OS MENSALEIROS DO PT ESTÃO DE VOLTA… OU: A VOLTA DOS QUE NUNCA FORAM

Publicado em 23/11/2009 16:09



“O PT está hoje muito maior, muito mais consolidado, mais calejado, muito mais senhor da situação. Não existe na história da humanidade, na história política do mundo, um partido que estando no poder não tenha cometido erros. Isso aconteceu no mundo inteiro e aconteceu no PT. O que nós precisamos é ter clareza que os erros cometidos devem servir de ensinamentos para que a gente não erre outra vez.”

A fala acima, vocês certamente não tiveram de recorrer à adivinhação, é do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele a pronunciou ontem, quando foi votar no processo eleitoral interno que escolhe a nova direção do partido. José Eduardo Dutra, ex-senador e ex-presidente da Petrobras, será eleito. A questão é saber se ganha no primeiro turno, o mais provável, ou disputa o segundo com o atual secretário-geral, José Eduardo Cardozo, ligado ao ministro da Justiça, Tarso Genro. Com Dutra (e também seria assim com Cardozo), voltarão ao comando do partido José Dirceu, José Genoino e João Paulo Cunha, todos réus, entre outros, no processo do mensalão.

A fala de Lula é essencialmente indecorosa e dá conta do laxismo moral que vigora no partido. Não se trata, como é notório, de avaliar ações impróprias de indivíduos na esfera privada — embora estas tenham, sim, importância se colidirem com o discurso público do político; já escrevi muito sobre isso; não faltarão boas chances para fazê-lo de novo em futuro próximo. Estamos falando, nesse caso, de atos cometidos por políticos envolvendo dinheiro público, instituições públicas, políticas públicas. Lula, “o filho do Brasil”, realmente pariu um modo nefasto de fazer política: as ações bem-sucedidas de seu governo — ou simplesmente o cumprimento de obrigações, já que está lá para aplicar o dinheiro que o estado toma da sociedade — ganham logo o ar de ineditismo: “Nunca antes na história destepaiz…”

Quando seu governo acerta, nunca se viu nada igual, e os que vieram antes dele só fizeram bobagens e prejudicaram o Brasil. Quando se está diante do erro, da vigarice, da mais descarada sem-vergonhice, bem, então aí “JÁ SE VIU ISSO ANTES NESTEPAIZ”. Não só “nestepaiz”. Também “estemundo” assistiu a coisas semelhantes. Para Lula, no que acerta, o PT é único; no que erra, nada mais faz do que repetir procedimentos alheios.

Ora, não é nenhuma surpresa o fato de que a verdade está no exato contrário. O que há de bom no governo Lula não é novo, e o que ele fez de realmente novo não é bom. E estou me lixando se os 80% que o aprovam sabem ou não disso. Não sou político. Não preciso poupar Lula para não perder voto. Eu até diria que é o inverso: quanto mais os seus entusiastas discordarem do que escrevo, mais sinto que devo escrever para que essa discordância se aclare. É assim que me sinto testando o limite deles, bem pequeno, de tolerância com a crítica.

Como sabem todos os que se dedicam a um exame objetivo da situação política e econômica do Brasil, o maior acerto de Lula está na continuidade, e sua grande sorte, como notou a  revista The Economist no especial sobre o Brasil, foi suceder FHC, que arrumou a economia com o Plano Real e estabeleceu o tripé da estabilidade: disciplina fiscal, política de metas de inflação e câmbio flutuante. Não há aqui questão de gosto, mas de fato. Mesmo os programas sociais são a ampliação de políticas herdadas do antecessor — se expandi-las brutalmente, como se fez, foi um acerto dará um bom debate um dia. O “nunca antes nestepaiz” de Lula é, com efeito, um “déjà-vu”robustecido pela máquina de propaganda.

Mas o petismo, com efeito, também se realizou o famoso “nunca antes na história destepaiz”. O mensalão, com efeito, foi coisa inédita. A conversa mole de que se trata de uma reutilização do chamado “valerioduto mineiro” é conversa de mentirosos, de vigaristas. Não que o tal esquema que vigorou em Minas tenha sido algo honrado, que doure a política com brocados morais. Foi uma sem-vergonhice também. Mas foi outra sem-vergonhice: ali, com efeito, se deu o que Delúbio Soares, num rasgo poético, classificou de “recursos não-contabilizados de campanha” — ou seja: caixa dois. O mensalão petista, sem deixar de ser também isso, foi muito mais do que isso como testemunharam muitos de seus participantes — e o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), que botou a boca no trombone, é sua testemunha mais eloqüente. O esquema montado partiu para a compra de partidos de porteira fechada; o esquema buscava influenciar votações no Congresso. Se  tivesse prosperado, avançado, isso significaria que as leis no Brasil seriam definidas num fórum paralelo, clandestino.

Uma ova!!! Nunca antes na história destepaiz e destemundo se viu algo parecido. Talvez a antiga máfia italiana. Essa inovação criminosa é tipicamente petista, e, agora, os seus protagonistas estão de volta, abençoados pela atual cúpula partidária e, de fato, pela única instância decisória do PT: Lula. TENHO DE OBSERVAR AQUI QUE JAMAIS ACREDITEI QUE ELE PRÓPRIO NÃO SOUBESSE DO ESQUEMA; SÓ SE FOSSE IDIOTA, E EU JÁ ESCREVI QUE O CONSIDERO NOTAVELMENTE INTELIGENTE.

Diz o presidente que partidos que estão no poder cometem erros no mundo inteiro. Eu diria que os cometem até fora dele. Mas, nas democracias exemplares, os que erram, quando flagrados, são punidos. O exemplo mais saliente é Helmut Kohl, o ex-chanceler alemão que comandou o complicadíssimo processo de reunificação das duas Alemanhas. Admitiu que seu partido recebeu uma doação irregular de campanha de US$ 1 milhão —uma ninharia para padrões brasileiros. Sua carreira política morreu ali.

E no Brasil de Lula, aquele que fala lá no alto? Em 2002, o publicitário Duda Mendonça fez cinco campanhas para o PT, incluindo a de Lula. Cobrou, ao todo, R$ 25 milhões. Pois o partido depositou em uma conta secreta de Duda, nos EUA, a bagatela correspondente a R$ 10,5 milhões. Depósito feito em dólares em nome de uma empresa de fachada chamada Düsseldorf. Vejam que amador era o pobre, punido e esquecido Helmut Kohl, o homem que venceu o muro. Profissional é o PT!  E Duda se explicou na CPI: “O dinheiro era claramente de caixa dois. Nós sabíamos, mas não tínhamos outra opção. Queríamos receber”.

Então Lula não venha com a história de que o seu partido fez o que qualquer partido no mundo faz. Como já se escreveu aqui — e o trecho foi parar em Máximas de Um País Mínimo, meu novo livro,  que está estourando por aí —, “há, vocês sabem, muitas diferenças entre o que se chama ‘Primeiro Mundo’ e o tal ‘Terceiro Mundo’. Entre as mais evidentes, está o que eles fazem com os seus bandidos e o que nós fazermos com os nossos. Eles põem os deles na cadeia; nós pomos os nossos no poder.

PS - Claro, vocês não pode esquecer: Dilma também se regozijou com a volta desses companheiros. Se for eleita presidente, esses moralistas do mensalão certamente estarão dividindo com ela a difícil tarefa de governar… José Dirceu já é um dos manda-chuvas da campanha.


O tesoureiro do PT e a burguesia do capital alheio


Parece uma piada; parece aquele negócio de história se repetindo como farsa… Mas é só a farsa sendo atualizada. João Vaccari Neto será o novo tesoureiro do PT. É o homem que vai cuidar da grana da campanha de Dilma Rousseff à Presidência. Atenção, leitor! É escolha pessoal de Lula. Vaccari é seu velho conhecido da CUT.

E de onde ele vem? É presidente da famosa Bancoop, a cooperativa de habitação dos bancários, que Ricardo Berzoini, atual presidente do partido, conhece muito bem. Se vocês jogarem a sigla no Google, vem lá um rosário de acusações de irregularidade: desde compradores se dizendo lesados à acusação de doação irregular de recursos para o PT.

Mas não é só: Vaccari também é conselheiro de… Itaipu!!! A essa altura, vocês já ligaram o nome ao apagão, não é mesmo? Se a ida para a tesouraria do partido indicar que ele vai sair da estatal, algum bem já terá havido aí.

Vejam que interessante: Vaccari é a síntese perfeita dos tentáculos do petismo: tem origem no meio sindical, preside uma cooperativa de problemas, é membro do conselho de uma estatal e agora é designado para cuidar da grana do partido em ano eleitoral, quando vai ter de “negociar” bastante com aquilo que chamamos por aqui, numa licença poética, de “iniciativa privada”.

Não me darão o mérito, mas não ligo, porque está escrito. Chamei o petismo de “nova classe social” antes de Chico de Oliveira. E até batizei a turma: “burguesia do capital alheio”. Eis aí.


FANTASMAS DO PASSADO ASSOMBRAM OS VIVOS


É claro que, no mundo dos fatos, Franklin Martins não é mais do MR-8 — embora o jornal do grupo tenha recebido, até outro dia, publicidade de estatais, centralizada nas mãos de Martins. Restou nele, certamente, uma doce memória a julgar por testemunhos dados aqui e ali. Acredita que estava combatendo a ditadura quando, por exemplo, seqüestrou um embaixador. Já a ministra Dilma Rousseff, ex-VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), também já expressou grande orgulho por seu passado em depoimento no Senado. Chegou mesmo a sugerir que se tratava da defesa da democracia. A VPR era sabidamente um grupo terrorista. Como o terrorismo ajuda a democracia é desses mistérios que só mesmo esses heróis são capazes de explicar. Em recente carta a Lula — e ao “povo brasileiro” —, o homicida Cesare Battisti afirmou algo semelhante: segundo ele, as conquistas sociais da Itália decorrem do “sangue dos mártires”. Bem, para ele, “mártires” eram os terroristas italianos que mataram, mutilaram, deixaram pessoas em cadeiras de rodas…

Um esquerdista, pouco importa se continua terrorista ou não, tem esta visão perturbada do mundo e da história: acredita firmemente que o Bem pode derivar do Mal; está certo de que não se fazem omeletes sem quebrar os ovos… alheios!!! Essa história do omelete e dos ovos, já contei para vocês, não é de Stálin, como se pensa habitualmente, mas de Nadejda Mándelstam, mulher do poeta Ossip Mándelstam, assassinado a mando do ditador. Era a imagem que ela usava para definir os métodos do facínora. No livro em que fala da culinária do mega-homicida, ela afirma sobre o verdugo: “Cada nova morte era justificada com a desculpa de que construíamos um notável mundo novo”. Está na página 114 de Stálin - A Corte do Czar Vermelho, de Simon Sebag Montefiore — leitura obrigatória faz tempo, queridos. Quando forem comprar o livrinho do Tio Rei, aproveitem para levar também um Sebag, hehe…

Assim, muito cuidado com a “conversão à democracia” de certas mentalidades que, quando testadas, mal conseguem disfarçar o apego à velha teoria… dos ovos. Diz-se por aí que a política e a guerra travada por outros meios. Cuidado! Há gente para a qual a democracia é só uma maneira de esmagar o inimigo… por outros meios. E um esquerdista fiel a seus princípios sabe que o “avanço da luta” depende da contínua ocupação de espaço.

E é aqui que relato uma historinha bacana para vocês. Dilma, ex-VPR, não vive o seu melhor momento com Franklin Martins, ex-MR-8. Ele experimenta o auge do que certos psicanalistas chamam “delírio de potência”. Está certo, não sem certa razão, que é o mestre, artífice e condutor de uma azeitadíssima máquina de propaganda como nunca antes houve… nestepaiz. Franklin ocupa todos os espaços: do planejamento das peças publicitárias e definição e distribuição de uma verba oficial bilionária ao bate-papo de pé-de-ouvido com seus, digamos assim, interlocutores na imprensa — onde separa o que, para ele, é o trigo do jornalismo do desprezível joio —, nada escapa à sua cada vez mais alastrante, larga mesmo!, figura! No encaminhamento da proposta oficial do pré-sal, Franklin atuou como primeiro-ministro. E Lula, evidentemente, lhe é muito grato.

Franklin tem a ilusão de ser uma espécie de Rasputin de Dilma Rousseff — ou, sei lá, seu cardeal Richelieu. E ela está começando a ficar incomodada. Dilma é uma invenção de Lula — e, dizem alguns amigos gaúchos, de si mesma: sempre muito competente em espalhar que é competente —, mas Franklin tenta se apoderar do invento, o que tem irritado um pouco a ministra-candidata. Lula é o único homem a cuja liderança ela se submete sem contestar ou pestanejar. Todo o “homeril” que a cerca no governo, já sabemos, é constituído de “homens meigos”. E os filhos intelectuais de Lênin, nós sabemos, não primam exatamente pela meiguice.

Assim que se consolidar a nova direção do PT, outro que vem para também cuidar de Dilma é José Dirceu. Em tempos idos, muitas histórias sobre os bastidores das esquerdas clandestinas os colocavam mais como desafetos do que como companheiros. Isso tudo não deixa de ter a sua graça macabra. Fantasmas do passado assombram o cérebro dos vivos…

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Fonte: Blog Reinaldo Azevedo (Veja)

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