Se Laerte virasse Sônia num país islâmico, o cartunista não chegaria ao fim da primeira maquiagem
Se Laerte virasse Sônia num país islâmico, o cartunista indulgente com liberticidas não chegaria ao fim da primeira maquiagem
O universitário Laerte Coutinho, com quem convivi por dois anos na Escola de Comunicações e Artes da USP, já refletia no traço e no conteúdo a influência do cartunista Georges Wolinski, uma das vítimas do ataque terrorista à redação do Charlie Hebdo. Discípulo aplicado de um mestre do humor anárquico, era impiedosamente irônico com qualquer tema ou personagem colocados na mira do seu lápis. A escolha do alvo passava ao largo de opções políticas, ideológicas ou religiosas. Tudo e todos podiam virar piada.
Nos anos seguintes, os charges, quadrinhos e cartuns que o transformariam em celebridade ficaram mais refinados e inventivos. Mas o profissional famoso foi essencialmente uma continuação do amador que admirava Wolinski até que, 2004, o cartunista que debochava da tribo dos engajados se apaixonou pela causa dos transgêneros. Passou a usar trajes femininos, concedeu-se o direito de acesso ao banheiro das mulheres e acabou virando “Sônia”. Assim começou a agonia do Laerte que conheci. A morte foi consumada pela reação de Sônia ao espetáculo do horror protagonizado em Paris por fundamentalistas islâmicos.
A perplexidade provocada pela execução do octogenário Wolinski talvez tivesse ressuscitado o cartunista que disparava charges em todas as direções se o discurso de adeus não fosse interrompido por Sônia antes que a temperatura chegasse ao ponto de combustão. “O ruim é que tudo isso vai fortalecer a direita”, advertiu a voz suave. No mundo binário em que vive a estranha entidade, só existem esquerda e direita. Se os franceses alarmados com o crescimento da comunidade islâmica são de direita, deve-se deduzir que é de esquerda, como Sônia, gente que metralha quem ousa ironizar figuras sagradas e morre acreditando que vai acordar num céu atulhado de virgens.
Nesta terça-feira, enquanto milhões de manifestantes se juntavam na portentosa ofensiva contra o primitivismo liberticida, a charge na segunda página da Folha confirmou que a mudança operada no autor foi muito além da troca de calças por saias. Assinada por um Laerte que já não há, a obra parida por Sonia se divide em dois quadrinhos. No primeiro, alguns vultos planejam numa sala da redação a edição seguinte, que se concentraria no monumento à boçalidade homicida. A dúvida sobre o que deveria ser destacado na capa é desfeita no segundo quadrinho, que reproduz a capa em que VEJA revelou que Lula e Dilma sabiam do que ocorria nas catacumbas da Petrobras.
O Laerte que não depilava o corpo enquadraria os carrascos. A ativista Sonia insinua que os colegas do Charlie Hebdo estariam vivos se fossem mais ajuizados. É sempre um perigo mexer com fanáticos que não sorriem. O desfecho sangrento seria evitado caso tivessem optado pela autocensura e proibido a entrada do profeta Maomé nas páginas do semanário. Em troca da sobrevivência, só perderiam a honra. O Laerte de antigamente estaria traduzindo charges ferozes a indignação com a tentativa de assassinato da liberdade de expressão ocorrida em Paris. Sônia ficou por aqui, concebendo o trucidamento simultâneo do jornalismo independente e da verdade.
A mão que rabiscou a vigarice obedece a uma cabeça em tumulto. Compassiva com matadores de humoristas, odeia a altivez da revista que, por cumprir sem medo a missão de informar o que efetivamente ocorreu, apressou o desmantelamento da quadrilha do Petrolão. Até terça-feira, o maior e mais abrangente esquema corrupto da história do Brasil havia merecido uma única e escassa charge da companheira Sônia. A primeira misturou a carnificina em Paris com a roubalheira na Petrobras para excluir Lula e Dilma do caso de polícia — e endereçar a quem noticia um crime a ironia que o extinto Laerte reservava aos criminosos.
Tudo somado, está claro que o cartunista já não sabe o que diz ou desenha. Laerte-Sônia ignora, por exemplo, como são as coisas no mundo islâmico. Nem desconfia que, se tentasse virar mulher por lá, não chegaria ao fim da primeira maquiagem.
Tags: atentado terrorista, charge, Charlie Hebdo, Laerte, Sônia, Veja
(por Augusto Nunes)
Papa diz que a liberdade de expressão não dá o direito de ofender o próximo
Leiam o que vai na VEJA.com. Volto daqui a pouco para chicotear o papa.
O papa Francisco afirmou nesta quinta-feira que a liberdade de expressão tem seus limites e que não se pode provocar nem ofender a religião. Durante sua viagem de avião do Sri Lanka para as Filipinas, o sumo pontífice foi questionado por um jornalista sobre o atentado ao semanário satírico francês Charlie Hebdo, na semana passada. Cauteloso, sem mencionar especificamente o ataque e nem o nome do semanário, o papa disse que tanto a liberdade de expressão como a liberdade religiosa “são direitos humanos fundamentais”. “Temos a obrigação de falar abertamente, de ter esta liberdade, mas sem ofender”, continuou.
Sobre a liberdade religiosa, destacou que “cada um tem o direito de praticar sua religião, mas sem ofender” e considerou uma “aberração” matar em nome de Deus. “Não se pode ofender, ou fazer guerra, ou assassinar em nome da própria religião ou em nome de Deus”, afirmou. “Também nós fomos pecadores, mas não se pode assassinar em nome de Deus”, insistiu Francisco. “Acho que os dois são direitos humanos fundamentais, tanto a liberdade religiosa, como a liberdade de expressão”, continuou o papa sobre a compatibilidade entre ambos os conceitos.
O jornalista francês que lhe fez a pergunta o interrompeu e afirmou: “Vamos falar sobre Paris, sejamos claro”. O papa então disse: “Temos a obrigação de falar abertamente, de ter esta liberdade, mas sem ofender. É verdade que não se pode reagir violentamente, mas se Gasbarri [Alberto Gasbarri, responsável pelas viagens internacionais do papa], grande amigo, diz uma palavra feia sobre minha mãe, pode esperar um murro. É normal!”, assegurou. “Dei este exemplo para dizer que na liberdade de expressão há limites, como o que Gasbarri disse da minha mãe”, disse o papa aos jornalistas. Francisco ainda lamentou que exista “muita gente que fala mal de outras religiões ou das religiões”. Para o pontífice, estas pessoas “provocam”.
Ainda sobre a liberdade de expressão, Francisco esclareceu que “é uma obrigação dizer o que se pensa para ajudar o bem comum. Se um senador ou um político não diz o que pensa, não colabora com o bem comum’”. O papa ainda citou o seu antecessor, o papa emérito Bento XVI, quando ele palestrou na universidade alemã de Regensburg sobre a existência de uma mentalidade ‘pós-positivista’ que conduz erroneamente a considerar como ‘subculturas’ as religiões ou as expressões religiosas.
Por Reinaldo Azevedo
Papa Francisco tropeça na sandália do pescador de águas turvas e diz besteira. Ou: Bergoglio está preparado para cura de aldeia, não para chefe da Igreja Católica
O mundo vive uma crise de liderança sem igual. Em toda parte. Onde está Barack Obama, presidente dos EUA? Deixem-me ver. Ele tentou transformar em notícia desta quinta mais um passo do governo americano na aproximação com… Cuba! Quem se importa com essa bananice? No comando da Igreja Católica, está um jesuíta com formação teológica precária, talhado, como diz um meu amigo italiano, para ser “cura de aldeia”, não o chefe da Igreja. Sim, ele é o líder máximo da minha religião, mas suas ambiguidades me incomodam.
Se concede uma entrevista sobre o aborto, depois é preciso esclarecer pontos obscuros de sua fala; se tece considerações sobre catolicismo e homossexualidade, logo é preciso que o Vaticano esclareça o que quis dizer. Faço aqui uma ironia delicada: jesuítas sempre foram de uma inteligência política ímpar, mas, em matéria de teologia, não são aquilo tudo… E Padre Vieira? Foi o maior prosador da língua portuguesa e um… grande político. Na teologia, forçava a mão.
O ex-peronista Bergoglio não me entusiasma nem como teólogo, o que ele não é, nem como liderança política — e seu posto também tem esse significado. Parece-me viciado em aprovação popular. “E João Paulo II não era assim?”, poderia indagar alguém. Não à custa da clareza, respondo eu.
O papa falou a jornalistas durante uma viagem do Sri Lanka às Filipinas. Indagado sobre o ataque ao jornal francês “Charlie Hebdo”, saiu-se com a ambiguidade de hábito. Reconheceu que tanto a liberdade religiosa como a de expressão são “direitos humanos fundamentais”. Mas considerou: “Temos a obrigação de falar abertamente, de ter esta liberdade, mas sem ofender”.
É claro que ninguém defende o direito natural à ofensa. O ponto não é esse. A questão é saber como devem reagir os que se consideram ofendidos. O papa afirmou, sim, que não se deve matar em nome de Deus, mas se saiu com um exemplo de uma pobreza, lamento dizer, estúpida. Até botou a mãe no meio. Disse: “Temos a obrigação de falar abertamente, de ter esta liberdade, mas sem ofender. É verdade que não se pode reagir violentamente, mas se Gasbarri [Alberto Gasbarri, responsável pelas viagens internacionais do papa], grande amigo, diz uma palavra feia sobre minha mãe, pode esperar um murro. É normal!”.
O exemplo é de um didatismo pedestre. Não é uma fala para ser entendida pelos simples, como devem fazer os cristãos, mas para excitar os tolos. Em primeiro lugar, “papa” e “murro” não devem se misturar numa mesma frase. Em segundo lugar, a sua metáfora cretina, queira ele ou não, justifica o ataque terrorista. Afinal, para os extremistas, eles apenas deram “um murro” — a seu modo — porque provocados.
A fala se dá em meio a outras declarações delinquentes. Ahmet Davutoglu, primeiro-ministro da Turquia, comparou seu congênere israelense, Benyamin Netanyahu, aos terroristas de Paris. Lideranças muçulmanas mundo afora têm se manifestado de forma ambígua sobre os ataques, sempre partindo desse lamentável ponto de vista do papa: “Eles falaram mal de nossa mãe” — no caso, do “nosso Profeta”.
Bergoglio, dito Francisco, deveria se calar. Ser ambíguo sobre aborto, homossexuais ou casamento de padres só traz alguma turbulência à própria Igreja. Ser ambíguo sobre terrorismo pode ser muito perigoso. A propósito: se alguém insultar Cristo, que tipo de “murro” o papa acha que os católicos devem dar?
Por Reinaldo Azevedo
O Papa Francisco falou bobagem. Ou: Pelo direito de “insultar”
A fala em clima descontraído e informal do Papa Francisco, condenando o uso da religião para a violência, mas alegando que ninguém tem o direito de insultar os outros e que é normal reagir a isso até mesmo com um murro, repercutiu pelo mundo todo. Tenho pouco a acrescentar ao excelente texto de Carlos Graieb, editor da Veja.com. Mas mesmo assim vou comentar o ocorrido.
O Papa Francisco errou, disse uma besteira. Gosto do Papa, ou ao menos até aqui tenho tido simpatia por sua postura, com ressalvas (quando se mete a falar de economia e capitalismo). E até entendo o sentido que ele tentou dar à fala, pois qualquer um se sentiria ofendido se alguém falasse mal da sua mãe. Aqueles que forçam a barra para interpretar que até o papa justificou o atentado bárbaro estão sendo desonestos, simples assim. Não foi nada disso que ele fez. Ainda assim, falou bobagem.
Ninguém pode ter o direito de não se sentir ofendido. Esse seria um direito absurdo, que levaria a uma tirania. Afinal, cada um se ofende com alguma coisa. Torcedores fanáticos ficariam ofendidos se falassem mal de seu time do coração. Socialistas se ofenderiam com as críticas ao modelo utópico coletivista que trouxe apenas escravidão e miséria ao mundo. Cristãos se ofenderiam o tempo todo com sátiras a Cristo.
A ofensa nunca é um bom parâmetro para julgar o limite da liberdade de expressão. E infelizmente vivemos na era do sentimentalismo exacerbado, em que “almas sensíveis” chegaram ao poder e se julgam no absoluto direito de não ficarem ofendidos. O politicamente correto é o corolário disso, uma ditadura velada que oblitera a linguagem e cria um clima de autocensura insuportável. Daí vem a ideia de que tudo é bullying hoje. Xô, apelidos!
Eis algo que os religiosos precisam compreender: blasfêmia é um conceito que faz sentido apenas para o crente. Um estado laico, portanto, que separa estado de religião, não pode ter leis contra a blasfêmia. Não faz sentido, pois para quem não compartilha da fé em questão, ironizar a crença alheia jamais será uma “blasfêmia”. O sagrado só é sagrado para o crente.
A boa educação e a civilidade recomendam, porém, respeito às crenças religiosas dos demais. Afinal, vivemos num mundo em busca de sentido, e as religiões sempre foram, historicamente, a resposta a esse anseio universal. Falsas ou não, isso não vem ao caso. O ateu militante mais parece um crente, além de ser muito chato. E o militante agressivo, desrespeitoso, é apenas um infantil gritando por ajuda: “Não creio no seu Deus, esse maldito!”
Os humoristas inteligentes ainda existem, mas o fato lamentável é que o humor se vulgarizou, como tudo mais. A sátira passou a ser cada vez mais ácida e agressiva, para se destacar num mundo em que o desrespeito foi banalizado. Não entro no caso específico dos franceses mortos, mas aqui no Brasil sabemos como falta inteligência aos jovens humoristas famosos, cuja fama foi construída à base de muitas ofensas e vulgaridade.
Mas condenar o desrespeito ou mesmo a estupidez não é o mesmo que demandar leis contra os insultos. Coerção estatal não é a resposta certa, muito menos os atentados terroristas. Os néscios têm direito às suas estultices. E a “blasfêmia” ou a sátira agressiva jamais justificam a barbárie, que os multiculturalistas preferem chamar de “diferenças culturais”. Sim, a diferença entre quem respeita a vida e quem ama a morte.
Curiosamente, os mesmos que levantam a bandeira da “tolerância” contra o preconceito e da censura aos insultos, usando a fala do papa de forma oportunista, adoram cuspir no Cristianismo ocidental. Há um viés seletivo nessa postura de respeito às religiões: só engloba o Islã ou as exóticas orientais e africanas, nunca a própria religião predominante no Ocidente. Cristo pode ser ridicularizado, mas Maomé, jamais. Santa hipocrisia, Batman!
No fundo, esses relativistas sabem onde a porca torce o rabo, e morrem de medo dos fanáticos islâmicos. Sabem que a feminista com o peito de fora na igreja, perturbando o pobre padre, sairá de lá ilesa, viva. Sabem que o indecente uso da cruz para cenas pornográficas em praça pública não será punido. Sabem que declarações explícitas de judeofobia não vão dar em nada. Mas sabem, também, que uma simples charge ironizando Maomé pode acabar em tiroteio e bomba. São covardes.
Eis o que boa parte da esquerda e uma ala menor da direita ainda não entenderam: a defesa da liberdade de expressão só faz sentido quando discordamos do que é dito, ou até mesmo quando abominamos o que é dito. Defender o direito de o outro se manifestar verbalmente quando concordamos com ele é moleza. Difícil é adotar a máxima atribuída a Voltaire, e defender até a morte o direito de o outro falar o que pensa, mesmo sem concordar com uma só de suas palavras.
O humorista Rafinha Bastos, em artigo publicado hoje na Folha, fez um desabafo legítimo, perguntando onde estavam esses todos que agora dizem ser Charlie, em homenagem aos chargistas franceses mortos, quando ele era censurado e atacado. Veja bem: você tem todo o direito de achar o humor de Rafinha Bastos ridículo, ofensivo, patético, estúpido. O segredo é perceber que uma coisa não tem ligação com a outra. O liberal defende o princípio, não o discurso que lhe agrada.
Quando a editora Abril, após expor fatos incômodos ao PT, foi atacada por vândalos, estes foram elogiados por partidos de esquerda. A “liberdade de expressão” dos esquerdistas é válida para um lado somente. O esquerdista pode insultar todos, chamar de “fascistas” ou “nazistas” os liberais que repudiam o fascismo e o nazismo, que não tem problema.
Mas o insulto passa a ser abominável quando atinge uma das “minorias” protegidas pelos “progressistas”. Qualquer coisa vira “islamofobia”, por exemplo, quando vai contra o Islã “pacífico”, que praticamente monopoliza os casos de terrorismo na atualidade. Dois pesos, duas medidas: a marca dos hipócritas.
Ofensa gratuita não é bom humor, e extrai gargalhadas apenas dos mais limitados. Humor fino, por outro lado, é inteligente, e estimula risos nos mais sábios. Mas a diferença entre um e outro deve ser definida pelo “mercado”, pela liberdade de escolha. Insultos são normalmente ataques de inseguros. Vejo isso diariamente aqui no blog, pela horda de esquerdistas que aparece apenas para me ofender, incapazes de debater ou argumentar.
Mas como liberal, defendo o direito ao insulto, à “blasfêmia”, pois a alternativa é uma crescente censura que terminaria abolindo a preciosa liberdade de expressão. O Papa, portanto, escorregou feio e levantou a bola para os autoritários que se julgam no direito de usar a força (lei) para não se sentirem ofendidos. Como ateu, fico feliz ao ver que não estou só na crítica ao líder máximo dos católicos, pois um deles, Reinaldo Azevedo, teceu o mesmo tipo de crítica em sua coluna de hoje na Folha:
Francisco tem cabeça e postura de cura de aldeia, não de papa. Suas entrevistas ambíguas são detestáveis. O jesuíta leu mal São Paulo e não sabe que cítara e flauta têm de soar de modo distinto. Suas opiniões sobre o atentado e a liberdade de expressão são covardes, imprecisas e politiqueiras. Deveria se esconder debaixo da cama com Barack Obama para conversar sobre o nada. Ainda bem que nenhum católico vai tentar me dar mil chicotadas por isso.
E essa sim, é uma ironia fina no final. Com ela, Reinaldo Azevedo expõe toda a hipocrisia dos multiculturalistas que apontam os dedos para os chargistas, transformando vítimas em culpados. Criticar o papa não coloca a vida de ninguém em risco. Já fazer um desenho bobo do profeta dos muçulmanos…
Rodrigo Constantino
Minha coluna na Folha: “Francisco, por que não te calas?”
Seguem trechos:
Li dia desses o que, parece-me, ambicionava ser um norte moral: deve-se rir do opressor, não do oprimido. Isso é política, não humor. Essa suposta bondade em favor dos fracos é parente da lógica do terror. Ou não é verdade que o terrorista reivindica o lugar do humilhado e diz reagir à agressão do mais forte? Foi a justificativa dada por Amedy Coulibaly, que invadiu um supermercado kosher em Paris e matou quatro pessoas.
O poder das vítimas, um perigoso oximoro, é uma ameaça constante às conquistas da civilização. Os vários fascismos do século passado manipularam com muita habilidade sentimentos coletivos de frustração e de humilhação. As democracias ocidentais se defrontam hoje com o fascismo islâmico –que conta quase sempre com a simpatia das esquerdas.
A melhor cena de humor que conheço está no filme “A Vida de Brian”, de Monty Python (aqui). Ironiza a resistência da Frente Popular da Judeia (oprimidos) aos romanos (opressores). Deveria ser condenada pelo Tribunal das Causas Politicamente Corretas? O humor de boa qualidade desconstrói a “doxa” e não tem programa de governo. Se tem, o humorista deve disputar eleições. É outro seu picadeiro.
(…)
Para encerrar: Francisco tem cabeça e postura de cura de aldeia, não de papa. Suas entrevistas ambíguas são detestáveis. O jesuíta leu mal São Paulo e não sabe que cítara e flauta têm de soar de modo distinto. Suas opiniões sobre o atentado e a liberdade de expressão são covardes, imprecisas e politiqueiras. Deveria se esconder debaixo da cama com Barack Obama para conversar sobre o nada. Ainda bem que nenhum católico vai tentar me dar mil chicotadas por isso.
Leia a íntegra aqui
Por Reinaldo Azevedo
A rica Europa como celeiro de terroristas islâmicos. Por quê? Ou: Ele só tem 13 anos
Younes Abbaoud: belga, apenas 13 anos e possível membro do Estado Islâmico
A Polícia da Bélgica matou, num tiroteio, dois indivíduos acusados de preparar um grande atentado terrorista. O confronto se deu em Verviers, no leste do país. Um terceiro homem foi preso. Eles pertencem a um grupo de cidadãos belgas que haviam retornado de uma viagem à Síria. Outros indivíduos estão sob investigação.
O que se passa na Bélgica, em certa medida, desafia a lógica convencional — ou nem tanto, vamos ver. O país oferece um dos melhores padrões de vida da Europa. Costuma ser usado como exemplo de desenvolvimento, de respeito à diversidade e de bem-estar social. Sabe-se que há pelo menos três mil cidadãos da Europa lutando nas fileiras do Estado Islâmico, boa parte sem nenhum vínculo original com o islamismo. Com passaporte europeu, poderia haver pelos menos 5 mil. Estimam-se em 500 os originários do Reino Unido, que tem uma população de 64 milhões. Duzentos seriam oriundos da Bélgica, que tem uma população de pouco mais de 11 milhões. Proporcionalmente, é o país europeu que mais forneceu mão de obra ao terror.
É de lá que saiu, por exemplo, Briande de Mulder, filho da brasileira Rosana Rodrigues, até outro dia tido como um quadro de destaque do Estado Islâmico. A foto de Younes Abaaoud chocou o mundo. Nasceu na Bélgica, filho de um imigrante marroquino, e teria se ligado ao Estado Islâmico em 2014, com apenas 13 anos. Teria viajado à Síria em companhia do irmão mais velho, Abdelhamid Abaaoud, de 27. Por que recorro a esse tempo verbal da dúvida? Não se conseguiu a prova inequívoca de que o garoto integra as fileiras do Estado Islâmico, mas tudo indica que sim.
O que leva jovens a abandonar uma vida confortável em países europeus, tenham ou não qualquer vínculo cultural ou religioso com o islamismo, para se ligar a um grupo cuja delinquência atinge padrões inéditos? Cada um dos ramos da ciência social encontraria uma explicação plausível. Mas me parece que o ódio que amplos setores da intelectualidade e da própria imprensa ocidentais passaram a devotar ao regime de liberdades públicas explica o fenômeno. Ou não haveria tantos “pensadores” tentando encontrar na sociedade francesa os responsáveis pelos atentados que mataram os… franceses.
O Estado Islâmico assume o lugar da vítima e não hesita nunca. Se os relativistas do Ocidente levam amplos setores da juventude a duvidar do sistema que lhe garante a plena liberdade, um canalha moral e religioso como Abu Bakr Al-Baghdadi, o picareta que é chefão dessa organização terrorista, só lhe oferece certezas, ainda que a certeza das trevas.
Atenção para a comparação que vou fazer agora: por que há alguns jovens no Brasil, especialmente os ligados a grupos de esquerda, que rejeitam a democracia, que querem controlar a mídia, que pretendem criar um departamento de censura, que acreditam que a imprensa é sempre culpada? Porque é isso o que ensinam hoje nas escolas os “odiadores” da democracia, os “haters” profissionais — no mais das vezes, estão a serviço de partidos políticos.
Ora, não vimos em 2013 e 2014 a condescendência com que foram tratados os black blocks? Mais do que isso: Gilberto Carvalho confessou que fez várias reuniões com os delinquentes. A propósito, e ainda voltarei ao assunto: uma parceira assumida dos bandidos mascarados, Ivana Bentes, acaba de ser nomeada para um importante posto do Ministério da Cultura.
O ódio à democracia veiculado permanentemente por grupos militantes haveria de ter um preço. O Ocidente já começa a pagar por ele. Mesmo assim, vejo alguns bacanas mais preocupados com “a direita e a islamofobia” do que com a “liberdadefobia”. Os extremistas primeiro sequestraram do Ocidente as suas verdades. Agora, começam a sequestrar seus jovens.
Por Reinaldo Azevedo