Ação do PCdoB reúne bobagens e questões que podem render um bom debate. Ou: Será que STF atira contra o passado e contra o futur

Publicado em 08/12/2015 09:04
Questionamento sobre voto secreto pode encontrar eco no STF; contestação de chapa alternativa é besteira... Digamos que Dilma sobreviva a esta primeira onda do impeachment. Cabe a pergunta: resistiria a uma segunda? (por REINALDO AZEVEDO)

O PCdoB decidiu agora, ora vejam, ser a “voz da legalidade” — a legalidade de um comunista — no processo de impeachment. Quem diria, né? Do Araguaia para o tapetão do Judiciário. O que o partido não conseguiu de metranca na mão tenta obter na base da chicana jurídica. Vamos ver se o partido será bem-sucedido. Vamos ver se o Supremo vai se deixar arrastar pela crise que hoje já toma os Poderes Legislativo e Judiciário. Explico o que quero dizer. Vamos lá.

Nesta terça, antes ainda da votação em que o governo foi fragorosamente derrotado, o PCdoB recorreu ao Supremo com um instrumento chamado “Medida Cautelar Incidental” pedindo que o tribunal declare sem efeito a votação secreta que elegeu a comissão especial do impeachment, argumentando que ela tem de ser aberta e que as indicações têm de ser feitas pelos partidos — o que impediria a chapa alternativa que abriga dissidentes.

O PCdoB fez esse pedido no âmbito de um outro recurso com a qual o partido já entrou: a chamada ADPF: Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental, esta ainda mais ampla.

Em tal ação, o partido pede que seja declarada a incompatibilidade de vários aspectos da Lei 1.079 com a Constituição em vigor. O partido argumenta, por exemplo, que o presidente da Câmara não poderia aceitar o início da tramitação da denúncia sem ouvir a defesa da presidente porque isso feriria o direito à ampla defesa.

 

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Bem, vamos ver. A ADPF do PCdoB traz apenas uma questão procedente. Aponta que a Lei 1.079 estabelece que o presidente se afaste assim que a denúncia contra ele for aceita por dois terços da Câmara — e é verdade: está no parágrafo 5º do Artigo 23 da lei. Mas a Constituição afirma no Inciso II do Parágrafo 1º do Artigo 86 que o mandatário tem de ser afastado depois de instaurado o processo no Senado.

A diferença é pequena, de um poucos dias. O resto da ação, como já disse aqui, é conversa mole, ainda que engenhosa.

Muito bem! O relator é Edson Fachin, que pediu que todos os atores envolvidos se manifestassem: Presidência, Advocacia-Geral da União, Senado, Câmara e Procuradoria-Geral da República.

A votação está pautada para o dia 16. A questão será decidida pelos 11 ministros da Casa.

Não deixa de ser curioso, não é? Como Cunha retirou o rito especial que havia estabelecido para a tramitação da denúncia, ficam valendo as regras antigas — as mesmas que depuseram Collor. Será que corte suprema do país vai decidir que o processo que afastou Collor da Presidência e que o conduziu à renúncia estava viciado? Será que o tribunal jogaria uma bomba, a um só tempo, contra o futuro e contra o passado do Brasil?

A ADPF, ainda que engenhosa, parece sem fundamento.

Quanto à questão do voto secreto, um questionamento desta terça, aí há possibilidade de se ter um debate razoável. Por quê? Voltemos à prisão de Delcídio do Amaral (PT-MS). O próprio Senado decidiu que a deliberação sobre a sua manutenção ou não seria aberta. Ainda que não o tivesse feito, o ministro Edson Fachin (o relator das ações do PCdoB) havia concedido liminar determinando que assim fosse. E explicou: “Não havendo menção no art. 53, § 2º, da Constituição à natureza secreta da deliberação ali estabelecida, há de prevalecer o princípio democrático que impõe a indicação nominal do voto dos representantes do povo (…)”.

Notem: quando a Constituição quer voto secreto, ela especifica. Em alguns casos, ela é omissa a respeito e se entende que pode ou não sê-lo, cabendo, em princípio, ao Parlamento decidir. Mas há sempre a possibilidade de a Corte entender que, sendo omissa a Carta, deva prevalecer o princípio da publicidade.

Já o questionamento do PCdoB sobre a formação da chapa avulsa é uma rematada bobagem. O Artigo 8º do Regimento Interno da Câmara permite candidaturas avulsas até para o comando da Câmara. Por que não permitiria para uma comissão? E, nesse caso, não há dispositivo constitucional nenhum que garanta ao menos um bom debate.

Finalmente, observo que, dada a reputação do governo, não sei por que os governistas, além da aposta na truculência, acham que o voto aberto lhes seria útil. Será mesmo que há tanta gente querendo ligar o seu nome à permanência de Dilma?

 

A liminar de Fachin, o seu alcance e quem decide

Pois é, meus caros!

Todo mundo sabe o que eu penso. Mas faço a distinção entre aquilo que quero que aconteça e aquilo que acho que pode acontecer. Ou ainda que vai acontecer.

Antes de saber da concessão da liminar de Edson Fachin, suspendendo o ritual do impeachment, escrevi (post anterior):

E Fachin concedeu a liminar suspendendo o rito. Escreveu:
“Em relação ao pedido cautelar incidental que requereu a suspensão da formação da comissão especial em decorrência da decisão da Presidência da Câmara dos Deputados de constituí-la por meio de votação secreta, verifica-se, na ausência de previsao constitucional ou legal, bem como à luz do disposto no artigo 188, inciso lll, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, a plausibilidade jurídica do pedido, bem como, ante a iminência da instauração da comissão especial, o perigo de dano pela demora da concessão liminar requerida. É coerente e compatível com a Constituição da República de 1988 procedimento regular que almeja, em face de imputação de crime de responsabilidade, o respectivo impedimento da presidente da República”.

Quem for procurar meus escritos no passado, quando todos salivavam pelo voto aberto, opus um monte de restrições. Poderia ser uma arma ambígua porque expunha parlamentares à pressão do governo.

De toda sorte, a decisão de Fachin vale até o dia 16, quando o Supremo começa a votar a ADPF (Ação de Descumprimento de Direito Fundamental). O plenário é que vai decidir.

Achei que Fachin poderia empregar o critério que empregou para determinar que a votação sobre a continuidade ou da prisão de Delcídio do Amaral fosse aberta. E ele empregou. Naquele caso, a decisão foi inócua porque o Senado já havia escolhido a votação aberta.

Ainda escreverei mais a respeito. Notem que Fachin não anulou nada e que a liminar se restringe ao tipo de votação. A ADPF do PC do B versa sobre muito mais coisas.

É claro que, até para os propósitos do governo, trata-se de um erro. Vou explicar por que em outro texto.

Mas, convenham, será que eles ainda conseguem acertar?

Ah, sim: é evidente que, em casos assim, que expõem parlamentares a pressões oficiais, sou contra o voto aberto — mas lembro que tive de enfrentar muita gente que me acusava de não “estar vendo direito as coisas”… Eu estava, sim.

É claro que o Supremo deveria ficar longe dessa história. E é claro que o controle de constitucionalidade de muitas das matérias que passam pelo Congresso pertence ao tribunal. Mais: ele também vela pelas garantais constitucionais dos agentes políticos.

No caso em questão, trata-se apenas de uma comissão — que tem, sim, graves responsabilidades, mas que é apenas uma comissão. De resto, o juízo que ela venha a ter sobre a denúncia contra Dilma não é definitivo. Quem decide é o plenário. E judicializar esse debate pode ser um tiro no pé.

 

Dilma e o PT veem fantasma do impeachment se agigantar; arrogância oficial cavou a derrota

Chapa anti-Dilma vence por 272 a 199; ainda seria pouco para o impeachment, mas, com esse número, a petista não governa

Desde que acompanho política, e comecei cedo, nunca vi tamanha incompetência do governo, o que dá uma medida do que pode acontecer com o país caso, Deus nos livre!, Dilma permaneça na Presidência. O que o PT e a presidente viram nesta terça foi se agigantar o fantasma do impeachment ou, ainda pior, da ingovernabilidade. Vamos lá.

O governo esticou a corda e decidiu bater chapa com oposição e dissidentes pelo controle da comissão especial que vai analisar a denúncia contra a presidente. Bateu chapa e perdeu. Bateu chapa e perdeu feio. Bateu chapa e perdeu por 272 votos a 199.

Que coisa!

Se a base governista tivesse sido menos truculenta na formação da chapa oficial, é possível que não se tivesse formado a chapa dois, batizada de “Unindo o Brasil”. Mas eles são quem são. Resolveram atropelar, esmagar, passar por cima…

Leonardo Picciani (PMDB-RJ), por exemplo, líder do PMDB, que foi cooptado pelo Palácio do Planalto, decidiu que as oito cadeiras do partido seriam entregues a adversários do impeachment. Vale dizer: a metade (ou mais) do partido que pensa o contrário não seria representada.

Os petistas não escolheram deputados, mas uma tropa de choque, composta, entre outros, de Sibá Machado (AC), José Guimarães (CE) e Wadih Damous (RJ). São lideranças que chamam o simples debate do impeachment de “golpe” (a exemplo da presidente) e que não reconhecem, pois, o foro para o qual se candidatam. É uma vergonha!

Foi o governo que forçou os dissidentes da base e a oposição a formar uma chapa alternativa. Vale, para essa gente, a frase de Talleyrand sobre os Bourbons: eles não aprendem nada nem esquecem nada.

As chapas foram à votação com, respetivamente, 47 e 39 membros — a menor era a composta pelos adversários de Dilma. Caso o STF decida não atravessar a rua para comprar uma briga monumental (vou escrever a respeito), a chapa vencedora terá de receber ainda 26 membros, para compor os 65 necessários.

Sim, segundo as regras, os partidos têm de estar proporcionalmente representados. Se a base não estivesse dividida, é claro que o governo teria o controle da comissão. Mas o caos se instalou. Para vocês terem uma ideia, 20 dos 39 membros da chapa anti-Dilma pertencem a partidos que têm cargos na Esplanada dos Ministérios.

Fantasma do impeachment
É claro que o PT e Dilma viram se agigantar à sua frente o fantasma do impeachment — ou, ainda pior, da ingovernabilidade. Sim, se a votação de hoje tivesse sido a da aceitação ou rejeição da denúncia, Dilma teria sido fragorosamente derrotada nos números, mas teria vencido no placar.

Bastam 171 votos (ou 172 se todos os 513 votaram “sim” ou “não”) para Dilma permanecer no cargo, e a denúncia morrer na Câmara. Já os que querem o impeachment precisam reunir a enormidade de 342 votos.

Notem, Dilma obteve nesta terça 27 ou 28 votos a mais do que precisaria para barrar o impeachment. Embora a oposição e dissidentes tenham tido 73 a mais do que os governistas, ainda lhe faltariam 70 para afastar Dilma.

Cabe, então, a pergunta que já fiz aqui: um governo consegue a estabilidade necessária com 199 votos na Câmara? A resposta está dada. Esse é hoje o tamanho da base fiel — e olhem lá. Eu duvido que esse mesmo tanto defendesse, por exemplo, a CPMF — que, para ser aprovada, precisa de 308 votos na Câmara: 109 a mais do que os obtidos nessa terça.

Não é possível que Dilma não perceba que seu segundo mandato acabou antes de começar. Sempre destacando que a pressão em favor do impeachment não deriva da sua incompetência — nem mesmo da roubalheira do petrolão. Dilma pode cair em razão dos crimes de responsabilidade cometidos.

Ainda que o ministro Edson Fachin resolva meter a mão em cumbuca, anulando a sessão em favor do voto secreto, a derrota já está dada.

O governo, definitivamente, acabou.

 

A carta – Há interpretações para todos os gostos. Uma coisa é certa: é rompimento, sim!

Sobram interpretações para todos os gostos. Que peso tem a carta de Michel Temer a Dilma? Pois é… A presidente decidiu evitar qualquer tipo de resposta pública ao texto. Na mensagem, o vice elenca 11 evidências de que Dilma não confia nem nele nem em seu partido, o PMDB.

O governo partiu para a plantação desenfreada. Reportagem do jornal O Globo informa que o PMDB no Senado não teria recebido muito bem a carta. Segundo pessoas próximas a Renan Calheiros e José Sarney, os peemedebistas teriam dito que o vice-presidente “se apequenou”. Será mesmo que, num ambiente assim, Renan e Sarney são boas fontes?

Na tentativa de contornar a crise, lideranças do PMDB na Casa tentam minimizar o impacto da carta, afirmando publicamente que ela teve caráter pessoal, e não partidário, e que revelaria o desejo de Temer de colaborar mais com o governo.

E essa não é a única ajuda que a legenda pretende dar ao Planalto. O PMDB do Senado articula para que a Lei de Diretrizes Orçamentárias não seja votada, o que obrigaria a convocação automática do Congresso no recesso parlamentar.

Oposições
Os partidos de oposição avaliaram que a carta de Temer representa uma “ruptura profunda e irreversível” entre PT e PMDB. Para o senador tucano Aloysio Nunes Ferreira (SP), a mensagem de Temer é muito clara e representa um sinal verde para que os peemedebistas apoiem integralmente o impeachment de Dilma Rousseff.

O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, afirmou que esse é o momento em que partidos políticos e a sociedade civil devem se unir para pressionar em favor do afastamento da petista.

E o que pensa Eliseu Padilha, um dos pivôs da crise entre governo e PMDB? Afimou hoje que a carta de Temer não significa uma ruptura entre a presidente e o vice. Segundo Padilha, a manifestação está mais para uma “DR”, uma discussão de relacionamento.

Apesar de negar que o documento marque o fim da aliança entre Planalto e PMDB, o ex-ministro afirmou que a carta “é muito expressiva” em relação às queixas da legenda. O já ex-ministro deixou o governo oficialmente ontem, mas sua saída foi anunciada na sexta-feira passada. Em entrevista nesta terça, ele explicou que “motivos partidários, pessoais e funcionais” o fizeram deixar a Secretaria de Aviação Civil.

Então resta o quê?
Vamos lá. É claro que a carta marca um rompimento. O vice deixou claro que tem o seu próprio espaço político. Não se trata de uma simples DR porque Temer expressa a convicção de que a relação não ter conserto.

Digamos que Dilma sobreviva a esta primeira onda do impeachment. Cabe a pergunta: resistiria a uma segunda? Ou alguém acha que o governo terá vida fácil caso consiga, sei lá, 180 votos para barrar o impeachment — só precisa de 171?

 

Planalto vaza carta de Temer a Dilma, dá tiro no pé e esquenta clima pró-impeachment

Meme do Movimento Brasil Livre ironiza as dificuldades de Dilma com o latim…

Michel Temer, vice-presidente da República, é um homem educado também no sentido, vamos dizer, escolar do termo. Tanto é assim que recorreu ao velho estilo epistolar para evidenciar as múltiplas provas de desconfiança dadas por Dilma e expor o tratamento truculento de que tem sido vítima. Nesta segunda, enviou uma carta à presidente elencando 11 provas concretas de que ela não confia nem nele nem em seu partido, PMDB. A mensagem, esclarece a Vice-Presidência, não implica um rompimento pessoal com Dilma nem o fim da aliança do PMDB com PT. Ainda que assim seja, é claro que o texto se tornou um marco. Agora, ou racha ou racha.

Com a carta, Temer respondia ao assédio brutal dos palacianos, que tentam, na prática, cassar-lhe prerrogativas constitucionais. A ousadia é tal, já apontei isso aqui, que o ministro Jaques Wagner teve o topete de pôr na boca do vice palavras que este não pronunciou.

Agora vamos ao que é mais impressionante. A carta foi enviada à presidente nesta segunda, quando governistas fiéis ao Planalto lutavam com dissidentes, em companhia da oposição, pelo controle da comissão especial que vai analisar a denúncia que pode resultar no impeachment de Dilma. Trata-se de uma mensagem pessoal. Ora, é evidente que jamais deveria ter sido vazada para a imprensa. Mas foi.

O próprio Temer se surpreendeu. Afirmou:
“Escrevi uma carta confidencial e pessoal à presidente da República. Tive o cuidado de mandar pessoalmente a minha chefe de gabinete entregá-la. Mais uma vez, avaliei mal. Desembarquei em Brasília agora à noite e me surpreendi com o fato gravíssimo de o palácio ter divulgado uma carta confidencial. Eu já tinha me decepcionado quando os ministros Edinho Silva e Jaques Wagner divulgaram versões equivocadas do meu último encontro com a presidente, me deixando mal jurídica e politicamente.”

Pois é… A que alude o vice? Explico. Temer esteve com Dilma. Os dois ministros espalharam a versão de que o vice não via base jurídica para Eduardo Cunha aceitar a denúncia contra Dilma.

Temer não se furta a expor com todas as letras o seu desconforto:
“Eu havia sido comunicado pelo Eduardo Cunha que ele acolheria o pedido de impeachment. Reconheci seu direito de fazê-lo, e, depois, o ministro Jaques Wagner colocou na minha boca a afirmação de que a decisão não tinha lastro jurídico. Constrangido, tive que desmenti-lo. O acolhimento tem sim lastro jurídico.”

Pode não ser uma carta de rompimento pessoal e de descolamento do PMDB do governo, mas é evidente que, depois dela, ou racha ou racha. O que quero dizer com isso? Michel Temer está deixando claro que é vice-presidente da República; que a Constituição lhe assegura prerrogativas que governo nenhum pode tolher; que não vai entrar pessoalmente no jogo para influenciar os votos no Congresso; que não vai aderir à gritaria histérica do Planalto, que acusa “golpe”. Temer está dizendo, em suma, que seguirá leal ao papel que lhe atribui a Constituição.

Falemos um pouco da carta. O vice a inicia com uma epígrafe de um ditado latino, a saber: “Verba volunt; scripta manent” — palavras ditas voam; palavras escritas permanecem. Ou por outra: ele preferiu escrever porque ouviu dizer que a presidente o chamaria para mais um encontro. E, depois das distorções de Wagner e Edinho, Temer não quis correr o risco de ouvir falas que não são suas a voar por aí, como se suas fossem.

Na epístola enviada a Dilma, elenca 11 episódios em que a desconfiança da presidente no seu vice e no PMDB ficou patente. Pois é… Temer poderia ter citado ainda um outro adágio latino: “Verba movente; exempla trahunt”. Ou: as palavras movem; os exemplos empurram. Mas isso é literal demais e não aclara as coisas. O melhor seria: as palavras movem; os exemplos compelem, convencem, evidenciam.

Temer afirma que passou os quatro primeiros anos como “vice decorativo” e que “só era chamado para resolver votações do PMDB e crises políticas”. Diz que jamais foi convocado para discutir “formulações econômicas ou políticas do país”. E resume: “Éramos meros acessórios, secundários, subsidiários”.

Deixa claro que sentiu como agressão pessoal a retirada de Moreira Franco do Ministério da Aviação Civil, já que era uma indicação sua. Sustenta que Eliseu Padilha deixou a mesma pasta na semana passada porque desprestigiado, mas que o governo fez questão de alardear que isso era parte de uma conspiração supostamente liderada por ele, Temer.

No quinto item de suas razões, lembra a coordenação política que chegou a assumir em abril, para dela sair em agosto, depois de aprovado o ajuste fiscal, porque os acordos que foram costurados para conseguir aquelas votações não foram cumpridos.

Na reforma ministerial que mudou peças do PMDB, Temer lembra que, apesar de ser presidente do partido, Dilma preferiu ignorá-lo e chamou para cuidar do assunto Leonardo Picciani (RJ), líder do partido na Câmara, e seu pai, Jorge Picciani.

Na ordem dos insultos, Temer observa que, na posse, Dilma manteve reunião de duas horas com Joe Biden, vice-presidente dos EUA, fazendo questão de ignorá-lo — justo ele, que diz manter uma relação de amizade com o político americano.

Temer afirma que até o programa da Fundação Ulysses Guimarães “Uma Ponte para o Futuro” foi usado como suposta evidência contra o PMDB e contra ele próprio. E diz que o governo continua tentando dividir o partido, sem sucesso.

O vice-presidente, em suma, deixou claro que a relação de confiança alardeada por Dilma não existe. E conclui: “Finalmente, sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB hoje e não terá amanhã”.

Na mosca!

Não fosse a conjugação de crise econômica, crise política e crise de confiança, o PT estaria empenhado neste momento em destruir o PMDB. Apontei aqui essa disposição já em fins de 2011 e início de 2012. Na sua brutal arrogância, os petistas julgavam que já tinham destruído o PSDB e que era a hora de começar a caçar os aliados.

Agora é ou racha ou racha. O PMDB pode, sim, continuar na base — até porque, suponho, o próprio governo não pretende se livrar dele —, mas Temer deixa claro que, a exemplo de Dilma (deveria ser assim ao menos), as suas responsabilidades pessoais transcendem as do partido.

Dilma terá de lutar por seu mandato — espero que o faça dentro das regras do jogo, e Temer tem de ter claro que seu papel institucional é substituí-la em caso de impedimento. Com a grave responsabilidade de encontrar um caminho que ao menos nos livre da depressão econômica.

Cada um no seu quadrado. Sei lá por que diabos o Planalto divulgou a carta. Há mais fígado do que cérebro nessa decisão. Para Temer, foi excelente. Aquilo que é dito apenas entre duas pessoas não impõe, aos olhos da opinião pública, nenhuma forma de especial decoro. Quando, no entanto, a conversa confidencial vira assunto até de boteco, não resta às personagens, ou aos litigantes, outra coisa que não o dever da coerência.

E o dever de Temer, agora, é ficar longe de Dilma para, se preciso, substituí-la e dar início ao seu governo.

É a regra.

É a lei.

É a Constituição.

E o PT vai de ter de engolir ou de engolir.

Se Dilma acha que é golpe, então tem de voltar a pegar em armas

De todos os argumentos vigaristas para combater o impeachment da presidente Dilma Rousseff, o mais estúpido é o que sustenta que sua situação é muito diferente da de Fernando Collor porque este, afinal, não tinha partido, não tinha base social e não tinha incluído milhões de pessoas na economia.

Aliás, aí está a essência do que defini como “petralhismo”, que é prática dos petralhas: apelar ao social para justificar ações criminosas. Consegue ser um lixo moral superior à defesa do roubo puro e simples. Por quê?

O ladrão que não procura se justificar tem ao menos o bom gosto de não corromper o bem, não é mesmo? Esses outros não: arrastam qualquer ideia de virtude em sua pantomima criminosa. Se os operadores dessa máquina maligna são detestáveis, seus arautos na imprensa, no mundo do direito e na academia constituem a mais nefasta canalha.

Os ladrões que se assumem como aquilo que efetivamente são não degradam as instituições, não inviabilizam países, não condenam gerações ao atraso, à penúria e à melancolia. Esses outros, por óbvio, sim.

Pensem: quanto tempo vai demorar para que o estado brasileiro se alimpe dessa súcia que infelicita o Brasil, que impede a devida aplicação de políticas públicas, que se impõe para defender e proteger os interesses de seu grupo, de sua camarilha, contra as necessidades do conjunto da população?.

Se querem uma evidência do que essa gente é capaz, olhem para a nossa educação, olhem para a saúde. Tomem como exemplo o surto de microcefalia no país. Há quantos anos o governo central namora com o mosquito, que antes era só da dengue, depois passou a ser também da chikungunya e agora é do zika vírus? O que mata os brasileiros não é um destino, mas suas escolhas.

E, como resta claro, nem uma sombra de bom senso ameaça a incompetência arrogante do governo. Nesta segunda, o ministro Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) concedeu até uma entrevista razoável à Folha. Mas a ponderação durou pouco.

Ontem, Dilma compareceu à abertura da Conferência Nacional de Assistência Social — essas conferências, desde sempre, de qualquer área, são conduzidas por franjas do petismo. Foi recebida aos gritos de “não vai ter golpe”. A presidente não se fez de rogada. Afirmou: “Ao longo da história, os golpes não constroem harmonia, a unidade, nem constroem a pacificação necessária para os países avançarem. Pelo contrário: geralmente o que os golpes constroem é o caos, que deixam feridas e marcas profundas”.

Dilma sabe que não há golpe nenhum. Ao fazer essa acusação, deslegitima o próprio Parlamento que vai tomar a decisão sobre o seu caso. Ela está a dizer que só aceita um resultado. Mas um Poder Legislativo que só pudesse votar de uma maneira seria livre?

E não pensem que Dilma negou as pedaladas, não. Ela as admitiu nestes termos: “Nós escolhemos um caminho, uma política, e podem ter certeza de que essa escolha, mais cedo ou mais tarde, sempre é cobrada. Uma parte do que me acusam é de ter pago o Bolsa Família e o Minha Casa Minha Vida. Uma parte do que me acusam é por isso. Paguei, sim. Mas nós pagamos com dinheiro do povo brasileiro. Não foi empréstimo que pagou o Minha Casa Minha Vida, foi o dinheiro legítimo dos tributos pagos pelo povo desse país”.

Aí está, para aqueles ditos juristas do nariz marrom que lhe foram puxar o saco no Palácio do Planalto, a confissão do crime. Atenção! Dos R$ 40 bilhões das pedaladas dadas só em 2014, R$ 19,6 bilhões foram do BNDES, que nada têm a ver com os programas sociais a que se referiu na governanta. Dilma está admitindo o crime, sim. Deixa claro que o cometeu de forma consciente. E conta uma mentira sobre a destinação do dinheiro.

É evidente que, se Dilma acha que está diante de uma ação golpista, então ela não reconhece as instâncias que vão avaliar o processo contra ela e, eventualmente, julgá-la. Se é assim, como é que aceita se submeter, então, a um julgamento que pode contemplar um golpe?

Se é como diz a presidente, o melhor que ela tem a fazer é voltar às suas origens, aderir a um grupo clandestino e partir para a resistência armada. Mas que o faça já, não é? Não pode esperar a votação da Câmara e, eventualmente, o julgamento do Senado.

Ou será que a presidente deixou a luta armada para mais tarde, para a hipótese de o Congresso fazer a coisa certa e, diante da confissão do crime e a evidência de que ela o cometeu de modo claro, consciente e determinado, condená-la por isso?

Os Pingos nos Is – Militontos disfarçados de pensadores

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Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo

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