Reforma Tributária provocará impactos negativos para a floricultura nacional
O texto da Reforma Tributária, recentemente aprovado na Câmara dos Deputados e atualmente em tramitação no Senado, tem como objetivo simplificar a legislação tributária. No entanto, a redação não ofereceu tratamento igualitário a todos os produtos da Horticultura (FFLV) e, como consequência, estima-se que o aumento da carga tributária para o setor de flores e plantas ornamentais será de quase 500%. O setor de Flores e Plantas Ornamentais gera mais de 272.000 empregos diretos, representando 1,17% dos empregos gerados pelo agronegócio brasileiro (CEPEA/ESALQ/USP), sendo o setor que mais emprega mulheres no segmento, com uma média de quase 50% de empregabilidade feminina, chegando a 63%, dependendo da região.
O Ibraflor - Instituto Brasileiro de Floricultura –defende a necessidade de uma reforma que simplifique o sistema tributário brasileiro, mas alerta que a redação atual representa um grande risco ao setor que tanto contribui na geração de renda, empregabilidade feminina e na fixação do homem no campo. “O não tratamento igualitário do setor da Horticultura (FFLV) causará grande impacto ao setor de Flores e Plantas Ornamentais, o que afetará a geração de emprego, desestruturando o setor, que ainda não se recuperou da pandemia “covid-19”. Além disso, anulará os benefícios esperados pela recém-criada política nacional de incentivo ao setor, aprovada em julho deste ano”, explicou William José de Wit, presidente do Ibraflor. No dia 25 de julho de 2023, a Lei nº 14.637 instituiu a Política Nacional de Incentivo à Cultura de Flores e de Plantas Ornamentais de Qualidade”, sendo uma das suas diretrizes, justamente, garantir “a sustentabilidade econômica e socioambiental da floricultura nacional. “As flores e plantas ornamentais são extremamente delicadas e altamente perecíveis, exigindo cuidados especiais para prolongar a sua durabilidade nas etapas de pós-colheita, logística e comercialização. Essa característica torna nosso produto altamente sensível às flutuações do mercado, exigindo uma rápida comercialização sem espaço para especulações, ao contrário de outros produtos agrícolas”, esclarece o presidente.
Desenvolvimento Econômico e Social
A flor, além de sua beleza e significado, também se revela como um poderoso instrumento de desenvolvimento social. Isso se evidencia ao observarmos os polos de floricultura que desempenham um papel crucial no fomento do desenvolvimento em todas as regiões do Brasil, com destaque para São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Goiás, Ceará, Bahia, Distrito Federal, Pernambuco, Espírito Santo, Pará e Paraíba. Os polos de floricultura são verdadeiros propulsores de crescimento econômico e social, fomentando a expansão do turismo, atraindo investimentos e fortalecendo a cadeia produtiva, desde os pequenos produtores até o comércio varejista.
Durante a pandemia da covid-19 ficou claro o quanto as flores e plantas ornamentais são propagadoras de bem-estar emocional e da qualidade do ambiente. Inclusive, diversos estudos comprovam o papel importante delas na melhora da qualidade do ar em ambientes fechados. Na defesa e preservação do setor, o Ibraflor tem atuado junto aos senadores, esclarecendo as singularidades do setor, seu protagonismo na empregabilidade feminina e desenvolvimento socioeconômico das regiões produtoras. “Reconhecemos a necessidade da reforma tributária, mas é essencial que alguns pontos sejam revistos para garantir um tratamento igualitário aos produtos da Horticultura (FFLV) face a sua especificidade. Os senadores estão sendo extremamente receptivos e sinalizando apoio ao pleito. Esperamos que esse apoio se concretize no texto a ser aprovado por eles”, acredita William José de Wit.
História Inspiradora
Um exemplo importante da empregabilidade feminina no Setor de Flores e Plantas Ornamentais vem da Paraíba, mais precisamente do sertão, do município de Pilões, a 140 km de João Pessoa, região na qual a temperatura média é de 18 graus centígrados. No final dos anos 1990, com o fechamento das usinas açucareiras, o desemprego assolou a região. Os homens buscaram trabalho nos centros maiores, mas as mulheres precisavam contribuir para o sustento familiar. Assim, um grupo inicial de 21 mulheres, com parcos conhecimentos de agricultura na época, pediu ao Sebrae, em 1999, orientação sobre o que plantar. O Sebrae detectou que as flores consumidas na Paraíba eram provenientes de três estados brasileiros: Ceará, Pernambuco e São Paulo, tomando-se caras para o consumidor final daquele Estado. Como nem tudo no Nordeste representa seca e aridez, foram também realizados estudos climáticos, de solos e de temperatura para verificar a viabilidade da produção de flores naquela região para abastecimento do mercado local.
Mas, faltava o dinheiro e nenhum banco se aventura a investir em quem já não tem crédito. Por meio de projeto junto ao Governo do Estado, pediram R$ 150.000,00 ao Banco Mundial. Receberam a metade - R$ 75 mil -, quase quatro anos depois. Assim, a Cooperativa Flores de Pilões começou a funcionar oficialmente em 2003 com a produção de flores mais simples, como crisântemos. Em 2007, com o sucesso do primeiro empreendimento, a Cooperativa adquiriu terras em Areias, município a apenas 4 km de Pilões, onde foi instalada uma segunda unidade, o que permitiu a expansão da produção e, agora, com flores mais sofisticadas, como gérberas, rosas e gipsofilas. Diante da expansão da produção em outro município, o nome mudou para Cooperativa Flores do Brejo. Em 2019, no ápice da Cooperativa, que agora se chama COFEP - Cooperativa dos Floricultores do Estado da Paraíba - para ser ainda mais abrangente -, eram 35 mulheres associadas, que, por empregarem seus filhos na produção e colheita, geravam mais de 70 empregos indiretos, aproximadamente.
No entanto, em 2020, quando da pandemia da covid-19, toda a produção foi perdida com o fechamento do comércio e proibição de festas e eventos que afetaram drasticamente o mercado floricultor. A solução foi passar quase três anos aproveitando as estruturas metálicas (estufas) para o plantio de hortaliças e viver com o pouco que se conseguia. Após as vacinas, no final do ano passado, elas decidiram retomar a produção de flores, mas o caixa estava zerado. Graças a um árduo trabalho junto a parlamentares para a concessão de emendas para o projeto e, novamente, ao Banco Mundial, elas conseguiram injetar R$ 500.000,00 na retomada da recuperação do plantio. Gradativamente, estão reativando as estufas e chamando de volta as trabalhadoras: 29 delas já conseguiram restabelecer o plantio em 6 estufas e a primeira colheita pós-pandemia está prevista para 26 outubro de 2023, curiosamente exatos 20 anos após a primeira vez em que as flores puderam ser colhidas naqueles campos paraibanos (outubro de 2003).
As mulheres empreendedoras da Paraíba estão indo além. Com as lições aprendidas na pandemia com as hortaliças, elas estão testando novos produtos: “Microverdes”, que são hortaliças, ervas aromáticas, condimentares e até mesmo espécies silvestres que são cultivadas e colhidas poucos dias após a semeadura, entre elas as flores comestíveis, conhecidas por pancs - plantas alimentícias não convencionais, pois o valor de venda agregado chega a representar três vezes mais ao mês, conforme relata Karla Rocha, cooperada por 10 anos e, hoje, consultora da COFEP. Karla informa que tudo ainda está em uma área “laboratório”, em teste de viabilidade. No entanto, no dia 14 de setembro último, a Cooperativa colheu as três primeiras caixas de flores comestíveis e as encaminharam para o chef gastronômico Houston Pina, muito conhecido no Estado, que se interessou pelo projeto. Ele garantiu a compra da primeira produção para usar em suas receitas e se prontificou a revender as flores comestíveis das próximas colheitas para outros estabelecimentos gastronômicos. “Não sabemos ainda se vai decolar, mas é um novo projeto que estamos à frente”, diz. No entanto, para quem está conhecendo a histórias dessas agricultoras empreendedoras, não resta a menor dúvida de que será um sucesso!