NOTA DE FALECIMENTO – Crédito Agrícola, por Eduardo Lima Porto
NOTA DE FALECIMENTO – Crédito Agrícola
O Crédito Agrícola estava ameaçado, terminou sendo fulminado e levadoà morte pelo STJ.
O torpor setorial tem sido tamanho que a morte ocorreu sem maiores repercussões. Será que a importância do Crédito Agrícola não mereceria destaque ou pelo menos uma homenagem póstuma?
Sempre tivegrande consideração pelo Crédito Agrícola. Sou autor de uma frase que vem sendo repetida há tempos: “O Crédito é o segundo insumo mais importante da Agricultura. O primeiro é a Água”.
Reconheço a importância fundamental do Crédito Agrícola no desenvolvimento econômico brasileiro dos últimos anose lamento muitíssimo pela enorme quantidade de produtores rurais que ficarão desassistidos daqui para frente.
A causa mortis do Crédito Agrícola deve ser atribuída diretamente à sucessão de intervenções iatrogênicas do Judiciário patrocinadas pela indústria dos honorários. No mérito, há que se reconhecer também a contribuição decisiva de uma insólita associação formada pelos políticos emprenhadores de orelhas e alguns acéfalos que se intitulam “defensores do Agro”, sem os quais o fatídico destino não teria ocorrido.
A vanguarda do atraso vive momentos de êxtase.
Teses jurídicas impregnadas de argumentos falaciosos na defesa da ineficiência gerencial e da ganância desenfreada estão sendo cristalizadas de forma jurisprudencial.
A história precisa ficar muito bem registrada para que não se incorra no risco do esquecimento.
O caos no setor agrícola virá a cavalo estribado na absoluta insegurança jurídica.
Não é uma profecia. Trata-se de uma triste constatação de quem aprendeu a fazer contas e entendeu cedo o significado da terceira Lei de Newton, conhecida como o “Princípio da Ação e da Reação”.
Está muito claro que as Recuperações Judiciais do Agro, especialmente às de Pessoas Físicas, se baseiam numa interpretação “criativa”de uma legislação que nasceu disfuncional.
A desfaçatez e o caradurismo estão estampados em algumas petições que obtiveram o deferimento para determinadas Recuperações Judiciais. Eivadas de distorções e de verborragias inconsistentes que buscam justificar o indefensável, acobertar fraudes contra credores de diferentes tipos e tamanhos, como funcionários, fornecedores, bancos e o fisco.
Vários casos indicam que a venda de terras poderia resolver boa parte dos problemas financeiros, sem prejuízo para a essencialidade da permanência na atividade e muito menos para a função social que se busca preservar. Muitos deram passos maiores do que as pernas e agiram manifestamente com dolo para atingirem a condição de grandes produtores.
Revoltante assistir o despreparo profissional de alguns magistrados responsáveis por questões que geram enorme impacto social e econômico. É inaceitável que não possuam conhecimentos elementares de contabilidade. Que não saibam que quando o Ativo for menor do que o Passivo, teremos como resultado um Patrimônio Líquido negativo, configurando, consequentemente, a condição de insolvência.
Tão simples verificação não exige a contratação urgente de um Perito Contábil.
Um diagnóstico isento e tecnicamente confiável não pode ser feito às pressas, no prazo médio de 7 a 10 dias, como vem se tornando a prática. Na melhor das hipóteses, dependendo da complexidade da causa e dos valores envolvidos, demandaria no mínimo 3 meses.
Afigura-se impossível que um profissional possa constatar a normalidade da atividade do postulante a recuperação judicial em tão pouco tempo, fornecendo num laudo informações consistentes sobre as razões que geraram as dificuldades financeiras, indicando a existência ou não de desvios, manipulações contábeis, confusão patrimonial, crimes e fraudes de gestão, além de poder concluir com rigor técnico se o negócio é recuperável ou não.
Alguns magistrados deveriam renunciar o recebimento de causas nas quais não detenham conhecimento suficiente ou que resultem no risco de danos irreparáveis a terceiros. Não se trata de declaração de incompetência profissional, já que ninguém detém o domínio absoluto de todos os ramos do saber, mas sim de uma manifestação de integridade e respeito para com o bem maior que é a própria Justiça.
A absoluta falta de plausibilidade de alguns julgados culminou na invalidez das garantias reais (hipotecas e alienações fiduciárias), no aborto do recém-nascido “patrimônio em afetação” que reduziria muito os juros do setor e na extinção da razão de existir da Cédula de Produto Rural (CPR).
Em breve, a concessão de prazo para a compra de insumosna agricultura significará o mesmo que a emissão de um atestado de loucura.
Forçosamente, os financiadores do capital de giro no Agro (bancos, tradings e/ou fornecedores de insumos) deverão registrar detalhadamente nas notas explicativas, que compõem as demonstrações contábeis, quais foram os critérios que justificaram a concessão do crédito, como estão constituídas as provisões de inadimplência e quais serão os mecanismos de mitigação sobre a exposição de riscos assumida.
O retorno à normalidade se afigura remoto, infelizmente. Improvável que haja uma correção de rumo. A racionalidade econômicae a moralidade estão irremediavelmente ofendidas.
Os bons pagadores estão equiparados aos “nós cegos”.
Nem mesmo uma nova onda de “quantitative easing” será capaz de recuperar a confiança no setor.
O lado positivo desse processo é que as transações passarão a ser à vista, o que não será de todo ruim porque eliminará do contexto a um monte de aventureiros e principalmente os eternos zumbis do ramo.
Nos primeiros tempos poderá haver uma retração no volume de produção com sérios riscos de desabastecimento, inflação e tensões sociais.
Os sobreviventes se tornarão mais sólidos e haverá um aumento drástico da concentração da atividade em grandes grupos, principalmente no setor de grãos.
A deteriorada situação fiscal do Brasil impedirá o retorno dos subsídios e subvenções do Estado, mesmo se formos acometidos pela desgraça do retorno da esquerda.
Não tenho fé na ressureição do Crédito Agrícola.
Atenciosamente,
LucrodoAgro – Consultoria Agroeconômica
Eduardo Lima Porto
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