Renda no campo pode subir 8% este ano (graças ao cambio), mas cenário é outro, diz a FOLHA
Após meia década surfando em boas ondas, o agronegócio poderá passar por turbulências neste ano.
O setor provavelmente não sentirá os efeitos do agravamento da recessão como os demais da economia, mas o produtor que não fizer ajustes em gastos e levar as contas na ponta do lápis vai passar por maus momentos.
O cenário mudou radicalmente para o agronegócio. As influências vêm não só das incertezas políticas e econômicas que afetam o país, mas também do exterior.
Os preços das principais commodities estão em queda em dólar e uma reversão desse cenário não é provável, a menos que ainda haja uma catástrofe na safra 2015/16 da América do Sul.
A pressão nos preços internacionais vem de uma reposição de estoques mundiais de grãos. Além disso, o aumento das taxas de juros nos Estados Unidos e a valorização do dólar devem levar os fundos a migrar das commodities para outros ativos financeiros.
Internamente, os custos de produção aumentam. O dólar, que foi a mola propulsora do setor em 2015, pode servir de peso neste ano.
Crédito caro e escasso e clima adverso completam a lista dos problemas que geram uma grande indefinição para o setor, principalmente para a safra 2016/17.
A boa notícia vem da demanda por proteína, que continua em alta, e do câmbio desvalorizado, que aumenta os ganhos dos exportadores em reais e os preços no mercado doméstico. Essas circunstâncias tornam o setor um dos poucos com perspectiva favorável para 2016.
"É o que vai evitar um derretimento maior do PIB", afirma Fábio Silveira, diretor de pesquisa econômica da GO Associados. Ele estima crescimento entre 8% e 9% para a receita no campo em 2016.
Os analistas do Bradesco preveem um aumento ainda maior da renda agrícola neste ano, de 12%. Para o PIB do agronegócio, a expectativa é de crescimento de 2% em 2016, ante 2,2% em 2015.
Um crescimento entre 2% e 2,5% também é esperado pela Abag (Associação Brasileira de Agribusiness).
PROBLEMAS
Para Leonardo Sologuren, da consultoria Horizon, as condições de financiamento devem ser o principal desafio a ser enfrentado pelos produtores. Quem tiver de ir ao mercado pagará 20% de taxa e "é quase irracional produzir em um cenário como esse", diz.
O produtor capitalizado sobrevive, mas vai diminuir o apetite para produzir.
Os bancos vão pisar no freio no repasse de dinheiro, o que vai levar os produtores para as tradings, que também vão avaliar cada vez mais a saúde financeira do agricultor. "Acendeu a luz amarela, pois sem crédito a agricultura não roda", diz Sologuren.
Fabiana Alves, diretora de Rural Banking do Rabobank, banco voltado ao setor, não acredita em redução nos volumes liberados, mas afirma que as instituições devem ficar mais seletivas.
Com custos em alta e preços em dólar em queda, o principal conselho da especialista para o produtor não assistir a uma queda na renda é controlar custos. "É preciso negociar bem a compra de insumos e buscar ao máximo a sua eficiência", diz.
"Em 2016, o produtor deverá ter muita seriedade no caixa", afirma Luiz Cornacchioni, da Abag (Associação Brasileiro do Agronegócio).
Quem não sair da safra 2015/16 com finanças equilibradas vai se enrolar pois o crédito será escasso e caro, diz. Ele também prevê margens mais apertadas devido à queda das commodities –e não há sinais de recuperação.
Para os analistas da AgRural, será um ano bipolar, intercalando altas e baixas de preços. As altas poderão vir de um rali climático e compras de fundos de investimentos. Já os recuos de preços poderão vir da boa produtividade da safra 2015/16, até então prevista.
As incertezas econômicas e políticas no país também trazem novos agravantes para o agronegócio. Um deles é a logística, que terá investimentos travados em 2016.
O Brasil também voltará a ter a concorrência da Argentina, onde a mudança de presidente deverá melhorar o cenário do agronegócio. Além de serem bons no setor, os argentinos têm uma logística bem mais eficiente do que a brasileira, diz Cornacchioni.
Governo não aumentará para R$ 815 milhões os subsídios rurais em 2016
Decisão do CMN (Conselho Monetário Nacional) deverá fazer o governo evitar um gasto adicional de R$ 815 milhões para pagamento de subsídios deempréstimos para a safra agrícola em 2016.
Em reunião extraordinária nesta quinta (31), os diretores do Conselho, vinculado ao Ministério da Fazenda, decidiram não aumentar o valor previsto de desembolsos de créditos subsidiados para o Plano Safra 2015/2016, previstos em R$ 216 bilhões.
Essa possibilidade existia porque houve uma aumento em relação ao estimado na quantidade de recursos da Poupança Rural, de onde os bancos captam dinheiro para emprestar no Plano Safra. Como os bancos são obrigados a ofertar um percentual de 74% do dinheiro da Poupança Rural, haveria aumento do volume de recursos disponíveis para a linha subsidiada do Plano Safra.
O Conselho decidiu criar novo fator de cálculo para a captação do dinheiro da Poupança Rural que, na prática, vai manter a quantidade de recursos previstas para o Plano Safra igual. Assim, se os recursos do Plano Safra fossem aumentados, os gastos com subsídios poderiam chegar a R$ 815 milhões.
Nas linhas de crédito do Plano Safra, os agricultores pegam recursos com taxas de juros abaixo dos valores de mercado. O governo compensa o banco pelo pagamento mais baixo de juros com recursos do Tesouro, a chamada equalização.
Neste ano de 2015, o governo pagou ao Banco do Brasil pela equalização da safra agrícola R$ 6 bilhões. Não foi divulgada a estimativa de quanto seria pago em 2016.
A falta de pagamento de R$ 10 bilhões dos subsídios devidos ao Banco do Brasil em 2014 foi um dos motivos que levou o TCU (Tribunal de Contas da União) a recomendar ao Congresso a rejeição das contas de governo da presidente Dilma Rousseff de 2014.
O relator do caso no Congresso, senador Acir Gurgacz (PDT-RO), recomendou ao Congresso a aprovação das contas com ressalva, revendo a posição do TCU. A palavra final do Congresso deverá ocorrer em 2016.
Insumos mais caros podem limitar tecnologia no agronegócio
O produtor rural deve enfrentar aumento de custos com compra de insumos, o que pode limitar a aplicação de tecnologia no campo.
Os preços de defensivos e fertilizantes são atrelados ao dólar, que em 2015 subiu de forma mais significativa no segundo semestre, depois de a maioria dos agricultores terem comprado sua matéria-prima. Será em 2016 que a conta virá mais alta. Além do preço mais elevado dos produtos, o crédito será mais caro e escasso.
Para Eduardo Daher, diretor-executivo da Andef (Associação Nacional de Defesa Vegetal), as vendas de defensivos devem apresentar comportamento semelhante ao visto em 2015. O volume de vendas do setor deve cair 5% em 2015, influenciado pelo atraso na liberação do crédito e pela menor ocorrência de chuvas, que reduz a demanda por fungicidas.
Para as multinacionais do setor, que faturam em dólar, a queda nas receitas deve chegar a 20% no ano passado. Para 2016, as incertezas políticas e econômicas também devem frear os investimentos.
"Ainda há positivismo no agronegócio. A situação do setor é muito diferente dos outros. Mas o produtor está com receio como todo mundo", afirma Daher.
Para Carlos Florence, diretor da AMA (Associação dos Misturadores de Adubos do Brasil), a relação de troca ainda é favorável ao agricultor. Os preços dos fertilizantes, diz, têm queda no mercado internacional, praticamente compensando a alta do dólar.
Para 2016, a expectativa também é de preços controlados, devido à queda no preço do petróleo –os fertilizantes fazem parte da cadeia petroquímica.
O patamar mais baixo do valor do óleo também deve trazer alívio a um outro importante componente de custos: o óleo diesel.
"Não há espaço para subir os preços do diesel, que no Brasil já está 35% acima da cotação internacional", diz Fábio Silveira, da GO Associados.
Na safra 2015/16, as vendas de fertilizantes devem cair entre 6% e 7%, segundo Florence. "Boa parte dos agricultores tinha alguma coisa em estoque."
Agronegócio segue ganhando relevância nas exportações do Brasil
A expressão "fiel da balança" é usada para definir aquele que decide, que é prioridade ou o mais confiável. Quando o assunto é a balança comercial brasileira, ela cai muito bem às commodities.
Mesmo com o preço de todos os produtos agropecuários mais vendidos pelo Brasil em queda na comparação com o mesmo período do ano passado, o agronegócio continua aumentando a sua participação nas exportações.
No primeiro semestre deste ano, o setor foi responsável por 46% das receitas com as vendas externas. Em 2014, o percentual foi de 43%.
Os dados consideram o agrupamento de produtos utilizado pelo Ministério da Agricultura para definir agronegócio, incluindo a celulose.
Os números não refletem apenas méritos do setor, mas também um desempenho sofrível das exportações de produtos industrializados, cujos embarques caíram 8% no primeiro semestre.
O resultado reflete também a crise no mercado de minério de ferro, que perdeu o posto de principal item da pauta exportadora para a soja.
O complexo soja (grãos, farelo e óleo) respondeu por 16% das exportações brasileiras no primeiro semestre, mesmo com a queda de aproximadamente 30% nos preços em relação a 2014.
Neste ano, 6 dos 10 principais itens da pauta de exportação brasileira são agropecuários: soja, derivados de soja, carne de frango, café, açúcar e carne bovina. Eles responderam por 27% das receitas externas. Considerando a celulose, também no grupo dos 10 mais exportados, essa participação vai a 30%.
Uma análise de longo prazo mostra como esse setor vem ganhando relevância: há cinco anos, os seis itens agropecuários mais exportados respondiam por 24% do total. No primeiro semestre de 2005, eles foram apenas 8%.
Não por acaso, o setor deu um salto em produtividade nos últimos 15 anos, o que lhe garantiu posição de destaque no comércio global de matérias-primas.
No caso da soja, carro-chefe das exportações brasileiras, a produção subiu de 2,25 sacas por hectare, na safra 2004/05, para 3,02 estimados pela Conab (Companha Nacional de Abastecimento) para a safra atual, em média.
PESO NA ECONOMIA
Apesar da relevância cada vez maior para a balança comercial e, como consequência, para o balanço de pagamentos do país, a agropecuária tem uma participação pouco relevante no PIB (Produto Interno Bruto) calculado pelo IBGE. No ano ano passado, foi de 4,8%, com a geração de R$ 262 bilhões.
Esse valor corresponde apenas às atividades primárias do setor, ou seja, tudo o que foi produzido "da porteira para dentro". Exclui, por exemplo, os setores de insumos, como adubos, fertilizantes e agroquímicos, a agroindústria e a distribuição.
Considerando toda a cadeia, desde a produção primária até a distribuição, a participação do agronegócio na economia ultrapassa 20%. O cálculo do PIB agropecuário é feito pelo Cepea (Centro de Estudos em Economia Aplicada, da Esalq/USP) e considera a evolução do volume produzido e dos preços, já descontada a inflação.
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FIEL DA BALANÇA
46% foi a participação do agronegócio nas exportações no primeiro semestre
16% é quanto o complexo soja representa nas receitas do país com as vendas externas
6 dos 10 principais itens da pauta exportadora brasileira são agropecuários.
Exportar café em cápsula é exemplo para agregar valor e manter lucros
O ciclo de alta das commodities chegou ao fim. Para manter a rentabilidade, o setor será obrigado a agregar mais valor à produção. O jargão econômico, que já virou clichê quando o assunto é exportação, tornou-se prioridade em algumas lavouras e indústrias do país.
O café é um dos casos mais emblemáticos nesse tema. O Brasil é o maior produtor e exportador de café verde (cru, em grãos) do mundo, mas vende pouco ao exterior o produto torrado e moído, de maior valor, que representa cerca de 10% dos embarques.
Ao mesmo tempo, o país quadruplicou as importações nos últimos cinco anos, devido às compras de café em cápsula. No ano passado, essas importações somaram US$ 60 milhões. Só neste primeiro semestre, foram US$ 36 milhões, alta de 57%.
O mesmo café que sai do Brasil em grãos com destino à Europa muitas vezes retorna ao país em cápsulas, com um valor muito superior –apropriado inteiramente pelas indústrias estrangeiras.
Algumas iniciativas, no entanto, indicam que o país pode virar o jogo. Hoje, mais de 60 empresas vendem cápsulas de café produzidas no Brasil –nesses casos, as indústrias terceirizam o encapsulamento para uma empresa especializada, europeia. Há um ano, "eram cinco ou seis", afirma Nathan Herszkowicz, diretor-executivo da Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café).
A grande mudança deve acontecer em 2016, quando três grandes fábricas de cápsulas estarão em operação.
Em Montes Claros (MG), Nestlé e 3 Corações constroem unidades onde serão produzidas monodoses de café. A terceira unidade será no Espírito Santo, da Wine.com.br, empresa de comércio eletrônico de bebidas que entrou no setor neste ano, com a aquisição da suíça Mocoffee.
A expectativa é que as cápsulas não atendam apenas o mercado interno, mas sejam também exportadas.
"Com essas três fábricas, vamos iniciar um ciclo novo mais consistente de exportação de café torrado e moído", acredita Herszkowicz.
Na exportação de café verde, também é visível o esforço para elevar a rentabilidade. No primeiro semestre, os cafés diferenciados representaram 25% do volume total exportado pelo país.
Fazem parte desse grupo grãos com qualidade superior, certificação de boas práticas de sustentabilidade e preço de venda no mínimo 25% superior à média.
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O Brasil é o maior exportador mundial de café cru, mas, segundo em consumo, importa muitas cápsulas |
AO GOSTO DO FREGUÊS
Os exportadores de frango são pioneiros nesse negócio. Com cortes ao gosto do freguês, o Brasil conquistou mercados mais sofisticados, como o Japão, que aprecia o "kakugiri" (empanado feito de forma diferenciada para os japoneses) e o "middle joint", feito de metade da asa.
Os brasileiros também ganharam espaço nos países árabes, que só compram a carne se o frango tiver sido abatido de acordo com os princípios islâmicos. Mais de 30% dos embarques de carne de frango do Brasil, maior exportador mundial, vão para a Arábia Saudita e o Japão.
Na carne suína, cortes especiais até então exclusivos da bovina –como picanha e filé mignon– ajudaram a reduzir a rejeição a essa proteína e elevaram o consumo per capita, hoje em torno de 14 quilos por ano.
Já nos bovinos, chegou a hora das "butiques". Mais preocupado com a saúde e com a qualidade dos alimentos, o consumidor começa a trocar a quantidade por porções menores e de valor superior. Frigoríficos e varejo se aproveitam do momento com lojas especializadas e atendimento personalizado.
Alguns investem em marca, o que há pouco tempo parecia inviável para um produto "in natura". São os casos de Friboi, da JBS, e de Bassi, que pertence à Marfrig.
Mas ainda há um longo caminho a percorrer. "O Brasil é líder na exportação de muitos produtos agrícolas, mas é o quarto maior exportador de alimentos. Precisamos agregar mais valor", afirma Francisco Turra, presidente da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal).
"Espanha e Itália, por exemplo, produzem menos, mas exportam produtos de altíssimo valor agregado", afirma Turra, lembrando dos famosos presuntos pata negra e de Parma.
Com novos hábitos, alimento orgânico ignora crise e segue em expansão
Hábitos de alimentação mais saudáveis levaram as vendas de produtos orgânicos a um crescimento de dois dígitos nos últimos anos.
Em 2015, diante de uma grave crise econômica e de uma inflação que encolheu a renda real, era de se esperar que esses produtos, em geral mais caros do que os tradicionais, reduzissem o seu ritmo de expansão. Mas não é o que ocorre no país.
Após uma alta de 30% no faturamento em 2014, que atingiu R$ 2 bilhões, o setor deve fechar este ano com R$ 2,5 bilhões em receitas.
Para quem faz parte do mercado, não se trata de uma surpresa. "O segmento de orgânicos no mundo sempre cresceu em tempos de crise. Em 2008 e 2009, nos EUA e na Europa, não foi diferente", diz Ming Liu, coordenador do Organics Brasil, que reúne os exportadores do setor.
Ele lembra que, em momentos de dificuldade financeira, a tendência é o consumidor migrar para produtos mais baratos, e reduzir a fidelidade à marca. "No caso dos orgânicos, a marca sempre foi secundária. A procura é por produtos com garantia de alimento seguro e que fazem bem à saúde", acrescenta.
O diretor comercial da Korin Agroindustrial, Edson Shiguemoto, concorda. "Historicamente, crescemos mais em anos de crise", afirma. A situação econômica não abala a empresa, que investe R$ 5 milhões na ampliação da capacidade de abate de aves, seu carro-chefe. De 18 mil aves por dia atualmente, a Korin passará para 40 mil abates diários em 2016.
Segundo a Apas (Associação Paulista de Supermercados), retirar produtos do carrinho é o último passo adotado pelos consumidores durante uma crise financeira.
Antes de chegar a essa etapa, o cliente busca pontos de vendas mais baratos; faz compras em determinado período do mês; opta por diferentes tipos de embalagens (com mais produtos a um preço menor) e troca marcas convencionais por mais baratas.
"Diante da atual situação financeira, muitas pessoas estão trocando as marcas de alguns produtos, como os de limpeza, para manter os hábitos alimentares adquiridos no período em que a economia estava em alta", diz Fernando Henrique de Cerello Costa, comprador comercial do Pão de Açúcar.
Pelo menos no que diz respeito aos orgânicos, os novos hábitos parecem preservados. Enquanto as vendas dos produtos tradicionais seguem estáveis neste ano, a comercialização de orgânicos teve aumento de até 13% –caso de itens de mercearia salgada, segundo pesquisa da Apas.
Segundo a associação, para 32% dos consumidores saúde e qualidade de vida são as maiores preocupações.
REGULAMENTAÇÃO
Apesar dos avanços recentes, o Brasil ainda precisa percorrer um longo caminho até chegar ao estágio de mercados maduros. Uma das explicações para esse atraso é a regulamentação, que é recente no Brasil, de 2011.
"Nos EUA, esse processo ocorreu em 2001 e, até 2008, os orgânicos eram considerados nicho de mercado. Hoje, 78% dos americanos já consumiram orgânicos", diz Ming. Segundo ele, a partir da regulamentação, o mercado tende a evoluir de forma significativa, devido à entrada de grandes corporações.
O mercado global de orgânicos movimenta cerca de US$ 72 bilhões por ano, segundo a empresa de pesquisa Organic Monitor. Os EUA lideram em receita, seguidos por Alemanha e França.
Fazenda vende laranja pela internet; conveniência eleva valor da fruta
Em agosto de 2013, a empresária Alessandra Sodré ficou desesperada ao ver laranjas dos 150 mil pés da propriedade de sua família, em Sorocaba (SP), no chão. A indústria se recusou a comprá-las.
"Pedi autorização para o meu pai para encontrar uma outra forma de vender as laranjas. Decidi colocar um anúncio no Facebook", conta. "Ofereci laranjas fresquinhas da fazenda, em sacos de 27 quilos, por R$ 35. No primeiro dia, recebi 20 pedidos."
O ágio era alto em comparação com o valor que a família estava acostumada a receber. Hoje, dois anos depois, a indústria paga cerca de R$ 15 por um saco de 40 quilos, segundo Sodré.
Ela se animou com o negócio. Aceitava todas as encomendas que apareciam e passou a levar de Sorocaba para São Paulo, diariamente, sacos de laranja em seu próprio veículo. "Depois de um mês, contratei um motorista e ele começou a fazer as entregas para mim", afirma.
O crescimento da procura pelas laranjas da fazenda levou a uma profissionalização do negócio no final de 2014, dando origem à Laranjas Online. "Até então, eu recolhia todos os pedidos pelo celular. Agora, fazemos tudo pela internet", afirma.
A Laranjas Online tem hoje cerca de 600 clientes fixos por mês, todos residenciais. Vende sacos de três, cinco, dez e 20 quilos de laranja. O maior é vendido a R$ 30 –o valor é quatro vezes o que seria pago pela indústria (R$ 15 por 40 quilos)
Mas o que sai da fazenda direto para a casa ainda representa apenas 10% da produção total da propriedade. O restante continua sendo oferecido à indústria.
É uma forma, no entanto, de agregar valor ao produto, não só pela conveniência da entrega, mas também pelo diferencial da fruta. "O nosso principal atrativo é o frescor da fruta. Em três dias, no máximo, ela sai do pé e chega na casa do cliente", afirma.
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COMPARAÇÃO
R$ 30 é o valor de um saco de 20 quilos de laranja pelo delivery on-line
R$ 15 é quanto a indústria paga pelo dobro (um saco de 40 quilos de laranja) ao produtor.
Agricultura inicia nova fase com lavoura, pecuária e floresta integradas
A agricultura brasileira começa viver a terceira revolução. A primeira foi a chegada do plantio direto nos anos 1970. O produtor teve seus custos diminuídos e deixou de agredir o solo anualmente com a remoção da terra.
A segunda foi a adoção do plantio de milho no inverno, a chamada safrinha. Criou-se uma renda para um período em que boa parte da terra ficava sem cultivo.
Agora o país adota a terceira revolução, constituída por uma integração entre lavoura, pecuária e floresta.
"É uma otimização do uso dos ativos que o produtor têm", diz Paulo Herrmann, presidente da John Deere e entusiasta dessa nova fase.
O processo ainda está no começo e exige investimentos, mas quem já o adota sente os efeitos na renda.
Quem está na lavoura terá de aprender a ser pecuarista. Já os pecuaristas também não terão uma vida fácil ao ter de conviver com os desafios da produção de grãos.
Cresce ainda mais a dificuldade para os que incorporarem floresta na integração.
O resultado, no entanto, compensa, segundo Flávio Wruck, da Embrapa, empresa que tem conduzido as pesquisas nessa nova fase da agricultura brasileira.
Jorge Pires foi um que, pecuarista, se lançou na produção de grãos. Está promovendo uma revolução na fazenda Rio do Sangue, em Brasnorte (MT). Os desafios são grandes, a começar pelos cem quilômetros de estradas da propriedade. Onde antes passavam só bois, agora passam também colheitadeiras de grande porte, que exigem estradas planas e conservadas.
A integração traz novos horizontes, diz Pires. Antes com um olhar apenas voltado para o gado, ele tem de se preocupar com a produção de grãos, armazenagem, trabalhadores com um perfil mais qualificado e até a industrialização da ração, grãos produzidos na própria fazenda.
Lycurgo Iran Nora, consultor da fazenda, diz que a utilização da própria matéria-prima nesse processo evita o passeio de grãos saindo da propriedade e o de outros insumos entrando para a alimentação do gado.
José Constantini, da fazenda Malanda, também um pecuarista da região de Brasnorte que aderiu à lavoura, diz que esse novo sistema permitiu um ganho de produtividade tanto na pecuária como na lavoura. Hoje produz o dobro de há três anos, diz ele.
"Além do aumento de produtividade, esse novo sistema traz fluxo de caixa."
Agora nas duas atividades, Pires avalia que o pecuarista é estritamente tradicional. Sem endividamento, mas com pouco avanço na atividade. Já a agricultura tem um ritmo dinâmico, até pela disponibilidade de mais equipamentos para a atividade.
Ele alerta, no entanto, para o fato de o produtor precisa investir em um projeto empresarial que seja rentável, sustentável e social. "O produtor precisa estar o mais próximo possível da eficiência e da competitividade."
TÉCNICA
Para Wruck, o ideal é o produtor inicialmente desenvolver essa nova atividade em pequenas áreas, para aprender a técnica. Os custos iniciais dessa integração podem superar R$ 2.000 por hectare, dependendo da terra.
Nora destaca o avanço que a pecuária teve na genética e no controle sanitário. Mas a alimentação é essencial para o desenvolvimento do gado.
E esse sistema desenvolve bem a parte da alimentação, permitindo, inclusive, que a ocupação da pastagem intensiva suba de apenas 1,2 gado por hectare para 7 nesse novo sistema de integração.
"Entramos na fase do boi safrinha, cuja produtividade pode aumentar próximo de 14 arrobas por hectare, dependendo do nível tecnológico da fazenda", diz Wruck.
Para Herrmann, "agora podemos fazer duas safras de grãos e uma de boi [ao ano]".
Mas investir em algumas regiões ainda exige coragem. Gargalos que poderiam ser resolvidos de maneira simples se arrastam por anos.
Pires cita a dificuldade na obtenção de energia elétrica, o que facilitaria a secagem de grãos e até a industrialização na fazenda.
Duas linhas de alta tensão passam sobre a fazenda, mas ele ainda não tem acesso a essa energia.