Bovespa recua 1,85% e fecha no menor patamar desde março de 2014
SÃO PAULO (Reuters) - O pessimismo prevaleceu na bolsa paulista nesta quarta-feira, com o Ibovespa recuando para a mínima em 17 meses, em meio à apreensão persistente com um eventual fim do mecanismo de juros sobre capital próprio e com o anúncio de estímulos ao setor automotivo reavivando temores de ingerência do governo federal nos bancos públicos.
De acordo com dados preliminares, o Ibovespa fechou em queda de 1,85 por cento, a 46.571 pontos, menor nível desde 19 março de 2014. O giro financeiro totalizava aproximadamente 5,5 bilhões de reais.
Na FOLHA: Bolsa atinge menor nível em 17 meses com quadro político; dólar sobe
A Bolsa brasileira atingiu nesta quarta-feira (19) o menor nível desde março de 2014 afetada por preocupações com votações que podem prejudicar o ajuste fiscal. Dados fracos de atividade econômica também pesaram, assim como incertezas envolvendo a economia chinesa e a divulgação da ata do banco central americano.
O Ibovespa, principal índice do mercado acionário brasileiro, caiu 1,82%, para 46.586 pontos, o menor nível desde 19 de março de 2014, quando o índice encerrou a 46.567 pontos.
No mercado cambial, o dólar voltou a subir em relação ao real, também impactado pelo cenário político. No entanto, a divulgação da ata do Federal Reserve (Fed, banco central americano) conteve o avanço da moeda americana, com a percepção de que a alta de juros nos Estados Unidos deve ocorrer apenas em dezembro.
O dólar à vista —referência no mercado financeiro e que fecha mais cedo— teve alta de 1,22%, para R$ 3,503. O dólar comercial, usado em transações no comércio exterior, subiu 0,60%, para R$ 3,487.
Pesou no mercado a notícia de que o relator no Senado do projeto de lei que reverte parte da política de desoneração da folha de pagamento, Eunício Oliveira (PMDB-CE), deve manter o texto aprovado na Câmara dos Deputados. Isso significa menos receita para o governo e um ajuste fiscal menor.
O mercado também avaliou negativamente a notícia de que o governo pretende usar bancos públicos para socorrer empresas que se comprometerem a não demitir funcionários.
Segundo o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, as novas linhas de créditopara o setor automotivo não comprometem o ajuste fiscal.
O uso dos bancos públicos para financiar o setor produtivo fez parte da política de incentivo ao crescimento adotada entre 2008 e 2014, abandonada e criticada pela atual equipe econômica, em especial pelo Ministério da Fazenda e pelo Banco Central.
"Foi um 'efeito recaída' da [presidente] Dilma [Rousseff] para incentivar novamente os bancos públicos, além de ser negativo para o ajuste fiscal", diz Eduardo Velho, economista-chefe da Invx Global Partners.
FGTS
Outra notícia ruim para o ajuste fiscal foi a aprovação, na Câmara dos Deputados, da mudança na correção do FGTS.
O governo era contra alterar as regras, mas decidiu fechar acordo para evitar uma nova derrota. Conseguiu garantir recursos para o Minha Casa, Minha Vida e a regra de aumento gradual do percentual de remuneração.
Dados econômicos também causaram preocupação de investidores. O Banco Central divulgou que a atividade econômica do país teve queda de 2,49% no primeiro semestre do ano. Em junho, o recuo foi de 0,5% na comparação mensal.
Além disso, o IBGE informou que o emprego na indústria acumulou redução de 5,2% no primeiro semestre deste ano na comparação com o mesmo período do ano passado.
Para Leandro Martins, analista da corretora Rico, o mercado deve voltar a subir nos próximos dias. "Você tem um cenário de muita volatilidade no mercado. Os papéis estão com preços bem esticados para baixo e a Bolsa vem mostrando que quer voltar a subir nos últimos dias", ressalta.
CHINA
O governo chinês ampliou a política de incentivo fiscal para pequenas empresas em uma tentativa de impulsionar o consumo e conter a desaceleração da economia. De acordo com a medida, os impostos que incidem sobre o lucro dessas companhias serão reduzidos à metade. Serão beneficiadas empresas que tiverem lucro anual taxável de no máximo 300.000 yuans (US$ 46.907).
"A sinalização é ruim para os mercados, pois o governo está tentando diminuir a aversão ao risco com medidas fiscais. Caso volte a adotar outras medidas, como a desvalorização do yuan, pode pressionar os emergentes, que ficam menos competitivos em termos de balança comercial", ressalta Velho.
As ações da Vale —que exporta minério de ferro para o país— fecharam em baixa pelo quinto dia. Os papéis preferenciais da mineradora tiveram desvalorização de 2,67%, para R$ 13,48, e os ordinários caíram 3,33%, para R$ 16,84.
As siderúrgicas também foram afetadas. As ações da CSN tiveram queda de 5,74%, enquanto Gerdau caíram 4,24% e as ações preferenciais da Usiminas cederam 3,87%.
As ações da Petrobras caíram pelo quinto dia. As ações preferenciais —mais negociadas— cederam 2,33%, para R$ 8,79. No horário, os papéis ordinários —com direito a voto— caíram 2,50%, para R$ 9,77.
O setor financeiro fechou o dia com fortes desvalorizações. As ações do Itaú Unibanco tiveram queda de 2,05%, para R$ 26,28. Os papéis preferenciais do Bradesco perderam 2,72%, para R$ 23,60. As ações do Banco do Brasil encerram o dia com queda de 6,17%, para R$ 18,41.
EUA
O momento mais aguardado do dia pelos investidores foi a divulgação da ata da última reunião do Fed, em julho. A minuta mostrou que a elevação dos juros nos EUA ainda não é consenso entre as autoridades que compõem o comitê de política monetária.
A aposta maior era de alta já em setembro, mas o tom da minuta fez com que aumentassem as expectativas de aumento em dezembro. Na ata, integrantes do Fomc observaram que o pleno emprego está próximo, mas indicaram que precisam de uma melhora adicional no mercado de trabalho antes de elevar os juros. A inflação também preocupa, por estar bem distante da meta de 2% ao ano estimada pelo Fed.
"A desaceleração da China foi citada na ata como um dos motivos para a cautela do banco central americano em elevar os juros", avalia Linican Batista, executivo da equipe de analises da Um Investimentos. "Foi incorporado o fator China".
"A desvalorização do yuan pode impactar negativamente a inflação nos EUA via balança comercial. Se a moeda chinesa se desvaloriza em relação ao dólar, os produtos chineses ficam mais baratos comparativamente em dólar. Isso acaba atrapalhando os EUA em sua meta de inflação", destaca.
O aumento dos juros nos EUA deixaria os títulos do Tesouro americano -cuja remuneração acompanha essa taxa e que são considerados de baixíssimo risco- mais atraentes do que aplicações em emergentes, como o Brasil, provocando uma saída de recursos dessas economias. Com a menor oferta de dólares, a cotação do dólar seria pressionada para cima.
Nesta quarta-feira foram divulgados dados mais fracos que o esperado de preços ao consumidor nos Estados Unidos. O índice de preços ao consumidor subiu 0,1% em julho, de acordo com dados que excluem efeitos sazonais. A leitura ficou abaixo da expectativa de analistas, que viam avanço de 0,2%.