Em mercado atípico, leite registra redução de oferta e cotações aquecidas
Com 1,5 bilhão de litros captados no primeiro semestre de 2020, o Paraná se manteve como segundo maior produtor nacional de leite e o principal da região Sul, conforme dados da Pesquisa Trimestral do Leite (PTL), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com essa captação, o Estado responde por 12,9% da produção nacional. No ranking brasileiro, seguimos atrás apenas de Minas Gerais, que produziu 3,1 bilhões de litros no primeiro semestre de 2020. A disputa pela segunda colocação é sempre acirrada entre Paraná e Rio Grande do Sul, que se alternam ano a ano. Na parcial de 2020, o Paraná mantém o resultado de 2019.
O recuo na captação do primeiro para o segundo trimestre é tradicional no Brasil. A sazonalidade da produção forrageira das pastagens, sobre as quais grande parte da produção nacional depende, contribui para a redução na oferta de alimento, trazendo reflexo na produção leiteira. Contudo, chama a atenção a maior expressividade desse fenômeno em 2020, explicado pelo menor regime de chuvas em todo o Brasil.
Essa redução na oferta de leite agrava a competição entre os laticínios pela matéria-prima, contribuindo para sua valorização. O bom escoamento dos derivados lácteos para o atacado, e consequentemente no varejo, também impulsionam a alta. Nesse contexto, os efeitos da pandemia foram determinantes para um ano recorde de preços nominais do leite no campo.
Custo de produção
Entretanto, vale lembrar que as cotações aquecidas não são garantia da lucratividade. A atividade enfrenta uma sequência de aumentos de custos de produção de anos anteriores, superiores à escalada das cotações do leite. De acordo com o Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento (Seab), há um ano a tonelada de farelo de soja era cotado a R$ 1.298,36, enquanto a saca de milho, a R$ 34,04. Atualmente, ambas as cotações foram acrescidas em cerca de 50%, alcançando R$ 1.952,58 e R$ 51,50, respectivamente. Soma-se a isso medicamentos, equipamentos e insumos, em grande parte importados. No intervalo de um ano, o leite valorizou apenas 35%, mantendo os desafios da atividade.
A estocagem de produtos alimentícios pela população no início do isolamento social contribuiu para a valorização do leite. Mas o fechamento de restaurantes e food services trouxeram retração na demanda, interrompendo a curva ascendente do valor de referência para o leite de janeiro a abril, o que provocou a única queda nos valores divulgados pelo Conselho Paritário Produtores/Indústrias de Leite do Estado do Paraná (Conseleite-PR), em maio.
Ao longo da pandemia, verificou-se certo deslocamento da demanda do setor de serviços (restaurantes) para as redes supermercadistas, dado o favorecimento da população por refeições em casa. Nesse contexto, o pagamento do auxílio emergencial pelo governo federal foi determinante, trazendo consigo solidez na demanda por leites, queijos, manteiga, requeijão, entre outros. Ao todo, foram injetados cerca de R$ 250 bilhões na economia, predominantemente utilizados para a alimentação das famílias.
Esse aquecimento na demanda refletiu na capacidade de pagamento pelas industrias pela matéria-prima, retroalimentando a escalada de preços dos derivados e, consequentemente, do leite, acompanhada pelo Conseleite-PR. Verificou-se que a pandemia causada pela Covid-19 trouxe um cenário de mercado atípico, nunca antes verificado na história da produção de alimentos. Os gastos públicos estimulando o consumo para um terço da população nacional trouxeram robustez para a demanda e culminaram em melhor escoamento da produção leiteira. Entretanto, a redução de 50% no valor do auxílio emergencial deve impactar negativamente o escoamento de lácteos no varejo.
A conjuntura de intempéries climáticas e aumentos nos custos de produção, associados ao desestímulo de produtores com a atividade, histórico de preços não muito atrativo e a arroba valorizada têm contribuído na redução da oferta de leite. Esses fatores resultaram em aumento nas cotações desse alimento fundamental para milhões de brasileiros.
Entretanto, resta a preocupação com o cenário futuro, pois ainda é cedo para identificar os rumos que os reflexos da pandemia ditarão ao mercado. Mas uma coisa é certa, os picos de preço não prevalecem por muito tempo. Cabe ao produtor aproveitar o bom momento de preços para revisar seus custos e otimizar a alocação dos investimentos, visando recuperar as margens perdidas em anos anteriores.