Torrefadores europeus de café são afetados por baixa qualidade dos grãos após chuvas no Vietnã
Por Ana Ionova
Os principais compradores europeus de café, como a Nestlé, estão com dificuldade para obter grãos de robusta de alta qualidade após chuvas no Vietnã no ano passado causarem estragos na safra do maior produtor mundial da variedade.
Os torrefadores de café têm exigências restritivas em relação à qualidade de seus grãos robusta, variedade mais barata do que a arábica e usada para o café instantâneo, e estão rejeitando entregas, disseram comerciantes.
Os torrefadores queixam-se que o café está mofado e amargo, tendo passado o Outono do ano passado por fortes chuvas durante a colheita, época em que os produtores colocam as cerejas para secar ao sol.
Os danos causados pelo clima também podem ser vistos na coloração – mais grãos do que o habitual têm apresentado tom marrom ou preto, em vez da típica cor verde pálida do café cru.
A Nestlé, maior empresa de café do mundo, foi duramente atingida, disseram traders, pois também tem se comprometido a comprar café que atenda ao Código Comunitário Voluntário para a Comunidade do Café, conhecido como padrões de sustentabilidade 4C.
"Eles têm padrões de qualidade específicos que são geralmente mais altos do que outros", disse um comerciante europeu.
O abastecimento de café tem sido mais difícil neste ano devido à produção cerca de 20% menor no Vietnã, bem como uma segunda safra baixa no Brasil, segundo maior produtor de robusta do mundo.
Comerciantes disseram que a Nestlé havia ofertado no início deste ano cerca de 3 milhões de sacas de 60 kg de café robusta vietnamita para entrega em março de 2017 e março de 2018.
Um trader disse que a Nestlé, normalmente, usa de 5 milhões a 6 milhões de sacas de café robusta vietnamita por ano, o que representa aproximadamente um quarto da produção do país na temporada 2016/17, esperada em cerca de 24,5 milhões de sacas.
A Nestlé recusou solicitação para falar sobre o assunto.
A Nestlé poderia experimentar usar café de outras fontes alternativas, disseram traders, mas poucos países cultivam o grão que a empresa necessita em larga escala.
O 4C é um padrão de referência amplamente utilizado, mas representa apenas cerca de 29% da produção global – 2,6 milhões de toneladas (43,3 milhões de sacas) em 2015 de acordo com a Plataforma Mundial do Café –, e atende às especificações da Nestlé. A maioria do robusta 4C vem do Vietnã.
A maior parte do 4C no mundo é café arábica, tipicamente usado em misturas premium, de países como o Brasil e Colômbia.
A Indonésia, terceira maior produtora de robusta do mundo, cresce pouco com café 4C, mas comerciantes disseram que o país geralmente fica aquém nos testes de sabor da Nestlé.
"Você fica preso porque você se comprometeu com aquela cadeia de fornecimento e esse programa de sustentabilidade", disse um segundo comerciante. "Você pode ter o café perfeito ao lado – mas sem certificação."
Cafés de alta qualidade da Índia e Uganda poderiam atender ao perfil da Nestlé, mas esses países também produzem apenas pequenos volumes de café 4C e os comerciantes dizem que o prêmio sobre a oferta desses países é de US$ 160 a US$ 200 por tonelada ante o robusta vietnamita de alta qualidade.
Por enquanto, as questões de qualidade têm afetado principalmente as empresas que compram pelo sabor ao invés de olharem o grão e o café evitado pela Nestlé é esperado que encontre um destino facilmente e improvável de ser descartado.
"Há muitas pessoas menos exigentes", disse outro comerciante.
Mais amplamente, o mercado está preocupado com a oferta futura do Vietnã devido aos produtores terem vendido seu melhor café em uma tentativa de bloquear os lucros no início deste ano, quando os preços do robusta atingiram máximas de US$ 2.282 por tonelada.
A baixa qualidade do estoque remanescente no Vietnã também está causando preocupação, já que grandes e intermediários cafeicultores estão sem vender neste momento da temporada. Os comerciantes estimam que apenas 20% a 30% da produção permanece no país, em comparação com um volume de 45% a 50% em um ano típico.
O foco também está nos grãos descoloridos, que alguns comerciantes dizem que podem fazer de 8% até 10% da colheita total. Os comerciantes dizem que mais de 20% da safra restante do Vietnã poderia ser grãos escuros, que afetam o sabor e podem ter que ser misturados com a próxima safra.
Os diferenciais de preços ainda não mudaram drasticamente, mas o desconto para grãos de baixa qualidade sugere excesso de oferta; Grau 3 está sendo negociando em cerca de US$ 150 a US$ 200 por tonelada abaixo da Grade 2 em comparação com cerca de US$ 100 anteriormente.
"Quanto mais tempo passa, mais percebemos que temos atraído o bom café", disse um terceiro comerciante.
"Em algum momento isso vai ser um problema."
(Reportagem adicional de Michael Hogan em Hamburgo e Mai Nguyen em Hanoi, edição de David Evans)
Tradução: Jhonatas Simião