Estratégia para o maior consumidor de agrotóxico
Os dados, compilados num estudo da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e publicados na última terça-feira em reportagem do caderno Caminhos do Campo, da Gazeta do Povo, estão servindo para uma revisão da postura nacional em relação ao assunto. O Brasil tenta conhecer mais detalhadamente esse mercado, ao mesmo tempo em que se dá conta de que precisa tomar uma posição mais incisiva.
Afinal, há uma série de questões sem respostas. O atual sistema de registro tem conseguido atender à necessidade de novas tecnologias ou simplesmente beneficia as empresas detentoras das fórmulas dos agrotóxicos? Os produtos aprovados no Brasil são realmente seguros? Qual o risco de as indústrias estarem despejando por aqui compostos proibidos em outras regiões do mundo e desqualificando os alimentos brasileiros no mercado internacional? A indústria brasileira e os centros de pesquisa nacionais – públicos e privados – estão ocupando seu espaço nesse mercado gigante, que se revela cada vez maior?
A proposta da UFPR, a partir desse diagnóstico do mercado de agrotóxicos, é manter uma espécie de observatório do setor. A pesquisa vem sendo bancada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa, órgão do Ministério da Saúde.
Como maior consumidor do mundo de agrotóxicos, o Brasil tem se mostrado ambientalmente preocupado. Pelo próprio custo dos produtos, os agricultores tentam aplicar as doses mínimas indicadas. O principal passivo seriam as embalagens, coletadas de forma exemplar num programa estimulado pelas indústrias. O programa de destinação de embalagens de agrotóxicos, como é conhecido, encaminha para reciclagem mais de 90% dos frascos coletados, conforme o instituto inpEV. O restante segue para incineração. O volume de coleta – 7 mil toneladas no primeiro trimestre, mil delas no Paraná – torna o programa uma referência para o mundo.
No entanto, ainda há problemas na poluição da água e do ar, que crescem automaticamente com o aumento no consumo de defensivos agrícolas, seja pelo uso descontrolado ou pela falta de orientação aos produtores. As cenas de trabalhadores aplicando agrotóxicos sem equipamentos de proteção ainda são comuns. Não se pode esperar que esses produtores, que arriscam as próprias vidas, estejam preocupados com o ambiente ou com a saúde das pessoas que vão consumir o que eles colhem.
A adoção de programas para controle de questões sanitárias, ambientais e de saúde pública é questão estratégica. Pela própria dimensão que o mercado de agrotóxicos tomou. O volume vendido no Brasil passou de 1 milhão de toneladas em 2009.
E as razões para esses programas são óbvias. Basta lembrar que o mercado internacional mostra-se cada vez mais exigente em relação aos países exportadores de alimentos. Com sistemas de rastreamento criteriosos, pedem todo o cuidado possível no uso de defensivos. A preferência é sempre pelas fórmulas menos tóxicas e poluentes.
A indústria que vende no Brasil insumos com restrições nos grandes mercados consumidores prejudica não apenas a produção brasileira, mas a si própria. Isso porque o país é que deve garantir sustentação a esse setor industrial, enquanto nação que detém maior área livre em todo o mundo para ampliar o cultivo de alimentos (perto de 70 milhões de hectares, sem contar áreas de florestas). E o segmento mostra saber disso, ao ampliar suas instalações e investir em novas indústrias no território brasileiro.
O volume de dinheiro que gira no setor é astronômico. Conforme os dados apurados pela UFPR, foram US$ 13,7 bilhões nos últimos dois anos. Mas as cifras podem ir além disso. Segundo a Embrapa Soja, a agricultura nacional gasta entre US$ 1 bilhão e US$ 2 bilhões anualmente só com fungicidas para controlar a ferrugem asiática da soja.
Entre os interesses econômicos, ambientais e a saúde pública, deve prevalecer o bom-senso. Entre as apostas das indústrias e as exigências extras dos importadores de alimentos, que prevaleçam os interesses nacionais.