Mudança no blend? Com alta nos preços do robusta e dúvida para o arábica, indústria do café está aflita
Os preços do robusta não param de subir. Na manhã desta quarta-feira (3) o contrato referência no terminal de Londres ganhava mais de US$ 120 por tonelada e atingia novos recordes para os preços. As condições atuais trazem grandes oportunidades para o Brasil em termos de negócios, mas para a indústria do café o momento atual é repleto de incertezas.
Traçando uma linha do tempo recente, com a crise climática afetando a produção de arábica no Brasil, a indústria passou a utilizar mais do café conilon, o que foi aceito pelo consumidor final, mas os altos preços agora trazem nova preocupação para o setor. De acordo com Celírio Inácio, diretor executivo da Associação Brasileira da Indústria do Café (ABIC), a indústria está alita, passando por um momento de apreensão.
"Costumamos dizer que o café em grão sobe de elevador e o torrado de escada, existe um hiato muito grande nas negociações para o varejo. A indústria se adaptou ao conilon em termos de qualidade e preço, o que foi aceito pelo consumidor sem queda nos indicadores. O momento agora é da indústria aflita, o conilon pode não ceder e o arábica com qualquer base de fundamento pode estourar também", afirma ao Notícias Agrícolas.
Atualmente a indústria encontra café conilon com diferença entre R$ 40 e R$ 60,00 em comparação com o arábica. Algumas praças já negociam o café conilon a quase R$ 1.000,00. Com a aproximação do El Niño para o segundo semestre, não existe no mercado a expectativa de uma correção muito significativa nos preços.
"A dúvida não é nem em relação ao conilon, mas sim ao arábica. Os fundamentos do conilon estão bastante firmes. Mas o arábica vai continuar sem reação? Estamos também esperando para saber o número de produção para entender melhor qual o cenário com a nova safra", complementa.
O robusta sobe e favorece as altas do conilon do Brasil desde o ano passado. Nas últimas semanas, no entanto, essa valorização foi ainda mais signficativa com o mercado atingindo patamares não visto há 30 anos. Os dados de base do Notícias Agrícolas mostram que o contrato referência em Londres, neste mesmo período em 2023 era negociado por US$ 2229. Atualmente, a mesma referência é negociada por US$ 3731 - o que significa uma alta de quase 70% no intervalo de um ano.
"A indústria tem mais dificuldade no repasse. É um jogo perigoso principalmente para pequenas e médias indústrias", afirma. Segundo Inácio, até o momento não foram observadas mudanças no blend, mas as próxima semanas serão fundamentais para entender a necessidade da indústria e como os negócios serão feitos de agora em diante.
"Nesse momento as empresas ainda têm estoques remanescentes, agora na virada do mês poderemos ter um termômetro mais claro do que pode acontecer e se as contas vão fechar", afirma.
A CRISE DO ROBUSTA E ATÉ QUANDO O MERCADO DEVE SE SUSTENTAR
De acordo com Haroldo Bonfá, analista da Pharos Consultoria, não há previsão de mudanças significativas ao menos no médio prazo. A produção da Ásia também sentiu os impactos das condições climáticas e tanto Vietnã como da Indonésia tiveram baixas significativas.
Além disso, recentemente o Vietnã se retraiu ainda mais no mercado e informou que só comercializará cerca de 30% de uma produção que não deverá alcançar as 30 milhões de sacas no ciclo atual. O produtor aguarda por preços mais atrativos e ainda há os problemas com a logística no Mar Vermelho que trazem ainda mais motivos para os preços em alta neste momento.
"Continuaremos competitivos até a entrada da nova safra da Indonésia, que começa a ser colhida agora, entre abril e maio, e também vamos depender da perspectiva à nova safra do Vietnã, a 24/25, que será colhida entre outubro e janeiro de 2025", afirma.
Outro fator importante, segundo o analista, é a chance de um novo La Niña levar mais chuva para a o Vietnã. Diferente do Brasil, o fenômeno climático pode gerar mais precipitações no país asiático e ajudar no desenvolvimento de uma safra mais positiva.