Dilma na ONU: não se trata apenas de um equívoco; trata-se de um crime
Poucas coisas revelam com tanta clareza a natureza do PT e põem na devida perspectiva a sua história como a acusação destrambelhada de que impeachment é golpe. Sim, claro, todos sabemos: esse é um argumento de quem já perdeu e investe numa versão que possa justificar atos de sabotagem contra o futuro governo, que já foram anunciados. Mas é mais do que isso, reitero: expõe-se aí uma essência.
O PT nunca acatou a democracia como um valor inegociável. Querem a prova? Na oposição, sabota governos; no governo, mobiliza-se para não apear do trono nunca mais. Não reconhece a legitimidade do “outro” nem a alternância do poder.
Alguns esperavam — eu não, confesso — que fosse um pouco mais responsável. Não é. Imaginem um partido em que um sujeito considerado moderado, como José Eduardo Cardozo, transforma a Advocacia-Geral da União num centro de baixo proselitismo político. O ápice da irresponsabilidade está no discurso que Dilma pode fazer amanhã, na ONU, com referências ao suposto golpe que estaria em curso no Brasil.
Nesta quarta, três ministros do Supremo repudiaram de maneira inequívoca a fala: Celso de Mello, Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Disse Mello: “Há um equívoco quando [Dilma] afirma que há um golpe parlamentar, ao contrário. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, deixou claro que o procedimento destinado à abertura do processo de impeachment observa os alinhamentos ditados pela Constituição da República”.
E o ministro avançou: “Portanto, ainda que a senhora presidente da República, veja, a partir de uma perspectiva eminentemente pessoal a existência de um golpe, na verdade, há um grande e gravíssimo equívoco, porque o Congresso Nacional, por intermédio da Câmara dos Deputados e o Supremo Tribunal Federal, deixaram muito claro que o procedimento destinado a apurar a responsabilidade política da presidente da República, respeitou até o presente momento, todas as fórmulas estabelecidas na Constituição”.
Também o ministro Gilmar Mendes insistiu na normalidade institucional: “Eu não sou assessor da presidente e não posso aconselhá-la. Mas todos nós que temos acompanhado esse complexo procedimento no Brasil podemos avaliar que se trata de procedimentos absolutamente normais, dentro do quadro de institucionalidade. Inclusive as intervenções do Supremo determinaram o refazimento até de comissões no âmbito do próprio Congresso Nacional, da própria Câmara, [o que] indica que as regras do Estado de Direito estão sendo observadas”.
Toffoli destacou uma questão para a qual já chamei atenção dos leitores muitas vezes. Se a própria presidente apresentou a sua defesa nas instâncias adequadas, como pode chamar de golpista o aparato ao qual recorreu para se defender? Disse: “Falar que o processo de impeachment é um golpe depõe e contradiz a própria atuação da defesa da presidente, que tem se defendido na Câmara dos Deputados, agora vai se defender no Senado, se socorreu do Supremo Tribunal Federal, que estabeleceu parâmetros e balizas garantindo a ampla defesa. Portanto, alegar que há um golpe em andamento é uma ofensa às instituições brasileiras, e isso pode ter reflexos ruins, inclusive no exterior, porque isso passa uma imagem ruim do Brasil. Eu penso que uma atuação responsável é fazer a defesa e respeitar as instituições brasileiras e levar uma imagem positiva do Brasil para o mundo todo, que é uma democracia sólida, que funciona e que suas instituições são responsáveis”.
Cadê Lewandowski?
Que bom! As instituições democráticas respiram normalmente. A fala dos três ministros honra a corte constitucional brasileira. Mas vou aqui lançar perguntas: “Onde está o ministro Ricardo Lewandowski, que é a autoridade máxima do Poder Judiciário no momento? Como é que ele permite que prospere essa farsa e mantém um silêncio cúmplice a respeito?”. Ainda que ele possa achar que inexistam elementos para processar a presidente por crime de responsabilidade, ele sabe que golpe não é.
Mesmo Renan Calheiros (PMDB-AL) sendo um dos investigados da Lava-Jato, segue sendo presidente do Senado e do Congresso Nacional. Também a ele cabe repudiar de pronto a acusação.
E não posso, uma vez mais, deixar de lado uma questão importante. Dilma não está apenas cometendo um equívoco. Ela está praticando novos crimes. A um presidente da República não se faculta a licença para tratar como golpistas os Poderes Legislativo e Judiciário, quando estes, obviamente, estão seguindo a Carta Magna e as leis. A presidente ofende, assim, o Artigo 85 da Constituição nos seguintes incisos:
Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
II – o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;
III – o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV – a segurança interna do País;
VII – o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
Creio que nem preciso explicar por quê. A disposição de Dilma de levar a questão para a ONU revela a determinação do PT de sabotar o futuro governo e emite um sinal de que as franjas do partido, que se dizem movimentos sociais e sindicais, pretendem aderir mesmo à mais pura e escancarada subversão da ordem democrática.
E há de valer para o PT a máxima tocquevilleana, não é? Vamos corrigir os males da democracia com mais democracia. Na exata medida em que os petistas, liderados por Lula, decidirem afrontar algum dispositivo da Carta, será preciso usar a Carta para que voltem a se comportar segundo as regras da civilidade. Ou para que paguem o preço de sua transgressão.
Na tirania petista, tudo pode ser permitido ao tirano e seus amigos. Na democracia, não!
Dilma tem de arcar com o peso de suas irresponsabilidades adicionais.
Temer concede entrevistas a veículos estrangeiros e evidencia a mentira da tese do golpe
Exercendo interinamente a Presidência em razão da viagem de Dilma Rousseff a Nova York, Michel Temer concedeu entrevistas a veículos estrangeiros para rebater a mentira que a presidente espalha mundo afora, a saber: o impeachment seria um golpe. Em entrevistas separadas, o ainda vice falou aos americanos The New York Times, The Wall Street Journal e Dow Jones (agência de notícias) e ao britânico Financial Times.
A todos, lembrou o óbvio, já destacado por ministros do Supremo: os passos do impeachment estão previstos na Constituição e são acompanhados pela Justiça. O país vive um período de absoluta normalidade democrática, tanto é que a presidente viajou, e ele, Temer, exerce interinamente a Presidência, que volta às mãos da titular tão logo esteja em solo pátrio.
Referindo-se ao possível discurso de Dilma na ONU com alusões a um suposto golpe, afirmou Temer ao NYT: “Estou muito preocupado com a intenção da presidente de dizer que o Brasil é uma República de menor importância onde há golpes”. E fez uma observação certeira ao FT: “O que ela deveria fazer, na minha opinião, é defender-se no Senado, com argumentos sólidos, e, então, o Senado não vai julgá-la nem afastá-la”.
Os idiotas que estão por toda parte não param de envergonhar o Brasil na ONU
No fim dos anos 80, o presidente José Sarney apareceu na Organização das Nações Unidas numa limusine branca, como um noivo do Michigan. Durante o discurso, interrompido duas ou três vezes por um deputado mineiro que gritava APOIADO!, apresentou ao mundo o poeta maranhense Bandeira Tribuzzi. O governo do Brasil chegara ao limite do ridículo, certo?
Errado. No começo dos anos 90, quando acompanhou o presidente Fernando Collor numa assembleia da ONU, a ministra da Fazenda, Zélia Cardoso de Mello, circulou por Nova York a bordo de uma carruagem. O governo do Brasil chegara ao limite da jequice provinciana, certo?
Errado. Na primeira década deste século, o presidente Lula, que não fala sequer português, botou na cabeça que merecia virar secretário-geral da ONU (e, antes ou depois, prêmio Nobel da Paz. O governo lulopetista alcançara a última fronteira da maluquice megalomaníaca, certo?
Errado, avisa a viagem de Dilma Rousseff a Nova York. Ela anda por lá para contar aos integrantes da organização internacional que o País do Carnaval inventou o golpe de Estado autorizado pela Constituição, regulamentado pelo Supremo Tribunal Federal, aprovado pelo Congresso e apoiado por oito em cada dez eleitores.
Como lembra o comentário de 1 minuto para o site de VEJA, Nelson Rodrigues constatou há 50 anos que os idiotas estão por toda parte. Poderiam ao menos permanecer por aqui ─ e parar de envergonhar o Brasil na ONU.
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A algema que ameaça o braço direito complica a viagem tramada por Dilma para
denunciar na ONU o golpe que não derruba o golpeado nem confisca seu passaporte
O desembarque de Giles Azevedo no noticiário político-policial informa: a taxa de bandidagem alcançada pelo círculo íntimo de Dilma Rousseff já rivaliza com a de qualquer bando de brothers de um chefão do PCC. O índice tornou a subir na segunda semana de março, quando a melhor amiga (secreta, por imposição do prontuário) Erenice Guerra apareceu boiando no pântano drenado pela delação premiada de Delcídio Amaral. Segundo o senador, a mulher que transformou a Casa Civil num esconderijo de parentes larápios andou fazendo o diabo nas catacumbas da usina de Belo Monte. Promovida a operadora do esquema de propinas, irrigou a campanha de 2014 com R$ 45 milhões.
Dias depois, a devassa das bandalheiras protagonizadas pelo governador mineiro Fernando Pimentel revelou que o mais antigo amigo de Dilma pode perder o mandato bem antes do prazo previsto ─ já estará no lucro se mantiver o direito de ir e vir. Na semana passada chegou a vez de Gim Argello, conselheiro, confidente e parceiro de caminhadas de Dilma. A Polícia Federal descobriu que o ex-senador do PTB embolsou mais alguns milhões para excluir empreiteiros assustados da lista de depoentes da CPI da Petrobras. A presidente tentou infiltrá-lo no Tribunal de Contas da União. O protegido acabou instalado na traseira de um camburão.
Nesta quarta-feira, informações fornecidas à Operação Lava Jato pela publicitária Danielle Fonteles, dona da agência Pepper, elevaram a lama que inunda o Planalto à altura do pescoço de Giles Azevedo, assessor especialíssimo e especializado em missões ultrassecretas. Segundo a revista Isto É, trechos da delação premiada de Danielle detalharam o esquema comandado pelo braço direito presidencial (que nada faz sem a expressa concordância do esquerdo e em obediência ao mesmo neurônio). A usina de dinheiro sujo permitiu à agência receber recursos ilegais que vitaminaram com R$ 58 milhões as campanhas de 2010 e 2014. “Quando o Giles fala, ouço a voz da presidenta”, diz um veterano sacerdote do PT.
Na véspera do voo rumo a Nova York, Dilma viu engordar a bagagem de complicações a resolver. Não será fácil explicar aos participantes do encontro na ONU, o que faz por lá a mulher alvejada por um golpe liderado por um vice que, graças à viagem da golpeada, está governando como interino o país representado no exterior pela titular itinerante. Que tipo de golpe é esse que nem sequer derruba o golpeado? Que golpistas são esses que nem se dão ao trabalho de confiscar o passaporte da figura escorraçada pela violência inconstitucional?
Caso algum jornalista pergunte por Giles, também terá de esclarecer como consegue resistir a tantas tentações sem um único amigo honesto a apoiá-la. Deve ser bem mais difícil que passar a vida inteira num bordel sem pecar contra a castidade.
Tags: Dilma, Giles Azevedo, Gim Argello, golpe, Nova York, ONU
A inocência da onda foi provada por Raul Seixas há 36 anos. Falta identificar os culpados pela queda da ciclovia de R$ 45 milhões que acaba de engolir duas vidas
por BRANCA NUNES
Na década de 1980, ao ser “atropelado por uma onda” quando passava de carro pela Avenida Delfim Moreira, no Leblon, Raul Seixas resignou-se: “A onda está certa, o que está errado é esse negócio de aterro, botar edifício aí”.
Passados 30 anos, nesta quinta-feira, pelo menos duas pessoas morreram depois que uma onda atropelou ─ e destruiu ─ parte da ciclovia construída há menos de 3 meses entre os bairros de São Conrado e Leblon, no Rio de Janeiro. A obra engoliu R$ 45 milhões.
No local do acidente, Pedro Paulo Carvalho, secretário municipal de Coordenação do Rio, avisou que é cedo para identificar causas e falhas que possam esclarecer o episódio. “É muito precipitado nós fazermos qualquer tipo de acusação sem ter ainda o laudo dos engenheiros, mas é claro que um acidente como esse é imperdoável”.
Pode ser prematuro apontar as falhas técnicas que provocaram o acidente. Mas não há como qualificar de afoito quem responsabiliza o poder público por não ter projetado uma estrutura, localizada sobre um penhasco, capaz de neutralizar os efeitos de um fenômeno que precedeu a chegada dos primeiros seres humanos às praias cariocas.
Duas obviedades merecem registro. Primeira: liberar a ciclovia para uso público em dias de ressaca é coisa de irresponsável. Segunda: em países sérios, uma obra tão recente e tão cara não cai sem mais nem menos. Tais evidências informam que não será difícil chegar aos culpados. Para que as investigações não percam tempo com uma inocente, basta lembrar a lição de Raul Seixas: “A onda está certa”.
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PSDB não quer participar do governo Temer: erro ou oportunismo?
Eu não sou exatamente um “pragmático” e confesso que tenho alguns problemas com a palavra “pragmatismo” porque costuma se entregar a uma rima pobre: “oportunismo”. Assim, prefiro os princípios.
Leio na Folha que o PSDB tende a fechar questão, em reunião da Executiva Nacional do dia 3 de maio, contra a participação de quadros do partido num possível governo de Michel Temer. Os tucanos devem, sim, dar apoio ao peemedebista no Congresso — uma pauta está sendo elaborada para entregar ao ainda vice —, mas sem ocupar cargos no primeiro escalão. A justificativa de alguns tucanos, segundo a reportagem, é que um eventual naufrágio do novo governo não pode prejudicar a legenda como alternativa de poder em 2018.
Dizer o quê? A prevalecer essa decisão, que contaria com a simpatia dos governadores Beto Richa (PR), Geraldo Alckmin (SP) e Pedro Taques (MT), só me resta observar: está tudo errado. E por um conjunto de motivos combinados.
Em primeiro lugar, observo: quem ajuda a derrubar tem de ajudar a governar, a menos que o PSDB de 2016 queira repetir o PT de 1992. Lula foi um dos líderes da deposição de Fernando Collor, mas decidiu que o seu partido não integraria o novo governo. Também os petistas estavam de olho nas eleições presidenciais, a exemplo dos tucanos agora.
Parecia que tudo caminhava para que a Presidência caísse no colo de Lula em 1994. Quando alguém falou que FHC, ministro da Fazenda, poderia se candidatar, os petistas caíram na gargalhada, e os petralhas das redações perguntavam se ele faria campanha em francês. Foi eleito e reeleito no primeiro turno, em 1994 e 1998, respectivamente. O excesso de esperteza engoliu o PT.
E o que significa “fechar questão”? Se Temer convidar um tucano para o governo, ainda que não em nome do partido, o PSDB faria o que o PT fez com Luíza Erundina, que foi expulsa da legenda por ter aceitado o cargo de ministra da Administração de Itamar? Se, sei lá, Temer oferecer o Ministério da Saúde para José Serra, por exemplo, os tucanos dirão algo como: “Se aceitar, está fora” — embora o partido continuasse a apoiar o governo no Congresso?
Faz sentido? Não faz.
Em segundo lugar, pergunto: então o PSDB não poderia se arriscar apoiando um governo Temer, mas o Brasil, nessa hipótese, com a ajuda dos tucanos, pode “correr o risco”? Os peessedebistas não querem arcar com o peso da aposta, mas convidam o brasileiro a fazê-lo? Não parece muito honesto intelectualmente. Não se trata de “ajudar o Temer”, mas de ajudar o país.
Uma decisão como essa parece estar mais inclinada a não criar fatos novos na fila dos pré-candidatos tucanos à Presidência do que a dar uma resposta a uma das maiores crises da história do país.
Em terceiro lugar, noto que o PSDB deveria fazer uma única exigência a Temer: o envio de uma emenda parlamentarista, com posterior referendo, já para 2018, não para 2022 — até lá, daria tempo de um presidente, qualquer que seja, bombardear a ideia. E os tucanos têm obrigação moral de apresentar essa proposta porque o PSDB é o único partido programaticamente parlamentarista.
A crise que aí está representa também uma chance imensa de mudar a qualidade do debate. Mas, para tanto, convém pensar primeiro no país. Mesmo! E esse é um bom jeito de pensar nos interesses do partido. De resto, acreditem em mim: no dia em que não houver mais fila no PSDB para disputar a Presidência, todos ficarão mais leves e poderão emprestar aos brasileiros os seus melhores talentos.