Uma sabatina como nunca houve. Ou: Em quase 13 horas, Fachin cobriu com glacê retórico suas posições radicais

Publicado em 13/05/2015 08:19
Do hábito de levar a vida de joelhos. Ou ainda: Senado e Fachin tiveram de trabalhar..., por REINALDO AZEVEDO, DE VEJA.COM

Uma sabatina como nunca houve. Ou: Em quase 13 horas, Fachin cobriu com glacê retórico suas posições radicais. Ou: Do hábito de levar a vida de joelhos. Ou ainda: Senado e Fachin tiveram de trabalhar

Algumas vozes da política brasileira insistem em nos empurrar para o desânimo, mas a gente não cede. E não em razão daquela tolice do “sou brasileiro e não desisto nunca”. Fosse só por isso, eu já teria desistido faz tempo. Eu insisto apenas porque acho que estou certo. Ponto. Uns bobalhões vieram perturbar no blog com o placar de 20 a 7 na CCJ em favor de Luiz Edson Fachin, como se fosse inesperado, e apontar o que chamam a “derrota de Reinaldo Azevedo”. Vamos ver.

Em primeiro lugar, é o plenário que aprova a indicação, não a CCJ. E a votação só será no dia 19. Em segundo lugar, eu, pessoalmente, não ganho nem perco nada. Em terceiro lugar, fosse o caso de pesar perdas e ganhos, ganhei e ganhamos. Ganhei porque foi este blog quem revelou ao país o que pensa Fachin. Convenham: não fosse a minha iniciativa, o debate nem teria começado. E isso é apenas um fato. E ganhamos como país porque, finalmente, se fez uma sabatina de verdade. Com o perdão da imodéstia: sem esta página, o advogado não teria ficado mais de 11 horas se explicando, numa sessão que durou quase 13, ainda que alguns senadores fizessem questão de ficar de joelhos quando tiravam as mãos do chão. Sugiro que troquem a cadeira por almofadas. Deve facilitar o trabalho da genuflexão.

Uma das razões que explicam ser este um país rico com uma esmagadora maioria de pobres — que Dilma e os petistas chamam “classe média” — é o ódio que se tem à clareza, ao “pão, pão”, “queijo, queijo”. Alguns acham natural que três senadores do Paraná, porque do Paraná, de partidos distintos, se alinhem com um candidato ao Supremo que leva a marca do Estado.

Refiro-me a Álvaro Dias (PSDB), Roberto Requião (PMDB) e Gleisi Hoffmann (PT), enroscada na operação Lava Jato. Ela ainda aproveitou para louvar a amizade com a desembargadora Rosana Fachin, mulher do candidato ao tribunal. Ali estava o país cordial de “Raízes do Brasil”, em que o privado e o público se estreitam num abraço insano. Ali estava, em suma, o país de “Casa Grande & Senzala”.

Busquem o vídeo ou a transcrição das respostas de Fachin. Ele só conseguiu ser claro em uma questão: o aborto. E, ainda assim, falou contra o procedimento em si. Ocorre que nem os mais fanáticos defensores da descriminação da prática se dizem favoráveis a ela. Advogam é o direito natural que teria a mulher de interromper a gravidez. As palavras têm sentido. E eu me apego a ele.

Fachin reviu o que pensa sobre direito de propriedade? Não! Ele se limitou a evocar a Constituição. Afinal, o Inciso II do Artigo 185 deixa claro que a propriedade produtiva é insuscetível de reforma agrária. ELE NÃO RENEGOU O ARTIGO QUE ESCREVEU EM 1986 EM QUE DEFENDE CONFISCO DE TERRAS E EXPROPRIAÇÃO DE ÁREAS PRODUTIVAS. ESCONDEU-SE NA CONSTITUIÇÃO PARA ESCONDER O PRÓPRIO PENSAMENTO.

Com habilidade, lembrou que o Artigo 5º, um das cláusulas pétreas da Carta, garante o direito à propriedade no seu caput. É verdade. Mas o Inciso XXIII do mesmo artigo a condiciona à “função social”. Ora, de um Plano Nacional de Direitos Humanos ao Código de Processo Civil, quantas são as tentativas de, na prática, impedir um juiz de conceder uma liminar de reintegração de posse?

Fui rever boa parte das respostas do candidato sobre direito de família. À diferença do que parece — com seu ar muito pio, acompanhado dos seus, o netinho inclusive —, ele não renegou as suas teorias exóticas sobre o direito de família, mas as relegou à condição de querelas acadêmicas. O teórico das famílias múltiplas e dos direitos de amante se disse, segundo entendi, um monogamista pessoal, mas aberto à diversidade. Fosse por sua iniciativa, o Brasil já teria incorporado em suas leis o conceito de “famílias simultâneas” e de “multiparentalidade”.

Maioridade penal e lei anti-homofobia
Para quem se apega ao sentido das palavras, ficou claro que o doutor é contra a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, chegando a flertar com a possibilidade de que o limite vigente seja uma cláusula pétrea — imutável, pois —, o que só pode ser piada. E se disse, sim, favorável à chamada Lei Anti-Homofobia. Indagado pelo senador Magno Malta (PMDB-ES), deixou claro que, na sua opinião, religiosos só poderiam censurar o comportamento homossexual “na espacialidade de sua fé” — vale dizer: dentro das igrejas. Fora delas, seria, então, “homofobia”…

Crime de responsabilidade
E sobre a possibilidade de a presidente da República ser denunciada ou processada por crime de responsabilidade? Ele disse seguir o que está no Parágrafo 4º do Artigo 86 da Constituição:

“§ 4º O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.”

Pois é… Um crime de responsabilidade cometido por um presidente no primeiro mandato seria “estranho” à sua função quando ele emenda um segundo? Fachin tergiversou. Tivesse respondido, não teria feito nada demais porque lhe foi cobrado que falasse em tese.

Nunca houve uma sabatina como a desta terça-feira, está claro. Mas não está menos claro que, sob o manto da cordialidade, Fachin ensaiou algumas abjurações para, no fim das contas, referendar o que pensa sobre propriedade e direito da família.

E, por óbvio, restou sem resposta a sua dupla militância no Paraná, como procurador e como advogado, quando isso era proibido por lei e pela Constituição do Estado. A sua explicação, qualquer um sabe disto, chega a ser desastrada.

A maioria do Senado dirá no dia 19 se Fachin conseguiu, com seu glacê retórico, cobrir a substância do seu pensamento, que segue intacta. Vamos ser claros: ele tem todo o direito de tentar passar mel da boca dos senadores. Estes só lambem os beiços se for de sua vontade.

Texto publicado originalmente às 4h02

Por Reinaldo Azevedo

 

CCJ aprova Fachin por 20 votos a 7; no dia 19, o plenário vota

Depois de quase 13 horas — doze horas e quarenta e três minutos — e de mais de 11 horas de perguntas e respostas, o nome de Luiz Edson Fachin, conforme o esperado, foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça por 20 votos a 7. Na próxima terça, dia 19, o plenário se manifesta.

Foi, até onde sei, a mais longa sabatina da história. A CCJ cumpriu a sua função. Na madrugada, obviamente, volto ao tema e trato uma vez mais das respostas de Fachin.

Por Reinaldo Azevedo

 

O “clown” da turma: Omar Aziz

Que vergonha!

Omar Aziz (PSD), senador pelo Amazonas, depois de também se colocar de joelhos, decidiu ser fulminante com Fachin: “O que o senhor acha da Zona Franca de Manaus?”

Perplexo, Fachin tartamudeou: “Senador, sobre a Zona Franca de Manaus, francamente…”

Azis se deu conta do ridículo e emendou:
“Eu sei, o senhor não se preparou. Mas tenho a certeza de que o senhor será um defensor da Zona Franca…”

E Fachin: “Obrigado, senador, pela pergunta e pela resposta”.

Por Reinaldo Azevedo

 

Alguns senadores deveriam trocar a cadeira por um almofada

Delcídio Amaral (PT-MS) também não tem pergunta. Só queria fazer elogios: garantista, progressista, pessoa ilibada, pai de família, avô, humilde, currículo impecável, viveu um tempo na Alemanha, professor convidado do King’s College… E terminou com um “parabéns, Doutor Fachin”.

Olhem aqui… Alguns senadores mereciam trocar a cadeira por uma almofada: fica mais fácil ficar de joelhos.

No momento, fala Gleisi Hoffmann (PT-PR), a segunda enroscada do dia na Operação Lava Jato a rasgar loas ao candidato. O outro foi Lindbergh Farias (PT-RJ).

Ela, claro!, disse que o desempenho de Fachin “é um orgulho para nós, paranaenses”.

Gleisi, a senadora petista investigada na Operação Lava Jato, também saudou a amizade com a desembargador Rosana Amara Giardi Fachin.

Brasil.

Por Reinaldo Azevedo

 

O “senador Gutemberg” espera contar com o voto dos tucanos

O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) também não tinha pergunta nenhuma a fazer. Ele só estava preocupado em fazer salamaleques. Mostrou-se grato porque Fachin se comportou de forma educada. Que bom, né? E, para estupefação de qualquer pessoa de bom senso, quis saber como ele poderia ser considerado um adversário da família se chegou ao Senado com em companhia da mulher…

Também ele desqualificou os críticos de Fachin — sabem como é… Tudo invenção dos meios de comunicação.

Lindbergh, por conta própria, decidiu que todos os senadores estavam muito satisfeitos e expressou a confiança de que Fachin será facilmente aprovado.

E fez um estranho elogio à bancada do PSDB, depois de cantar as glórias do tucano Alvaro Dias (PR): segundo disse, os senadores tucanos são tão qualificados que ele, Lindbergh, espera contar com o “sim” de todos. E emendou: “De Ronaldo Caiado (DEM-GO), eu não espero o voto”.

Ao agradecer, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça, José Maranhão (PMDB-PB), agradeceu:
“Obrigado, senador Gutemberg”.

Por Reinaldo Azevedo

 

Fachin e os crimes de responsabilidade de um presidente

O senador tucano Flexa Ribeiro (PA) fez duas questões importantes a Fachin, que sintetizo:
a: um presidente da República em segundo mandato não pode ser responsabilizado por crimes cometidos no primeiro?
b: mesmo por crime cometido no exercício do mandato, um presidente não pode ser ao menos investigado?

Fachin não respondeu e disse que os limites estão estabelecidos na Constituição. Sabem o que isso quer dizer? Nada! E por quê?
O Parágrafo 4º do Artigo 86 da Constituição estabelece o seguinte:
“§ 4º O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.”

Pois é… Que leitura Rodrigo Janot, por exemplo, faz desse texto? Que qualquer que tenha sido a lambança que um presidente tenha cometido no primeiro mandato, ele não poderá arcar com as consequências legais no segundo.

Qual é o busílis? Esse artigo foi posto na Constituição antes de provada a emenda da reeleição. Vamos ao texto: um presidente não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções. E ele tem a “função” de presidente no primeiro ou no segundo mandatos. A menos que a Carta desse a um presidente o direito de cometer crimes e permanecer impune.

Mais: segundo jurisprudência do Supremo, mesmo por crimes próprios à função, um presidente pode, no exercício de seu mandato, ser investigado. Não pode, como reza claro o texto, ser processado.

Fachin poderia ter respondido as duas questões sem problema. Não respondeu.

Por Reinaldo Azevedo

 

Fátima e Marta: elogios ao léu

 Ai, meu Deus!

Fátima Bezerra (PT-RN) não tinha pergunta nenhuma a fazer e se limitou apenas a fazer elogios ao candidato. Marta Suplicy (sem partido-SP) foi pelo mesmo caminho, mas piorou tudo.

Fátima, ao menos, improvisou. Marta limitou-se a ler um texto, que levou pronto. Vale dizer: pouco importava o que o homem dissesse.

Não tinha pergunta nenhuma a fazer. Ao se alinhar com tanto entusiasmo com Fachin, duvido que tenha colaborado com a aprovação.

Ah, sim: em seu texto, a senadora tentou desqualificar os críticos de Fachin, que estariam preocupados apenas com questões ideológicas.

Como disse um amigo há pouco, Marta saiu do PT, mas o PT não saiu de Marta.

Por Reinaldo Azevedo

 

Marta tenta ajudar Fachin e acaba atrapalhando

A senadora Marta Suplicy (sem partido-SP) tentou colaborar com Luiz Edson Fachin e acabou complicando as coisas para o candidato.

O senador Magno Malta (PR-ES) quis saber se Fachin é ou não favorável à lei que pune a homofobia. E teceu algumas considerações, sugerindo que ele estaria na origem da proposta.

Marta interrompeu para dizer que não; que a proposta era originalmente dela e que Fachin apenas colaborou com a causa, já que sempre foi um homem de vanguarda.

Na resposta, embora excessivamente palavrosa, Fachin afirmou que é, sim, favorável à lei e disse a seguinte frase: “Não se deve heterossexualizar a homossexualidade”. Não sei o que quer dizer, mas a frase deve fazer um baita sucesso.

A resposta foi de tal sorte rocambolesca que Malta ironizou: “A sua fala veio com tanta palavra jurídica que eu não entendi quase nada. Eu fiz vestibular três vezes para direito e fui reprovada as três”.

Ah, sim: Fachin deixou claro que eventuais manifestações contra a prática homossexual devem se restringir aos cultos religiosos. 

Por Reinaldo Azevedo

 

Renan marca a votação no plenário para o dia 19

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) marcou para a próxima terça-feira, dia 19, a votação em plenário da indicação de Luiz Edson Fachin para o Supremo Tribunal Federal. Afirmou o seguinte:
“Se você improvisar a apreciação do nome do ministro do Supremo, vai haver quem responsabilize pelo quórum baixo ou quórum alto, e isso arranha a isenção do presidente do Senado”.

Ele está certo.

O Planalto queria apressar a coisa. Sob o impacto de um Fachin cordato, a aprovação poderia ser mais fácil.

Por Reinaldo Azevedo

 

 

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Fonte: Blog Reinaldo Azevedo (VEJA)

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