Na FOLHA: empresários e banqueiros mantem Dilma no Poder

Publicado em 17/08/2015 02:42
Na prática, o "FORA DILMA" já está valendo. Mas ganha sobrevida com apoio de empresários ligados a Michel Temer

Ainda nas cordas (editorial da FOLHA)

Apesar de mudanças recentes no comportamento de políticos e empresários, Dilma continua pressionada pelos protestos nas ruas

Centenas de milhares de pessoas voltaram às ruas neste domingo (16) para protestar contra o governo Dilma Rousseff (PT).

Criticando a administração federal, condenando a corrupção, execrando Lula e o PT ou pedindo o afastamento da presidente, os manifestantes se reuniram em pelo menos 120 cidades.

Não eram tantos quanto no dia 15 de março, quando o maior ato, na avenida Paulista (São Paulo), atraiu 210 mil pessoas, de acordo com medição do Datafolha.

Mas os 135 mil que, segundo o instituto, se aglomeraram desta vez no mesmo local constituem, ainda assim, multidão bastante expressiva sob qualquer perspectiva –basta lembrar, por exemplo, que no dia 12 de abril se contaram 100 mil manifestantes.

Sem que tenham sido os maiores, mas sem que tenham perdido força, os protestos deste 16 de agosto não parecem destinados a provocar mudanças no atual ritmo da crise política. Se mantêm Dilma nas cordas, não a nocauteiam –pelo menos não por enquanto.

Ainda muito pressionada e tendo três anos e três meses de governo adiante, a presidente mais impopular da nossa história começou nos últimos dias um atabalhoado diálogo com variados setores da sociedade.

Ao país não interessa que essas conversas resultem em conchavos ou acordões por baixo dos panos –e a cobrança das ruas sem dúvida inibirá movimentações nessa vergonhosa direção.

Interessa, contudo, que se apresentem soluções para a crise brasileira, que não se resume a uma recessão na economia e a um desarranjo na coalizão parlamentar.

O que há de relevante no governo Dilma são as providências econômicas propostas, negociadas e implementadas parcialmente pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Trabalhos, porém, que também se limitam à administração de emergência dos imensos problemas gestados de 2011 a 2014.

As solicitações de apoio e o novo fôlego que o PMDB parece disposto a oferecer devem ter como contraparte um plano de reformas.

Trata-se de um novo pacto, um reconhecimento de que é preciso reorganizar o governo em outros termos, pois as ações do primeiro mandato de Dilma, seu programa eleitoral e a base política que mal e mal o sustentavam se esfarelaram.

Não se trata de dizer apenas que a presidente precisa reconhecer seus erros ou fazer um "mea culpa" público –isso não basta.

Dilma Rousseff precisa governar com a nova coalizão que procura formar e em resposta a uma realidade econômica dramática. Suas palavras não podem ser oportunistas ou vazias.

 

VINICIUS MOTA

Os piratas e a náufraga

SÃO PAULO - A disposição de sair à rua e protestar mantém-se firme, a julgar pelo público presente na avenida Paulista neste domingo. Já na avaliação da população brasileira, o quadro para Dilma Rousseff só fez piorar de abril para cá: 71% julgam ruim ou péssimo o seu governo; 8% o consideram ótimo ou bom; 66% querem o impeachment.

Na prática o "Fora, Dilma" já ocorreu, pois a presidente deixou de governar. É uma náufraga à deriva em meio aos escombros do primeiro governo. Agarra-se a qualquer objeto que flutue lançado pelos bucaneiros que sustentam sua existência simbólica, enquanto despojam o segundo navio e acotovelam-se pelo timão.

Dilma é útil aos piratas porque para ela e seu partido convergem os feixes das frustrações na República.

A condição material de vida da população vai piorar ainda mais nos próximos 12 meses. O monstro da corrupção na Petrobras e em outros ramos do Estado ficará mais visível. Esses poderosos vetores concorrerão para a cristalização da impopularidade da presidente e do PT.

É confortável, para aliados e adversários presos no labirinto de seu egoísmo, manter uma carcaça presidencial sobre a qual recai por inércia a culpa pelos estragos. Todos os outros atores podem se distanciar da responsabilidade, enquanto pilham o que resta da máquina do Executivo e oneram o futuro do país.

Nestes últimos dias a opinião pública se iludiu um pouco mais a respeito do caráter sacrossanto do impeachment. Arraiga-se a impressão de que haveria óbices incontornáveis na legislação para responsabilizar o presidente da República. Não os há.

A lei dos crimes de responsabilidade –nos itens sobre probidade e gestão orçamentária e financeira– é ampla o bastante para facultar a abertura do processo. O que existe é uma confluência de interesses políticos, cuja menor preocupação é preservar um mandato obtido nas urnas, a bloquear o caminho por enquanto.

Crise em verde e amarelo, por Fernando Canzian

As milhares de pessoas que se manifestaram neste domingo (16) contra o PT e o governo Dilma foram às ruas de um país que se deteriorou rapidamente em cinco meses, desde o grande protesto de 15 de março passado. Nem o simbolismo verde e amarelo saiu incólume dessa decadência.

De novo preponderaram as camisas do Brasil, ostentando no peito dos manifestantes o emblema da CBF. Mais uma piada pronta.

Desde maio, a Confederação Brasileira de Futebol está metida em um escândalo internacional sem precedentes, com seu ex-presidente José Maria Marín (2012-2015) preso na Suíça e outros sendo investigados.

Em março, o Brasil já havia tomado ciência da fraude que Dilma e o PT conduziram para ganhar as eleições. Também sabia que medidas duras viriam para tentar contornar a situação. A incógnita era a velocidade e a intensidade com que rumaríamos para um longo período de vacas magras.

As coisas estão mais claras. O que vemos é um pouco assustador.

Em março, o Ministério da Fazenda ainda perseguia um corte de gastos da ordem de R$ 66,3 bilhões (equivalente a 1,2% do PIB) para controlar o crescimento da dívida pública. Com a economia em recessão, Joaquim Levy jogou a toalha e a economia agora, se obtida, não deve passar de R$ 8,7 bilhões (0,15% do PIB).

A projeção de inflação para o ano também saltou, entre março e agora, de 7,9% para 9,32%. E o tamanho da recessão, que era calculado em uma queda do PIB de 0,66%, pode atingir 2%. Isso tudo combinado com uma taxa de juro básica (Selic) que passou de 12,75% ao ano em março para 14,25%, o que deprime ainda mais a economia.

O resultado tem sido menos atividade econômica, menor arrecadação e aumento da dívida pública. Que é corrigida pelos juros altos e que não está sendo contida por cortes de gastos. Tudo isso sem abalar a expectativa de descontrole nos preços.

No cotidiano dos manifestantes, o que importa é o desemprego. Passou de 6,2% em março para 6,9% em junho (último dado disponível). A população desocupada subiu a 1,7 milhão de pessoas. Em relação a junho de 2014, esse grupo cresceu 45%, o maior aumento anual de toda a série do IBGE, iniciada em 2002.

Abaixo, três exemplos da crise entre manifestantes paulistanos.

  Fernando Canzian/Folhapress  
O casal Adriano e Raquel Mota, 56

O casal Adriano e Raquel Mota, ambos com 56 anos, são donos de uma metalúrgica cujo faturamento já caiu cerca de 40%. Têm 160 funcionários e recentemente fizeram um corte de 10% no pessoal. Só a conta de energia, um dos "choques surpresa" de Dilma 2, saltou de R$ 112 mil ao mês para R$ 204 mil.

"Chega a doer. E não há como repassar esse reajuste" , diz Adriano. "Em 30 anos, nunca passamos por uma crise como essa", completa Raquel. O casal nunca votou no PT.

  Fernando Canzian/Folhapress  
O desempregado Marlon Calado, 20

O desempregado Marlon Calado, 20, é outro retrato da crise. Terminou o terceiro grau e não vê chance agora de se beneficiar de programas federais para cursar faculdade. Ambulante, vendia água na avenida Paulista ontem. Diz que, "com sorte", fatura cerca de R$ 1.000 por mês fazendo isso em jogos de futebol e outros eventos.

Marlon, mulher e filha pequena moram em uma invasão de um terreno na Zona Leste de São Paulo, onde construíram uma casa de madeira e se abastecem com "gatos" de água e luz. Ele nunca votou. "Não acredito em nada em se tratando de política", diz.

  Fernando Canzian/Folhapress  
Mohamed Geha, 28, médico residente na área de ortopedia

Mohamed Geha, 28, é médico residente na área de ortopedia. Diz que nada mudou ainda de forma aguda em sua vida. Mas ele e a mulher, Talita, acham que "o momento é de se proteger". Adiaram troca de carro, passaram a economizar mais e a planejar viagens "bem mais baratas". Sempre votaram no PSDB.

Replicados entre milhões de brasileiros, os exemplos acima ajudam a entender a velocidade da atual degradação econômica.

 

"Empresários doam água fria" (por Vinicius Torres Freire)

Michel Temer, Joaquim Levy e Romero Jucá fizeram mágicas e milagres a fim de salvar Dilma Rousseff de sua mais recente temporada no último círculo do inferno.

Pelo menos nos últimos dez dias, o trio não só procurou apoio dos donos do dinheiro grosso mas foi procurado por figuras e associações da elite econômica. Um industrial importante diz que "até queríamos alguém para conversar antes. Mas estava difícil, o governo Dilma não tem guichê nem conversa. Tivemos de falar com Temer e mesmo com Sarney".

Pelo menos desde o discurso do "alguém que reunifique o país", Temer passou a se encontrar ainda mais frequentemente, para não dizer freneticamente, com empresários, além de tentar amansar o Tribunal de Contas da União, que tem nas mãos um dos garrotes de Dilma.

Muito encontro relevante foi nos finais de semana, em São Paulo. Empresário graúdo foi à procura de Temer, por causa do "clima de intranquilidade do país". E tudo isso foi muito além e diferente das homenagens de Firjan-Fiesp ao vice-presidente, na semana retrasada, quando Dilma estava ao rés do chão.

Levy tem apoio relevante, embora chamuscado pelos aumentos de impostos, mas desta vez foi além de vender seu plano econômico. Ao levar os banqueiros a uma reunião consigo, em Brasília, contribuiu para criar a impressão, por ora não mais que isso, de que o governo não tinha sido abandonado de vez. Na verdade, um banqueiro que não é do Bradesco e deu peso à reunião de terça-feira vinha dizendo, nas internas, que, embora Dilma Rousseff seja um problema, as "exacerbações" e o "encaminhamento político" da questão não "contribuíam em nada para o país".

Na sexta-feira, Levy correu para outro abraço da galera empresarial, em São Paulo. Voltou a demonstrar otimismo, coisa que não fazia na primeira fase de vendas do ajuste fiscal, quando parecia querer trocar a ameaça de desastre iminente pela aprovação de seu plano de arrumação das contas.

O senador Romero Jucá (PMDB), entidade brasiliense sempiterna e líder parlamentar sem fronteiras (de FHC inclusive), arregimentou mais apoio, dada a sua antiga experiência de articular demandas empresariais e projetos de lei. Tudo isso, enfim, teve o "nihil obstat" de Renan Calheiros.

A Agenda Brasil, um arremedo de programa de Dilma 2 cheio de jabutis de lobbies, o casamento de fomes políticas com vontades de comer empresariais, também hábil e rapidamente costuradas por Jucá. Nessas conversas, porém, o senador não deu vida mansa à presidente. O PMDB-Senado quer "reorientar" o governo, em "estado crítico", dar "previsibilidade" ao empresariado e se mostrar à altura de governar em "qualquer situação", no dizer de um empresário "quase amigo" de Jucá.

Se o trio agiu de modo concatenado, não foi possível descobrir. Das conversas fica a impressão de que Calheiros e Jucá são agastados com Levy. De qualquer modo, houve um esforço concentrado de pedidos de socorro ao mundo da empresa, que por vezes até chegou de modo próprio a pedir "serenidade" a lideranças políticas.

Não é nem de longe toda a história da operação água na fervura (por que certas lideranças políticas deram um refresco à presidente?). Mas ajudou a dar sobrevida a Dilma 2.

 

VALDO CRUZ

O alívio da falsa estabilidade

BRASÍLIA - O dia de protestos não foi uma avalanche, o que faria o Palácio do Planalto amanhecer nesta segunda-feira (17) coberto de nuvens carregadas. Oxigênio para a presidente Dilma, que ganha mais tempo para tentar sair das cordas.

Mas não chegou a ser um dia de total alívio para o governo. Se pela manhã os dados captados pelo Planalto indicavam menos pessoas nas ruas neste domingo (16), à tarde São Paulo reuniu um pouco mais de manifestantes do que em abril.

Em outras palavras, as manifestações não foram gigantescas, como previa o governo, mas mostraram que a mobilização ainda segue acesa nesta terceira onda de protestos em sete meses e meio do segundo mandato da petista.

Um feito para os organizadores dos protestos, mas que não tiveram sucesso, por outro lado, em aumentar a pressão sobre a presidente.

Daí que, mesmo não sendo um dia para sair festejando, o Planalto tem o que celebrar. Afinal, desta vez a oposição resolveu divulgar os atos, foi para as ruas, mas não conseguiu engrossá-los. Sinal de que ainda não tira boa parte dos insatisfeitos de dentro de suas casas.

Ponto para o governo, pois, pelo ambiente atual, o cenário era perfeito para a oposição se juntar aos grupos independentes e colocar mais gente nas ruas. A inflação hoje está acima de 9%, o desemprego sobe, a economia afunda e a reprovação de Dilma Rousseff é recorde.

Em março, a situação era ruim, mas não tanto quanto hoje, e o número de manifestantes foi bem maior do que neste domingo. Agora, os indicadores são mais negativos, mas os novos insatisfeitos preferem bater forte na petista nas filas de supermercados, bancos, escolas e ônibus a sair do conforto de seus lares.

Enfim, a semana vai começar mais tranquila para Dilma, mas tudo ainda é muito incerto. Ela está sentada numa falsa estabilidade, que pode ser detonada a qualquer momento pela Operação Lava Jato.

VERA MAGALHÃES painel@uol.com.br

Meio cheio

Ao chegar ao Palácio da Alvorada no fim da tarde de domingo, auxiliares de Dilma Rousseff buscavam alento no fato de que a convocação feita pelo PSDB para os protestos não conseguiu inflá-los. Citando a queda de adesão em São Paulo e Rio, governistas ensaiavam o discurso de que o "povo não é massa de manobra" e rejeita a "partidarização" dos atos. Fora do discurso otimista, preocupou o governo o fato de os atos no Nordeste, notadamente em Salvador, terem sido significativos.

Olha ele O que mais chamou a atenção da oposição nos atos foi a unanimidade do apoio ao juiz federal Sergio Moro, que ofuscou todos os líderes partidários, inclusive Aécio Neves (PSDB-MG).

Cristal quebrado Congressistas de DEM e PSDB comemoravam o fato de o ex-presidente Lula ter sido foco dos protestos também no Nordeste. Diziam que a Lava Jato fez com que o petista perdesse a condição de intocável que detinha na região.

Inflamável Deputados insatisfeitos com a aproximação de Dilma com o Senado celebraram o tamanho dos atos. Dizem que eles mostraram que a "Agenda Renan" não foi suficiente para apaziguar as ruas. O clima na Casa deve permanecer instável.

 

Fonte: Folha de S. Paulo

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