Código Florestal: Como as principais mudanças da nova lei impactam na produção agropecuária do Brasil

Publicado em 20/11/2012 10:13 e atualizado em 10/03/2020 12:56
Grandes e médios produtores são responsáveis por 76% da área agrícola do País.
A Agência Câmara fez uma série de reportagens para explicar quais as principais mudanças depois da sanção do novo Código Florestal brasileiro e como irão impactar na produção agropecuária do país. As matérias explicam ainda de que forma serão afetados os pequenos, médios e grandes produtores. Confira abaixo as reportagens e entenda o que mudou. 

Obrigações diferentes de acordo com o tamanho da terra

A lógica usada na preservação e recuperação de matas nativas no campo brasileiro mudou. Uma das principais novidades do novo Código Florestal (Lei 12.651/12) é tratar de maneira diferente pequenos, médios e grandes produtores.

Se pelo código anterior, de 1965, as obrigações eram praticamente as mesmas entre os produtores, independentemente do tamanho da propriedade, agora os critérios são outros, principalmente no que diz respeito à recomposição de reserva legal e áreas de preservação permanente - aquelas às margens de rios e nascentes, por exemplo.

Justiça social
O deputado Bohn Gass (PT-RS), presidente da comissão especial sobre a medida provisória que alterou recentemente pontos do novo código, avalia que, apesar dos embates entre ruralistas, ambientalistas e governo, o texto final mantém o foco na justiça social.

"Nos lugares onde não há nenhuma árvore e precisa haver recuperação, o pequeno agricultor vai recompor menos, o médio mais e o maior ainda mais. É como na Justiça Tributária: quem tem muito paga muito e quem tem pouco paga pouco."

O novo código usa o módulo fiscal como critério para definir o tamanho das propriedades. Imóveis de até quatro módulos são considerados pequenos. De quatro a quinze módulos, médios. E, acima de quinze, grandes.

O módulo fiscal varia entre cinco e 100 hectares, de acordo com o município. Na Amazônia, por exemplo, ele ocupa, em média, 76 hectares. Na capital paulista, um módulo equivale a cinco hectares.

No Brasil, os médios e grandes agricultores representam cerca de 20% produtores. Por outro lado, as médias e grandes propriedades são responsáveis por 76% da área agrícola do País. É gente como o produtor paulista Marcelo Costa Censoni. A propriedade da família, em Leme, tem 157 alqueires, o equivalente a cerca de 21 módulos fiscais no município. Quando adquiriram a propriedade, há cerca de 14 anos, o registro da reserva legal em cartório não era cobrado. Os irmãos compraram a terra, então, sem os 20% de reserva nativa exigidos pela lei para a região.

Recuperação facilitada
Pelos cálculos de Marcelo Censoni, se tivesse que cumprir o Código Florestal anterior, a propriedade perderia de 30% a 35% de área produtiva. Com o novo código, ficou mais fácil. Além de poder considerar as áreas de preservação permanente (APPs) no cálculo da reserva legal, os critérios para recomposição de mata nativa às margens de rios, nascentes e encostas estão mais flexíveis.

Os rios passam a ser medidos, por exemplo, a partir do leito regular e não mais a partir do leito maior, o que, na prática, diminui a faixa de mata ciliar protegida.

Otimista com a nova lei, o produtor paulista já começou a recuperar as matas nativas conforme as atuais regras, antes mesmo de o Cadastro Ambiental Rural e o Programa de Regularização Ambiental previstos no código saírem do papel.

Novo código flexibiliza a composição de reserva legal

O debate de mudanças na legislação florestal brasileira ganhou força no Congresso nos últimos quatro anos, após o governo do ex-presidente Lula editar um decreto prevendo multa para quem não cumprisse os índices de reserva legal na propriedade. A possibilidade mais concreta de punição, aliada a restrições a crédito, fiscalização por satélite e pressão do Ministério Público, acendeu o sinal de alerta no campo.

O antigo Código Florestal, sancionado em 1965 e depois alterado pontualmente, passou a ser mais fortemente criticado pelos produtores.

Durante os debates no Congresso, a aplicação das multas pelo descumprimento da reserva legal foi adiada seguidas vezes. Até que, com a aprovação de um novo código em maio (Lei 12.651/12) e algumas alterações em outubro (Lei 12.727/12), produtores e governo chegaram a um consenso sobre como a regularização poderia ser flexibilizada conforme o tamanho da propriedade e o período de ocorrência do desmatamento.

A reserva legal continua variando entre 20% e 80% de mata nativa na propriedade, dependendo da região do País. Mas, pela nova lei, o proprietário pode incluir no cálculo da reserva outras áreas obrigatórias de preservação, como as matas às margens de rios, por exemplo. Isso era bastante restrito antes.

Proteção menor
Na prática, as áreas protegidas vão diminuir, o que preocupa ambientalistas como o advogado Raul do Valle, do Instituto Socioambiental. Ele lembra que as regras mais flexíveis vão atingir, principalmente, as regiões do País mais carentes de vegetação nativa e, por isso, mais sujeitas a problemas de água e fertilidade do solo.

O advogado alerta ainda para possíveis dificuldades de aplicação da lei, o que, na sua avaliação, terá de ser resolvido nos decretos que virão para regulamentar o novo código.

"Essa lei criou duas categorias de cidadãos: os que respeitaram a lei terão obrigação de preservar mais do que os que não preservaram. A lei trouxe anistia maior para os chamados pequenos agricultores, mas muitas fazendas no Brasil estão divididas em mais uma matrícula. No cartório, é mais de uma fazenda.”
Para Raul do Valle, se o decreto não proibir o cadastramento fracionado de imóveis, “essa anistia que foi direcionada para os pequenos produtores tende a se espraiar para médios e grandes."

Futuras mudanças
O ex-ministro da Agricultura e deputado Reinhold Stephanes (PSD-PR) concorda que a prática poderá levar a novas mudanças no código. A diferença, segundo ele, é que agora a maioria dos produtores conta com uma norma possível de aplicação.

"[O novo código] tranquiliza mais ou menos 90% dos nossos produtores. Mas ainda teremos, com certeza, alguns problemas para o futuro à medida que o código for sendo aplicado.” Stephanes ressalta que a legislação anterior não gerava problemas porque não era aplicada.

“O Congresso devia criar uma comissão especial para acompanhar a implantação e estudar questões básicas, como custo de implantação", sugere o parlamentar.

O deputado Bohn Gass (PT-RS), presidente da comissão especial sobre a medida provisória que fez as últimas alterações no código, defende que o debate da aplicação da legislação passe também pela busca de técnicas agrícolas menos agressivas ao meio ambiente.

"O debate que precisamos fazer é de aprimoramento no sentido de termos mais tecnologia menos agressiva ao meio ambiente. Que não tenha a necessidade de o Brasil ser o campeão mundial de uso de veneno na lavoura. Como vamos preservar melhor a água. Esse é o debate do futuro."

Por enquanto, o governo editou apenas um decreto para regulamentar pontos gerais do Cadastro Ambiental Rural e do Programa de Regularização Ambiental. Entidades do agronegócio e ONGs ambientalistas reivindicam participação ativa na definição dos próximos critérios para regular o novo Código Florestal.

Medida provisória alterou recomposição de matas ciliares

Em vigor desde maio, o novo Código Florestal (Lei 12.651/12) sofreu algumas alterações em outubro a partir de uma medida provisória - (MP 571, convertida na Lei 12.727/12) - enviada ao Congresso pela presidente Dilma Rousseff.

Nessa nova etapa de discussão, a maioria dos parlamentares decidiu incluir critérios especiais para as médias propriedades na recomposição de matas ciliares em rios de até dez metros de largura, assim como já havia para as pequenas. O governo discordou e vetou a mudança, sob o argumento de que a inclusão dos médios reduziria a proteção mínima originalmente proposta.

Com o veto, propriedades com área entre quatro e dez módulos fiscais devem manter, pelo menos, 20 metros de vegetação às margens desses cursos d'água. Em propriedades maiores ou em rios mais largos, a recomposição deve ser entre 30 e 100 metros de mata ciliar.

Regulamentação
Apesar de considerar os critérios do novo código razoáveis, o ex-ministro da Agricultura e hoje deputado Reinhold Stephanes (PSD-PR) prevê problemas na aplicação da legislação para os médios proprietários.

"Uma propriedade até quatro módulos, pequena, de maneira geral, está com uma legislação muito adequada e bem protegida. Mas uma propriedade ligeiramente acima [deste tamanho] pode perder 30%, 50%, 60% da sua área de produção."

Na avaliação de Rodrigo Justus, assessor de Meio Ambiente na Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a regulamentação do novo código terá de definir com mais clareza as especificidades de cada tipo de produtor e região, bem como os prazos para conversão de áreas produtivas em mata nativa obrigatória.

Apesar de o produtor ter agora mais chances para se legalizar, Justus acredita que a regularização será um desafio. "O País não detém toda a tecnologia para fazer as soluções. Para cada situação, você vai ter um incremento de custos. A tarefa de fazer não é simples, mesmo para quem tem dinheiro."

Para o advogado Raul do Valle, do Instituto Socioambiental, esse é o momento de o governo corrigir erros e lacunas na nova lei. "A gente tem dois níveis de regulamentação: um jurídico, de definições do que pode e do que não pode; e os atos infralegais, que são um pacote de apoio à regularização. Se eles não tiverem nem a parte de proteção antiga e nem uma parte de incentivo - que a antiga não tinha - a gente tem o pior dos mundos. Porque temos menos proteção na lei e continuamos sem nenhum apoio real."

Punições suspensas
Enquanto os Programas de Regularização Ambiental (PRA) não saírem do papel, as punições por desmatamentos ilegais nas propriedades do País estão suspensas. A partir da implementação dos programas, as multas permanecem suspensas para aqueles produtores que se cadastrarem e aderirem à regulamentação.

Por enquanto, o governo editou apenas um decreto para regulamentar pontos gerais do Cadastro Ambiental Rural e do PRA. Tanto setores ligados ao agronegócio como ambientalistas reivindicam participação ativa na definição dos próximos critérios de regulação do código.

Novo código facilita regularização do pequeno agricultor

Um dos principais argumentos usados para aprovar um novo Código Florestal (Lei 12.651/12) no País foi a situação complicada da maioria dos agricultores brasileiros, principalmente os pequenos. Pelos cálculos da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), quase 4 milhões de imóveis rurais familiares estão com alguma problema ambiental, cerca de 90% do total.

Como as pequenas propriedades, de até quatro módulos fiscais, representam 24% das terras agrícolas no País, a aposta do governo e da maioria dos parlamentares é de que uma maior flexibilidade nas regras florestais voltadas a esses produtores não resultará em prejuízos ambientais muito grandes. A estimativa é que, mesmo com as mudanças, mais de 20 milhões de hectares de matas nativas sejam recuperados.

Presidente da comissão especial sobre a medida provisória que alterou recentemente pontos do novo código, o deputado Bohn Gass (PT-RS) avalia que o próprio produtor sabe da necessidade de um equilíbrio entre produção e preservação.

"Todos os agricultores sabem que se não preservarem não terão água nem para sua produção. Então, eles são os maiores interessados."

Exceções
Com 84 artigos, o novo código abre uma série de excepcionalidades para os pequenos agricultores. Pelas novas regras, todo agricultor deve se inscrever no Cadastro Ambiental Rural, em fase de estruturação. Para os agricultores familiares, a inscrição será simplificada e deverá contar com apoio técnico e jurídico do poder público.

O cadastro é o primeiro passo para a adesão aos Programas de Regularização Ambiental, a serem coordenados pelo governo federal e os estados. No cálculo de quanto cada produtor deve em termos florestais, os pequenos serão os maiores beneficiados.

Enquanto imóveis com mais de quatro módulos fiscais devem recuperar áreas de preservação permanente (APPs) desmatadas às margens de rios em índices que variam entre 20 e 100 metros, conforme o tamanho do curso d'água, os pequenos devem recompor as matas ciliares em índices que vão de 5 a 15 metros, dependendo da extensão da propriedade e independentemente da largura do rio.

Outra vantagem é que, para os pequenos proprietários com APPs convertidas em atividade agrícola até julho de 2008, está garantida uma trava na porcentagem de recuperação. Quer dizer, para imóveis com área de até dois módulos fiscais, a recomposição das APPs não ultrapassará 10% da propriedade. Em imóveis com área entre dois e quatro módulos fiscais, a recuperação não passará de 20%.

Mário Plefk é proprietário de um imóvel de dois módulos fiscais em Ortigueira, no Paraná, onde mantém pastagem e lavouras de milho, feijão e arroz. Apesar de cumprir a legislação florestal desde o código anterior, ele confirma que muitos pequenos agricultores estão aliviados com a flexibilidade da nova lei.

Reserva legal
Além dos problemas com APPs, pequenos produtores também vinham enfrentando dificuldades para cumprir os índices de reserva legal, que variam entre 20% e 80% da propriedade, conforme a região.

Pelo novo código, em propriedades de até quatro módulos fiscais, a área de reserva é considerada regularizada se o imóvel possuía algum remanescente de vegetação nativa até julho de 2008, mesmo que em índices inferiores aos exigidos pela lei.

Segundo a Contag, as regiões Sul, Sudeste e Nordeste concentram os principais passivos ambientais entre as pequenas propriedades. O cálculo coincide com a estimativa da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

Para o assessor de meio ambiente da CNA Rodrigo Justus, mesmo com as facilidades trazidas pelas novas regras, pequenos produtores podem ter dificuldades para se cadastrar. "Nas regiões de agricultura altamente desenvolvida, os produtores já têm, com certeza, a sua imagem e, no dia em que o cadastro abrir, eles poderão se cadastrar. Mas as regiões mais remotas, terão um problema sério de cadastramento."

Além de possíveis dificuldades de cadastramento, a fiscalização do novo código em campo também preocupa ambientalistas. André Ferretti, da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, avalia que o acompanhamento da lei ficou mais complexo.

"Se já era difícil quando você tinha uma regra única para todo mundo, imagine agora que, para quem tinha cumprido a regra tem que manter uma faixa de um determinado tamanho, e, para quem não tinha cumprido, essa faixa vai poder ser menor.”

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, discorda. "O órgão de fiscalização vai ter que se preparar [para lidar com as novas regras]. Nós entendemos que esse Código Florestal é infinitamente mais equilibrado do que o anterior."

A partir da implantação do Cadastro Ambiental Rural, previsto no novo código, os produtores terão um ano para se inscrever. O prazo poderá ser prorrogado por mais um ano. Com o cadastro, o agricultor poderá aderir a um programa de regularização, o que lhe permitirá manter suspensas as punições previstas a quem desmatou vegetação nativa sem autorização antes de julho de 2008.

Como fica a situação de quem cumpria a lei anterior

Nos últimos anos, com o aperto ao cerco a quem estava em desacordo com a lei, houve dois movimentos entre os proprietários. Alguns procuraram apoio e resolveram se adequar às regras, outros preferiram pressionar o governo e o Congresso e esperar por mudanças no Código Florestal, o que acabou acontecendo.

Se, por um lado, as novas regras facilitam a vida de quem precisa se regularizar; por outro, mantêm praticamente iguais as exigências para quem já cumpria a lei. Quer dizer, as propriedades regularizadas não vão poder desmatar para cumprir índices mais flexíveis. A flexibilidade é apenas para os imóveis com produção consolidada até julho de 2008 em áreas de preservação permanente (APPs) e de reserva legal.

Para quem está regular, independemente do tamanho do imóvel, a reserva legal continua variando entre 20% e 80%, conforme a região. Às margens de rios, as matas seguem protegidas em um raio entre 30 metros e 500 metros e, na beira de nascentes, num raio de 50 metros.

Para quem precisa se regularizar, dependendo do tamanho do imóvel, a reserva legal pode ser menor e as áreas de preservação permanente às margens de cursos d'água podem variar entre 5 e 100 metros. No caso de nascentes, a recomposição chega a um máximo de 15 metros de mata, também dependendo do tamanho do imóvel.

Injustiça
Na avaliação do advogado Raul do Valle, do Instituto Socioambiental, o novo Código Florestal (Lei 12.651/12) é injusto com quem cumpria a lei anterior. "Esse é o aspecto mais pernicioso dessa nova lei. Está premiando aqueles que não queriam cumprir a lei anterior e apostaram contra ela."

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, faz avaliação diferente. "Se o produtor tem uma APP em beira de rio que seguia os critérios da lei anterior, vai ter que continuar seguindo porque ele não tem área rural consolidada. Em compensação, ele pode ter eventualmente um excesso de área com mata nativa que lhe permitirá ingressar num futuro mercado de Cotas de Reserva Ambiental.”

Cota ambiental
A Cota de Reserva Ambiental (CRA) citada pelo ministro é um dos mecanismos previstos no novo código para incentivar índices de preservação superiores aos exigidos pela lei. A cota corresponde, por exemplo, às áreas de reserva legal preservadas em percentuais superiores aos previstos em lei ou às regiões protegidas na forma de reservas particulares do patrimônio natural. No caso de pequenas propriedades, de até quatro módulos fiscais, a cota relativa à reserva legal poderá ser emitida mesmo que a área não exceda ao mínimo legalmente previsto.

Cada CRA equivale a um hectare de vegetação nativa nessas condições. Para ter direito à cota, o proprietário deverá se inscrever no Cadastro Ambiental Rural, atualmente em fase de estruturação pelo poder público. A cota será emitida mediante comprovação do órgão ambiental ou de entidade credenciada.

Uma vez emitida a CRA, o dono do imóvel poderá negociar a sua transferência, gratuita ou após pagamento. A cota pode ser adquirida, por exemplo, por um proprietário de imóvel localizado no mesmo bioma que queira compensar a reserva legal em outra área que não sua.

Apesar de elogiado, o mercado de cotas ainda tem futuro incerto, segundo o ex-ministro da Agricultura e hoje deputado Reinhold Stephanes (PSD-PR). "Essa questão de pagamento por serviços ambientais ou incentivos ainda é uma questão colocada com fragilidade. Não acredito que isso venha a vigorar tão cedo."

Restrições econômicas também são um incentivo à manutenção de vegetação nativa nas propriedades rurais. Mesmo com a mudança na legislação florestal, governo federal, indústrias e exportadores de cereais assinaram recentemente, por exemplo, a prorrogação da chamada moratória da soja. Em vigor desde 2006, o compromisso é um pacto pela não aquisição de grãos produzidos em áreas amazônicas degradadas de maneira ilegal.

Brasil tem legislação florestal há 78 anos

Os últimos quatro anos foram de intensos debates no governo e no Congresso sobre mudanças na legislação florestal. Desde maio, o País conta com um novo Código Florestal (Lei 12.651/12), que, na prática, só começou a valer mesmo em outubro, quando entraram em vigor novas alterações, aprovadas por medida provisória (MP 571, convertida na Lei 12.727/12). O motivo principal de todo o debate foi a necessidade de encontrar uma solução para mais de quatro milhões de propriedades no Brasil que, segundo o Ministério da Agricultura, têm alguma pendência ambiental.

Histórico
A legislação florestal não é nova. O primeiro código a tratar do tema no País é de 1934, quando o então presidente Getúlio Vargas editou um decreto (Decreto 23.793/34) criando limites para ocupação do solo e uso dos recursos naturais. Entre outras regras, o decreto estabeleceu que reservas florestais deveriam ser mantidas em, pelo menos, 25% de cada propriedade.

Em 1965, o ex-presidente Castello Branco sancionou o Código Florestal Brasileiro (Lei 4.771/65), que, apesar de algumas mudanças pontuais em anos seguintes, serviu de base para o setor até pouco tempo atrás, quando veio então o novo código.

A lei de 1965, com suas alterações, definiu os percentuais de reserva legal e localização das áreas de preservação permanente (APPs), limitando o uso que o produtor poderia fazer da terra. Em sua última versão, o antigo código previa áreas de reserva legal ocupando entre 20% e 80% das propriedades, conforme a região. Às margens de rios, as matas deveriam ser preservadas em faixas de 30 a 500 metros, de acordo com a largura do curso d'água.

Regras mais flexíveis
O novo Código Florestal, aprovado pelo Congresso e sancionado pela presidente Dilma Rousseff em 2012, flexibilizou as regras para recomposição de reserva legal e APPs, especialmente para os pequenos produtores. O texto recebeu muitas críticas de ambientalistas. Mas, para o governo, a maioria do Congresso e o setor produtivo, as novas regras são mais realistas, já que, desde 1965, apenas 20% dos agricultores conseguiram cumprir o previsto na lei anterior.

Considerado o primeiro ministro do Meio Ambiente do País e um dos pioneiros na defesa de nossos recursos naturais, Paulo Nogueira Neto acompanhou de perto as mudanças na nossa legislação florestal ao longo dos anos. Entre 1974 e 1986, ele ocupou a Secretaria Especial de Meio Ambiente, que gerenciava os temas ambientais no governo federal antes de haver um ministério específico para a área.

Para Nogueira Neto, um dos principais erros na condução do antigo código foi permitir a falta de aplicação da lei por tantas décadas. "Essa foi a maior falha porque, se o código não estava sendo aplicado direito, já deveria ter sido revisto há muito tempo.”

Em sua avaliação, a lei anterior tinha alguns absurdos. “Por exemplo, a reserva legal era 20% e, além dessa reserva, o fazendeiro tinha que preservar também as APPs, como encostas dos morros. Agora é uma coisa só. Reserva legal pode ter e deve ter áreas de preservação permanente, onde não se faz agricultura."

Impactos
A ambientalista e primeira ministra do Meio Ambiente do governo Lula, Marina Silva, lembra que a preservação das florestas tem impactos até no índice pluviométrico. "No caso do Brasil, a maior parte das chuvas que nós temos é produzida graças às nossas florestas, sobretudo a Amazônica. A destruição das florestas significa um risco grande para o equilíbrio de chuvas no nosso País.”

Além das chuvas, a preservação das florestas também tem consequências para a biodiversidade. Ministro do Meio Ambiente durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o hoje deputado Sarney Filho (PV-MA) lembra que a manutenção de vegetação nativa nas propriedades rurais, mesmo com os problemas de descumprimento do antigo código, contribuiu para a conservação de nossos biomas, inclusive dos mais frágeis. "As matas ciliares hoje servem também como corredores ecológicos. Eles possibilitam que os maciços florestais, que são poucos, tenham ligações e possa haver trocas genéticas, tanto da fauna quanto da flora."

O novo Código Florestal trouxe aos agricultores uma chance para regularizarem o passivo ambiental acumulado em décadas de descumprimento da antiga lei. Tanto ambientalistas como representantes do agronegócio reivindicam voz ativa no processo de regulamentação dos detalhes do código, em construção pelo governo. O movimento é para que, desta vez, a legislação seja regra de fato. O futuro vai dizer se produção e conservação conseguiram se equilibrar.
Fonte: Agência Câmara

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