Restrições a carne brasileira pode ter viés protecionista
Os recentes escândalos envolvendo, sobretudo, a qualidade e eficácia do sistema sanitário brasileiro, colocam em risco a produção nacional. Mas, as restrições impostas pelos Estados Unidos e União Européia podem não estar ligadas somente a problemas no controle e inspeção de produtos de origem animal do Brasil.
O setor produtivo nacional tem crescido e se modernizado na última década. As indústrias de processamento seguem o mesmo padrão, tanto que é brasileiro o maior frigorífico do mundo. Toda essa visibilidade causa temores nos concorrentes, não há como negar.
Contudo, a vulnerabilidade institucional que tomou conta do país, especialmente após a deflagração de diversas operações da Polícia Federal, colocou em xeque a credibilidade do Brasil e, por conseqüência, o sistema de produção agropecuária.
"A fragilidade institucional existente no país hoje permitiu aos concorrentes aproveitar a situação para impor as sanções comerciais ao Brasil nos últimos dias", pondera a SRB (Sociedade Rural Brasileira).
Embora seja impossível delimitar, neste momento, até que ponto as denúncias visam o bem estar dos consumidores que recebem a carne brasileira, ou se as medidas têm caráter comercial, de uma coisa é fato, "o comércio internacional, em especial de produtos agrícolas, está sujeito a pressões protecionistas de nossos concorrentes, sempre muito politicamente ativos", lembra a SRB.
O Brasil abriu mercado para os EUA no segundo semestre de 2016, após uma década e meia de intensas discussões. Neste mês, as exportações para o país alcançavam o auge, atingindo 2.510 toneladas. Em 16 dias úteis, os norte-americanos ficaram com 3,3% da carne embarcada do Brasil, ante dos 2,8% na participação de janeiro a maio deste ano.
"Quando conseguimos a autorização, eles fizeram um verdadeiro levante pedindo a suspensão e não conseguiram. E agora, na primeira oportunidade em que surgiu um problema, houve a suspensão e eu quero crer que a pressão dos produtores americanos tem muito a ver com isso", disse o Ministro da Agricultura, Blairo Maggi.
Em uma carta endereçada no início deste mês, ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, uma associação de produtores de gado (R-Calf) demonstrou preocupação quando a atuação de empresas brasileiras no mercado norte-americano, e chegou a afirmar que havia tentativa de pressão para reduzir o preço do boi no país através de importações. A associação pediu então, que o governo dos EUA abrisse investigação e tomasse providências quanto às perdas dos produtores locais nos últimos anos.
Vale lembrar também, que os norte-americanos recentemente abriram mercado para China - o maior comprador de carnes do Brasil. O mercado chinês estava fechado para os Estados Unidos havia 14 anos, desde a ocorrência de um caso de vaca louca, em 2003, no Estado de Washington.
Ao anunciar o fim do embargo, os participantes do mercado dos Estados Unidos avaliaram ser o 'melhor' momento para voltar a participar do mercado asiático, visto que o Brasil esteve envolvido em problemas de sanidade. No caso especifico da pecuária bovina, os analistas lembram que a Austrália, [outro forte concorrente], tem a oferta de carne bovina apertada, devido a secas no país.
Nosso melhor cliente, a China, está comprando menos e pode cortar ainda mais as importações no futuro próximo. Não porque a China tenha perdido o interesse pela carne brasileira. Mas a conjunção de fatores não favorece a produção brasileira. A concorrência vai se acirrar.
Para a SRB, não há dúvidas sobre a qualidade da carne brasileira, embora seja preciso reconhecer que problemas existem. "É preciso reagir, porém, sem negar os problemas, pois eles existem, ainda que diminutos. É preciso reagir, corrigindo, em primeiro lugar, o relacionamento entre os setores público e privado. Em segundo lugar, tomar a iniciativa imediata de alterar as pequenas questões identificadas, visando eliminar os problemas de inspeção".
Ao informar que o Ministério irá apresentar novas formas de fiscalização ao governo dos EUA, Blairo ressaltou que "se aceito, e acredito que será, temos o segundo momento, que é a situação política de voltar a ter autorização para um novo embarque dessas mercadorias. Estou otimista e espero que possamos resolver esse assunto até a próxima semana. O Brasil tem o direto legal de fazer o envio de carne para lá se atender às exigências fitossanitárias e de qualidade do produto e é o que nós vamos insistir agora".