Dólar sobe mais de 3% e fecha a R$ 4,10; Mercado prevê queda no PIB de 2,8% e inflação a 9,46%
Após dois pregões de trégua, o dólar voltou a subir e encerrou a sessão desta segunda-feira valendo 4,10 reais. Trata-se da segunda maior cotação da história da moeda desde a criação do real, em 1994 – o recorde foi atingido na última quarta-feira, quando ela fechou a 4,14 reais. Nesta segunda, a valorização foi de 3,36%. Foi a maior alta verificada em apenas um dia desde 21 de setembro de 2011, quando o salto foi de 3,75%.
A forte valorização reflete a cautela dos investidores com o futuro do ajuste fiscal e também reverbera as altas da moeda no exterior. Além disso, o mercado pressiona o Banco Central a continuar fazendo intervenções sobre o câmbio e segue receoso com o risco de um novo rebaixamento da nota de crédito do país.
Operadores consideraram natural que a moeda tivesse trajetória ascendente nesta segunda, dada a manutenção das incertezas sobre o quadro doméstico e o fato de o dólar ter caído cerca de 4% nas últimas sessões. Os eventos da semana também inspiram cautela, pois deve ser apreciado pelo Congresso o veto ao reajuste salarial de até 78,56% dos funcionários do Judiciário. A presidente Dilma Rousseff deve ainda colocar em prática sua reforma ministerial, cortando até dez pastas. Resta saber em que ambiente político essas ações devem ocorrer.
No exterior, o dólar avançou em comparação com as moedas de países emergentes, que foram penalizadas por um dado apontando forte queda no lucro das principais indústrias da China. Outro fator que contribuiu para a alta foram declarações de membros do Federal Reserve (Fed, banco central americano) reforçando a percepção de que os juros vão subir ainda este ano, movimento que tende a fortalecer a moeda dos EUA.
Na reta final do pregão, a moeda ampliou ainda mais seus ganhos nas trocas com o real, sem uma motivação específica a puxar as máximas. O movimento teria sido fruto da atuação de especuladores, principalmente quando o avanço bateu em 2%. O pano de fundo dessas apostas foi a mensagem do Banco Central, na semana passada, de que, se for preciso, ele poderá usar suas reservas internacionais para intervir no câmbio.
Inadimplência das empresas brasileiras sobe 16% em agosto
Na VEJA.com:
A inadimplência das empresas brasileiras avançou 16,1% em agosto na comparação com o mesmo mês do ano passado, reflexo do aprofundamento da recessão, associado aos juros e dólar mais altos, informou a consultoria Serasa Experian nesta segunda-feira.
De janeiro a agosto, o índice de inadimplência das empresas já acumula alta de 13,3%, maior nível desde 2012, quando subiu 14,3% no mesmo período. O valor médio dos títulos protestados cresceu 15,4% no acumulado do ano, ao passo que os cheques sem fundos subiram 6,8%.
“O aprofundamento da recessão econômica e as escaladas das taxas de juros e do dólar estão impactando negativamente a geração de caixa e a capacidade de pagamento das empresas, impondo sérias dificuldades à quitação de seus compromissos financeiros neste ano de 2015″, disse a Serasa, em comunicado.
Já na comparação de agosto com julho, a inadimplência recuou 5,7%, influenciada pela queda de 13,4% dos cheques sem fundo e baixa de 2% nos protestos.
Mercado prevê queda no PIB de 2,8% e inflação a 9,46%
Na VEJA.com:
As perspectivas do mercado financeiro sobre o desempenho da economia brasileira continuam piorando semana após semana. Os analistas ouvidos pelo Banco Central para produção do boletim Focus voltaram nesta segunda-feira a projetar uma recessão mais profunda e uma inflação maior tanto para 2015 como para 2016.
Segundo o relatório divulgado hoje, o mercado agora espera uma queda no Produto Interno Bruto (PIB) de 2,8% – na semana passada, a previsão era de 2,7% negativo. Para 2016, a estimativa passou de 0,8% para 1% de recuo. Esta é a décima primeira vez consecutiva que os analistas ajustam o porcentual para baixo na previsão deste ano, e a oitava vez no caso de 2016. Se confirmado, será o maior decréscimo no nível da atividade econômica desde 1990, quando o PIB encolheu 4,35%, no governo do hoje senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL).
Inflação – O mercado também projetou um aumento no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador usado para medir a inflação, de 9,34% para 9,46%. É a segunda semana seguida em que o índice é reajustado. Os economistas voltaram a elevar as estimativas da inflação depois da disparada do dólar vista nas últimas semanas. Se confirmado, este ano terá a maior inflação desde 2002, quando chegou a 12,53%. Para 2016, o mercado prevê que o IPCA fique na casa dos 5,87% – na semana passada, a projeção era de 5,7%.
Mesmo esperando uma inflação mais elevada, os analistas continuam na expectativa de que não haverá mais nenhum reajuste na taxa básica de juros (a Selic) neste ano. Desde o último aumento, a Selic está na casa dos 14,25%. Para 2016, a previsão é de que ela diminua gradativamente até chegar a 12,50% Inflação – a estimativa anterior era de 12,25%.
Na última quinta-feira, o Banco Central divulgou as suas últimas estimativas sobre a trajetória dos principais indicadores econômicos, com um quadro também mais pessimista: para o PIB, foi estimado uma queda de 2,7%; e para a inflação, o patamar de 9,5%.
A classe C de volta ao SUS
Ao lado da escola particular para os filhos, o plano de saúde particular foi a grande conquista da classe C. Foi. Atingido em cheio pela crise, o setor perdeu quase 200 000 usuários só no primeiro semestre deste ano. É a primeira queda registrada na base de dados da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge).
Da redação de VEJA.COM
Rolf Kuntz: Um governo em liquidação
Publicado no Estadão
Num aperto danado, com 985 mil empregos formais fechados em um ano, a presidente Dilma Rousseff resolveu vender o Ministério da Saúde ao PMDB, em troca de proteção contra o impeachment e de apoio a medidas de ajuste. A oferta, quase no estilo “família vende tudo”, envolve um pacote ministerial. Mas a decisão de trocar o companheiro Arthur Chioro por um peemedebista qualquer tem significado particular.
Durante anos, o governo tentou impingir ao público a imagem de grande preocupação com a saúde. Também tentou propagar o mito de realizações importantes no setor. Além disso, desde a extinção do imposto do cheque, a CPMF, em 2007, petistas do alto e do baixo clero lamentaram, num choro incessante, a perda de um tributo apontado como essencial para a saúde. Agora, de repente, o ministério, até há pouco tratado como joia da coroa, torna-se tão vendável quanto um sofá usado. Além disso, os R$ 32 bilhões esperados da nova Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira deverão reforçar – quem diria? – as finanças da Previdência. Foi essa a finalidade apontada pelos ministros econômicos quando propuseram a recriação do mais aberrante dos tributos brasileiros.
Nenhum cidadão razoavelmente informado e com pelo menos dois neurônios em operação levou a sério, em qualquer momento, a propaganda oficial sobre a política de saúde – ou, a propósito, sobre a política educacional do PT. Da mesma forma, só os muito desinformados e muito desprevenidos acreditaram no vínculo entre a CPMF e os programas de saúde. O imposto do cheque sempre serviu, de fato, para engordar a receita geral do Tesouro e para sustentar, especialmente no período petista, a gastança do governo federal.
Se educação e saúde fossem mesmo prioritárias, para os governos e para seus aliados, a aplicação de recursos nos dois setores nunca dependeria de verbas vinculadas nem de tributos carimbados. Vinculação fiscal – exceto, talvez, por períodos limitados e em casos muito especiais – distorce o uso de recursos, torna a administração menos eficiente e menos criativa, dispensa a competência e abre espaço para a corrupção. Quando é obrigatório gastar certo volume de dinheiro, a tendência a gastar mal torna-se muito forte. Tudo isso é confirmado pela experiência brasileira. Além disso, a repentina mudança da finalidade oficial da CPMF elimina qualquer dúvida sobre o interesse real do governo.
Parte dos congressistas ainda se opõe, pelo menos vocalmente, à recriação desse tributo. O apoio dos petistas parece garantido. Além do mais, governadores interessados numa lasca do bolo pressionarão parlamentares pela aprovação com alíquota de 0,38%, quase o dobro da proposta pelo Executivo (0,20%). Há, entre os chamados formadores de opinião, quem aponte a CPMF como um tributo justo, por incidir, supostamente, mais sobre o rico e poupar o pobre. Essa crença é uma bobagem. Mesmo se ganhasse uma carteirinha para ficar livre do imposto na ponta do consumo, o pobre ainda seria onerado pela incidência nas fases anteriores da circulação. Cumulatividade é um de seus defeitos.
Os ministros econômicos sabem disso e conhecem também as outras más características do imposto do cheque. Mas deixam de lado esses detalhes, ou por darem pouco valor à qualidade e à funcionalidade dos tributos ou por julgarem muito difícil, talvez impossível, consertar as contas federais sem esse recurso.
A tarefa é complicada, de fato, porque a ampliação constante dos gastos obrigatórios, como os salários, os benefícios da Previdência e também as despesas vinculadas, tornou mais engessado, ano a ano, um orçamento já pouco flexível. Mesmo assim, muito provavelmente seria possível aumentar os cortes, de forma significativa, se houvesse disposição e coragem para uma redução severa dos postos de livre nomeação e para um exame detalhado de todos os programas.
Em 2011, quando houve um ensaio, ou encenação, de faxina ministerial, foi descoberto um enorme desperdício de recursos. Perdia-se muito dinheiro em projetos mal concebidos e mal executados. Gastava-se em programas de utilidade duvidosa. Queimavam-se grandes verbas em convênios com ONGs muitas vezes despreparadas para a prestação dos serviços contratados.
Houve muito barulho, na época, e até a esperança de eliminação das bandalheiras mais evidentes. Nada indica, no entanto, uma alteração efetiva dos padrões dominantes na administração. Ao contrário: nos anos seguintes, bastaria acompanhar a execução dos programas ligados à Copa do Mundo para verificar a persistência, e até o agravamento, dos maiores vícios.
A devastação da economia, acelerada no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, coincidiu com o engessamento maior do Orçamento federal e com maior degradação dos padrões administrativos. O fiasco permanente do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), apenas disfarçado pelos números do programa habitacional, confirmou muito claramente a incompetência crescente da gestão pública. Mas o funcionalismo nunca deixou de crescer e o aumento da folha sempre superou a inflação. Ao mesmo tempo, subsídios continuaram e continuam sendo canalizados para grupos escolhidos.
A resposta da presidente consistiu, até agora, em propor remédios para fechar as contas em 2016. Para este ano, a expectativa de um pífio superávit primário de 0,15% do PIB, reafirmada há poucos dias, depende de cerca de R$ 43 bilhões de receitas extraordinárias – tão extraordinárias e voláteis quanto o apoio comprável com nomeações. Nenhuma solução de maior alcance foi sugerida seriamente. Para conseguir apoio a esse quase nada a presidente põe à venda o governo. A Standard & Poor’s limitou-se a rebaixar a nota de crédito do país. A autodegradação do governo é muito mais séria do que isso.
(POR ROLF KUNTZ)
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