Na FOLHA: 'Índice de infelicidade' é o maior em 9 anos -- e explica a queda da popularidade de Dilma

Publicado em 14/05/2015 08:18
Indicador que soma desemprego e inflação dá um salto no primeiro trimestre e é o mais alto desde o fim de 2005, por ÉRICA FRAGA, da FOLHA DE SÃO PAULO

'Índice de infelicidade' é o maior em 9 anos

Para economista de consultoria que calculou índice, dado ajuda a explicar a queda da popularidade de Dilma

 

A sensação de bem-estar da população brasileira medida pelo "índice de infelicidade" --soma das taxas de desemprego e inflação-- atingiu no primeiro trimestre de 2015 seu pior patamar em mais de nove anos.

Entre os três últimos meses de 2014 e os três primeiros deste ano, o indicador (também conhecido como "índice de miséria") saltou de 13,5 para 15,5 pontos. Trata-se do maior nível registrado desde o último trimestre de 2005, segundo a LCA Consultores.

O cálculo considerou a inflação, acumulada em 12 meses, de 8,1% em março e a taxa de desemprego de 7,3% (com ajuste sazonal), entre janeiro e março deste ano, segundo a Pnad Contínua, pesquisa que mede o nível de ocupação em todo o país.

Embora a nova pesquisa de desemprego do IBGE tenha dados a partir de 2012, a LCA construiu uma série mais longa da Pnad Contínua, desde 1995, feita com base em outras estatísticas oficiais.

A partir dessas estimativas de desemprego, a consultoria calculou o "índice de infelicidade" trimestral nas últimas duas décadas no país.

Os dados indicam que o salto de dois pontos percentuais sofrido pelo indicador na virada entre 2014 e 2015 foi o mais elevado em 12 anos.

Para Bráulio Borges, economista-chefe da LCA, a deterioração abrupta ajuda a explicar a forte erosão da popularidade do governo de Dilma Rousseff no período.

"O índice é uma boa medida de bem-estar social e tem uma alta correlação com a popularidade do governo", diz.

Embora a inflação --que corrói o poder de compra da população-- já tivesse iniciado uma trajetória de alta nos últimos anos, o desemprego permanecia baixo.

A piora da situação econômica, no entanto, tem revertido esse quadro.

Como a expectativa é que o desemprego continue subindo nos próximos meses e a inflação permaneça alta, o "índice de infelicidade" deve subir ainda mais.

Isso significa que a avaliação do governo Dilma poderá voltar a piorar.

Em abril, apenas 13% dos eleitores consideravam a administração petista boa ou ótima, segundo pesquisa feita pelo Datafolha.

A taxa só é comparável à dos piores momentos de Itamar Franco (12% de aprovação em novembro de 1993) e Fernando Henrique Cardoso (13%, em setembro de 1999).

MAU HUMOR E PANELAÇO

Para o cientista político Carlos Melo, do Insper, é improvável que a taxa de aprovação do governo tenha novo recuo significativo, por já se encontrar em nível muito baixo. Mas ele acredita que a nota que a população atribui à administração petista (3,8 no Datafolha de abril) pode continuar caindo.

"Isso poderá levar a uma indisposição ainda maior com o governo, mais mau humor, mais panelaço", diz Melo.

Para o especialista, é difícil prever se esse movimento, se confirmado, fortaleceria grupos que defendem o impeachment de Dilma. Mas, segundo ele, enfraqueceria ainda mais a presidente em sua relação com o Congresso.

 

VINICIUS TORRES FREIRE

O novo calendário da crise

Com otimismo, economistas de Dilma 2 devem apagar incêndio de Dilma 1 até junho; e daí?

ATÉ O COMEÇO de junho, os economistas de Dilma 2 devem apagar a maior parte do incêndio tocado por Dilma 1, caso o Congresso não lance chamas nas ruínas.

Concedido o relativo otimismo, fica a pergunta: Dilma 2 vai então formular algum projeto positivo de reforma? Vai começar a discutir o ajuste de 2016?

Até junho vota-se o plano de corte de despesas e aumento de impostos de Joaquim Levy. O ministro da Fazenda promete que em até dez dias sai o Orçamento de verdade.

No início de junho, o Banco Central deve fazer ou anunciar o último aumento da taxa básica de juros neste ano. Também no mês que vem, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, deve revelar o plano concessões de infraestrutura, aeroportos, rodovias, ferrovias e talvez alguma coisa em portos.

Graças à recessão feia, ao aumento horrendo de preços e a alguma sorte com as chuvas, estima-se agora que não deve haver racionamento de eletricidade neste ano. Existe até a esperança de que se desmonte, ainda que de modo disfarçado e precário, o programa que arruinou a Petrobras.

A própria enumeração dos focos de incêndio, porém, indica que a coisa ainda estará quente em 2016.

O superavit primário federal prometido para 2016 é o dobro do anunciado para 2015. A economia deve crescer um tico, e haverá receita extra devida a leis aprovadas neste ano. Ainda assim, não vai ser fácil. Para começar, não conviria contar com outro talho no investimento público, que será de uns 30% neste ano, o equivalente talvez a um quarto do superavit federal deste 2015.

O setor elétrico está em desordem endividada. Sim, usinas importantes passam a operar daqui até 2016. Mas a situação dos reservató- rios ainda será crítica e, a não ser em caso de novo desastre econômico, o consumo de eletricidade vol- ta a crescer. Ainda não se sabe de reforma do setor.

Faltam crédito e meios de financiar setores essenciais para alguma retomada econômica, construção pesada, infraestrutura, construção civil, em parte devido à ruína corrupta das empreiteiras. Escasseia o dinheiro no BNDES, na poupança ou no FGTS, por exemplo, e ainda não está claro como será a transição para um sistema de financiamento mais dependente do setor privado.

Fica-se a pensar se é possível ressuscitar o investimento público sem alta adicional de impostos (ou corte de algum gasto público grande, o que em geral depende de leis complicadas de aprovar).

Decerto os economistas de Dilma 2 estavam e ainda estarão por alguma tempo envolvidos na tarefa de lidar com a agonia de Dilma 1 e o decorrente risco de desastre. Porém, ainda que o paciente fique estável, o estado da economia é crítico ou pelo menos preocupante.

Pode ser que o sucesso do arrocho, a recessão e a relativa calmaria no exterior permitam um corte na taxa de juros a partir do início de 2016. Mas o ânimo ou a capacidade dos bancos de conceder crédito devem estar avariados pela crise, falências e desemprego. O mercado de capitais está na apatia sabida; falta criar ou azeitar instrumentos para financiar a retomada de investimentos.

Ainda restam muita fumaça tóxica e brasa dormida do incêndio de Dilma 1. O rescaldo vai demorar. Começa logo no mês que vem.

 

Governo vence uma votação na Câmara, mas perde duas

Texto principal de segunda medida do pacote fiscal foi aprovado com folga

Na votação do chamado fator previdenciário e de uma emenda sobre auxílio-doença, porém, o Planalto foi derrotado

RANIER BRAGONSOFIA FERNANDESVALDO CRUZDE BRASÍLIA

Depois de aprovar com folga o texto principal da segunda medida do pacote fiscal, o governo Dilma Rousseff foi derrotado duas vezes na Câmara, resultado de traições em partidos da base aliada, entre eles o PMDB e o próprio PT, os dois maiores aliados.

As derrotas foram nas votações de emendas à medida provisória 664, que restringe a concessão de benefícios previdenciários como pensão pós-morte e auxílio-doença.

Por 232 votos a 210, os deputados impuseram a primeira derrota ao Planalto ao aprovar, na noite desta quarta (13), uma emenda que cria uma alternativa ao fator previdenciário na hora de o trabalhador decidir se aposentar.

O PMDB, do novo articulador político do governo, o vice Michel Temer, registrou 20 votos contra. O PT contribuiu com outros nove votos contra. O governo perdeu por uma diferença de 22 votos.

A segunda derrota, por 229 a 220, foi na emenda que derruba a proposta do Planalto de elevar de 15 para 30 dias o período que as empresas têm de pagar para seu trabalhador o benefício do auxílio-doença. Depois, as despesas ficam com a Previdência.

Nesta votação, o PMDB registrou 17 traições. Já o PT votou em peso com o governo, registrando só um voto contra. O Planalto, porém, foi traído por quase toda bancada do PP, autora da emenda, com o apoio do empresariado.

Segundo a Folha apurou, a presidente Dilma irá vetar a emenda sobre o fator previdenciário, se o Senado também aprovar o texto, e negociar com as centrais sindicais uma outra proposta num prazo de 180 dias.

Pelos cálculos do governo, se os trabalhadores passarem a não optar pelo fator na hora de se aposentar a partir deste ano, os gastos da Previdência com aposentadoria vão aumentar em R$ 40 bilhões em dez anos; e R$ 300 bilhões nos próximos 20.

O fator previdenciário foi criado no governo do tucano Fernando Henrique Cardoso com o objetivo de retardar as aposentadorias. Ele é calculado de acordo com a idade do trabalhador, tempo e alíquota de contribuição e expectativa de sobrevida.

A emenda aprovada no plenário da Câmara nesta quarta, de autoria do PTB, propõe uma exceção a essa regra, com a adoção da fórmula 85/ 95 --soma, para mulheres e homens, da idade mais o tempo de contribuição. Caso o trabalhador decida se aposentar antes de atingir essa marca, a emenda determina que a aposentadoria continue sendo reduzida pelo fator previdenciário.

Antes da votação da emenda, o governo havia conseguido aprovar com tranquilidade, por 277 votos a 178, o texto principal da medida provisória 664. Conseguiu endurecimento da regras de concessão de pensão por morte.

Durante a votação do texto principal, o governo voltou a enfrentar protestos da oposição, que mais uma vez entoou no plenário o coro de que "o PT pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão". Os deputados levaram faixas contra Dilma, o que causou empurra-empurra entre congressistas.

A sessão foi interrompida quando alguns manifestantes da Força Sindical, ligados ao deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), abaixaram as calças nas galerias e mostraram as nádegas.

Na semana passada, a Câmara aprovou a medida 665, que reduz direitos trabalhistas como seguro-desemprego. Completa o pacote fiscal o projeto de lei que revê a política de desoneração da folha de pagamento, que deve ir a voto na próxima semana.

Traição ocorreu até entre líderes do PT

Nove dos 63 membros da bancada petista votaram contra o governo, entre eles o ex-presidente da Câmara Marco Maia

Apesar de fator previdenciário ter sido criado por FHC, tucanos foram unânimes em flexibilizar regra

DE BRASÍLIA

A traição na votação desta quarta (13) que criou alternativa ao fator previdenciário envolveu integrantes do primeiro time da bancada do PT.

Entre os nove deputados (de uma bancada de 63) que votaram contra os interesses do governo estão o ex-presidente da Câmara Marco Maia (RS), o ex-líder da bancada Vicentinho (SP) e o relator da MP 664 --a que restringe direitos previdenciários--, Carlos Zarattini (SP).

O PMDB também registrou mais traições do que nas votações anteriores do ajuste fiscal: 20 de seus 67 deputados votaram contra o Planalto.

Durante toda a sessão, o governo pediu aos seus aliados que não apoiassem a emenda do PTB. Mas nem mesmo a promessa do Planalto de que uma nova alternativa ao fator viria à tona em 180 dias evitou a derrota.

O PDT e o PC do B também votaram em peso contra a presidente Dilma. No PP, PSD e PTB as dissidências também foram expressivas.

Na oposição, o PSDB mais uma vez agiu de forma coesa contra Dilma. Apesar de o fator previdenciário ter sido criado no governo do tucano FHC, todos os 45 deputados da sigla que votaram apoiaram a emenda que flexibiliza a regra previdenciária.

Fonte: Folha de S. Paulo

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