Política e Clima: Os desafios do produtor da Argentina para finalizar 2019 e começar 2020

Publicado em 10/12/2019 17:00
Novo governo toma posse e setor já teme aumento das retenciones; competitividade pode ficar comprometida

A nova safra de soja da Argentina se desenvolve sobre uma série de incertezas, porém, duas delas preocupam mais os produtores locais neste final de 2019: o clima e a política. E para o início de 2020, as mudanças esperadas são bastate profundas, haja vistas que o novo presidente, Alberto Fernández, assumiu nesta terça-feira, 10 de dezembro, e traz como sua vice, Cristina Kirchner. 

A ex-presidente foi um grande problema para o agronegócio. A competitivida da agropecuária argentina foi severamente comprometida, alguns produtores vieram a falência e a carga tributária sobre o setor foi expressivamente elevada. E Fernández assume uma Argentina com sérios problemas econômicos, que já exigem cautela e preocupação dos produtores rurais. 

Mais do que isso, o novo presidente assume diante de problemas já sérios vividos no campo. O tempo seco provocou quebras nas safras de trigo e cevada do país, principalmente na região dos Pampas, e ambas as culturas são de extrema importância para a economia agrícola argentina, principalmente entre as exportações. 

"O mercado tem a visão do governo Fernández como um governo bastante instável, principalmente quando a história recente nos mostra o governo de Cristina Kirchner sendo extremamente danoso para a economia e para o sistema político da Argentina. Nada mudou com o Macri, que não tinha o apoio político para colocar em prática as reformas necessárias", explica o diretor da ARC Mercosul, Matheus Pereira. 

Ainda como explica Pereira, o mercado espera que as tarifas para a exportação do grão de soja in natura volte aos 30% ou fique acima disso, enquanto para milho e trigo podem voltar aos 22%. Confirmados estes números, a competitividade do produtor argentino ficaria bastante comprometida diante de seus principais concorrentes. 

"A preocupação se volta agora para a elevação tributária, se acontecerá ou não, e o mercado tem o indicativo de que a tributação deva aumentar porque o governo precisa arrecadar mais dinheiro, uma vez que o governo pegou uma administração com uma dívida multibilionária", diz. 

O andamento do mercado cambial é outro ponto de atenção do mercado. "Acreditamos que até meados do ano que vem, o peso deva se desvalorizar de 20% a 30%, a depender muito do tom que Fernández vai assumir. Isso é bom para o produtor que vai ter grão na mão, mas esse repasse chegará também aos insumos". explica o diretor da ARC. 

Caso isso se confirme, os produtores argentinos deverão optar por culturas de menor risco, de menor alavancagem, diante de um país em crise e com instabilidade financeira. "A soja se torna uma cultura mais barata para o cultivo 2020/21!", conclui. 

RETENCIONES x NOVO GOVERNO

E as exportações agrícolas são, de fato, importantes para a Argentina. Entre os planos do novo presidente está o de ampliá-las e, ao mesmo tempo, elevar as já conhecidas retenciones sobre elas. Entretanto, suas medidas podem já começar frustradas diante dessa oferta menor. 

A agência internacional de notícias Bloomberg citou como exemplo produtores de trigo que vêm sua produtividade cair cerca de 40%, com aproximadamente 70% de sua safra já comercializada, e com a taxação atual de quase 7%. A nova tarifa, portanto, não valerá, ao ser implementada, para esse percentual já vendido. 

Assim, como o Notícias Agrícolas já havia noticiado na ocasião da eleição de Alberto Fernández, os produtores argentinos avançam com sua comercialização, buscando evitar as novas retenciones, já que deverão ser mais altas. 

O gráfico a seguir, da Bloomberg com dados do Ministério da Agricultura da Argentina, mostram que os percentuais de soja, milho e trigo - em preto, rosa e amarelo, respectivamente - são maiores do que em anos anteriores. 

Dessa forma, de acordo com o economista-chefe da Bolsa de Buenos Aires, Agustin Tejeda, ouvido pela Bloomberg, as vendas externas de trigo e cevada devem render US$ 2,9 bilhões, contra os US$ 4 bilhões do ano comercial anterior. 

O ministro da Economia do novo governo, Martín Guzmán, já deixou claro que uma de suas prioridades será o pagamento da dívida pública, "gerando condições de pagamento com crescimento". No entanto, explica ainda que o país deverá adiar os pagamentos dos próximos dois anos, segundo uma notícia do jornal local La Nación. 

Guzmán deverá ser um dos mais jovens ministros a assumir a pasta no país e fala em um grande plano 'integral e flexível' para recuperar a economia da Argentina e, dessa forma, tratar das retenciones é inevitável. Em seu artigo para o La Nacional, Claudio Jacquelin deixa claro que essa deverá ser uma das medidas do político, mesmo que detalhes de suas ações ainda não sejam conhecidas. 

Martín Guzmán, ministro da Economia da Argentina - Foto: La Nacion

"Alertar sobre o aumento das retenciones nas exportações agrícolas parece inevitável como conseqüência da impossibilidade de obter financiamento, alinhado ao objetivo de evitar novos desequilíbrios nas contas públicas", diz o autor argentino.

Afinal, Guzmán e sua equipe já deixaram claro que "considera que o setor agrícola um dos mais dinâmicos e modernos da economia nacional, um dos mais tecnologicamente avançados e com importância estratégica, pois é gerador das moedas que a Argentina precisa para se desenvolver de maneira sustentável. Portanto, as retenções devem ser baseadas no desenvolvimento produtivo". 

Em seu discurso de posse, Alberto Fernández disse ainda que "o cooperativismo e a agricultura familiar serão pontos centrais". Reafirmou ainda um compromisso com a segurança alimentar citando a severa situação de fome e pobreza de parte expressiva da população argentina. 

CLIMA

Enquanto isso, as lavouras ainda sofrem nos campos da Argentina com a falta de chuvas e as temperaturas muito altas. Nesta terça-feira, o Serviço Nacional de Meteorologia do país (SNM) informou que as temperaturas continuarão a subir e nas regiões dos Pampas, passarão dos 40ºC.

"Altas pressões no sul do Brasil, pouca nebulosidade e ausência de frentes frias entrando no território nacional favorecerão o aumento gradual das temperaturas nesta semana", afirmou o SNM. A previsão é de que a partir desta quarta-feira (11) uma frente fria pode chegar, trazendo algum rápido alívio. 

Para Jacob Christy, trader da Andersons, Inc., em um vídeo postado pela consultoria, "ainda é muito, muito cedo, mas teremos que ficar de olho na previsão de chuvas na Argentina", ainda como noticiou a Bloomberg.

Nas últimas 24 horas, de acordo com informações apuradas pelo Commodity Weather group (CWG), as áreas de soja, milho e trigo estiveram secas e nenhum volume considerável de chuvas foi registrado. E para os próximos cinco dias, as previsões mostram que os acumulados não deverão passar de 75 mm apenas pontualmente. 

"Nos próximos 11 a 15 dias, algumas chuvas começam a chegar a Argentina, principalmente no Sudoeste e Norte, mas as áreas-chave de soja e milho no Centro da Argentina não deverão ser favorecidas", diz o CWG em seu reporte diário. Os mapas abaixo mostram as previsões para a América do Sul até o dia 24 de dezembro. 

Fonte: Commodity Weather Group

Com informações do La Nacion, Infocampo e Bloomberg

 

Por: Carla Mendes| Instagram@jornalistadasoja
Fonte: Notícias Agrícolas

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