Entrevista de Beatriz torna a história ainda mais enrolada e inverossímil (Reinaldo Azevedo)
Entrevista de Beatriz torna a história ainda mais enrolada e inverossímil
Conforme antecipei aqui, a advogada Beatriz Catta Preta concedeu uma entrevista — no caso, ao repórter Cesar Tralli, da Globo — em que diz ter desistido dos seus clientes porque estava se sentindo ameaçada pela… CPI.
Ameaçada de quê? Não ficou claro! Falou em ameaças “cifradas, veladas” e só. Não acusou diretamente Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, mas a sugestão ficou no ar. Segundo disse, a pressão ficou maior depois que Julio Camargo mudou a versão e passou a acusar Cunha.
Voltarei o assunto. Para mim, a história ficou mais enrolada do que antes e direi por quê.
OAB
A OAB entrou com um pedido no Supremo para que Beatriz não tivesse de depor. Ricardo Lewandowski, presidente do tribunal, que responde pelo plantão, não tinha, obviamente, como proibir o depoimento sem cometer uma violência contra o Legislativo. Ele a autorizou a não falar sobre coisas que dizem respeito ao sigilo profissional.
Não mudei de posição: sou contra a convocação da advogada pela CPI — embora não seja ilegal. Mas isso não quer dizer que essa não seja a história mais mal explicada da Lava Jato até agora.
Ainda volto ao assunto.
Não estou acusando Beatriz de nada, mas a sua história não me convenceu. Ela é uma penalista. Fosse espectadora da própria entrevista, acharia tudo muito estranho, não é?
Por Reinaldo Azevedo
Desconstruindo Beatriz Catta Preta 1: uma história da carochinha. Ou: Quem será a Beatriz de Beatriz? Ou ainda: A quem ela anunciou que não vai fugir?
Vamos lá. Começo pelo óbvio e não mudei de ideia: continuo a me opor à convocação da doutora Beatriz Catta Preta pela CPI da Petrobras porque acho que isso abre a porta para se relativizar o direito de defesa. E fui o primeiro na grande imprensa a me insurgir contra isso. Como me insurgi contra a tentativa de transformar Dora Cavalcanti em ré. Mas daí a acreditar no conteúdo da entrevista de Beatriz, concedida a Cesar Tralli, que foi ao ar no Jornal Nacional desta quinta, vai uma diferença abissal.
A criminalista Beatriz poderá procurar com lupa nos meus posts uma só acusação contra ela. Não haverá. Não é do meu feitio. Não sou procurador, delegado ou juiz. Eu lido com a lógica e com os fatos que apuro. Não acreditei em uma palavra do que ela disse. Nada! E esse é um direito que eu tenho. E não acreditei porque a sua narrativa é um apanhado de absurdos e de despropósitos. Mais: serve para demonizar a CPI da Petrobras — e, por consequência, o Congresso. Quer dizer que doutora Beatriz acha um absurdo falar a uma CPI, mas pensa ser razoável jogar acusações ao vento no Jornal Nacional?
Antes que avance: tudo certo com a entrevista de Cesar Tralli. Fez boas perguntas, não todas as boas que poderia, e, a meu juízo, intencionalmente ou não, contribuiu para revelar o que acho ser peça de ficção. De saída, eu tenho uma questão para a doutora Beatriz. Se ela quiser responder, publico. É um dos pontos centrais do imbróglio.
Se Júlio Camargo, seu ex-cliente, falou a verdade quando afirmou ter pagado US$ 5 milhões em propina ao deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, então esse mesmo Camargo mentiu nos depoimentos iniciais, já sob delação premiada. Doutora Beatriz, me conte: ele mentiu para a senhora ou vocês dois mentiram para a Corte? Essa resposta precisa ser dada, não é mesmo?
Eu sou muito atento à linguagem. Eu tenho apreço pelo sentido das palavras. Tralli quis saber por que Camargo negava antes o pagamento de propina a Cunha e só o admitiu depois. Ela respondeu: “Receio. Ele tinha medo de chegar ao presidente da Câmara.” E pergunta o JN: “E por que ele muda de ideia? O que o faz mudar de ideia?” Aí Beatriz dá a resposta impossível, leiam: “A colaboração dele, a fidelidade, a fidedignidade da colaboração, o fato de que um colaborador não pode omitir fatos, não pode mentir, o levaram então a assumir o risco. Aquele risco que ele temia, e levar todos os fatos então à Procuradoria-Geral da República.”
Entendi. O medo fez Camargo mentir. E uma súbita coragem, saída sabe-se lá de onde, o fez falar a verdade? É nesse ponto que caberia e cabe a pergunta que não quer calar: “A senhora sabia que ele estava mentindo?” A propósito: quem mente por medo uma vez não pode mentir uma segunda em razão de um medo ainda maior? Pergunta agora ao mundo jurídico: uma delação premiada pode ser um “work in progress”? Um advogado acerta os termos de uma delação premiada ou de uma conta de chegada, alterando a narrativa ao sabor dos ventos e da metafísica influente? É assim que se faz no resto do mundo? Ninguém precisa me responder. Eu sei a resposta. Não é.
O verbo “fugir”
Doutora Beatriz estava logo ali, em Miami. Como diria Gilberto Gil na excelente música “Parabolicamará”, para ela mandar uma mensagem ao Brasil, leva “o tempo que levava a Rosa para ajeitar o balaio, quando sentia que o balaio ia escorregar”. Deixou que prosperasse por aqui a informação de que havia fechado o escritório, que se mudaria para aquela cidade americana, de que trabalharia lá, onde tem (ou tinha?) um escritório. E nada de desmentido. Ao contrário: foram se acumulando os boatos de que teria sido ameaçada por Cunha etc — versão que ela endossa, ainda que de forma enviesada.
Bastou que começassem a surgir por aqui notícias sobre a sua impressionante proximidade com a força-tarefa de Curitiba, sobre o modo como trabalharia alinhada com o Ministério Público — de sorte que seu escritório é chamado por alguns de “anexo da força-tarefa” — e sobre a abordagem algo heterodoxa que seu marido faz com os clientes, e ela decide desmentir, então, a informação de que deixaria o país, o que poderia ter feito logo no primeiro dia.
E, ora vejam, a primeira pergunta feita a ela — o que pode ser parte da combinação para conceder a entrevista (e não há mal nenhum nisso!) — é esta: “A senhora está morando em Miami”?
E ela responde:
“De forma alguma. Eu saí de férias. Aliás, eu costumo sair de férias e viajar pra lá, sempre que os meus filhos estão em período de férias escolares. Nunca cogitei sair do país, ou fugir do país como está sendo dito na imprensa.”
Foi ela quem usou o verbo “fugir”, não a imprensa. Fiquei com a impressão, e tenho o direito de tê-la, que ela está mandando um recado a alguém — alguéns?: “Não vou fugir!” Fugir de quê? Ela é uma penalista. Conhece o peso dessa palavra. Certamente não está dizendo a seus supostos perseguidores “que não vai fugir”, certo?
Ademais, desde que com os devidos papéis, não há nada de errado em morar em Miami, especialmente alguém que se diz sob perseguição. A negativa não precisa de ênfase.
Beatriz é incapaz de dizer que tipo de ameaça sofreu. Afirmou: “Não recebi ameaças de morte, não recebi ameaças diretas, mas elas vêm de forma velada. Elas vêm cifradas.” Certo! E isso fez, meus caros, atenção, com que ela desistisse não só dos clientes: BEATRIZ USOU O JORNAL NACIONAL PARA ANUNCIAR QUE ESTÁ DEIXANDO A ADVOCACIA!
Também nesse caso, pareceu-me um recado: “Ok, pessoal, estou fora dessa profissão. E não vou fugir”. Sigo no post abaixo. Encerro este tentado a sugerir a Beatriz que arrume uma Beatriz em benefício de uma narrativa mais verossímil.
Texto publicado originalmente às 4h45
Por Reinaldo Azevedo
Desconstruindo Beatriz Catta Preta 2: Demonizando Cunha e a CPI da Petrobras. Ou: Direito de Defesa e justas prerrogativas não justificam ataque ao Congresso
No despacho em que autorizou Beatriz Catta Preta a não responder perguntas na CPI que digam respeito ao sigilo profissional — e essa é uma garantia que tem de ser mantida —, escreveu Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo: “Com efeito, para se preservar a rigidez do devido processo legal, e, em especial, o equilíbrio constitucional entre o Estado-acusador e a defesa, é inadmissível que autoridades com poderes investigativos desbordem de suas atribuições para transformar defensores em investigados, subvertendo a ordem jurídica. São, pois, ilegais quaisquer incursões investigativas sobre a origem de honorários advocatícios, quando, no exercício regular da profissão, houver efetiva prestação do serviço”.
Nada a objetar. Mas eu lamento a ligeireza — e, agora a doutora há de entender a dureza, vinda de um discípulo de Montesquieu — com que ela dispensou à CPI da Petrobras o tratamento de antro de bandidos. Pode ser vício profissional. Sua profissão a obriga a ficar perto deles, e ela pode ter confundido as coisas. O direito de defesa e as prerrogativas de um advogado não dão a ninguém licença para enxovalhar uma instituição chamada Congresso Nacional. Perguntou Cesar Tralli: “A senhora consegue identificar de onde vem essa intimidação que a senhora enxerga tão claramente hoje?” E ela responde: “Vem dos integrantes da CPI, daqueles que votaram a favor da minha convocação.”
Aí, não! Aí a doutora foi longe demais. Revejam o releiam a entrevista. Está aqui. Ela não está apontando uma simples pressão ou, sei lá, uma intimidação quase burocrática. Não! Ela disse com todas as letras: “Depois de tudo que está acontecendo, e por zelar pela segurança da minha família, dos meus filhos, eu decidi encerrar a minha carreira na advocacia. Eu fechei o escritório.”
As palavras, reitero, fazem sentido. No discurso da doutora, a sua família está sob ameaça, e a intimidação “vem dos integrantes da CPI”. Calma lá! Estamos falando de um instrumento legítimo de investigação do Poder Legislativo, suprapartidário, submetido ao escrutínio público muito mais do que os acordos de delação premiada, não é mesmo? Ou estou enganado? Então um dos Poderes da República, numa de suas tarefas mais importantes — comissões de inquérito — passará a ser tratado agora como ameaça?
O país derrubou um presidente da República depois de CPI; já investigou narcotraficantes; máfias disso e daquilo… Nunca vi advogados desistirem não apenas da causa, mas também da carreira porque… AMEAÇADOS POR DEPUTADOS!!!
Com a devida vênia, doutora… Desiste da profissão quem se desilude — e não me parece que alguém especializado em delações premiadas faça o gênero desiludido — ou quem não pode exercê-la em razão de algum óbice de natureza ética conhecido ou por conhecer. Não é o caso, certo? Nem que fosse para advogar em favor de ONGs de criancinhas pobres, sei lá…, que sentido faz abandonar a advocacia só porque foi convocada por uma CPI?
O Brasil não é a Coreia do Norte. O Brasil não é a Venezuela. O Brasil não é Cuba. O Brasil não é a China. Eu mesmo escrevi aqui contra a convocação. A OAB se insurgiu contra ela. Lewandowski se manifestou com dureza. É o caso de emprestar a essa decisão o peso de uma grande conspiração que se passa nas sombras — que, obviamente, teria Eduardo Cunha como personagem ausente, mas muito presente? Ora… O fato de ele ser o malvado predileto da imprensa, creio, não leva jornalistas a engolir qualquer coisa. Ainda que boa parte dos que cobrem a Lava Jato o façam com muita convicção e pouca Constituição.
Tralli fez a câmera dar um giro pelas amplas salas, em região nobre de São Paulo, agora vazias, que abrigavam o escritório de Beatriz. Tudo desmontado a toque de caixa, sumariamente, sem hesitação. Engraçado… Pensei comigo: é um modelo de negócio chegando ao fim. Qual negócio? Ora, as delações premiadas que ali se celebravam. Pensei em Júlio Camargo. Se ele receber um prêmio, premiar-se-á necessariamente também a mentira. Afinal, ou mentia antes, ao tempo em que, segundo diz sua defensora, tinha medo de Cunha, ou mente agora, quando não tem mais medo — não de Cunha ao menos…
Antonio Fernando de Souza, o procurador-geral da República da primeira fase do mensalão e hoje advogado de Cunha, foi duro com a entrevista. Chamou-a de “coisa montada”. E, contestando Beatriz, disse ter a certeza de que não existe prova nenhuma que ligue seu cliente a irregularidades. Hugo Motta (PMDB-PB), presidente da CPI, afirmou que a convocação foi suprapartidária.
Os advogados conhecem o que penso — só neste blog, há nove anos. Jamais condescendi, e assim é desde que entrei na profissão, com qualquer agressão ao direito de defesa, pouco importando a ideologia do acusado ou do réu ou sua condição econômica — pedreiro ou empreiteiro. Esse ou aquele reclamam. Não posso fazer nada. Como já disse, eu não combato os petralhas só porque eles são eles. Eu combato também os seus métodos. Defendo as prerrogativas de Beatriz e de qualquer outro defensor.
Mas não dá para silenciar diante de uma entrevista que vai bem além das raias do absurdo. Eu continuo querendo saber por que doutora Beatriz Catta Preta deixou os clientes e abandonou a advocacia. Eu quero agora saber a quem, segundo entendi, ela estava enviando o recado, dizendo que não vai fugir. Eu quero saber se, dada a primeira versão de Camargo, que ela agora diz ser falsa, ele mentia para ela ou os dois mentiam para o Ministério Público e para a Justiça.
Texto publicado originalmente às 5h14
Por Reinaldo Azevedo
FELIPE MOURA BRASIL: Catta Preta no Jornal Nacional serve para demonização de Eduardo Cunha. Mas isso interessa ao PT?
Beatriz Catta Preta, ex-advogada de delatores da Operação Lava Jato, disse no Jornal Nacional que se sentiu ameaçada por integrantes da CPI da Petrobras. Ela não citou nomes, mas afirmou que a intimidação vem dos que votaram a favor de sua convocação (para descobrir quanto ganhou dos clientes e de onde veio o dinheiro).
Reproduzo a entrevista e comento em seguida.
Jornal Nacional: Muito que se fala que a senhora deixou os clientes e fugiu do Brasil. Tirou os filhos da escola, saiu de São Paulo, e se mudou pra Miami. A senhora está morando em Miami?
Beatriz Catta Preta: De forma alguma, eu saí de férias. Aliás, eu costumo sair de férias e viajar pra lá, sempre que os meus filhos estão em período de férias escolares. Nunca cogitei sair do país, ou fugir do país como está sendo dito na imprensa. / Depois de tudo que está acontecendo, e por zelar pela segurança da minha família, dos meus filhos, eu decidi encerrar a minha carreira na advocacia. Eu fechei o escritório.
Jornal Nacional: É medo?
Beatriz Catta Preta: Sim.
Jornal Nacional: A senhora recebeu ameaças de morte pra tomar essa decisão?
Beatriz Catta Preta: Não recebi ameaças de morte, não recebi ameaças diretas, mas elas vêm de forma velada. Elas vêm cifradas.
Jornal Nacional: Foi a partir dessa nova revelação do Julio Camargo [sobre o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, ter pedido 5 milhões] que a senhora sentiu que o foco de retaliação se voltou pra senhora?
Beatriz Catta Preta: Sim. Vamos dizer que, aumentou essa pressão, aumentou essa tentativa de intimidação a mim e a minha família.
Jornal Nacional: O Julio Camargo, nos seus primeiros depoimentos, não falava de Eduardo Cunha, que tinha pago propina pro presidente da Câmara, que tinha dado 5 milhões, não dava revelações claras e informações tão precisas como ele deu agora recentemente. Por que que isso não foi feito antes?
Beatriz Catta Preta: Receio. Ele tinha medo de chegar ao presidente da Câmara.
Jornal Nacional: E por que ele muda de ideia? O que o faz mudar de ideia?
Beatriz Catta Preta: A colaboração dele, a fidelidade, a fidedignidade da colaboração, o fato de que um colaborador não pode omitir fatos, não pode mentir, o levaram então a assumir o risco. Aquele risco que ele temia, e levar todos os fatos então à Procuradoria-Geral da República. / Todos os depoimentos prestados sempre vieram respaldados. Com informações, dados, documentos, provas definitivas. Nunca houve só o dizer por dizer.
Jornal Nacional: A senhora se sente realmente perseguida?
Beatriz Catta Preta: Sem dúvida nenhuma.
Jornal Nacional: E a senhora se sente intimidada?
Beatriz Catta Preta: Sim, com certeza.
Jornal Nacional: A senhora consegue identificar de onde vem essa intimidação que a senhora enxerga tão claramente hoje?
Beatriz Catta Preta: Vem dos integrantes da CPI, daqueles que votaram a favor da minha convocação.
Jornal Nacional: Inclusive do presidente da Câmara, Eduardo Cunha?
Beatriz Catta Preta: Não posso afirmar, eu não vi nenhum depoimento dele a respeito desse assunto.
Jornal Nacional: Deputados comentam e até alguns advogados ligados à Lava Jato falam em off, nos bastidores, que a senhora já ganhou mais de R$ 20 milhões com as delações da Lava Jato. Essa cifra procede?
Beatriz Catta Preta: Esse número é absurdo. Não chega perto da metade disso.
[* Essa resposta ficou até engraçada: 6, 7 ou 8 milhões não chegam nem perto da metade de 20 milhões e ainda são muita coisa, não é mesmo?]
Jornal Nacional: Esse dinheiro que a senhora recebeu dos clientes da Lava Jato foram todos pagos por dentro? A senhora recebeu algum dinheiro fora do Brasil? A senhora sabe da origem desse dinheiro?
Beatriz Catta Preta: O dinheiro foi todo recebido via transferência bancária, aqui no Brasil, ou depósitos em cheque, na conta do escritório, tudo mediante nota fiscal, impostos recolhidos. A vida financeira do escritório, a minha vida financeira é absolutamente correta. Nunca recebi um centavo fora do Brasil.
Comento em tuitadas:
- Petistas da imprensa e da internet estão contentes com levantamento de suspeitas contra Cunha em horário nobre da TV. É bom que seja assim.
- Ainda que seja denunciado, Cunha não vai sair do cargo. PT só tem a perder com sua demonização. Quanto mais bater, mais vai levar na Câmara.
- Espero que Cunha julgue entrevista de Catta Preta no JN conspiração do PT contra ele e abra logo processo de impeachment de Dilma Rousseff.
Felipe Moura Brasil ⎯ https://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil
Dilma, os governadores, as conversas sobre o nada e… o disparate final
Conforme o antevisto aqui, a conversa de Dilma Rousseff com os governadores girou em torno do nada. Sem agenda, foi preciso improvisar uma coisa qualquer antes da foto — o que já chamei aqui de “abraçaço da afogada”. Disse a presidente, entre outras coisas, num longuíssimo discurso de 32 minutos, segundo leio na Folha:
“Eu não nego as dificuldades, mas afirmo que todos nós, e o governo federal em particular, temos como enfrentar essas dificuldades e em um prazo bem mais curto do que alguns pensam. [...] É importante estabelecer parcerias e enfrentar os problemas juntos”.
Mais “rápido” quanto? Qual é o plano? Quem são esses “alguns” que estariam pensando errado? Uma pessoa ali, com certeza, fazia afirmações sem sentido. Dilma ensaiou os motivos da crise por que passa o Brasil: “o colapso no preço das commodities, a grande desvalorização da moeda, com impacto nos preços e na inflação”. Não dá!
A desvalorização das commodities mostrou que viria para ficar já em meados de 2012, quando Dilma estava com um ano e meio de seu primeiro mandato. Agora ela vem alegar tal fator para explicar as dificuldades brasileiras? E o câmbio? Qualquer que seja ele, é a realidade internacional que está impondo isso ou aquilo? Nem ela acredita nisso. E menos ainda acreditaram os que a ouviram.
Um governante em crise precisa apostar em certo heroísmo. Aludindo, como sempre, a seu passado, lá veio a presidente:
“Eu, pessoalmente, sei suportar pressão e até injustiça, e isso é algo que qualquer governante tem que se capacitar e saber que faz parte da sua atuação. Tenho ouvido aberto, enquanto razão, e o coração, enquanto sentimento, para saber que o Brasil que cresceu e não se acomoda é o Brasil que nós queremos, que sempre quer mais”.
Então tá. Dilma deveria ir à televisão, em rede nacional, explicar que é uma injustiça que o povo cobre que ela cumpra o que prometeu. Ela pode tentar jogar a culpa no preço das commodities.
Dilma falou sobre as dificuldades fiscais, lembrando ser esse um problema de todo mundo, observou que assumiu o desgaste de vetar algumas propostas que geravam impacto negativo nas contas públicas e, por óbvio, acabou sugerindo que os governadores a auxiliem na relação com o Congresso.
Pacto
No fim das contas, meus caros, a conversa de fundo era mesmo alguma coisa parecida com um pacto de governabilidade — só que sem agenda. Precisando propor alguma coisa, Dilma sugeriu que todos se unissem em favor da redução de homicídios e da população carcerária. O que isso tem a ver com o conjunto da obra? Ninguém sabe.
Até porque, entre os presentes, estava Geraldo Alckmin (PSDB), governador de São Paulo. O Estado tem hoje a menor taxa de homicídios do país (9,38 por 100 mil), está entre os que mais prendem e tem a maior população carcerária do país: concentra 22% da população e 40% dos presos. Mais assassinos presos, menos assassinos matando na rua.
A equação é elementar demais para a dialética sem metas de Dilma. No fim das contas, os governadores entenderam tudo: Dilma não estabeleceu meta nenhuma, mas prometeu que, tão logo ela a cumpra, a meta será dobrada.
Entenderam?
Por Reinaldo Azevedo
O marketing do PT vai de vento em… bomba
A armadilha funcionou: Dilma Rousseff emplacou ontem duas fotos com os governadores para aparentar normalidade contra o impeachment, além de um post mentiroso no blog da Presidência segundo o qual eles “fizeram uma defesa clara da democracia, do Estado de Direito e da manutenção do mandato legítimo da presidenta Dilma”, o que até seu aliado tucano Geraldo Alckmin negou, dizendo que “Isso não foi tema da reunião nem está em discussão”.
Mas Dilma não pensa em outra coisa.
1) Para engrossar o lobby no Tribunal de Contas da União contra a rejeição das contas do governo em 2014, ela convocou os ex-ministros do TCU Ubiratan Aguiar, que esteve no plenário na quarta confabulando com ministros, e Valmir Campelo, hoje vice-presidente do Banco do Brasil. Além disso, as denúncias contra o “indeciso” Aroldo Cedraz aumentam a cada dia e, depois dos casos envolvendo seu filho, agora seu cunhado é acusado de ter desviado dinheiro de uma ONG da região do Sisal, na Bahia, segundo a Folha. O jogo é pesado no TCU.
2) No Tribunal Superior Eeleitoral, que investiga o abuso de poder político e econômico na campanha de Dilma, o governo conta com a possibilidade de uma troca na relatoria da ação antes do julgamento. O mandato do atual corregedor-geral da Justiça Eleitoral, João Otávio de Noronha, se encerra no fim de setembro e a próxima a ocupar o cargo é a ministra Maria Thereza de Assis Moura, que já pediu arquivamento de outra ação de investigação eleitoral que corre na corte contra Dilma. Maria Thereza é uma dos três ministros que tendem a favor do governo, sendo os outros com Henrique Neves e a ex-advogada de campanha de Dilma, claro, Luciana Lóssio, como mostrei aqui.
3) Para garantir o apoio da base aliada, Dilma já liberou 1 bilhão de reais de restos a pagar das emendas de 2014 e, como informou a coluna Radar, os gabinetes dos deputados estão recebendo telefonemas do Ministério das Cidades com o aviso. Eu havia perguntado aqui quantos apoios Dilma comprará até setembro para não cair e talvez já tenhamos a resposta no fim de agosto, embora sem saber exatamente o que cada um levou.
Hoje, Dilma inaugurou uma obra do Minha Casa Minha Vida e o Instituto Lula acusou seus adversários políticos de terem lançado uma bomba institucional, digo, “caseira”, em sua sede, embora as ‘investigações’ não tenham concluído se a nota foi escrita antes ou depois do ‘atentado’, nem se os acusados são os mesmos que quebraram a vidraça do Foro de São Paulo em 2013, ‘bombardearam’ a sede do PT durante a campanha de 2014, picharam a rua do Jô Soares após a entrevista com a mulher sapiens, fizeram ataques racistas contra a apresentadora Maju e “quase agrediram” o petista-propaganda do Banco do Brasil, Gregório Duvivier.
Em todo caso, duas teses genéricas podem ser ditas:
Para o PT, a melhor defesa é atacar-se.
Para blindar Dilma e Lula, o marketing do PT vai de vento em bomba.
Felipe Moura Brasil ⎯ https://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil
Conforme este blog antecipou no dia 22, país está em déficit primário
Queridos leitores,
Vou falar aqui de déficit primário. Mas, antes, farei uma digressão que, em vez de nos distanciar do tema, mais nos aproxima.
Meu compromisso, como jornalista, é com os fatos, não com os meus amores e meus ódios — estes, de resto, inexistem porque, diante da simples suspeita de que algo semelhante possa brotar em mim, atuo para matar o mal na origem. O ódio escraviza. Talvez eu não seja um cristão exemplar por uma porção de razões, mas não por essa. De fato, a piedade logo toma em mim o lugar em que poderia brotar o ódio. E não pretendo mudar.
Ao longo dos anos, todas as críticas que fiz e faço ao PT e ao governo — e a outras forças políticas — estão centrada em valores. E eu não abro mão deles. Se e quando mudo de análise, aviso. Não cedo a pressões. Não cedo a patrulhas. Não cedo a baixarias. Tampouco me divertem os insucessos do governo, de Dilma, de quem quer que seja. Não vibro com desastres alheios, não tripudio. São sentimentos malignos.
Mas não deixo de dizer o que penso, por mais duro que seja — e desde que relevante para o país. Não é assim porque sou bom, mas porque sou decente. E procuro, na conversa diária com vocês, apontar cenários, antecipar tendências, acusar desacertos — e até acertos, se e quando os há.
Ficamos sabendo que o Brasil teve hoje um déficit primário inédito no primeiro semestre: R$ 1,598 bilhão. É o primeiro saldo negativo no período desde 1997, quando o Tesouro Nacional deu início a essa série de medições.
Muito bem. Quando o governo anunciou a redução do superávit primário de 1,1% do PIB para 0,15%, escrevi aqui um post cujo título era este: “Levy é derrotado pela realidade; superávit será de 0,15% do PIB; o país já está em déficit primário”.
No texto, lia-se:
E o governo federal reduziu mesmo a meta de superávit primário de 1,1% do PIB para 0,15%, conforme antecipou a Folha na sua edição desta quarta. Um pequeno corte no corte de 86,36%. Governo que planeja é assim. Não custa lembrar que essa meta foi definida há coisa de cinco meses. Há três dias Joaquim Levy se mostrava contrário até a que se reduzisse a dita-cuja de 1,1% para 0,4%, conforme propunha o senador Romero Jucá (PMDB-RR), mais realista do que o governo, sim, mas, ainda assim, muito otimista.
Previ nesta manhã que a reserva esperada para a amortização dos juros da dívida ficaria em R$ 9 bilhões. O governo anunciou hoje que será algo entre R$ 8,5 bilhões e R$ 9 bilhões. Por que você deve acreditar? Bem, você não deve.
(…)
Nesta manhã, afirmei que o país caminha para o déficit primário. Na verdade, os números divulgados pelo governo indicam que o país já está produzindo déficit primário: notem que o valor do novo corte do Orçamento praticamente coincide com tudo o que se espera economizar.
Os dados seguem devastadores para as contas públicas. O governo reduziu em R$ 46,7 bilhões a receita líquida esperada — ou quase 0,9% do PIB, mas a previsão de gastos aumentou em R$ 11,4 bilhões.”
Retomo
Aí está. Se um blog servir para que os leitores compreendam melhor a realidade, empregando os instrumentos da razão, ótimo. Esta página existe para isso e vai manter o seu eixo.
Um abraço.
Por Reinaldo Azevedo
Os governadores sob pressão de dois dígitos de inflação e um dígito de popularidade
A presidente Dilma Rousseff resolveu liberar, até o fim do ano, R$ 4,9 bilhões em emendas parlamentares, numa tentativa de unir a base. Encontra-se hoje com governadores para, em tese, fechar uma pauta mínima, na esperança de que eles possam interferir em votações na Câmara.
Dilma quer evitar a chamada aprovação da pauta-bomba — que arromba os cofres públicos — ou a derrubada de vetos já feitos, como o reajuste aos servidores do Judiciário, ou que fará: a correção de todas as aposentadorias segundo o índice que vai reajustar o salário mínimo, por exemplo. Em troca, vai discutir a unificação do ICMS — o que nunca unifica os governadores — e condescender com um drible de corpo na Lei de Responsabilidade Fiscal: promete sancionar projeto de lei que permite a estados e municípios o uso, como receita, de parte dos depósitos judiciais.
É claro que isso corresponde a, vamos dizer, estimular que seja considerado dinheiro bom o que essencialmente não é. Trata-se de uma deterioração nas contas públicas.
Olhem aqui: ninguém pode condenar um governo por tentar unir a sua base ou conquistar ou, ao menos, buscar o apoio da oposição em temas pontuais: a questão é saber em torno de quais propostas se fazem esses esforços. E aí está o busílis. O governo não tem agenda, reitero, nem para atrair os seus.
Os parlamentares, como se nota, estão sendo cooptados com os instrumentos de sempre: emendas. Assim entende esse governo a questão política: é como ir à feira. No caso dos governadores, acena-se com um freio de arrumação no ICMS, medida para evitar a guerra fiscal. É claro que a questão é relevante. Mas será mesmo esse o melhor momento? Isso não deveria ser parte de uma agenda de longo prazo, estruturada, num debate organizado?
Mas quê… É tudo da mão para a boca. Até porque se sabe que, não estivesse nas cordas, não haveria interlocução nenhuma. Essa questão do ICMS, por exemplo, poderia ser nova, mas não é.
Ocorre que essa agenda a ser debatida com os governadores é tão falsa como nota de R$ 3. Não é com esse propósito que Dilma os chamou. Trata-se de uma medida de desespero, na esperança de que eles consigam interferir nas bancadas federais de seus respectivos estados, mas não apenas em relação à chamada pauta-bomba. O Planalto está mesmo preocupado é com a votação do relatório do TCU: ainda hoje, dá como certo que o tribunal recomendará a sua rejeição. Pretende, então, contar com eles como instrumentos de pressão.
Já escrevi aqui e reitero: política de governadores nunca deu certo no país. Não há exemplos na história. As bancadas se organizam segundo outros fundamentos, muitos deles acima até dos interesses das respectivas legendas.
Podem-se preparar. Daqui a pouco, a reunião acaba, e os governadores serão ouvidos pela imprensa. E então constataremos o maior desfile de palavras ocas do ano. A razão é simples: o motivo por que Dilma os chamou lá não terá sido dito, e o que se disse não corresponde ao motivo. Então se estabelece um diálogo literalmente sobre o nada.
Insisto: não estou aqui a censurar Dilma porque faz, afinal de contas, um esforço para não cair. O que se lamenta e ver o desperdício de um a oportunidade de diálogo, que só está em curso porque o governo está acuado.
Ah, sim: de resto, não há como ignorar a tentativa de atropelar o comando da oposição, tentando atrair os governadores, que, prudentemente, já escrevi aqui, tentarão não se contaminar com os dois dígitos de inflação de Dilma e com o seu dígito único de popularidade.
Por Reinaldo Azevedo
Executivos da Andrade Gutierrez e da Odebrecht apontam Pessoa como uma espécie de intermediário do PMDB. Ou: Cartel jabuticaba
Venham cá: informações que não venham à luz no bojo de delações premiadas não têm importância? Há um problema de natureza lógica nessa história, não? Quer dizer que um sujeito só merece crédito quando confessa alguma coisa de olho num benefício? Se não for troca-troca, não vale? Mais: só ganha ares de verdade inquestionável na imprensa o que nasce da delação? É mesmo? E Julio Camargo, aquele segundo quem Eduardo Cunha primeiro não recebeu e depois recebeu propina?
Por que isso? Vamos lá.
Leio na Veja.com, em texto de Laryssa Borges, que Flávio David Barra, presidente da Andrade Gutierrez Energia, preso na 16ª fase da Operação Lava Jato, “afirmou em depoimento à Polícia Federal em Curitiba que, em reunião com o empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC, foi instado a fazer uma ‘contribuição’ ao PMDB a pedido do senador Edison Lobão, ex-ministro de Minas e Energia. De acordo com o executivo, o pedido ocorreu entre agosto e setembro do ano passado, durante um encontro entre representantes do consórcio Una 3, formado pelas empreiteiras Andrade Gutierrez, Norberto Odebrecht, Camargo Corrêa e UTC Engenharia, responsável pelas obras da usina de Angra 3.”
Muito bem! Entre agosto e setembro do ano passado, a Operação Lava Jato já tinha pelo menos cinco meses — teve início em março. Pois é…
Barra não é o único a fazer essa acusação ou a citar Ricardo Pessoa como, digamos, o porta-voz das ansiedades financeiras do PMDB ou de peemedebistas. Também Fábio Andreani Gandolfo, diretor superintendente da Odebrecht, afirmou à mesma PF que o mesmo Pessoa, que teve homologado o acordo de delação premiada, pediu ao consórcio Angramon que contribuísse com a campanha do PMDB. Só para evitar confusão: o consórcio “Angramon” nasceu da fusão dos dois grupos que disputaram o certame final para a construção da usina: o Una 3 e o Angra 3.
Tanto o executivo da Camargo Corrêa como o da Odebrecht dizem que não se fez doação nenhuma. Então vamos ver: empresas que compunham um mesmo consórcio eram alvos de, digamos, “pedidos” independentes para doar uma grana aos partidos — nesse caso, ao mesmo partido. Talvez seja essa a forma que o “cartel” tomou no Brasil: é o chamado “cartel jabuticaba”. A propósito: dois consórcios ficaram para a fase final na construção da usina: o Una 3 e o Angra 3. Depois eles se juntaram num só: o Angramon. Quem tomou a decisão? As empreiteiras “cartelizadas” ou o ente que promoveu a licitação?
O problema de dar às coisas o nome errado em razão da ideologia, da burrice ou seja lá do que for é o inconveniente que traz: manter inalterada a estrutura que gerou o desmando.
Dada a leitura em curso sobre o cartel, se todas as atuais empreiteiras do Brasil forem fechadas e substituídas por, sei lá, empresas chinesas, no dia seguinte, estaremos com o mesmo problema: um estado corrupto em busca de quem corrompa e se corrompa. Se bem que, no caso das chinesas, tudo ficará mais fácil: elas já chegarão aqui cartelizadas. Não será culpa dos patriotas brasileiros… Aí bastará pegar a propina. Sem estresse.
Por Reinaldo Azevedo
MPF denuncia Bené, suspeito de ser um operador de Fernando Pimentel
Por Gabriel Castro, na VEJA.com:
O Ministério Público Federal (MPF) denunciou o empresário Benedito Oliveira Neto, suspeito de ser um operador do governador mineiro Fernando Pimentel (PT), por peculato e fraude em licitação. Ao lado de outras oito pessoas, ele responderá também por improbidade administrativa e pode ser obrigado a devolver os 2,9 milhões de reais que, de acordo com os procuradores, foram desviados em um contrato com o Ministério das Cidades.
A atuação do grupo teria ocorrido entre 2007 e 2009, por meio da empresa Dialog Serviços de Comunicação (atual Due Promoções e Eventos). Segundo o Ministério Público, a Dialog usava uma estratégia apelidada de “jogo da planilha” para vencer as licitações. O truque envolvia a redução de preço de itens secundários e pouco utilizados e o sobrepreço em itens mais utilizados. Em uma concorrência com o valor previsto de 554 milhões de reais, a empresa saiu vencedora após apresentar um lance de apenas 24,8 milhões.
O maior – 1,2 milhão de reais – desvio teria ocorrido na organização da 3ª Conferência Nacional das Cidades, realizada em dezembro de 2007. O sobrepreço em um dos itens chegou a 1.500%. Entre os denunciados, ao lado de Bené, estão sete ex-funcionários do ministério, inclusive a ex-subsecretária de Planejamento, Orçamento e Administração Magda Oliveira e o coordenador de Licitação, Francisco de Assis Rodrigues Froés.
Os procuradores afirmam que Bené agiu em parceria com os servidores. “Verifica-se que este concorreu dolosamente para a prática dos atos criminosos aqui descritos ao arquitetar ilicitamente, em conluio com funcionários públicos do Ministério das Cidades, a vitória de sua empresa no certame licitatório pregão eletrônico”, diz a ação penal.
Benedito Oliveira já é investigado em outros casos de corrupção. O executivo Gerson Almada, da Engevix, apontou aos investigadores da Lava Jato que Bené era o arrecadador de propina para a campanha de Pimentel. O empresário também pertence à família dona da Gráfica Brasil, fornecedora da campanha de Pimentel e investigada na operação Acrônimo, da Polícia Federal, por indícios de lavagem de dinheiro. Bené foi preso em maio mas deixou a cadeia depois de pagar fiança.
Por Reinaldo Azevedo
A Olimpíada fecal: Imprensa americana aponta riscos de saúde para atletas nas águas do Rio, em 2016
Os atletas que competirão em modalidades aquáticas nos Jogos do Rio de 2016 terão contato com águas tão contaminadas com fezes humanas, segundo a Associated Press, que correrão o risco de ficar violentamente doentes e incapazes de seguir na competição.
Uma análise da qualidade da água, encomendada pela AP, revelou níveis perigosamente elevados de vírus e bactérias de esgoto humano em locais Olímpicos e Paraolímpicos – resultados que alarmaram especialistas internacionais e tiraram o ânimo dos atletas de vir treinar no Rio, alguns dos quais já tiveram febres, vômitos e diarréia.
É o primeiro teste global independente para vírus e bactérias nos locais olímpicos, embora o meu nariz faça testes diários por aqui e chegue ao mesmo resultado.
Funcionários brasileiros têm a certeza de que a água é segura para os atletas, diz a AP, mas o governo não testa a presença de vírus.
Apesar de décadas de promessas oficiais para limpar a bagunça, o fedor do esgoto ainda saúda os viajantes que chegam ao aeroporto internacional do Rio de Janeiro. As praias estão vazias porque o surfe fica pesado com lodo pútrido e mortandades periódicas deixam a Lagoa olímpica, Rodrigo de Freitas, cheia de peixe podre.
“O que você tem aí é basicamente esgoto bruto”, disse John Griffith, um biólogo marinho do Projeto de Pesquisa de Água Costeira do Sul da Califórnia.
“É toda a água dos banheiros e chuveiros, e o que quer que as pessoas despejam em suas pias, tudo misturado, e está indo para as águas da praia. Esse tipo de coisa seria fechado imediatamente se fosse encontrado aqui”, disse ele.
Ah, John, como eu te entendo, meu chapa!
Mais de 10.000 atletas de 205 países são esperados em 2016 e quase 1.400 deles vão navegar nas águas próximas à Marina da Glória na Baía de Guanabara, nadar na Praia de Copacabana, e remar nas águas salobras da Lagoa.
A AP encomendou quatro rodadas de testes em cada um desses três locais olímpicos de água, e também no do surfe da Praia de Ipanema, que é popular entre os turistas, mas onde não serão realizados eventos. Trinta e sete amostras confirmaram três tipos de adenovírus humano, bem como rotavírus, enterovírus e coliformes fecais.
O teste viral da AP, que continuará no ano que vem, não encontrou nem sequer um (hum!) local de água seguro para natação ou barco, de acordo com especialistas em recursos hídricos globais.
Em vez disso, os resultados mostraram altas contagens de adenovírus humanos ativos e infecciosos, que se multiplicam na extensão intestinal e respiratória das pessoas. Estes são vírus conhecidos por provocar doenças respiratórias e digestivas, incluindo diarreia explosiva e vómitos, mas também pode levar a doenças mais graves de coração, cérebro e outras.
As concentrações dos vírus em todos os testes foram mais ou menos equivalentes ao observado no esgoto bruto – mesmo em uma das áreas menos poluídas, a Praia de Copacabana, onde as provas de maratona e triatlo terão lugar e onde muitos dos esperados 350 mil turistas estrangeiros poderão dar um mergulho.
Já a Lagoa Rodrigo de Freitas é um dos locais mais poluídos, com resultados que variam de 14 milhões de adenovírus por litro na parte baixa a 1,7 bilhões por litro na parte alta.
Só para efeito de comparação, especialistas de qualidade da água que monitoram praias no sul da Califórnia ficam alarmados quando veem contagens virais atingindo apenas 1.000 por litro.
“Se eu estivesse indo competir nos Jogos Olímpicos”, disse Griffith, “eu provavelmente iria cedo para ficar exposto e construir o meu sistema de imunidade a estes vírus antes que eu tivesse de competir, porque eu não vejo como elas [as autoridades brasileiras] vão resolver este problema de esgoto.”
Nem nós, Griffith. Nem nós.
Felipe Moura Brasil ⎯ https://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil