Passagem forçada de água: conheça a decisão do TJRS que garantiu que produtor rural finalizasse o ciclo de produção de arroz irrigado
Decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reconheceu o direito de passagem forçada de água permitindo que o produtor rural finalizasse a lavoura de arroz irrigado.
No caso concreto, o produtor rural ingressou com ação de constituição de passagem forçada de águas por entender que não havia outro meio natural de acesso à irrigação que não fosse por meio de valos de irrigação na propriedade de vizinho.
Após modificar a decisão de primeiro grau, que havia permitido ao autor acessar à água para irrigação da cultura de arroz através de valos/aquedutos, a 18ª Câmara Cível do TJRS, reformou a decisão de primeiro grau, proibindo o aproveitamento do recurso hídrico.
Na iminência de perda de safra pela vedação ao acesso à agua, o produtor rural apresentou embargos de declaração com efeitos infringentes à Câmara, tendo sido dada a medida liminar, sendo posteriormente confirmada pelo colegiado, para fins de ultimação de colheita.
A Câmara fundamentou que se tratava de caso com repercussão na “política agrícola de interesse econômico e social” disposta no Estatuto da Terra, somado ao fato do risco de perda da produção pelo estágio da cultura, remetendo para momento posterior a discussão sobre a pertinência do direito de passagem forçada.
Após a colheita, as partes fecharam acordo e colocaram fim ao litígio.
Atuaram em defesa do produtor rural os advogados Wellington Gabriel Barros e Nedal Thalji.
Fonte: TJRS, Agravo de Instrumento 5185805-96.2021.8.21.7000/RS, Rel. Des. João Moreno Pomar.
Confira a íntegra da decisão:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5185805-96.2021.8.21.7000/RS
RELATOR: DESEMBARGADOR JOAO MORENO POMAR
EMBARGANTE: DIARLE GUERRA PIAZER
RELATÓRIO
DIARLE GUERRA PIAZER opõe embargos de declaração contra o acórdão que deu provimento ao agravo de instrumento interposto por GUILHERME PORTUGUES MEZZOMO, em decisão assim ementada:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PASSAGEM FORÇADA. AÇÃO DE CONSTITUIÇÃO DE PASSAGEM DE ÁGUA, C/C OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. – TUTELA PROVISÓRIA. TUTELA DE URGÊNCIA. CONSTRUÇÃO DE AQUEDUTOS. REQUISITOS. NA SISTEMÁTICA DO CPC/15 AS TUTELAS DE URGÊNCIA CAUTELARES E DE ANTECIPAÇÃO DE DIREITO MATERIAL ESTÃO MATIZADAS SOB O REGRAMENTO DA TUTELA PROVISÓRIA; E QUE AGORA PODE FUNDAMENTAR-SE EM URGÊNCIA OU TÃO SOMENTE NA EVIDÊNCIA. OS PROVIMENTOS DE URGÊNCIA, CAUTELAR OU ANTECIPATÓRIO, SUBMETEM-SE AOS PRESSUPOSTOS DE PROBABILIDADE DO DIREITO E DO PERIGO DE DANO OU RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO. CIRCUNSTÂNCIA DOS AUTOS EM QUE AUSENTE OS REQUISITOS; E SE IMPÕE A REFORMA DA DECISÃO RECORRIDA.
RECURSO PROVIDO.
Nas razões sustenta que recebeu com surpresa a decisão da Corte no sentido de prover o agravo de instrumento da parte ré para reformar a decisão que havia concedido a tutela antecipada para realização das passagens dos aquedutos/valos, e com isso conseguir água para irrigar a sua plantação de arroz na área adjunta arrendada; que embora o acórdão tenha reformado a decisão de primeiro grau, não examinou a questão das lavouras plantadas, conforme abordado na decisão interlocutória; que o prejuízo disso se dá pelo fato de que o juízo de primeiro grau, sem respeitar o trânsito em julgado desta decisão ordenou o fechamento dos valos, cuja abertura se deu após a concessão da liminar, no prazo de 48 horas, sob pena de multa diária; que o acórdão afastou a probabilidade do direito alegado por entender existir “outras formas de viabilizar a passagem de água na propriedade” e que a utilização das estruturas existentes se trata de “mera comodidade”; que a decisão é obscura ou eivada de erro material porque não existe outra forma de passagem de água; que há um equívoco interpretativo na decisão porque o autor não pode desviar os recursos hídricos de forma artificial, em favor de local que não os recebe naturalmente; que junta novo laudo técnico (com Anotação de Responsabilidade Técnica) do engenheiro agrônomo ROGÉRIO DOS SANTOS COUTINHO, CREA/RS 125.599, dando conta da impossibilidade de construção de uma nova estação de tratamento de água junto ao Arroio Butuí, porque depende: de liberação de órgãos ambientais da outorga de licença de água (pelo DRH e pela FEPAM); da construção em si, e do projeto de eletrificação aprovado pela RGE; que o fechamento do valo trará solução de continuidade à irrigação, comprometendo o estágio atual da lavoura de arroz plantada; que o embargante não visa descumprir decisão judicial, o que sustenta é que não houve pronunciamento sobre o estágio atual das áreas plantadas, providência cautelar que deve ser apreciada para que se permita a colheita da lavoura de arroz sem prejuízo à produção de alimentos, perda irrecuperável; que não há tempo hábil para que seja feita para essa safra uma verdadeira obra faraônica pois necessitaria de liberação por parte dos órgãos ambientais, projeto de eletrificação, projeto de engenharia para construção das irrigadeiras, estradas e demais canais, sem falar dos elevadíssimos custos com material e mão-de-obra especializada; que caso mantida a decisão embargada, o agravado, ora embargante, perderá a lavoura plantada e não poderá mais plantar a área, tendo em vista que é inviável economicamente a construção de uma nova estação de bombeamento; que desde a inicial, o embargante vem invocando o recente paradigma julgado pelo STJ com relação ao direito de acesso às águas; que o acórdão sequer mencionou as razões pelas quais não estaria acolhendo e aplicando o precedente, em afronta ao artigo 489, §1º, do CPC que diz que não se considera fundamentada a decisão judicial que deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento; que junta dois vídeos elucidativos que demonstram a realidade dos acontecimentos e a dificuldade de construção de outro valo; que um dos vídeos trata justamente da situação equivocada aventada por este Corte, de que haveria “mera comodidade” no uso dos autuais canais, já que a construção de um novo valor condutor inviabiliza a produção agrícola atual; que esta plenamente provado que a decisão embargada, somada à ordem de primeiro grau que determinou o retorno do estado anterior das coisas em 48 horas, sob pena de multa diária, irão causar dano de impossível reparação porque acarretarão a perda da lavoura de arroz; que não se pode punir o embargante/autor que, durante a vigência da liminar que havia sido concedida, executou a obra e por via de consequência, estava desenvolvendo sua atividade agrícola; que o mais prudente seria aguardar-se resultado de eventual perícia para a modificação do estado atual das coisas em razão da complexidade das questões técnicas que se apresentam, o que iria ao encontro do princípio do quieta non movere e mais, a preservação desse estado anterior é o próprio cenário que se tinha e que foi alterado a manu militare pelo agravante; que não se negando a cumprir a medida liminar, o embargante requer que este relator suspenda os efeitos da decisão embargada até a colheita da lavoura de arroz noticiada; que caso não seja revertida a decisão em sede de julgamento dos declaratórios, o embargante informa que atenderá o comando da decisão judicial. Postula pelo acolhimento do recurso.
O recurso foi recebido com efeito suspensivo, para permitir ao embargante a continuidade do uso dos valos de irrigação existentes (Evento 29).
Foram apresentadas contrarrazões (Evento 34).
Vieram-me conclusos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Eminentes Colegas!
O recurso é tempestivo. Assim, analiso-o.
REVOGAÇÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA. PENDÊNCIA DE COLHEITA.
O Código de Processo ao tratar da responsabilidade por prejuízo que decorra da efetivação de tutela de urgência, assim dispõe:
Art. 302. Independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se:
I – a sentença lhe for desfavorável;
II – obtida liminarmente a tutela em caráter antecedente, não fornecer os meios necessários para a citação do requerido no prazo de 5 (cinco) dias;
III – ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese legal;
IV – o juiz acolher a alegação de decadência ou prescrição da pretensão do autor.
Parágrafo único. A indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida, sempre que possível.
Não há dúvida que em regra a consequência da concessão de liminar ou de sua suspensão corre por conta e risco do que delas se beneficiar (ou seja, arcará com os prejuízos que der causa ou que tiver).
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE COBRANÇA. Hipótese em que a autora deve ser ressarcida do prejuízo sofrido em razão de cumprimento de liminar que depois foi revogada. Impossibilidade de discussão sobre a responsabilidade do Município de Porto Alegre na presente ação. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70058790288, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Maria Rodrigues de Freitas Iserhard, Julgado em 18/03/2015)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ARRENDAMENTO MERCANTIL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE COM LIMINAR DEFERIDA E SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA POSTERIORMENTE JULGADA IMPROCEDENTE NO SEGUNDO GRAU, COM TRÂNSITO EM JULGADO. RESPONSABILIDADE CIVIL PROCESSUAL. DANOS MATERIAIS E MORAIS DECORRENTES DO CUMPRIMENTO DA LIMINAR QUE POSTERIORMENTE FOI CASSADA. Os danos materiais e morais resultantes do cumprimento de liminar posteriormente cassada por decisão que transitou em julgado são devidos pelo requerente da medida, sem que se indague da culpa. É a responsabilidade civil processual, onde apenas são necessários os requisitos do nexo causal e dano. Diante da revelia, os danos materiais são aqueles afirmados na inicial. Os danos morais são corrigidos pelo IGP-M, a partir da data do efetivo prejuízo, por analogia ao que consta na Súmula nº 43 do STJ. APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70003438165, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel de Borba Lucas, Julgado em 12/05/2005)
No entanto, não impede que medidas sejam tomadas para tutelar determinadas situações em que não se trata de mera consequência patrimonial e interesse das partes. Isso ocorre em despejo de instituições de ensino que não pode ocorrer em período de atividade escolar; e de instituições hospitalares, asilo ou repartições públicas, por exemplo, que gozam de prazos estendidos.
Na situação que envolve litígios em áreas rurais, há peculiaridade do direito envolvido que estabelece política agrícola de interesse econômico e social. Dispõe a Lei 4.504/64 (Estatuto da Terra):
Art. 1° Esta Lei regula os direitos e obrigações concernentes aos bens imóveis rurais, para os fins de execução da Reforma Agrária e promoção da Política Agrícola.
§ 1° Considera-se Reforma Agrária o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade.
§ 2º Entende-se por Política Agrícola o conjunto de providências de amparo à propriedade da terra, que se destinem a orientar, no interesse da economia rural, as atividades agropecuárias, seja no sentido de garantir-lhes o pleno emprego, seja no de harmonizá-las com o processo de industrialização do país.
No caso dos autos a ação de constituição de passagem forçada foi ajuizada em 21/06/2021; em 08/09/2021 foi deferida a tutela de urgência, permitindo ao autor a realização das passagens dos aquedutos/valos, para conseguir água para irrigar a sua plantação de arroz.
Em 21/09/2021 o réu interpôs agravo de instrumento contra aquela decisão; foi postergada a análise do pedido de efeito suspensivo; e em 01/12/2021 o recurso foi provido, para revogar a tutela de urgência deferida na origem.
Em 12/12/2021 o agravado opôs o presente recurso, sustentando que não se examinou a questão das lavouras já plantadas; e foi deferido o pedido de efeito suspensivo ao recurso, para permitir ao embargante a continuidade do uso dos valos de irrigação existentes.
Destarte, desde 08/09/2021 o autor procedeu à irrigação da lavoura, por força daquela decisão liminar; o laudo que instruiu o pedido indica que eventual interrupção da irrigação, no atual estágio da cultura, poderá ensejar a completa perda da produção; e restou demonstrado que não haveria tempo hábil, neste momento, para a solução das questões hídricas pelo embargante, sem prejuízo da safra em andamento.
Com efeito, o cumprimento ou a revogação de medidas de urgência envolvendo imóveis rurais deve preservar a colheita da safra.
Circunstância dos autos em que se impõe preservar a natureza da atividade rural e assegurar que a revogação da tutela de urgência produza efeitos somente após a colheita da safra em andamento.
Portanto, no ponto, o recurso merece acolhimento.
DECLARATÓRIOS. REQUISITOS.
Os embargos de declaração têm por pressuposto que se configure alguma das hipóteses elencadas no art. 1.022 do CPC/15 que assim dispõe sobre seu cabimento:
Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para:
I – esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;
II – suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento;
III – corrigir erro material.
Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que:
I – deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento;
II – incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1o.
Destarte, sem omissão (falta de decisão ou pronunciamento sobre questões suscitadas pelas partes); obscuridade (ausência de clareza ou deficiência de raciocínio lógico); contradição (verificação de assertivas inconciliáveis na motivação apresentada ou fundamento em choque com a conclusão); ou erro material (hipótese jurisprudencial que veio acolhida no NCPC) não se justifica a interposição de embargos declaratórios.
O recurso não se presta, assim, para inovação ou instar a reapreciação de matéria com enfrentamento destacado de dispositivos legais ou de argumentos que não sejam capazes de infirmar a conclusão, se o julgamento for claro, integral e congruente ao resolver a lide ou o incidente suscitado. Ademais, não é próprio ao prévio questionamento com vista a recurso aos órgãos superiores. O seu oferecimento com o propósito de impedir a preclusão do questionamento somente se justifica quando evidenciada omissão do acórdão – o que se afasta quando os argumentos recursais se esvaem subsumidos nos fundamentos do julgado.
Portanto, deduz-se que aquele que recorre fora das hipóteses previstas na lei incorre em manuseio indevido do recurso, ainda que tenha intenção expressa ou presumida de prequestionar. Neste sentido orientam os precedentes do e. STJ:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO. PREQUESTIONAMENTO DE NORMA CONSTITUCIONAL. OBJETIVO DE REDISCUTIR O MÉRITO DO JULGADO. INVIABILIDADE.
(…)
2. Embora a embargante mencione a existência de omissões, fica evidente o objetivo exclusivo de rediscutir o mérito do julgado, que se encontra devidamente motivado.
3. Os Embargos de Declaração, ante a ausência de omissão, obscuridade ou contradição no acórdão embargado, não constituem instrumento adequado ao prequestionamento com vistas à interposição de Recurso Extraordinário (EDcl no AgRg na Rcl 13.132/DF, Rel.Ministro Humberto Martins, Primeira Seção, DJe 7/10/2013; EDcl no MS 15.474/DF, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 23/8/2013; EDcl no REsp 1.272.827/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 2/8/2013).
4. Embargos de Declaração rejeitados.
(EDcl no REsp 1353826/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/02/2014, DJe 21/03/2014)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 211 DO STJ. APRECIAÇÃO DE TODAS AS QUESTÕES RELEVANTES DA LIDE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE AFRONTA AO ART. 535 DO CPC.
(…)
2. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido analisou todas as questões pertinentes para a solução da lide. A simples menção dos dispositivos legais, sem que seja esclarecida a pertinência do tema para o desfecho da lide, não obriga o julgador a examinar um a um os argumentos. Ademais, o fato de a decisão ser contrária aos interesses da parte recorrente não configura negativa de prestação jurisdicional.
(…)
6. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no AREsp 418.604/RS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 25/02/2014, DJe 14/03/2014)
AGRAVO REGIMENTAL. REVISÃO CONTRATUAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. EXPRESSA PACTUAÇÃO. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. MULTA MANTIDA.
1.- A jurisprudência desta Casa é pacífica ao proclamar que, se os fundamentos adotados bastam para justificar o concluído na decisão, o julgador não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos utilizados pela parte.
(…)
(AgRg no AREsp 138.553/SC, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 27/06/2012)
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ALEGADA CONTRADIÇÃO NO ARESTO QUE ENTENDE POR AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO E, AO MESMO TEMPO, REJEITA A VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 535, II, CPC. NÃO CARACTERIZAÇÃO.
(…)
2. É possível que o Tribunal a quo manifeste-se sobre todas as questões colocadas à sua apreciação, decidindo a lide em sua integralidade sem, contudo, manifestar-se sobre todos os dispositivos legais apontados pela parte então recorrente. Sabe-se que é pacífico nesta Corte o entendimento de que não está o juiz obrigado a examinar, um a um, os pretensos fundamentos das partes, nem todas as alegações que produzem; o importante é que indique o fundamento de sua conclusão, que lhe apoiou a convicção no decidir.
3. Embargos de declaração rejeitados.
(EDcl no AgRg no REsp 895.753/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/04/2009, DJe 15/05/2009)
Naquela mesma linha indicam os precedentes deste Tribunal de Justiça:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. TELEFONIA MÓVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. COBRANÇA APÓS CANCELAMENTO DOS SERVIÇOS. ALEGAÇÃO DE CONTRADIÇÃO NO V. ACÓRDÃO EMBARGADO. INOCORRÊNCIA. ENFRENTAMENTO DE TODAS AS QUESTÕES RELEVANTES AO DESENLACE DA LIDE. DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. PRETENSÃO DE REEXAME DA MATÉRIA DE MÉRITO. DESCABIMENTO. DESNECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO EXPRESSA ACERCA DE TODOS OS DISPOSITIVOS LEGAIS INVOCADOS. NÃO-PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DISPOSTOS NO ART. 535, INCISOS I E II, DO CPC. EMBARGOS OPOSTOS COM FINS DE PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DESACOLHIDOS. (Embargos de Declaração Nº 70057867392, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Celso Dal Pra, Julgado em 27/02/2014)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ERRO MATERIAL. OMISSÃO. PRETENSÃO DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. PREQUESTIONAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. Os embargos de declaração não se constituem instrumento hábil à rediscussão de matéria já debatida, decidida e fundamentada no julgado. No caso, não ocorreu erro material ou omissão, evidenciando que a parte pretende novo julgamento de questão já decidida. Assim, de rejeitam-se os embargos declaratórios, porque inservíveis para este desiderato. O acolhimento dos aclaratórios pressupõe a presença de pelo menos um dos pressupostos elencados no art. 535 do CPC. Inviabilidade de acolhimento de embargos declaratórios com o fim de prequestionamento. DESACOLHERAM OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. UNÂNIME. (Embargos de Declaração Nº 70057361479, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson José Gonzaga, Julgado em 28/11/2013)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS EM FACE DE DECISÃO MONOCRÁTICA PROLATADA EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA. INOVAÇÃO RECURSAL, REAPRECIAÇÃO DE MATÉRIA JULGADA E PREQUESTIONAMENTO. Os embargos de declaração destinam-se a corrigir obscuridade, contradição ou omissão de ponto que exigia pronunciamento, como dispõe taxativamente o art. 535 do CPC. Não merece ser acolhido o recurso que configura inovação recursal, reapreciação ou prequestionamento de matéria julgada, ainda que sobre fundamentos recursais subsumidos nos pronunciamentos do recurso. NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO. (Embargos de Declaração Nº 70056880305, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Moreno Pomar, Julgado em 11/10/2013)
No caso dos autos a parte embargante sustenta que recebeu com surpresa a decisão da Corte no sentido de prover o agravo de instrumento da parte ré para reformar a decisão que havia concedido a tutela antecipada para realização das passagens dos aquedutos/valos, e com isso conseguir água para irrigar a sua plantação de arroz na área adjunta arrendada; que o acórdão afastou a probabilidade do direito alegado por entender existir “outras formas de viabilizar a passagem de água na propriedade” e que a utilização das estruturas existentes se trata de “mera comodidade”; que a decisão é obscura ou eivada de erro material porque não existe outra forma de passagem de água; que há um equívoco interpretativo na decisão porque o autor não pode desviar os recursos hídricos de forma artificial, em favor de local que não os recebe naturalmente; que junta novo laudo técnico (com Anotação de Responsabilidade Técnica) do engenheiro agrônomo ROGÉRIO DOS SANTOS COUTINHO, CREA/RS 125.599, dando conta da impossibilidade de construção de uma nova estação de tratamento de água junto ao Arroio Butuí, porque depende: de liberação de órgãos ambientais da outorga de licença de água (pelo DRH e pela FEPAM); da construção em si, e do projeto de eletrificação aprovado pela RGE; que desde a inicial, o embargante vem invocando o recente paradigma julgado pelo STJ com relação ao direito de acesso às águas; que o acórdão sequer mencionou as razões pelas quais não estaria acolhendo e aplicando o precedente, em afronta ao artigo 489, §1º, do CPC que diz que não se considera fundamentada a decisão judicial que deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento; que junta dois vídeos elucidativos que demonstram a realidade dos acontecimentos e a dificuldade de construção de outro valo; que um dos vídeos trata justamente da situação equivocada aventada por este Corte, de que haveria “mera comodidade” no uso dos autuais canais, já que a construção de um novo valor condutor inviabiliza a produção agrícola atual; que não se pode punir o embargante/autor que, durante a vigência da liminar que havia sido concedida, executou a obra e por via de consequência, estava desenvolvendo sua atividade agrícola; que o mais prudente seria aguardar-se resultado de eventual perícia para a modificação do estado atual das coisas em razão da complexidade das questões técnicas que se apresentam, o que iria ao encontro do princípio do quieta non movere e mais, a preservação desse estado anterior é o próprio cenário que se tinha e que foi alterado a manu militare pelo agravante.
No entanto, a parte embargante busca mera reanálise do julgamento; e não há vício na decisão embargada. Conforme constou no acórdão embargado, não há probabilidade do direito alegado pelo autor, na hipótese em que tenha outras formas de viabilizar a passagem da água em sua propriedade, ainda que para isso tenha que realizar investimentos.
Assim a decisão recorrida evidencia que houve manifestação expressa sobre os fundamentos pelos quais se formou o convencimento e solucionou-se a lide sem obscuridade, ou mesmo omissão, contradição ou erro material; e não há motivação ao acolhimento dos embargos declaratórios.
Com efeito, os embargos de declaração cabem apenas para corrigir obscuridade, contradição, omissão de ponto que exigia pronunciamento ou para corrigir erro material, como dispõe o art. 1.022 do CPC.
Circunstância dos autos em que a parte pretende mera reanálise; e o recurso não atende aos requisitos da norma processual.
Portanto, o recurso não merece acolhimento.
Ante o exposto VOTO por ACOLHER EM PARTE o recurso para assegurar que a revogação da tutela de urgência produza efeitos somente após a colheita da safra em andamento.
EMENTA
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS EM FACE DE ACÓRDÃO. PASSAGEM FORÇADA. AÇÃO DE CONSTITUIÇÃO DE PASSAGEM DE ÁGUA, C/C OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. – REVOGAÇÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA. PENDÊNCIA DE COLHEITA. O CUMPRIMENTO OU A REVOGAÇÃO DE MEDIDAS DE URGÊNCIA ENVOLVENDO IMÓVEIS RURAIS DEVE PRESERVAR A COLHEITA DA SAFRA. CIRCUNSTÂNCIA DOS AUTOS EM QUE SE IMPÕE PRESERVAR A NATUREZA DA ATIVIDADE RURAL E ASSEGURAR QUE A REVOGAÇÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA PRODUZA EFEITOS SOMENTE APÓS A COLHEITA DA SAFRA EM ANDAMENTO. – DECLARATÓRIOS. REQUISITOS. OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CABEM APENAS PARA CORRIGIR OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO, OMISSÃO DE PONTO QUE EXIGIA PRONUNCIAMENTO OU PARA CORRIGIR ERRO MATERIAL. CIRCUNSTÂNCIA DOS AUTOS EM QUE A PARTE PRETENDE MERA REANÁLISE; E O RECURSO NÃO ATENDE AOS REQUISITOS DA NORMA PROCESSUAL.
RECURSO EM PARTE ACOLHIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul decidiu, por unanimidade, ACOLHER EM PARTE o recurso para assegurar que a revogação da tutela de urgência produza efeitos somente após a colheita da safra em andamento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de fevereiro de 2022.