Bolsonaro se junta a PT contra intervenção; é outra sua proposta antiviolência: ele quer os nossos Nikolas com acesso a fuzis
A reação dos petistas à intervenção na área de segurança pública do Rio é, sim, asquerosa. E, ainda assim, não chega aos pés da vigarice política do deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ), pré-candidato à Presidência. Criticou a medida — suponho que vá votar contra; também já anunciou sua oposição à reforma da Previdência… Grande liberal!!! — e ainda ousou se manifestar em nome dos militares. Bem, acho que não preciso dizer que o preclaro não consegue falar nem em nome das próprias ideias. Para tanto, seria preciso que as tivesse.
Eis aí. Bolsonaro é deputado pelo Rio desde 1990. O que ele fez mesmo em favor da segurança pública no Estado, além de vomitar indecências contra os direitos humanos e em favor do armamento? Resposta: nada! Aliás, tente achar um único projeto de sua autoria que tenha sido aprovado. A sua vida partidária, convenham, é expressão de sua coerência política e da solidez de suas ideias e convicções: está agora no PSL. É sua 9ª legenda. Já pertenceu ao PDB, PP, PPR, PPB, PTB, PFL, PP e PSC. É preciso saber reconhecer o mito quando diante de um.
Ah, não! Bolsonaro não quer saber de intervenção. Até porque ele tem propostas muitas efetivas nessa área:
– extinguir o Estatuto do Desarmamento;
– distribuir porte de armas a granel;
– facilitar o acesso do homem do campo a fuzis…
Coisa de gênio.
O candidato a pensador da família, o também deputado federal Eduardo Bolsonaro — ele fala sobre ideologia, esquerda e direita com a habilidade, a destreza e a bibliografia de um dragão de Komodo na Biblioteca Britânica — fez um vídeo no Youtube em que expele barbaridades em meio a um monte de fuzis, que, entende-se, ele gostaria que fossem vendidos no Brasil com a mesma facilidade com que Nikolas Cruz, o atirador da Flórida que matou 14 pessoas, comprou o seu numa loja de Coral Springs, cidade vizinha a Parkland, onde ocorreu o massacre.
A propósito: quando é que os jornalistas investigativos procurarão saber detalhes sobre o financiamento do lobby pró-armamento no Brasil?
E, como se sabe, Bolsonaro tem dois outros filhos na política: um vereador e um deputado estadual.
Assim, pode-se perguntar e responder: além de fazer “bolsonarinhos” e de acumular um patrimônio multimilionário em sua carreira política, o que Jair Bolsonaro fez pela segurança no Rio? Resposta: propõe multiplicar exponencialmente o número de armas no país. O bolsonarismo e seus acólitos acham que o Brasil estará mais seguro no dia em que os nossos Nikolas puderem comprar um AR-15 na esquina.
Aí o boçal de plantão, com pretensões a ter um pensamento, levanta as patinhas dianteiras do chão e tenta argumentar, antes de partir para o xingamento e o vomitório de sempre: “Ah, mas arma na mão de bandido pode, né?” Não! É claro que não pode. Ocorre que isso não implica que armar a população seja uma resposta ao crime. Todas as evidências apontam o contrário: a circulação de armas, mesmo entre “as pessoas de bem”, é fator de aumento dos atos criminosos. Comparem o número de homicídios por 100 mil habitantes dos EUA com o da Alemanha ou o do Japão, por exemplo, onde é proibido circular até com arma branca. A propósito: a população civil mais armada do mundo é a venezuelana… Caracas é hoje a capital mais violenta do planeta.
Eis aí…
A verdade é que o senhor Bolsonaro, que ainda esta tentando descobrir o que é e para que serve o tripé macroeconômico, não tem ideia nenhuma também na área de segurança. Para ele, o tema é motivo só de proselitismo político e pretexto para expelir reacionarismos e boçalidades.
E, como se nota, mais uma vez, nós o vemos junto com os petistas, todos contra a intervenção.
Já estiveram do mesmo lado contra a reforma trabalhista, contra a terceirização, contra as privatizações, contra a reforma da Previdência…
Gleisi ataca a intervenção; petistas dizem que votarão contra a medida. Certo! Para eles, Rogério 157 poderia ser um Lênin!!!
Os descontentes com a intervenção federal na área de segurança pública do Rio, vejam vocês, são os petistas e o deputado Jair Bolsonaro. Tudo muito explicável, não é mesmo? A senadora Gleisi Hoffmann (PR), presidente do PT, saiu-se com uma explicação muito original. Segundo a preclara, o presidente Michel Temer só tomou essa medida para reprimir os movimentos sociais.
Olhem aqui: esta senhora comanda um partido de oposição ao governo. É natural que seja crítica à administração. É próprio da democracia. Mas convenham: ela poderia sofisticar minimamente as burrices que diz. Os líderes petistas já anunciaram que o partido votará contra a matéria quando esta chegar ao Congresso.
Ótimo! Façam isso mesmo. Tudo o que eu espero de petistas é que revelem a sua real natureza, colocando-se contra os interesses da população. É o que fazem os valentes quando se opõem, por exemplo, à reforma da Previdência. Só que isso não fica evidente porque boa parte das pessoas considera, erroneamente, que a dita-cuja vai lhes trazer prejuízos, o que é falso na esmagadora maioria das vezes.
No caso da intervenção, é diferente. A população do Rio e, creio, a esmagadora maioria dos brasileiros apoiam a medida porque já não aguentam mais ver gente decente ser refém de bandidos.
Mas por que essa postura de petistas e de outros esquerdistas?
É que essas mentes perturbadas consideram que bandidos são revolucionários que acabaram se desviando da rota. O criminoso que escolheu o caminho errado vira Rogério 157. O criminoso que escolheu o caminho certo vira Lênin.
Bem, esse é o substrato ideológico da crítica.
E há também o puro e simples oportunismo, não é? Afinal, se é medida tomada pelo governo e se o governo não é petista, então os petistas são contra.
Lembram? Os petistas são aqueles que não aprendem nada nem esquecem nada.
É de uma supina burrice ou má-fé afirmar que intervenção é só manobra por causa da Previdência. Ou: Corticoide e febre amarela
De todas as boçalidades ditas sobre a intervenção na área de segurança pública do Rio, a mais assombrosa é a que sugere que, agora, o presidente Michel Temer tem uma boa desculpa para deixar de lado a reforma da Previdência, já que ela vem se afigurando difícil, talvez impossível de ser aprovada.
Mal sei por onde começar a tratar da burrice — ou da vigarice analítica. O próprio presidente abordou a questão na entrevista exclusive que concedeu a este escriba no programa “O É da Coisa” (está aqui). Vamos lá.
Segundo dispõe o Artigo 60 da Constituição, esta não pode ser emendada na vigência de intervenção federal num estado. Ora, como romper o que parece, então, um impasse? Afinal, o país precisa da reforma da Previdência; o Rio, por outro lado, vive um caos na segurança pública. Com efeito, o país não pode ficar paralisado por causa da crise no Estado, mas o Estado não pode ficar à mercê da bandidagem porque o país precisa da reforma.
Na entrevista, o presidente lembrou duas coisas importantes. A Constituição proíbe aprovação de emenda durante a intervenção, mas não impede o Congresso de trabalhar em favor de uma proposta. Os debates não precisam ter fim. Que fale o presidente:
“Eles [Rodrigo Maia e Eunício Oliveira] vão examinar, ao longo desta semana, da outra semana, a possibilidade de votar a reforma da Previdência. Se chegarem, e chegarmos todos, à conclusão de que há os 308 votos necessários para aprovar a reforma da Previdência, o que é que eu faço? Eu faço cessar a intervenção. E aí, naturalmente, se retoma a possibilidade de votação da emenda à Constituição. A meu modo de ver, como a Constituição diz que ela não pode ser emendada durante a intervenção federal, não significa que não possa haver discussão. Emendar significa pôr um dispositivo novo na Constituição. Mas a discussão, as considerações a respeito disso, pode ser feita. O que não se pode é votar e depois colocar isso na Constituição. (…) Uma coisa não prejudica a outra. São duas coisas emergentes: a questão da reforma da Previdência, fundamental para o país, e a questão do Rio de Janeiro, igualmente emergente, porque tem repercussão não só no Rio, mas em todo o país. Então vamos conservar esses dois valores: de um lado, a intervenção; de outro lado, a possibilidade de continuar examinando [a reforma].”
Muito bem! Digamos que o governo consiga os 308 votos e que o presidente faça cessar a intervenção. Não se sabe quando isso pode acontecer. E se os problemas de segurança do Rio continuarem a pedir a intervenção. Bem, nada impede que ela seja decretada novamente, é claro, mas o presidente chamou a atenção para um outro aspecto de seu entendimento com o governador Luiz Fernando Pezão:
“Está combinado com o governador que, se eu cessar a intervenção em função da votação da Previdência, ele mantém a estrutura que foi montada pelo interventor e o próprio interventor. Então está combinadíssimo com o governador. Então eu acho que nós encontramos uma solução intermediária muito útil para o Rio de Janeiro e para o país”.
Tudo às claras
Como se vê, não há nada sendo escamoteado. Aprovar a reforma da Previdência não ficou nem mais fácil nem mais difícil com a intervenção. O ato impede a votação, mas não o trabalho político em favor da emenda. “Ah, se o presidente admite que, para votá-la, pode suspender a intervenção, então esta não era assim tão necessária”. Trata-se de um raciocínio asnal. Faz supor que uma necessidade elimine a outra.
Apelarei a medicina, com um caso em voga, para demonstrar a estupidez de tal raciocínio. Pacientes que estejam se tratando com corticoides não devem tomar a vacina contra a febre amarela. Digamos que um médico decida, por um tempo, suspender o tratamento com os corticoides para que o paciente seja devidamente imunizado. Mais tarde, oportunamente, retoma-se o tratamento com a droga se necessário. Segundo o raciocínio asinino, os corticoides, então, eram dispensáveis já que sua ministração foi suspensa para que o paciente pudesse tomar a vacina.
Não ocorre a esse raciocínio que tem os dois pés no chão e as duas mãos também que as duas coisas podem ser necessárias: os corticoides e a vacina — vale dizer: a reforma da Previdência e a intervenção federal. Ocorre que pode haver uma incompatibilidade temporal entre uma coisa e outra: a reforma e a intervenção (o corticoide e a vacina ). Faz parte da boa política e da boa medicina conciliar as necessidades, de sorte que não se precise abrir mão nem de uma coisa nem de outra.
Intervenção militar uma ova! A intervenção no Rio é civil porque feita nos termos da Constituição
É espantoso que parte da imprensa chame de “intervenção militar” a ação do presidente Michel Temer no Rio. O fato de que será um general — Walter Souza Braga Netto — a responder pela segurança pública do Estado não torna a intervenção militar. Que parte da Constituição essa gente não entendeu? Então eu lembro:
“Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:
(…)
III – pôr termo a grave comprometimento da ordem pública.”
E foi o que fez o presidente, para alívio do governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, e da população do Estado.
Para que vocês saibam: Pezão foi a primeira pessoa com quem o presidente Michel Temer conversou sobre a intervenção. Ela foi pedida pelo governador. Suponho que o chefe do Executivo estadual tenha ciência da situação. Fez ver ao presidente que a situação havia, sim, saído do controle e que se fazia necessária uma medida extrema.
Só então Temer mobilizou o ministro da Defesa, Raul Jungmann; Sérgio Etchegoyen, da Segurança Institucional, e os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e Eunício Oliveira.
Como é de seu feitio, Maia ameaçou espernear. Por alguma razão, achou que deveria ter sido consultado antes mesmo da conversa entre o presidente e o governador. E teve de ouvir do próprio Pezão que a intervenção era necessária. Passou, então, a elogiar a decisão.
A intervenção, Santo Cristo!, é civil porque feita nos termos da Constituição de 1988. O fato de que nunca se tenha recorrido a tal expediente desde a promulgação da Carta em nada altera a legalidade e a legitimidade do ato. É uma intervenção civil que será executada por um militar, sob o comando do presidente da República.