Indústria ainda paga mais no mercado interno e cenário de queda nas exportações do conilon não deve mudar no médio prazo
Confirmando a tendência apontada pelo analista de mercado Fernando Maximiliano, em entrevista ao Notícias Agrícolas há alguns meses, o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil reportou redução de 64% na exportação de café tipo conilon no mês passado. O resultado é reflexo da indústria demandando mais do produto no mercado interno, com diferencial que chama atenção com boas oportunidades ao produtor e de acordo com o analista, pelo menos no médio prazo o setor não deve observar mudança expressiva no cenário.
O preço do café conilon no mercado interno teve suporte diante dos inúmeros problemas envolvendo a produção de café arábica. É esperada uma recuperação na produção deste ano, mas com seca prolongada e geadas, a expectativa de uma super safra, antes estimada pelo mercado, já não é uma realidade para o Brasil.
"O diferecial entre o mercado interno e Londres, que já estava pagando bem desde fevereiro teve uma explosão nas últimas semanas e o mercado interno vem pagando uma média de US$ 800 por tonelada acima de Londres", explica o analista. Em reais, as negociações estão sendo feitas nos patamares de R$ 800,00 nas principais praças de comercialização do país.
Fernando acrescenta que as boas oportunidades para aquele produtor que ainda tem café em mãos devem continuar no médio prazo, enquanto a nova safra não entra no mercado. Segundo a cooperativa Cooabriel a colheita do conilon, que tradicionalmente começa na segunda quinzena de abril, deve ter um atraso de duas semanas, fator considerado positivo pela cooperativa em termos de qualidade do café e que deve manter os preços nos patamares atuais, segundo Maximiliano.
"A colheita aperta sim o cenário de oferta e demanda, mas não vejo grandes problemas. Se esse atraso se confirmar o cenário para esse diferencial no prazo deve se estender. Não acredito nos preços no Brasil retomando aos patamares vistos há muito tempo atrás, isso vai depender da cotação do café arábica e o reajuste com certeza acontece", afirma o analista. A estimativa da StoneX é de uma produção de 20.6 milhões de sacas de conilon neste ano.
Com o Brasil perdendo competitividade no mercado externo, a demanda foi atendida pelo Vietnã - maior produtor de café tipo conilon do mundo. E isso refletiu também nas exportações do país asiático, que teve alta de 28% no primeiro trimeste de 2022 em comparação com o mesmo período no ano passado. O país exportou 9.2 milhões de sacas nos primeiros três meses de 2022.
Neste mesmo sentido, Marcio Candido, presidente do Centro do Comércio de Café de Vitória (CCCV), destacou durante o evento “Debate Agro – Especial Conilon”, destaca a importância do produtor saber aproveitar as oportunidades atuais, além de ressaltar a importância da ligação entre todos os elos da cadeia cafeeira. "É de fato um ano muito produtivo para o setor, tem que aproveitar ao máximo o mercado interno. A safra vai entrar e pressionar os preços, esse diferencial não é algo que vai perdurar. Mercado não é de manipulação, é de oferta e demanda, é o que você tem para oferecer e o que você tem para pagar", afrima.
EXPORTAÇÃO
Marcos Matos, diretor geral do Cecafé, destacou a importância do café conilon para o mercado interno e as mudanças observadas pelo setor exportador nos últimos dois anos, com pandemia, consumo resiliente e mais recentemente a guerra entre Rússia e Ucrânia. O Cecafé também participou do evento em Linhares/ES.
Há mais de 40 dias o mercado de café vem observando volatilidade ainda mais intensa nos preços diante da guerra entre Rússia e Ucrânia. O cenário traz muita preocupação para o setor, considerando que a Rússia, de acordo com os dados do Cecafé, há muitos anos é um dos principais países importadores de café do Brasil, o que acaba refletindo diretamente para o café conilon e consequentemente o café solúvel.
“Diante da continuidade dos gargalos logísticos, da disponibilidade reduzida de arábica em função da safra de ciclo baixo, da maior procura industrial pelo conilon e, mais recentemente, do conflito na Ucrânia, o Brasil vem mostrando resiliência e apresentando números significativos nos embarques de café. No acumulado da safra 21/22, por exemplo, embarcamos 30,3 milhões de sacas, repetindo o desempenho da 19/20, última safra de ciclo baixo e que não sofria interferências logística, de guerra ou abastecimento”, compara.
Com relação a queda de 64% nos embarques no mês de março, Marcos reforçou que se trata do reflexo da dinâmica atual do mercado vivenciada mês a mês pelo setor. "É uma maior participação do conilon nos blends nas vendas de café tipo torrado e moído no mercado interno", afirma.
A logística, de acordo com o porta-voz, continua sim no radar, apesar da leve melhora observada no último mês. Além dos gargalos que surgiram com a retomada das economias, Matos destacou a necessidade do Brasil ampliar a infraestrutura para continuar atendendo a demanda exportadora que é cada vez mais forte para o país. "Até que ponto você trabalha no limite e precisa de uma estrutura maior? Grande desafio para o Brasil, os navios estão crescendo. Precisamos, neste momento, pensar "fora da caixa" em se ter portos com estrutura que atenda toda a demanda", acrescenta.
Abordando a crescente demanda mundial por produtos sustentáveis, Matos apresentou as ações de sustentabilidade e rastreabilidade que o Cecafé tem investido e firmado parcerias com instituições e produtores. Nesse sentido, ele destacou os resultados recentemente do Projeto Carbono, estudo que a entidade realizou sob condução técnico-científica do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) e do professor Carlos Eduardo Cerri, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP).
BRASIL É POTÊNCIA NA PRODUÇÃO DE SOLÚVEL
Aguinaldo José de Lima - Diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira da Indústria de Café Solúvel (ABICS) destacou, também durante o “Debate Agro – Especial Conilon" o café solúvel de qualidade que o Brasil vem entregando ao mercado.
"Solúvel faz a bebida que você quiser, mas a qualidade da bebida é determinante e o produtor tem feito a lição de casa. Nós somos a nação do café solúvel, sempre líder em produção e exportador", comenta. O segundo maior produtor de café solúvel do mundo é o México, que segundo Aguinaldo, atualmente não possui nem metade da capacidade de produção que o Brasil tem atualmente.
Segundo dados da ABICS, dos 145 países que importam café do Brasil atualmente, o café solúvel chega atualmente para grande parte deles. O produto café solúvel é hoje o 13º na lista de exportação do agronegócio brasileiro. O "complexo café" aparece sempre entre 4º e 5º lugar no ranking. "Nós somos a grande potência do solúvel. A Rússia sempre foi um grande cliente, representam 13% dos negócios de exportação do conilon, o que representa 500 mil sacas por ano", afirma comentando o cenário de guerra. A Rússia é o maior consumidor de café solúvel do mundo.
Aguinaldo comenta ainda que é importante que o produtor esteja tão atento à dinâmica de mercado quanto o setor da indústrias. Acrescenta que o Vietnã, por exemplo, possui acordo de tarifa zero para exportação de café ne Europa, e ainda assim o Brasil com 9% de tarifa continua sendo o maior fornecedor de café para União Europeia. "Se conseguirmos aplicar esse acordo, por exemplo, temos condição de avançar cerca de 30% em cinco anos tranquilamente. O solúvel representa 27% do consumo mundial, o Brasil 5%, veja quantas oportunidades a gente tem para crescer", afirma.