Juiz de Brasília torna Lula réu pela terceira vez (processo não tem nada a ver com a Lava Jato)

Publicado em 13/10/2016 20:05
por JOSIAS DE SOUZA (UOL)

Lula foi convertido em réu pela terceira vez. Deve-se a decisão ao juiz federal Vallisney de Souza Oliveira, de Brasília. Ele aceitou sem ressalvas a denúncia oferecida na última segunda-feira pelo Ministério Público Federal contra o ex-presidente. Aberta a nova ação penal, Lula responderá por quatro crimes: tráfico de influência, organização criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção passiva.

O caso envolve financiamentos do BNDES para obras da Odebrecht em Angola. Além de Lula, viraram réus o empreiteiro Marcelo Odebrecht e outras nove pessoas. Entre elas Taiguara Rodrigues dos Santos, sobrinho da primeira mulher de Lula. O processo não tem nada a ver com a Lava Jato. Aqui, detalhes sobre o caso.

Lula inclui até a Receita na grande ‘conspiração’

O problema de Lula é que a Justiça e os órgãos de controle têm enorme dificuldade para enxergar a lisura dos seus atos. E o ex-presidente tem dificuldade para demonstrá-la. A penúltima má notícia que abalroou Lula veio da Receita Federal. Em decisão publicada no Diário Oficial desta quinta-feira, o fisco suspendeu a isenção tributária do Instituto Lula referente ao ano de 2011. A entidade terá de recolher o Imposto de Renda e a Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido.

Os auditores da Receita concluíram que o Instituto Lula “está longe de se dedicar à defesa de direitos sociais, é mero escritório de administração de interesses particulares e financeiros do ex-presidente''. Identificaram-se despesas que não ornam com a natureza social da entidade. Entre elas gastos de Lula e de sua mulher, Marisa Letícia.

Dito de outro modo: o Instituto Lula opera como empresa, não como organização sem fins lucrativos. Como costuma fazer sempre que o ex-presidente se encontra na berlinda, sua assessoria divulgou uma nota oficial. Nela, insinua que, assim como Sérgio Moro, a Procuradoria, a Polícia Federal, alguns ministros do STF e o resto do mundo, o fisco também integra a conspiração anti-Lula.

Alega-se que as despesas questionadas correspondem a 2,74% das receitas do instituto. A maioria delas está relacionada a viagens de membros do instituto. Assim, tudo não passaria de mais “uma clara tentativa de ferir a qualquer custo a imagem do ex-presidente.”

Diz ainda a nota que os advogados de Lula já esclareceram à Receita que não há desvio de finalidade no instituto que leva o nome do morubixaba do PT. Nessa versão, a verba recolhida como doação ''é integralmente aplicada em atividades voltadas à divulgação e preservação da memória, do legado e do acervo do personagem histórico que é o ex-presidente Lula.” São tarefas “de cunho eminentemente cultural.”

A assessoria de Lula achou que a Receita aplicou a sanção ao instituto com rapidez inusal. E acusou: “Dado o pouco tempo passado entre a apresentação da defesa e a superveniência da decisão, fica confirmado o jogo de cartas marcadas já mencionado na peça defensiva, especialmente em virtude do indeferimento da produção complementar de provas, o que é direito de qualquer contribuinte.”

De resto, Lula e seus defensores avaliam que, além de a decisão ser “ilegal”, há transparência demais na causa. “O processo administrativo corre em sigilo, imposto por lei, que o Instituto Lula gostaria de ver respeitado, ao invés dos seguidos vazamentos ilegais feitos por funcionários públicos para a imprensa.”

A plateia começa a desenvolver em relação ao catecismo conspiratório de Lula o mesmo sentimento que os dogmas religiosos costuma despertar nos céticos. Nem todo mundo consegue acreditar no que o lulismo acredita. As pessoas ficam imaginando o que estão perdendo com a sua descrença.

A metafísica é muito mais divertida do que o materialismo chato em que irregularidades são sempre inapelavelmente irregularidades e nunca passam disso. As teorias conspiratórias são sempre criativas, cheias de intrigas e perfídias. Quem torce o nariz para elas se priva dos prazeres de uma boa ficção.

Eduardo Cunha troca bolero pelo rock and roll

Sergio Moro tirou Eduardo Cunha para dançar. Acatou a primeira denúncia que lhe chegou às mãos contra o deputado cassado. E deu prazo de dez dias para a apresentação da defesa. O ex-mandachuva da Câmara não está acostumado com tamanha desenvoltura. Movendo-se na cadência legislativa do bolero —dois pra lá, dois pra cá— Cunha retardou por mais de nove meses a cassação do seu mandato. Conhecerá agora o ritmo preferido do juiz da Lava Jato: rock and roll.

Nesta mesma quinta-feira, Moro ofereceu a Cunha um exemplo do que está por vir. Fez isso ao condenar o ex-senador Gim Argello a 19 anos de cadeia, em regime inicialmente fechado. Preso em abril, Argelo foi denunciado pelos procuradores da Lava Jato em maio. Menos de cinco meses depois, já frequenta o rol dos condenados. Recorrerá ao Tribunal Regional Federal da 4a. Região, em Porto Alegre. Ali, as sentenças de Moro costumam ser confirmadas.

Para desassossego de personagens como Gim Argello e Eduardo Cunha, ao manter a porta do xilindró aberta para os réus condenados na segunda instância do Judiciário, o Supremo Tribunal Federal prestigiou a coreografia de Sergio Moro. Quem dançar pode até recorrer aos tribunais de Brasília. Mas terá de aguardar o resultado do julgamento atrás das grades. É tempo de rock.

Condenação de Gim deixa o Senado em alerta

Ao condenar o ex-senador Gim Argello a 19 anos de cadeia por vender proteção a empreiteiros na CPI da Petrobras, o juiz Sérgio Moro reforçou a impressão de que o Congresso é um grande mercado. Vendem-se almas no varejo e a consciências no atacado. Na gôndola do Parlamento falta só um tipo de mercadoria: honra. Os 10% que ainda prezam a própria honra não a vendem.

E os 90% que topam vender até a honra não têm como oferecer certificado de garantia. Pelo menos dois empreiteiros confirmaram que compraram protetão na CPI: Ricardo Pessoa, da UTC e Leo Pinheiro, da OAS. Ambos também foram condenados. Em sua confissão, Leo Pinheiro disse ao juiz Sérgio Moro que, num dos encontros que teve na casa de Gim Argello, estava presente o então ministro Ricardo Berzoini (PT-SP), que era o coordenador político do governo Dilma Rousseff. Segundo ele, Berzoini falava em nome do governo e pediu que a OAS “colaborasse”. Berzoini negou.

Preso em Curitiba desde abril, Gim Argello não era um senador qualquer. Embora fosse um suplente do PTB de Brasília, ele frequentava as reuniões de cúpula do Senado. Era chegado a Renan Calheiros e José Sarney. Vizinho de Dilma na época em que ela era minsitra de Lula, fazia caminhadas matinais com aquela que seria a presidente da República. A atuação de Gim Argello reforça a má fama do Congresso, meio bazar, meio bordel. O grande receio dos amigos de Gim é o de que a instituição se transforme também em confessionário, com a conversão do condenado em delator.

CNJ pune juíza do Pará com o ócio remunerado

O caso estarreceu o país. Uma menina de 15 anos, corpo mal recoberto por uma sainha curta, uma blusa que prenunciava os seios adolescentes, foi jogada num calabouço masculino, com 30 marginais. Deu-se em novembro de 2007, nos fundões do Pará, município de Abaetetuba. Decorridos nove anos, o Conselho Nacional de Justiça decidiu “punir” a juíza responsável pelo absurdo. Chama-se Clarice Maria de Andrade. Foi sentenciada, por assim dizer, à pena de “disponibilidade”.

Repetindo: o “castigo” imposto à juíza por servir uma menina de 15 anos a três dezenas de marginais numa cela superlotada foi a disponibilidade. Os dicionários ensinam que disponibilidade é a condição daqueles que se encontram disponíveis. Disponível, ensinam também os dicionários, é estar livre, desimpedido —sem tarefas ou compromissos. Ou seja: a juíza foi “condenada” ao livre usufruto do ócio. Um ócio devidamente remunerado.

Relator do caso no CNJ, o conselheiro Arnaldo Hossepian classificou o gesto da juíza de “ignominioso”. Na língua dos mortais, isso quer dizer vergonhoso, degradante. E a “punição” foi a disponibilidade. A juíza fica afastada de suas funções e recebe mensalmente o salário pago pelo contribuinte. Depois de 2 anos, a doutora pode ser reconvocada para o trabalho. Brasillllllll!

Suprema ironia: o inaceitável de Abaetetuba teve um quê de inacreditável: a menina foi aviltada nas dependências de um Estado que era gerido por uma mulher, a então governadora petista Ana Júlia Carepa. Quem mandou a adolescente para a cela foi outra mulher, a delegada Flávia Verônica Pereira. A decisão recebeu o endosso de uma terceira mulher, a juíza Clarice Maria de Andrade.

Agora, quis o destino que o CNJ decidisse impor a “punição” que vale por um prêmio num instante em que a entidade é presidida por outra mulher, a ministra do STF Cármen Lucia. O mais inusitado é que, no fim das contas, a única punida foi a menina de 15 anos. Tudo na mais absoluta normalidade. Uma evidência de que algo de muito anormal precisa acontecer no Brasil.

O caso estarreceu o país. Uma menina de 15 anos, corpo mal recoberto por uma sainha curta, uma blusa que prenunciava os seios adolescentes, foi jogada num calabouço masculino, com 30 marginais. Deu-se em novembro de 2007, nos fundões do Pará, município de Abaetetuba. Decorridos nove anos, o Conselho Nacional de Justiça decidiu “punir” a juíza responsável pelo absurdo. Chama-se Clarice Maria de Andrade. Foi sentenciada, por assim dizer, à pena de “disponibilidade”.

Repetindo: o “castigo” imposto à juíza por servir uma menina de 15 anos a três dezenas de marginais numa cela superlotada foi a disponibilidade. Os dicionários ensinam que disponibilidade é a condição daqueles que se encontram disponíveis. Disponível, ensinam também os dicionários, é estar livre, desimpedido —sem tarefas ou compromissos. Ou seja: a juíza foi “condenada” ao livre usufruto do ócio. Um ócio devidamente remunerado.

Relator do caso no CNJ, o conselheiro Arnaldo Hossepian classificou o gesto da juíza de “ignominioso”. Na língua dos mortais, isso quer dizer vergonhoso, degradante. E a “punição” foi a disponibilidade. A juíza fica afastada de suas funções e recebe mensalmente o salário pago pelo contribuinte. Depois de 2 anos, a doutora pode ser reconvocada para o trabalho. Brasillllllll!

Suprema ironia: o inaceitável de Abaetetuba teve um quê de inacreditável: a menina foi aviltada nas dependências de um Estado que era gerido por uma mulher, a então governadora petista Ana Júlia Carepa. Quem mandou a adolescente para a cela foi outra mulher, a delegada Flávia Verônica Pereira. A decisão recebeu o endosso de uma terceira mulher, a juíza Clarice Maria de Andrade.

Agora, quis o destino que o CNJ decidisse impor a “punição” que vale por um prêmio num instante em que a entidade é presidida por outra mulher, a ministra do STF Cármen Lucia. O mais inusitado é que, no fim das contas, a única punida foi a menina de 15 anos. Tudo na mais absoluta normalidade. Uma evidência de que algo de muito anormal precisa acontecer no Brasil.

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Fonte: Blog do Josias (UOL)

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