comprometimento.

Para que servem os sacrifícios impostos pelos ajustes? Em geral, eles são sugeridos por tecnocratas descompromissados que não sabem nada a respeito do dia a dia das pessoas normais ou pouco se importam com isso.

Na semana passada, o economista britânico da Universidade de Princeton Angus Deaton ganhou o prêmio Nobel de Economia por seu trabalho sobre a origem da pobreza e sobre como o povo toma decisões de consumo.

Uma das lições de Deaton é que as populações pobres "precisam que os governos os guiem para uma vida melhor".

Tirar os governos da jogada, segundo o economista, pode melhorar as coisas no curto prazo, mas deixa sem solução os problemas estruturais.

Nossos governantes precisam olhar para as reais necessidades da população e deixar de contrariar a lei da gravidade. Chega de juros anormais, chega de falta de crédito, chega de dinheiro público mal gasto, chega de barbeiragens.

Vamos pensar no país como uma extensão de nossas casas. Se não tem, não gaste. Se não sabe, não faça. E se não acredita, não venda falsa ilusão. 

O show não terminou, por VINICIUS TORRES FREIRE

As vitórias provisórias no Supremo Tribunal Federal animaram o governo de Dilma Rousseff. Caso um endemoniado Eduardo Cunha aceite um novo pedido de impeachment, a gente do Planalto acha que no mínimo pode emperrar a tramitação do processo por via judicial.

Pode ser. O problema está longe de parar aí, ainda que o impeachment não prossiga. O novo rolo diz respeito ao que será das contas do governo em 2015 e 2016 e, indiretamente, ao que será feito do pacote fiscal emperrado no Congresso.

Embora quase todo mundo que acompanhe tais coisas dê de barato que o pacote foi, no geral, para o vinagre, se não era mesmo irrelevante, parte dos donos do dinheiro grosso pode se agitar com a confirmação de buraco ampliado nas contas públicas em 2016. Assim, o crédito do país desceria mais um degrau (tudo mais constante, isso significa que dólar e juros subiriam).

Hoje, a oposição, por meio dos advogados Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal, leva ao Congresso um novo argumento para a deposição de Dilma (a presidente teria repetido neste ano o crime fiscal que cometeu em 2014, segundo o TCU). Seja caso para impeachment ou não, a tese da pedalada em 2015 deve no mínimo causar tumulto adicional na previsão do Orçamento de 2016.

Não deve haver decisão tão cedo, dizem conhecedores de Eduardo Cunha (PMDB), que aliás continua a nos insultar com sua permanência na vida pública. O presidente da Câmara não ganharia nada gastando desde logo o último tiro maior no combate contra sua cassação e, pois, provável prisão. Pelo menos era ontem este o argumento de quem vive no meio dessas mumunhas.

Cunha, porém, pode dar tiros menores em um terreno bastante minado, atrapalhando ainda mais a tramitação do segundo remendo fiscal de Dilma 2.

Na semana que vem, o TCU pode tomar alguma decisão a respeito das "pedaladas" de 2014 (débitos que o governo pendurou em tese ilegalmente). Pode ser que constranja o governo a liquidar já tais compromissos. O governo já prevê deficit primário para este ano; se tiver de pagar os papagaios, a conta vai para um buraco de 1% do PIB.

A limpeza imediata das contas, a eliminação de esqueletos e caveirinhas, pode até não ser tão má ideia, mas ao menos por um tempo vai desorganizar todas as previsões de balanço das contas públicas para 2015, principalmente 2016 e talvez até 2017. No mínimo, seria preciso refazer parte dos Orçamentos, ainda inconclusos e a espera de votações mesmo sem esse novo rolo.

Não bastasse o fato de Cunha estar solto, há o risco de boa parte da cúpula do PMDB, quiçá do ora mais pacífico Senado, começar a debater-se loucamente no lodo da Lava Jato, dados os novos vazamentos.

Por último, o PMDB está se estranhando um pouco a respeito do que fazer do Congresso marcado em tese para meados de novembro, no qual o partido desembarcaria do governo. Parece que não vai fazer tal coisa, até porque precisa faturar a honra de administrar ministérios daqui a pelo menos o início do ano que vem, acumulando capital político, digamos, para alavancar alguns projetos eleitorais de 2016.

Mas há confusão por todos os lados no Congresso onde está atolado o pacote fiscal.

 

"Relator da CPI (Luiz Sérgio (PT-RJ)trata o contribuinte como imbecil", por Josias de Souza (UOL)

É dura a vida do brasileiro em dia com suas obrigações tributárias. Sob Lula e Dilma, estruturou-se na Petrobras um bilionário sistema de pilhagem. O assalto é estimado em cerca de R$ 20 bilhões. E o deputado Luiz Sérgio (PT-RJ), relator da CPI da Petrobras, decidiu tratar o contribuinte como imbecil.

Luiz Sérgio apresentou na noite desta segunda-feira seu relatório final. Nele, culpou os empreiteiros e os maus servidores pelo assalto, livrou a cara dos políticos e concluiu que não houve “corrupção institucionalizada” na Petrobras.

“A mais importante conclusão dessa CPI é que a Petrobras foi vítima de um cartel de maus fornecedores”, anotou o relator. Absteve-se de mencionar que o Planalto loteou as diretorias da maior estatal do país entre partidos aliados, dando-lhes salvo-conduto para roubar.

Como se fosse pouco, Luiz Sérgio criticou a força-tarefa da Lava Jato e o juiz Sérgio Moro pelo “excesso de delações premiadas.” Sugeriu que a lei que trata do tema, sancionada por Dilma, seja alterada para impedir que réus presos se convertam em delatores. Se essa regra já estivesse em vigor, não haveria Lava Jato.

Não é só: o relator tentou tapar com sua peneira a luminosa evidência de que um pedaço das propinas extraídas da Petrobras virou doação oficial de campanha, registada na Justiça Eleitoral pelos partidos e seus candidatos. Para Luiz Sérgio, as conclusões da Polícia Federal e da Procuradoria sobre essa matéria seriam “superficiais”, porque desconsideram o fato de as empreiteiras terem doado dinheiro para candidatos de vários partidos, entre eles PT e PSDB.

Beneficiário de um repasse de R$ 200 mil feito em 2014 pelo empreteiro Ricardo Pessoa, coordenador do petrocartel, Luiz Sérgio reincide numa mumunha manjada. Ele generaliza a prática da doação de verbas de má origem não para combatê-la, mas para institucionalizá-la.

Se o dinheiro que o PT e seus aliados lavaram no TSE tivesse saído do bolso do companheiro Luiz Sérgio, tudo bem. O diabo é que toda essa verba tem uma origem única e conhecida: o bolso do contribuinte.

De resto, Luiz Sérgio esboçou em seu relatório uma pantomima típica da era petista: a máfia sem capo. Antes mesmo do término da Lava Jato, sustentou que não há como impor nenhum tipo de responsabilidade aos ex-presidentes da Petrobras. Acha impossível atribuir qualquer tipo de culpa também a Lula e a Dilma. Decerto foi tudo obra de marcianos.

Nada de extraordinário, sobretudo se for considerado o fato de que Luiz Sérgio também não conseguiu enxergar um culpado na figura notória do presidente da Câmara. “Em que pesem as inúmeras notícias veiculadas recentemente sobre contas bancárias no exterior das quais o deputado Eduardo Cunha seria beneficiário, o fato é que esta CPI não recebeu prova alguma destas afirmações, não cabendo a este relator adotar providências'', ele escreveu.

É mesmo dura a vida do contribuinte brasileiro. O sujeito passa oito meses financiando todos os custos de uma CPI —o palco, a iluminação, as imagens, o som, o cafezinho, as viagens, a casa oficial, a comida, o celular, o transporte, os assessores e os salários dos atores— para ser chamado de imbecil no relatório final.

 

Fonte: Folha de S. Paulo

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