O agronegócio e as crises interna e externa: Desafios e oportunidades, por Geraldo Barros

Publicado em 13/03/2017 10:19
Por Prof. Geraldo Barros, Professor Sênior da Esalq/USP e Coordenador Científico do Cepea

Há um grande interesse em nível mundial a respeito de como o agronegócio brasileiro vai reagir à crise interna pela qual o País vem passando. Quão dependente é o agronegócio do apoio do governo e como suportará as restrições fiscais que deverão perdurar por vários anos?  Outra questão que vem sendo posta refere-se ao impacto que uma possível desaceleração no crescimento da China teria sobre o agronegócio do Brasil. Tendo a China como principal destino de suas exportações, como o agronegócio brasileiro reagiria a uma queda de demanda desse país, com especial destaque para a soja?

Do lado fiscal, é importante esclarecer, antes de mais nada, que o apoio recebido pelo agronegócio não é expressivo o suficiente para que o setor venha a se ressentir significativamente do endurecimento fiscal, desde que sejam mantidos os modestos investimentos em ciência e tecnologia e as também parcimoniosas políticas nas áreas de gerenciamento de risco, mudanças climáticas, agricultura de baixo carbono, e as voltadas para aspectos sanitários, por exemplo. 

Depois da década de 1980, o grau de proteção e apoio público dado à agropecuária nacional caiu aos menores níveis mundiais. Um fator fundamental para o agronegócio, entretanto, é a infraestrutura – que não se inclui nas aplicações agrícolas no orçamento público, que demanda vultosos investimentos, para os quais o governo não conta com recursos. Aqui, a solução é o desenho de novos modelos envolvendo o setor privado e que superem os entraves que essas iniciativas têm enfrentado.

Quanto às mudanças no mercado externo, o agronegócio brasileiro deve ficar atento para as ameaças e oportunidades que devem emergir da nova configuração dos padrões de comércio mundial, principalmente as relacionadas ao reposicionamento ainda imprevisível dos Estados Unidos sob a administração Trump. Em relação à possível desaceleração da China, as expectativas são de que seja moderada, mantendo-se esse país como principal destino das exportações brasileiras. 

Ademais, o agronegócio tem-se mostrado resiliente às mudanças nas condições mercado. O setor opera numa perspectiva de longo prazo, mantendo o contínuo empenho na busca de produtividade e eficiência, o que tem garantido um crescimento sustentável ao longo de décadas, sem pressão importante sobre os seus preços relativos – e, portanto, sobre a inflação – no mercado interno. A tendência é a de que, havendo um crescimento razoável no mercado internacional, o setor mantenha-se viável, garantindo, ao mesmo tempo, o abastecimento nacional. Ou seja, a recessão tem atingido o setor, como regra, de forma suportável no curto prazo. Clima e ocorrências de pragas e doenças têm sido os fatores que mais ameaçam o setor. É ilustrativo o crescimento esperado na safra corrente. É claro, de qualquer forma, que as perspectivas atuais de alguma recuperação da economia nacional são bem-vindas para o agronegócio.

Nunca é demais destacar que o agronegócio tem papéis fundamentais para a sociedade brasileira, o que não ocorre nas economias mais desenvolvidas com as quais compete no mercado internacional. Por ser um país de renda média e com elevado grau de concentração de renda e pobreza, um agronegócio eficiente – que produza volumes crescentes a preços estáveis ou decrescentes, como é o caso do Brasil – é instrumento essencial para tornar eficazes as políticas distributivistas de transferência de renda e de salários. Não se pode deixar de lembrar, a propósito, que o índice de pobreza no meio rural é praticamente o dobro do observado no País como um todo, questão que deve estar como prioritária na agenda dos formuladores de política pública. Como incluir produtivamente em torno de 70% dos agricultores brasileiros? 

Para a sociedade como um todo, o importante é ter em conta que o governo distribui dinheiro e o agronegócio ajuda a transformar esse dinheiro em renda (capacidade de consumo). No Brasil, o agronegócio também representa fonte de 21% do PIB e de 21% do emprego, tendo um potencial não desprezível para ajudar na recuperação econômica do País. O setor é, ainda, supridor de imprescindíveis reservas internacionais. Mais do que oportunidades legítimas de ganhar dinheiro para os empreendedores, o agronegócio tem um papel social da mais alta relevância no Brasil.       

*O conteúdo deste artigo se refere à apresentação realizada no dia 23 de fevereiro pelo coordenador científico do Cepea, Geraldo Barros, na 93ª edição do Agricultural Outlook Forum (Panorama da Agricultura, em tradução livre), realizado pelo USDA (Ministério de Agricultura dos Estados Unidos). 

Por: Geraldo Barros
Fonte: Cepea

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