Enquanto preço do arroz despenca no Brasil, milho é risco para inflação, dizem analistas

Publicado em 25/03/2025 15:03 e atualizado em 25/03/2025 17:20

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Por Roberto Samora e Rodrigo Viga Gaier

SÃO PAULO/RIO DE JANEIRO (Reuters) - As cotações do arroz ao produtor brasileiro acumulam queda de 20% no ano, o que indica que os consumidores devem continuar se beneficiando de um alívio no valor do produto básico nos supermercados, mas a pressão de alta da inflação que deve preocupar o governo Lula vem do milho e do impacto nas carnes, segundo especialistas.

Enquanto o arroz em casca é negociado abaixo de R$80 a saca de 50 kg no Rio Grande do Sul pela primeira vez desde outubro de 2022, o milho na praça referencial de Campinas (SP) opera em torno de R$90 a saca de 60 kg, no maior valor nominal em cerca de três anos, com alta de mais de 23% em 2025, segundo dados do Cepea, da Esalq/USP.

A queda nos preços do arroz ocorre por um esperado aumento de mais de 15% na produção brasileira, com boa recuperação na colheita gaúcha, além de uma melhora na oferta global. No caso do milho, o Brasil começou o ano com estoques baixos, há demanda firme da indústria de etanol e de carnes, além de preocupações com a segunda safra, a maior do país, que ainda precisa contar com o clima nos próximos meses para confirmar as previsões.

"No caso dos alimentos, um grande ponto de risco (para a inflação) é o milho, principal insumo utilizado na nutrição de aves de corte e postura, além de suínos e bovinos tanto nas criações de corte quanto de leite", afirmou a consultoria Datagro, em avaliação nesta terça-feira.

A alta do milho está entre os fatores considerados pela consultoria para ver uma inflação acima da meta em 2025 -- de 3,0%, com margem de 1,5 ponto percentual para mais ou menos --, em momento em que os preços dos alimentos têm preocupado integrantes do governo sobre o impacto disso na popularidade do presidente Lula.

A consultoria citou que os preços do milho em Rondonópolis, umas das referências em Mato Grosso, operavam em meados do mês com alta de mais de 40% sobre o mesmo período do ano passado, para cerca de R$85 a saca, no maior nível desde o início da invasão russa sobre a Ucrânia, no início de 2022.

A Datagro afirmou também, utilizando estudos econométricos, que a "aceleração vigente" nas cotações do milho pode impactar a inflação brasileira de alimentos em até 1,07 ponto percentual ao longo dos próximos seis meses, enquanto no índice geral o impacto pode chegar a até 0,47 ponto percentual em igual período.

Isso evidencia a "possibilidade de impacto inflacionário sistêmico de médio prazo imprimido pela alta de preços de um dos principais componentes do custo de produção de proteínas animais", como carnes de aves e suínos, afirmou a Datagro.

O economista do FGV IBRE André Braz, especialista em inflação, afirmou que, se for confirmada a queda dos preços do arroz aos consumidores, isso "vai ser uma boa ajuda" em termos inflacionários.

Mas ele destacou que o arroz --o quinto item alimentício de maior peso no IPCA -- já não vem sendo um vilão dos preços, acumulando variação negativa de 3,99% em 12 meses, enquanto frango em pedaços, contrafilé e carne de porco subiram 10,95%, 21,47% e 20,22%, respectivamente.

"Mas a questão toda é que o aumento é generalizado, proteínas, seja carne bovina, suína, de aves, peixe, ovo, essas proteínas pesam mais no índice, os cereais pesam, mas é mais pelo fato de ser alimento típico...", disse Braz.

"O efeito tem que ser generalizado, uma andorinha só não faz verão", afirmou ele, referindo-se ao arroz.

ESTOQUES PÚBLICOS

Carlos Cogo, sócio-diretor da consultoria Cogo Inteligência em Agronegócio, disse que a pressão baixista nos preços de arroz "deve persistir nestes meses de colheita no Brasil e só será interrompida se as exportações começarem a ganhar ritmo, o que ainda não aconteceu".

Essa conjuntura atenua o impacto de alimentos para a inflação, disse ele, citando também o feijão como um fator de baixa importante.

No caso do arroz, avaliou Cogo, a queda permitirá que o governo volte a recompor estoques, por meio dos Contratos de Opção de Venda (COV) oferecidos pela estatal Conab.

"A ideia deles (produtores) é aproveitar o afundamento de preços para exercer opções...", disse Cogo, estimando, contudo, que o volume que vai para estoques públicos será relativamente pequeno, de cerca de 90 mil toneladas.

A Conab tinha orçamento de R$1 bilhão para um programa COV de 500 mil toneladas de arroz, mas acabou usando R$162 milhões com menor interesse de produtores, segundo dados da estatal, que na semana passada abriu a possibilidade de o produtor antecipar de agosto para abril o exercício das opções.

Cogo também comentou sobre a pressão "altista" do milho, de outro lado, com impacto em "todas cadeias de proteínas", puxando inflação para cima de produtos como frango, carne suína, leite, ovos e bovinos.

Fonte: Reuters

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