Ministros do STF e politicos de oposição não gostaram de ver Bolsonaro com o povo
Sem citar nomes, Estadão diz que "ministros" do STF não gostaram das manifestações
Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e de tribunais superiores ouvidos reservadamente pelo Estado/Broadcast avaliam que houve "manipulação política" nos protestos a favor do presidente Jair Bolsonaro ocorridos neste domingo em cidades espalhadas pelo Brasil.
Embora evitem o confronto público com o Palácio do Planalto, magistrados reprovaram o gesto do presidente Jair Bolsonaro de romper o isolamento e falar com apoiadores durante a manifestação em Brasília, contrariando recomendações do Ministério da Saúde.
Bolsonaro teve teste negativo para o novo coronavírus, mas terá de refazer os exames. Nesse caso, a orientação de sua equipe médica é que ele fique em isolamento até quarta-feira, quando se completa uma semana do último contato com o secretário de Comunicação, Fábio Wajngarten, que está com a infecção.
Na avaliação de um ministro do STF, o principal problema foi o presidente da República apoiar um protesto em que os seus simpatizantes gritavam palavras de ordem contra o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o presidente do STF, Dias Toffoli, e pediam até o fechamento do Congresso Nacional.
Para esse magistrado, Bolsonaro busca criar um "eixo de conflito", lançando uma cortina de fumaça para tirar o foco dos problemas que atingem o governo. Essa estratégia já teria sido usada na semana passada, quando Bolsonaro lançou suspeitas sobre o sistema eletrônico de votação ao afirmar que houve "fraude" no pleito de 2018.
Antes da nova manifestação, Toffoli já vinha adotando um discurso de pacificação e de harmonia entre os Poderes. Depois de cumprir agenda oficial no Marrocos, Toffoli ainda não se manifestou publicamente sobre os atos deste domingo, mas no mês passado, divulgou nota em que afirmava que o Brasil "não pode conviver com um clima de disputa permanente" e que é preciso "paz para construir o futuro".
Toffoli afirmou na ocasião que não existe "democracia sem um Parlamento atuante, um Judiciário independente e um Executivo já legitimado pelo voto".
Um ministro de tribunal superior ouvido reservadamente pela reportagem considerou as manifestações um "desrespeito à democracia", não apenas pelas faixas e mensagens contra o Estado de Direito, mas à saúde pública, num momento no qual o mundo vive a gravidade de uma pandemia.
Embora defenda o direito de populares irem às ruas para expor suas ideias, um outro magistrado demonstrou desconforto com o apoio de populares à edição de um novo AI-5.
O AI- 5 foi o Ato Institucional mais duro instituído pela repressão militar nos anos de chumbo, em 13 de dezembro de 1968, ao revogar direitos fundamentais e delegar ao presidente da República o direito de cassar mandatos de parlamentares, intervir nos municípios e Estados. Também suspendeu quaisquer garantias constitucionais, como o direito a habeas corpus, e instalou a censura nos meios de comunicação. A partir da medida, a repressão do regime militar recrudesceu.
Para um quarto ministro, os protestos ficaram esvaziados diante da pandemia do coronavírus, o que teria enfraquecido a mobilização popular, e disse acreditar que é preciso lidar "com serenidade".
Bolsonaro se junta à multidão em frente ao Planalto; Congresso reage, diz a Reuters
(Reuters) - O presidente Jair Bolsonaro defendeu as manifestações deste domingo, se juntou a uma multidão em frente ao Palácio do Planalto, mesmo com o pano de fundo do surto do coronavírus, e disse que um entendimento dos Poderes com o povo vai mudar o país, o que gerou reação dos líderes do Legislativo.
"Isso não tem preço, não existe satisfação maior para um ser humano, para um político, do que isso", disse Bolsonaro, em referência ao apoio dos manifestantes, em uma transmissão ao vivo em rede social que durou mais de uma hora.
"Todos nós, políticos, chefes de Poderes, estamos no mesmo barco", disse. "Tenho certeza, um entendimento nosso com o povo, não é entre nós não, é nosso com o povo, a gente muda o Brasil", disse.
As manifestações deste domingo vinham sendo convocadas por grupos de apoio ao presidente, mas também para protestar contra o Congresso e contra o Judiciário. Bolsonaro, no entanto, classificou neste domingo os atos como um "movimento patriótico" e minimizou as críticas aos demais Poderes.
"Não estão lutando contra Poder nenhum, estão lutando pelo Brasil", disse. "Não é contra nada, é a favor do Brasil."
Devido ao aumento de casos do novo coronavírus no pais, o próprio Bolsonaro havia feito um apelo na quinta-feira para que as manifestações deste domingo fossem repensadas.
Autoridades e especialistas têm sugerido que sejam evitadas grandes aglomerações de pessoas. Isso não impediu, no entanto, que uma multidão compacta se juntasse diante do Palácio do Planalto.
O presidente Bolsonaro vinha publicando vídeos de manifestações pelo país em suas redes sociais desde o início da manhã deste domingo.
Ao começar a transmissão ao vivo em frente ao Planalto, o presidente ainda disse: "com tudo contra, imprensa, vírus, recomendações, o povo foi às ruas".
A expectativa era que o próprio presidente se resguardasse neste domingo. Após ser divulgado que o secretário de Comunicação de Presidência, Fabio Wajngarten, foi infectado com o coronavírus, Bolsonaro realizou um teste que teve resultado negativo.
Mas Bolsonaro ainda deve passar por outro exame para confirmar que não está infectado devido ao tempo de encubação do vírus.
Ainda assim, o presidente tocou muitas pessoas que estavam diante do Planalto, além de ter pego diversos celulares para tirar selfies com apoiadores.
O repetido apoio do presidente às manifestações tem gerado descontentamento entre parlamentares e no Supremo Tribunal Federal (STF). Apesar de Bolsonaro afirmar que os atos só visavam apoiar o governo ou o país, havia entre os manifestantes cartazes com duras críticas aos demais Poderes.
Em Brasília mesmo, em uma manifestação, uma faixa tinha os dizeres: "Contra os vírus do STF e do Congresso, álcool e fogo!".
No Rio de Janeiro, onde centenas de pessoas se reuniram na praia de Copacabana, também não faltaram ataques aos líderes do Congresso.
“Fora Alcolumbre, fora Rodrigo Maia, fora esses canalhas que acabam com o Brasil”, disse o manifestante Daniel Silva, com máscara e cartaz na mão, referindo-se ao presidente do Senado e Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP) e ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia.
“Sou brasileira patriota e quero esse país limpo. Não tem coronavírus que me impeça de defender o Brasil contra a patifaria do Congresso”, disse Claudia Santos à Reuters.
À noite, Maia e Alcolumbre, dois dos alvos dos protestos, reagiram à participação de Bolsonaro, especialmente em função da situação da pandemia do coronavírus, e pediram responsabilidade ao presidente.
"O mundo está passando por uma crise sem precedentes... Há um esforço global para conter o vírus e a crise", disse Maia no Twitter.
"Por aqui, o Presidente da República ignora e desautoriza o seu ministro da Saúde e os técnicos do ministério, fazendo pouco caso da pandemia e encorajando as pessoas a sair às ruas. Isso é um atentado à saúde pública que contraria as orientações do seu próprio governo", acrescentou.
Em nota, Alcolumbre disse que "é hora de amadurecermos como nação".
"Com a pandemia do coronavírus fechando as fronteiras dos países e assustando o mundo, é inconsequente estimular a aglomeração de pessoas nas ruas", disse o presidente do Congresso.
"A gravidade da pandemia exige de todos os brasileiros, e inclusive do presidente da República, responsabilidade! Todos nós devemos seguir à risca as orientações do Ministério da Saúde", continuou Alcolumbre.
"Convidar para ato contra os Poderes é confrontar a Democracia. É tempo de trabalharmos iniciativas políticas que, de fato, promovam o reaquecimento da economia, criem ambiente competitivo para o setor privado e, sobretudo, gerem bem-estar, emprego e renda para os brasileiros."
Mais tarde, em entrevista à CNN Brasil, Bolsonaro procurou minimizar a crise do coronavírus e disse que em outras epidemias não não houve tanta histeria em reação, como classificou o comportamento atual.
Parlamentares de oposição e ex-aliados também não gostaram do comportamento de Bolsonaro
Parlamentares ex-aliados de partidos de direita e de centro criticaram a atitude do presidente Jair Bolsonaro neste domingo, 15. Ele participou da manifestação pró-governo em Brasília e interagiu com manifestantes.
O líder do Solidariedade na Câmara, Zé Silva (MG), disse que "muito mais importante do que a gente fala é o que faz". A presidente da Comissão de Cidadania e Justiça (CCJ) do Senado, Simone Tebet (MDB-MS), também foi sucinta nas palavras. Ela disse apenas que deixa "a fotografia e história falarem por si"
A líder do PSL na Câmara, ex-partido de Bolsonaro, Joice Hasselmann (SP), disse que a atitude de Bolsonaro é incompreensível. "Não dá pra entender o comportamento irracional do presidente", disse. "Ou é maluquice ou irresponsabilidade. Nem Freud explica", afirmou.
O líder do PSD no Senado, Otto Alencar (BA), classificou o comportamento do presidente como o de um "bufão". "Uma palhaçada com uma coisa tão grave como essa", disse. Alencar, que é médico e ex-secretário de Saúde na Bahia, disse que irá encaminhar um pedido aos presidentes do Senado e da Câmara amanhã pedindo que os R$ 30 bilhões de emendas, os quais a gestão ainda é disputada entre Congresso e Executivo, sejam destinados à saúde para combater o avanço do coronavírus.
O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), também fez críticas. "Não ajuda neste momento que nós estamos vivendo tantos desafios", disse. O emedebista, no entanto, afirmou que a manifestação não altera a relação entre Executivo e Legislativo. "Ele (o presidente) tem um estilo. A essa altura, o Congresso já sabe o que esperar. Acho que não muda nada, não."
João Doria: Bolsonaro está mais preocupado com a sua vida política
Para o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), a atuação do presidente Jair Bolsonaro em relação aos atos pró-governo neste domingo, 15, foi "imprópria e inoportuna". Orientado a ficar em isolamento até refazer testes para o coronavírus, Bolsonaro cumprimentou apoiadores que se manifestavam no Palácio do Planalto.
"Imprópria e inoportuna. Nós estamos reunidos aqui para tomar decisões para proteger a vida das pessoas. E o presidente Bolsonaro está mais preocupado com a sua vida política. Eu procuro pensar em todos. O presidente pensa nele", comparou o governador ao Estado. Ele é apontado como possível adversário de Bolsonaro na eleição de 2022.
Em Brasília, Bolsonaro chegou a usar o telefone celular de algumas pessoas para tirar selfies ao lado delas, além de cumprimentá-las com as mãos abertas. Em alguns momentos, chegou a colar o rosto ao de apoiadores para fazer fotos.
Além de participar do ato em Brasília, Bolsonaro passou o dia compartilhando vídeos e fotos sobre as manifestações no Twitter. Em uma delas, era possível ler faixas 'Fora Maia', em referência ao presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ), 'Fora STF' e 'SOS Forças Armadas'. Bolsonaro identificava a imagem como sendo de Maceió, Alagoas. A foto foi apagada da conta de Bolsonaro.
Na capital paulista, Doria foi alvo de manifestantes que gritavam contra o "comunavírus" e veem a pandemia como uma "farsa". Para alguns dos manifestantes, o governador tentou impedir a realização do ato. Na sexta, o governo de São Paulo e a Prefeitura da capital cancelaram eventos públicos com mais de 500 pessoas. A Secretaria de Segurança Pública do Estado manteve o policiamento dos atos que já haviam sido comunicado à autoridades.
Witzel evita comentários
Procurado pela reportagem para comentar a participação do presidente Bolsonaro no protesto de Brasília, o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), disse que não comentará assuntos que não sejam os impactos da covid-19. "O governador Wilson Witzel está tratando, unicamente, das medidas para evitar os impactos da covid-19, inclusive que haja mortes no Estado", diz a nota enviada pela assessoria de imprensa do mandatário.
"Outros assuntos não são relevantes neste momento", continua o texto, que evitou comentar também o fato do ato em Copacabana, na zona sul do Rio, ter sido marcado também por protestos contra Witzel.
O governador fluminense vem tentando evitar polêmicas na hora de rebater atitudes de Bolsonaro ou aspectos do governo. Durante o carnaval, no desfile na Sapucaí, por exemplo, Witzel não endossou as críticas feitas ao presidente na avenida. Apesar disso, Witzel demonstra inconformismo com atitudes do Planalto, como a dificuldade de diálogo do presidente com os governadores.
Ao ir a manifestação, Bolsonaro contrariou médicos e auxiliares, diz Estadão
A decisão do presidente Jair Bolsonaro de ir ao encontro dos manifestantes no ato pró-governo neste domingo, 15, contrariou sua equipe médica e foi reprovada até mesmo por aliados próximos. Em caráter reservado, eles criticaram a atitude de Bolsonaro, que cumprimentou apoiadores com as mãos e fez selfies com o rosto colado, atitudes contrárias às orientações dadas pelo Ministério da Saúde.
Fontes da área de saúde admitiram ainda que esperavam que, apesar do comportamento impulsivo do presidente, dessa vez ele seguisse o protocolo diante do avanço da pandemia no Brasil, que já registra 200 casos. "Você acha que alguém tem coragem de peitar o presidente?", disse uma fonte, sob condição de anonimato.
Neste domingo, subiu para onze o número de infectados no grupo que acompanhou Bolsonaro na viagem a Flórida, nos Estados Unidos, na semana passada. Além dos onze brasileiros, o prefeito de Miami, Francis Suarez, que recepcionou a comitiva brasileira, também está com a covid-19.
Na sexta-feira, 13, médicos da Presidência orientaram que Bolsonaro, apesar de testar negativo para o coronavírus, ficasse em quarentena pelo menos até a terça-feira, 17. Nesta data, se completa sete dias da volta de Bolsonaro dos Estados Unidos ao Brasil, portanto o último contato sabido com pessoas infectadas
Outros integrantes que viajaram no avião presidencial ou estiveram com Bolsonaro nos Estados Unidos confirmaram que também foram orientados a ficar em autoisolamento, mesmo com resultado negativo para o coronavírus. Assim como o presidente, eles foram informados que terão de refazer o exame.
Ao divulgar neste domingo que quatro integrantes da equipe de apoio do voo presidencial testaram positivo para o coronavírus, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) confirmou a orientação de quarentena mesmo para quem não está infectado.
"Os demais componentes (da comitiva), cujos testes apresentaram resultados negativos, continuarão no autoisolamento, cumprindo o protocolo determinado pelas autoridades sanitárias", diz a nota do GSI.