Precisaremos de anos de trabalho para corrigir os estragos de Dilma (ALEXANDRE SCHWARTSMANN)
A proposta de criação do teto para as despesas federais é a principal iniciativa do governo na área fiscal. É também a única iniciativa do governo na área fiscal, mas seria a principal mesmo se houvesse outras. A razão é simples: há mais de duas décadas os gastos do governo vêm crescendo a um ritmo de 6% ao ano acima da inflação.
Como o PIB não cresce (nem crescerá) à mesma taxa, a tendência é que a despesa ocupe um pedaço crescente do produto. Assim, em 1997 o gasto equivalia a 14% do PIB; já em 2016 deve atingir 20% do PIB. Se esse ritmo for mantido pelos próximos dez anos, adicionaremos algo como 3% do PIB ao dispêndio federal. Tem, portanto, razão o ministro da Fazenda ao afirmar que, "se não for aprovado o teto dos gastos de despesas (...), só resta aumentar imposto (sic)".
Há, claro, quem defenda essa alternativa, mas não parecem se dar conta das consequências. O Brasil já apresenta uma das maiores cargas tributárias entre países com renda média (é o 25º no ranking de carga tributária, mas apenas 68º em renda per capita ).
Além disso, ela é extraordinariamente complexa: segundo o Banco Mundial, uma empresa brasileira típica requer 2.600 homens-hora/ano dedicados à tarefa de pagar impostos, algo como duas vezes e meia mais do que na Bolívia (a segunda colocada), ou quase 15 vezes mais do que a média dos países da OCDE. Podemos até enveredar por essa via, mas à custa de maior ineficiência e crescimento ainda mais baixo.
O caminho passa, pois, pela contenção das despesas. Em tese, valendo a regra do teto, inverteríamos a dinâmica das últimas décadas: o gasto passaria a crescer menos do que o PIB, em algum momento levando ao ressurgimento dos superavit primários. Mais à frente esses chegariam ao valor necessário para conter a elevação persistente da dívida pública e o país retornaria a uma rota de sustentabilidade fiscal, condição necessária (ainda que não suficiente) para o crescimento mais forte.
Mesmo, porém, que o teto funcione a contento, resta ainda saber quanto tempo seria necessário para que esse cenário de sonho se tornasse realidade. Obviamente há muitas variáveis envolvidas nessa resposta, como o crescimento da economia nos próximos anos, a taxa real de juros e a resposta das receitas do governo ao ciclo econômico, assim como o sucesso das iniciativas de concessões e privatizações.
Contudo, por mais complexa que seja a interação dessas variáveis, é possível simular diversos cenários para termos uma noção de como se comportaria o endividamento do governo partindo de diferentes premissas acerca do crescimento, juros etc. A conclusão, seja das simulações que fiz, seja das realizadas por outros economistas (seguindo metodologias bastante similares), é que a estabilização da dívida demandaria, no mínimo, de 4 a 6 anos, avançando sobre pelo menos mais um mandato presidencial.
A essas dificuldades somam-se os problemas de fazer o teto funcionar sem a reforma da Previdência, que adiariam ainda mais o horizonte de controle da dívida, conforme explorado recentemente por Cassiana Fernandez e Cristiano Souza.
Tivemos a chance de tratar disso já em 2005, mas havia Dilma Rousseff no meio do caminho. Agora precisaremos de anos de trabalho para corrigir os estragos; se os corrigirmos...
BC lança olhar de interrogação para congressistas: risco ou oportunidade? (por JOSIAS DE SOUZA, no UOL)
Saiu a ata da última reunião do Copom, encerrada na quarta-feira (20) da semana passada. Mesmo com a recessão a pino, os diretores do Banco Central concluíramque ainda não chegou a hora de baixar a taxa básica de juros de 14,25% ao ano. O texto, disponível aqui, empilhou as razões. A certa altura, o BC condicionou uma mudança de rota à disposição dos políticos de tirar do papel medidas capazes de deter a escalada dos gastos públicos.
Diz a ata do Copom: “Todos os membros do comitê enfatizaram que a continuidade dos esforços para aprovação e implementação dos ajustes na economia, notadamente no que diz respeito a reformas fiscais, é fundamental para facilitar e reduzir o custo do processo de desinflação. Não houve consenso sobre a velocidade desses ajustes, o que sugere que constituem, ao mesmo tempo, um risco e uma oportunidade.''
Nessa visão, os congressistas serão “um risco” se embromarem a ponto de solidificar no mercado a impressão de que brigaram com a máquina de calcular. Podem virar uma “uma oportunidade” se pararem de confundir dinheiro público com dinheiro grátis. O ponto de partida seria a aprovação da proposta de emenda constitucional que cria o teto para a expansão do gasto público, limitando-a à variação da inflação do ano anterior.
Ameaça de elevar impostos cheira a chantagem
Não é gratuita a pregação do ministro Henrique Meirelles sobre a possibilidade de aumento de impostos. Junto com a ameaça (aqui e aqui), o titular da Fazenda menciona a esperança de que o Congresso aprove “rapidamente” a emenda constitucional que institui um teto para os gastos públicos, limitando-os à inflação do ano anterior. A combinação da ameaça com a esperança resulta numa chantagem. É como se Meirelles declarasse: ou os congressitas aprovam o teto ou o remédio será ainda mais amargo.
Relator da emenda do teto de gastos na Câmara, o deputado Danilo Forte (PSB-CE) disse ao blog que a proposta só deve ser aprovada em plenário depois das eleições municipais de outubro. Meirelles insinua que a decisão sobre os tributos talvez tenha que ser tomada antes, no final de agosto. Convém que o governo se acerte com seus apoiadores no Legislativo. Sob pena de aviltar um vocábulo. Arrancar mais dinheiro do brasileiro, à força, e continuar chamando-o de “contribuinte'' não faz sentido.
62% apoiam novas eleições, diz dado que Datafolha publica agora (no EL PAÍS)
Para 62% dos brasileiros, uma saída para a crise política seria a renúncia deMichel Temer e Dilma Rousseff para que fossem realizadas novas eleições. Foi que responderam, quando questionados sobre a possibilidade, os entrevistados do Datafolha, mas o dado auferido na pesquisa feita pelo instituto em 14 e 15 de julho não apareceu nas reportagens publicadas sobre o assunto e nem no relatório da pesquisa disponibilizado pelo instituto em seu site nesta terça-feira. A existência desta e de uma outra pergunta, a respeito da percepção popular sobre os procedimentos do impeachment, foram reveladas pelo site Tijolaço e confirmado em reportagem publicada pela própria Folha, que traz link para a nova versão do documento. O episódio aprofunda a controvérsia em torno do mais respeitado instituto do país, que vinha sendo questionado por ter apresentado dados de maneira imprecisa em um gráfico do jornal sobre os favoráveis a uma nova votação e por supostamente não ter repetido a pergunta sobre o hipotético pleito, como no levantamento de abril.
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"O resultado da questão sobre a dupla renúncia de Dilma e Temer não nos pareceu especialmente noticioso, por praticamente repetir a tendência de pesquisa anterior e pela mudança no atual cenário político, em que essa possibilidade não é mais levada em conta", disse, no texto publicado pelo jornal, Sérgio Dávila, editor-executivo daFolha. Dávila argumentou que é prerrogativa da publicação escolher o que acha jornalisticamente mais relevante no momento em que decide publicar a pesquisa e que não é incomum que não usem perguntas do Datafolha em reportagens. O EL PAÍS havia questionado a Folha mais cedo, nesta quarta, sobre a ausência da pergunta de novas eleições. Ao Datafolha, a reportagem perguntou por que aparecia uma cifra de 60% de apoiadores de novas eleições no relatório da pesquisa então disponível, já que não havia referência ao dado no restante documento. Perguntou ainda sobre as novas perguntas apresentadas pelo Tijolaço. Em resposta, ambos anunciaram que publicariam reportagem sobre o tema. Alessandro Janoni, do Datafolha, acrescentou ainda sobre a nova versão do documento: "Atualizamos os relatórios no site do Data à medida que a Folha publica os resultados, justamente para não furar o jornal (permitir que a Folha publique em primeira mão). A pesquisa geralmente é fatiada e divulgada aos poucos."
Apoiadores de Dilma Rousseff e até da ex-senadora Marina Silva ansiavam por um levantamento a respeito da adesão à tese de novas eleições, uma posição que chegou a ser defendida em editorial pela Folha no começo do ano. Uma das últimas cartadas da presidenta afastada para conseguir os votos de senadores para se salvar do impeachment, cuja votação final está prevista para agosto, é se comprometer com um plebiscito para realizar uma nova eleição. Os defensores da saída esperavam contar com um índice popular da adesão à tese para tentar convencer os parlamentares, uma empreitada considerada extremamente difícil no momento. Em abril, o Datafolha apontou que 79% da população seria favorável a nova votação para presidente em caso de renúncia dupla. Pesquisa do Ibope pouco depois registrou apoio de 62% à possibilidade de eleições.
A outra pergunta que não constava do relatório publicado originalmente era: "Na sua opinião, o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff está seguindo a regras democráticas e a Constituição ou está desrespeitando as regras democráticas e a Constituição?". Para 49%, o rito segue as regras, contra 37% que a questionam.
A controvérsia em torno dos questionários do Datafolha cresceram agora, mas as perguntas já haviam atraído críticas em abril. Na época, a formulação sobre um possível processo de destituição de Temer, congelado na Câmara e sem perspectiva real de andamento, desagradou apoiadores de Temer, como o jornalista e colunista da Folha Reinaldo Azevedo. "Não faz sentido, a meu ver, o Datafolha indagar se as pessoas são favoráveis ao impeachment de Michel Temer. Trata-se de um erro brutal cometido pelo instituto, ao qual a Folha dá enorme destaque porque, suponho, encomendou o levantamento", escreveu ele em seu blog.
Apoio no Nordeste
À exceção do dado sobre o apoio à nova eleição, que ainda assim é menor que o de abril, os números não são alentadores para Dilma. Um dos alívios para a petista está no Nordeste, bastião do PT que destoa das demais regiões brasileiras quando o tema é a permanência de Michel Temer na presidência ou à volta da mandatária afastada ao Planalto. No conjunto dos nove Estados da União da região, 49% responderam ao Datafolha que preferem a volta da petista, enquanto 37% querem que Temer fique. média do país, quando questionados se preferem um ou outro, 50% querem que o interino fique e 32% gostariam que Dilma voltasse. Outros 3% responderam espontaneamente que preferiam novas eleições, o que deu origem aos questionamentos à forma de apresentação dos números do levantamento.
Temer também desfruta de avaliação pior do que o Governo de Itamar Franco que, em dezembro de 1992, dois meses após assumir no lugar de Fernando Collor, era considerado ótimo ou bom por 34% (contra 14% de Temer), regular por 45% e ruim ou péssima por 11%, com outros 11% sem opinião sobre o assunto. O peemedebista tem aprovação acima da média entre os mais ricos (23%) entre simpatizantes do PSDB (38%) e PMDB (27%).