No EL PAÍS: Vídeo mostra o fim simbólico do poder chavista na Assembleia da Venezuela

Publicado em 06/01/2016 21:55
Novo presidente do Parlamento, opositor radical Ramos Allup, coordena a retirada de cartazes e material do chavismo. "Não quero ver Chávez nem Maduro." (no EL PAÍS).

O novo presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, o opositor Henry Ramos Allup, quis dar um marco simbólico para o novo período do Legislativo, pela primeira vez em 16 anos sob o comando de forças antichavistas. Vídeo mostra Ramos Allup, 72 anos, mandando retirar da sede da Assembleia toda a iconografia associada ao presidente Hugo Chávez (1954-2013) e os retratos de seu sucessor Nicolas Maduro. Ramos Allup dá ainda ordens expressas para que só permaneça no recinto a representação a óleo clássica do herói nacional Simón Bolívar, o Libertador.  Chávez, quando presidente, promoveu um novo retrato do prócer, mais moreno e baseado num estudo da ossada de Bolívar. "Não quero ver um quadro aqui que não seja o retrato clássico do Libertador. Não quero ver Chávez nem Maduro. Levem tudo isso."

 
 
Imagem do ex-presidente Hugo Chávez é removida da Assembleia Nacional, agora controlada pela oposição, após quase 17 anos de domínio chavista(Ronaldo Schemidt/AFP)

O Parlamento da Venezuela empossou nesta quarta-feira três deputados opositores que haviam sidoimpugnados pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ). Um deputado da situação, também afetado pela decisão da corte venezuelana, ausentou-se e por isso não assumiu seu mandato nesta quarta-feira. Chavistas protestaram contra a diplomação dos opositores e afirmaram que denunciarão a direção do Parlamento, presidido pelo opositor Henry Ramos Allup, por desacato.

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A coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD) assumiu na véspera o controle da Assembleia, após quase 17 anos de hegemonia do chavismo. No total, 109 deputados da oposição e 54 governistas foram empossados. Os quatro impugnados aguardavam a decisão do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) sobre sua situação. Na terça-feira, a comissão encarregada da posse, liderada pelo deputado mais velho, um chavista, não aceitou as credenciais dos deputados impugnados, mas nesta quarta foi formada outra comissão, controlada pela oposição, que empossou os três novos legisladores. Aos gritos de "que se cumpra a lei" e "nulo, nulo", a bancada chavista rejeitou a posse dos três deputados, afirmando que qualquer decisão votada pelos três estará viciada.

Com a posse dos três deputados eleitos pelo estado do Amazonas, a oposição tenta garantir a poderosa maioria de dois terços conquistada nas urnas. Com ela, pode tentar encurtar o mandato do presidente Nicolás Maduro com a convocação de uma Assembleia Constituinte ou uma reforma constitucional, mecanismos que a pretende recorrer ainda neste primeiro semestre. Com os dois terços, a Assembleia também pode remover juízes do TSJ - que será o árbitro na disputa entre Legislativo e Executivo - e titulares de outros organismos do Estado, que segundo a oposição estão impregnados pelo chavismo. Hoje, o Tribunal Supremo de Justiça, a Corte máxima da Venezuela, é dominada por magistrados chavistas e atua como um órgão atrelado aos desejos de Maduro.

Tapetão - Derrotado pela oposição nas urnas em 6 de dezembro, o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), chavista, entrou com recursos contestando a apuração de votos em seis seções eleitorais de três Estados do país, segundo uma ata divulgada para os meios de imprensa pelo órgão judicial. No apagar das luzes de 2015, o TSJ ordenou a suspensão da proclamação de três deputados opositores e, por tabela, um governista eleito na modalidade de voto em lista. Com isso, a oposição ficou com 109 dos 112 deputados que tinham sido proclamados pelo CNE, e o chavismo, com 54 de 55.

Retratos do chavismo - Tão logo tomou posse como nova maioria na Assembleia Nacional, ontem, a oposição ordenou a remoção de cartazes e quadros que retratavam Chávez em diversos momentos da sua presidência, como o discurso da tribuna das Nações Unidas em que, referindo-se ao então presidente americano, George W. Bush, afirmou: "cheira a enxofre!". As imagens foram retiradas nesta quarta-feira.

Oliver Blanco, assistente do novo presidente do Parlamento mostrou a um grupo de jornalistas um vídeo gravado logo cedo em que se vê Ramos Allup coordenando a retirada das imagens de Chávez. "Não quero ver um quadro aqui que não seja o retrato clássico do Libertador", diz a certa altura. Em outro trecho do mesmo vídeo, que circulou pelas redes sociais, Ramos Allup ironiza: "que levem para Sabaneta", em alusão à terra natal do ex-governante Chávez no estado Barinas, sudoeste do país. Repórteres da AFP constataram que os painéis de madeira removidos na manhã de hoje foram armazenados em uma sala do Palácio Legislativo.

 

Oposição venezuelana quer anistia de presos políticos e saída antecipada de Maduro

São "compromissos inegociáveis", disse Henry Ramos Allup, novo presidente do Parlamento venezuelano, empossado ontem, pondo fim a quase 17 anos de domínio chavista

 

UMA SESSÃO HISTÓRICA

A jornada parlamentar não foi presidida por dois enormes retratos: um de Hugo Chávez e outro do rosto reconstituído de Simón Bolívar.

O governador do Estado de Miranda e duas vezes candidato presidencial de oposição, Henrique Capriles Radonski, esteve no recinto pela primeira vez desde 1999.

A ex-deputada da oposição María Corina Machado pôde participar de um evento na Assembleia Nacional desde que foi proibida de entrar em abril de 2014.

A Assembleia Nacional é dirigida de forma inédita por um político não chavista. Desde as marchas de protesto de fevereiro de 2014 não era permitido que manifestantes da oposição marchassem no centro de Caracas.

Em seu primeiro discurso como presidente da Assembleia Nacional, o deputado Henry Ramos Allup confirmou nesta terça-feira que a oposição ao governo de Nicolás Maduro, maioria na Casa, buscará aprovar uma lei de anistia para exilados e presos políticos e antecipar o fim do mandato do presidente por uma "saída constitucional, democrática, pacífica e eleitoral". São "compromissos inegociáveis", disse Allup.

As forças opositoras ao governo anunciaram que seus dirigentes pactuaram no ano passado um prazo de seis meses a partir de hoje para decidir "a via constitucional" para uma saída antecipada do poder de Maduro, que foi eleito em 2013 para um período que termina em 2019. As opções, lembrou Ramos Allup, são o referendo revogatório do mandato presidencial - que pode ser ativado a partir de julho, quando Maduro completar metade de sua gestão -, emenda constitucional, o estabelecimento de uma Assembleia Constituinte ou mesmo a renúncia do presidente.

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Ramos Allup confirmou que "nos próximos dias" deve receber Maduro no plenário e o fará "com dignidade e respeito". "Nos próximos dias virá aqui o presidente da República para fazer sua mensagem anual, ele e seus ministros. Vamos recebê-lo com dignidade e respeito, não por prestar culto a ninguém, mas porque essa é nossa condição cívica", disse. Ramos Allup também disse que será pedido a Maduro para dialogar publicamente com a oposição, porque "os venezuelanos querem diálogo". "As sociedades civilizadas ou dialogam ou se matam. Diálogo não representa entrega nem transação, nem claudicação nem covardia. Representa simplesmente troca de opiniões para negociações", destacou.

Tensão - Allup e os demais deputados eleitos em 6 de dezembro foram empossados nesta terça-feira em sessão tumultuada que pôs fim a quase 17 anos de domínio chavista. O clima de tensão era claro desde cedo, em meio a gritos e acusações mútuas dentro do Congresso, e com marchas de seguidores de ambos os lados do lado do lado de fora da Casa. Nas ruas e praças de Caracas, multidões se reuniram para apoiar chavistas ou opositores. O Palácio Legislativo foi cercado por um forte esquema de segurança.

Posse - Dos 167 deputados eleitos (112 opositores e 55 governistas), 163 foram empossados. Os quatro parlamentares impedidos não receberam suas credenciais de deputados, pois o Superior Tribunal da Venezuela suspendeu os resultados das eleições em seções eleitorais no Estado do Amazonas. Com isso, três deputados opositores e um deputado indígena ligado ao governo, apesar de presentes na Assembleia, não puderam assumir suas cadeiras. A oposição está recorrendo da decisão do Superior Tribunal.

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Chavistas - Em minoria, chavistas protestaram contra a oposição e abandonaram a sessão. Diosdado Cabello, o antigo presidente da Casa e número dois do chavismo, acusou Allup de violar o regimento ao abrir a sessão para debates. Allup reagiu. "Deploro que os colegas da bancada do Partido Socialista da Venezuela tenham abandonado o recinto em um momento tão importante e solene como este", disse o parlamentar. "Terão que se acostumar porque nestes próximos cinco anos haverá liberdade de opinião e todos vão respeitar as opiniões discrepantes e divergentes."

 

Brasil dá um basta ao bolivarianismo

Por CLÓVIS ROSSI, na FOLHA DE S. PAULO

O governo brasileiro rompeu nesta terça-feira (5) com a tradicional passividade em relação aos abusos da Venezuela chavista, por meio de nota oficial em que afirma claramente:

"Não há lugar, na América do Sul do século 21, para soluções políticas fora da institucionalidade e do mais absoluto respeito à democracia e ao Estado de Direito".

É uma alusão nada indireta às manobras do governo venezuelano para driblar a supermaioria (112 deputados em 167) que a oposição obteve no pleito de 6 de dezembro para a Assembleia Nacional, instalada ontem.

Ainda mais que a nota deixa claro, como Folha havia antecipado na edição desta terça (5), que "o governo brasileiro confia que será plenamente respeitada a vontade soberana do povo venezuelano, expressada de forma livre e democrática nas urnas.

Confia, igualmente, que serão preservadas e respeitadas as atribuições e prerrogativas constitucionais da nova Assembleia Nacional venezuelana e de seus membros, eleitos naquele pleito".

É uma nota inusualmente dura, mas que reflete o distanciamento que o governo brasileiro resolveu adotar em relação ao bolivarianismo, depois de inúteis tentativas de ajudá-lo a enfrentar a crise econômica e social que devasta o país (a previsão é de queda de 10% do PIB no ano passado, índice que nem países em guerra conhecem).

A nota do Itamaraty é, na prática, uma sequência à carta que a presidente Dilma Rousseff enviou a Nicolás Maduro, antes da eleição, recomendando respeito às regras do jogo, antes, durante e depois do processo eleitoral.

O "durante" até que funcionou, reconhece a nota do Itamaraty.

O problema veio depois, primeiro com a decisão do governo de recorrer a uma Justiça sabidamente controlada pelo Executivo para tentar cassar três dos 112 deputados oposicionistas, de forma a barrar a supermaioria que daria poderes extraordinários à Assembleia.

Depois, na designação de uma assembleia paralela, a Comunal, prevista nos regulamentos bolivarianos, mas em hibernação absoluta até a vitória oposicionista.

O rompimento do Brasil com os excessos do chavismo deixa Caracas isolada no Mercosul, já que o novo presidente argentino, Mauricio Macri, também se manifestou contra eles.

Na cúpula de dezembro do Mercosul, o Brasil concordou com a criação de um organismo de monitoramento de direito humanos no âmbito do grupo.

É fatal que a Venezuela caia nas malhas desse grupo, a julgar pelos seus antecedentes: entre 1995 e 2012, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou a Venezuela 16 vezes por episódios de mortes extra-judiciais (na verdade, execuções pelos corpos policiais), e por violações da liberdade de manifestação, entre outros abusos aos direitos humanos.

A Venezuela retirou-se da corte, sob a clássica alegação de que a Organização dos Estados Americanos, à qual está subordinada a instância, é instrumento dos Estados Unidos.

O Brasil nunca se manifestou antes nesses episódios. Agora, dá um basta. 

(por CLÓVIS ROSSI,  na FSP).

 

Reuters: Brasil vê situação na Venezuela com pessimismo e envia sinais contra transgressão democrática

 

Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) - O Brasil vê com crescente pessimismo a situação política na Venezuela e prevê um endurecimento ainda maior nas relações entre o governo do presidente Nicolás Maduro e a Assembleia Nacional, majoritariamente oposicionista, mas já enviou sinais a Caracas de que não poderá contar com apoio brasileiro em caso de transgressão das regras democráticas, informaram à Reuters duas fontes governistas.

A nota divulgada na última terça-feira pelo Ministério das Relações Exteriores deu o tom do tratamento que o Palácio do Planalto pretende dar à situação na Venezuela. Normalmente suave na tratativa com os vizinhos sul-americanos, o governo brasileiro disse na nota que “não há lugar na América do Sul do século 21 para soluções políticas fora da institucionalidade e do mais absoluto respeito à democracia”.

O Brasil vem endurecendo as cobranças ao governo de Maduro e divulgou a nota sobre o país vizinho no mesmo dia em que deputados governistas tumultuaram a instalação da nova Assembleia.   

Segundo as fontes governistas, o Planalto espera que o recado chegue aos ouvidos de Maduro, mas não descarta o envio de novos emissários ao país vizinho --possivelmente o assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia-- caso julgue necessário.

Nos últimos meses, o governo brasileiro procurou se afastar da impressão de que daria qualquer apoio a atitudes pouco democráticas do governo venezuelano. Mesmo o discurso da presidente Dilma Rousseff na última reunião de Mercosul, interpretado como conciliador, foi tratado pelo Planalto como um aviso de que o Brasil espera o respeito ao resultado das eleições na Venezuela, que deram à oposição a maioria no Legislativo do país.

A análise de diplomatas brasileiros é de que Maduro está em uma situação muito complicada e com pouca margem de manobra, especialmente porque não há interesse entre os oposicionistas em negociar nenhum tipo de trégua com o governo. E, com a maioria da oposição na Assembleia, a possibilidade de que o presidente seja afastado legalmente é real.

O temor no governo brasileiro, disse à Reuters um dos diplomatas, é que o presidente venezuelano resista a entregar o cargo caso perca um eventual referendo para revogar seu mandato. Qualquer quebra nos processos democráticos obrigará o Mercosul e a União das Nações Sul-Americanas (Unasul) a agirem. Hoje, o apoio a Maduro em qualquer uma das entidades é mínimo.

Mesmo dentro do Itamaraty, sempre dado à conciliação, a paciência com o governo venezuelano está no fim, disse um dos diplomatas ouvidos pela Reuters. A análise é que o governo de Maduro pouco fez para merecer as tentativas brasileiras de ajudar o país.

 

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Fonte: EL PAÍS + VEJA + FOLHA

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