Protesto de caminhoneiros afeta fluxo de mercadorias, exportações e colheita de soja

Publicado em 24/02/2015 18:38

Por Gustavo Bonato e Marcelo Teixeira

SINOP/SÃO PAULO (Reuters) - Os protestos de caminhoneiros em importantes rodovias do país se espalharam nesta terça-feira, sétimo dia de manifestação, chegando ao Estado de São Paulo e restringindo a oferta de combustíveis e matérias-primas para a indústria de alimentos em diversos Estados e impactando a colheita e a exportação de produtos chaves do país, como a soja.

Postos e distribuidoras de combustíveis no interior do país, bem como indústrias de alimentos, como a BRF, estão sendo diretamente afetados pelos bloqueios dos caminhoneiros, que reivindicam menores custos com combustível e pagamento de impostos.

As manifestações, além de interromperem o transporte interno de mercadorias, estão impactando a chegada de produtos de exportação aos portos, com reflexo no mercado externo. Os contratos futuros da soja fecharam em alta de mais de 1 por cento nesta terça-feira na bolsa de Chicago, referência internacional para os preços da commodity, com operadores preocupados com a oferta do Brasil, líder global na exportação do grão em 2014.

No início da tarde, manifestantes bloquearam o acesso e a saída no porto de Santos, o principal do país e o mais importante para a exportação de soja, café, açúcar e suco de laranja do país, além de produtos manufaturados.

A ALL, maior operador ferroviário do país, informou que a paralisação de caminhoneiros está afetando as operações da empresa, devido à falta de produtos nos terminais.

Os protestos se espalharam nesta terça-feira para cerca de 70 pontos em estradas federais, em seis Estados (Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Minas Gerais), segundo o último boletim Polícia Rodoviária. Mas há protestos também em rodovias estaduais, como no caso da Anchieta, que liga a Baixada Santista à região metropolitana de São Paulo.

Enquanto isso, a Justiça determinou a liberação de estradas federais bloqueadas por caminhoneiros no Rio Grande do Sul e Minas Gerais, informou a Advocacia-Geral da União nesta terça-feira.

As decisões pelo desbloqueio das estradas em Minas e no Rio Grande do Sul são as primeiras obtidas pela AGU, órgão responsável por defender os interesses do governo federal, que entrou com ações na Justiça para desbloquear rodovias em sete Estados.

Os protestos ocorrem em um momento em que o país vive um momento complicado, em meio ao escândalo de corrupção em sua maior empresa estatal, a Petrobras.

Uma das principais reivindicações dos caminhoneiros é a redução do preço do diesel, que sofreu elevação no fim do ano passado, após a Petrobras sofrer anos com a defasagem entre os preços internos e externos dos combustíveis.

COLHEITA AFETADA

A colheita de soja em diversas fazendas do norte de Mato Grosso, maior produtor de grãos do Brasil, foi paralisada nesta terça-feira, em um momento que seria de trabalhos intensos, devido à falta de diesel para abastecer o maquinário, em uma das consequências mais visíveis dos bloqueios nas estradas do Estado.

Há risco de perdas de parte da safra em função da paralisação dos trabalhos no campo, já que as chuvas previstas para o fim da semana poderão estragar os grãos maduros que restarem nas lavouras.

Os protestos de caminhoneiros afetam também o fluxo de soja em um momento em que o mercado internacional aguarda a oferta brasileira. A situação é preocupante também porque, antes do início dos protestos, a colheita já estava atrasada.

"Podemos perder parte da colheita... Sem diesel não se faz nada em propriedade nenhuma", disse nesta terça-feira à Reuters o presidente do Sindicato Rural de Sinop (MT), Antônio Galvan, que já recebeu relatos de paralisação em diversas lavouras na região.

A região do médio-norte concentra cerca de um terço da produção de soja de Mato Grosso.

A BR-163, um dos alvos dos protestos, responde por 70 por cento do escoamento da produção agrícola de Mato Grosso. A rodovia também é a única rota de abastecimento de diesel e outros insumos para os municípios da região.

O trânsito de veículos de carga está totalmente interrompido desde o final de semana em diversos pontos da estrada por empresários do setor de transporte e caminhoneiros que reclamam também do baixo preço recebido pelo frete.

O produtor João Marcos Bustamante pretendia colher 50 hectares nesta terça, mas não terá diesel para movimentar as máquinas.

"Nas distribuidoras não tem diesel. Vou ver se consigo um pouco no posto", disse ele, ressaltando que diversas outras fazendas vizinhas, no município de Santa Carmem, no Mato Grosso, também estão paradas.

Outro setor bastante prejudicado é a avicultura, na qual o Brasil tem destaque internacional, liderando as exportações de carne de frango.

Duas fábricas da empresa de alimentos BRF, maior produtora de carne de aves do Brasil, interromperam o processamento por falta de matéria-prima, devido aos protestos de caminhoneiros que atingem o Estado, informou a empresa na segunda-feira. As unidade em Francisco Beltrão e Dois Vizinhos continuavam paradas.

RESTABELECIMENTO DEMORADO

Um empresário do setor de combustíveis de Sinop (MT) disse que, mesmo que as estradas sejam liberadas nesta terça, demoraria pelo menos quatro dias para que o diesel começasse a chegar na cidade.

"Só começaria a amenizar o problema no sábado", relatou Jonas de Paula, proprietário de um grande posto e atacadista de combustíveis de Sinop.

A empresa dele tinha, nesta terça, pedidos não atendidos para 800 mil litros de diesel.

Até sábado, as encomendas de diesel não atendidas deverão chegar a 1,2 milhão de litros, disse. O volume equivale a uma semana de vendas da empresa, que tem 17 caminhões tanque parados nos bloqueios, tentando sair de Mato Grosso para buscar diesel nos fornecedores.

A escassez de combustíveis também afeta o Estado do Paraná, o segundo produtor de soja do Brasil. Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais também enfrentaram problemas em alguns postos de abastecimento, segundo o sindicato nacional dos distribuidores de combustíveis.

(Reportagem adicional de Roberto Samora, Alberto Alerigi Jr. e Eduardo Simões)

Fonte: Reuters

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