Agricultores estão deixando a atividade, mas o agronegócio gera emprego (por MARCOS YANK)

Publicado em 20/03/2017 07:59
tERCEIRO ARTIGO DA SÉRIE "Agrofalácias" - O deste sábado, na Folha de S. Paulo, tratou do mito do "emprego rural"

Durante muitos anos, grandes volumes de recursos públicos foram investidos na falsa premissa de que seria possível expandir o emprego no setor rural brasileiro.

No terceiro artigo da série "agrofalácias", começo mostrando que décadas de projetos de colonização, desapropriações de terras e assentamentos não conseguiram conter o movimento contínuo de migração do campo para a cidade.

Desde 1995, 88 milhões de hectares foram adquiridos ou desapropriados para fins de reforma agrária no Brasil, área que equivale a 1,5 vez o território da França. Isso sem contar os gastos com infraestrutura, crédito, educação, assistência técnica e agroindustrialização de pequena escala. O Incra fala em mais de 9.000 assentamentos, que teriam beneficiado quase 1 milhão de famílias.

Mesmo sem estatísticas confiáveis, sabe-se que a produção resultante dessa imensa quantidade de assentamentos é irrelevante, se comparada à que resultou da fenomenal revolução tecnológica que ocorreu na agricultura comercial no mesmo período. A reforma agrária brasileira fracassou rotundamente no objetivo de garantir trabalho e renda oriundos da produção agropecuária.

Ocorre que as últimas quatro décadas foram marcadas pela dualidade. De um lado, a explosão da produção e da produtividade da agricultura comercial, que resultou da profissionalização do produtor, das inovações tropicais brasileiras e da crescente complexidade organizacional e de gestão dos sistemas agroindustriais. Do outro, um crescente esvaziamento populacional no campo, em razão do êxodo rural e da rápida urbanização do país.

Os pesquisadores Eliseu Alves e Daniela Rocha mostram que 87% do valor total da produção agropecuária brasileira se origina de 500 mil estabelecimentos rurais, que representam 11% dos 4,5 milhões de estabelecimentos rurais registrados no mais recente Censo Agropecuário. E um dado ainda mais impressionante: apenas 27 mil estabelecimentos respondem por 51% do valor da produção agropecuária brasileira.

Só que esse fenômeno não é exclusivo do Brasil: não há um único país no mundo que tenha conseguido conter o êxodo rural e a inevitável urbanização, mesmo aqueles que sempre subsidiaram maciçamente os seus agricultores, como os Estados Unidos, a Europa e o Japão, ou a China, neste momento. Curiosamente, a relação de menos de 15% dos agricultores responderem por 90% da produção é também observada nos EUA e na União Europeia.

Não está errado afirmar que 80% dos atuais produtores correm o risco de desaparecer nas próximas décadas. Metade desse contingente vive no Nordeste rural e é formada por famílias envelhecidas, jovens que abandonam o campo e uma renda média mensal familiar que não passa de meio salário mínimo. Nesse grupo, o que realmente segura essas famílias no campo não é a atividade agropecuária, mas as aposentadorias rurais e as transferências sociais. Ou seja, uma realidade instável e sem horizonte de continuidade.

Mas o curioso é que o emprego nos demais elos das cadeias do agronegócio hoje já ultrapassa o das propriedades rurais. E essas empresas reclamam muito da falta de mão de obra qualificada, da legislação trabalhista anacrônica que não atende às especificidades do setor e das interpretações ambíguas feitas por fiscais e juízes, que levam os empresários a querer evitar contratações.

Em suma, é preciso parar de aplicar os recursos em programas falidos e concentrá-los em políticas que realmente gerem renda e emprego. O que falta no agronegócio não é emprego, mas, sim, condições adequadas para empregar. É urgente reformar a lei trabalhista, de forma que o sucesso do agro brasileiro no mundo beneficie o maior número de brasileiros.

(*) Marcos Sawaya Jank é especialista em questões globais do agronegócio. Escreve na FOLHA DE S. PAULO aos sábados, a cada duas semanas.

Fonte: Folha de S. Paulo

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