Seguro Rural: Pitaco, Palpite e Opinião, por Eduardo Lima Porto

Publicado em 02/08/2016 15:07
Eduardo Lima Porto é diretor da CustodoAgro Consultoria Agrícola

Pedro Loyola é realmente um excelente Economista e profundo conhecedor sobre Seguro Rural. Há anos que atua nesse segmento e literalmente defende os interesses dos Agricultores. 

No link abaixo, confira sua última entrevista ao Notícias Agrícolas:

>> Lei isenta produtores que acessam recursos oficiais acima dos R$300 mil do Proagro, mas bancos podem exigir seguro agrícola

O Seguro como negócio se caracteriza por ser de natureza extremamente complexa, independentemente do Ramo que se venha a analisar, mais ainda em se tratando da Agricultura num País das dimensões continentais do Brasil e com a intensidade do impacto gerado na Economia a cada ocorrência de um Sinistro.

Os anos passam, entra e sai Governo, e as controvérsias envolvendo a Política de Seguro Agrícola continua, em que pese os esforços de técnicos reconhecidamente competentes e bem intencionados, como o Pedro Loyola.
Pedirei desculpas para um um rápido desvio no tema, pensando que poderá fazer sentido na elucidação do que pretendo expor logo adiante.

Qual é a diferença entre um Pitaco, um Palpite e uma Opinião? Os leitores saberiam dizer?

Aprendi a distinção entre os 3 conceitos numa Mesa de Bar em Sorriso há uns anos atrás, ocasião em que estava na presença de um Amigo (grande conhecedor do Mercado Insumos) e de um Produtor de Soja reconhecido na região pela boa gestão que realiza. Por uma questão de reserva, não exporei os nomes de ambos.

A resposta ao questionamento foi mais ou menos a seguinte:
1) Pitaco = Sugestão não solicitada. Típica de quem se mete onde não é chamado ou que “fala atoa”;
2) Palpite = Manifestação baseada no achismo ou desprovida de fundamentação científica, com enorme probabilidade de imprecisão conceitual e com certa chance para o acerto ou erro;
3) Opinião = Narrativa baseada em fundamentos, ainda que não comprovados cientificamente, mas que obedecem uma certa lógica que poderá resultar como preponderante, caso não haja uma abordagem contrária, cuja construção teórica venha a ser considerada mais relevante ou intelectualmente superior.

Dito isso, ao tecer comentários sobre Seguros Agrícolas, não sei se realmente estou dando um Pitaco, emitindo um Palpite ou uma Opinião.

Minha posição se inclina para a combinação entre as 3 formas de manifestação, sem qualificar um peso maior ou menor para cada uma delas.

Nesse contexto, considero que há muita contaminação ideológica nessa discussão e, provavelmente, por isso que as soluções sejam tão difíceis de serem implementadas. 

Trata-se de uma questão de grande complexidade técnica, sendo a razão de existir de um sujeito conhecido como “Atuário”.

Para quem não sabe, tomando emprestada a definição do Wikipedia, o "Atuário é o termo que designa o profissional especialista em avaliar e administrar riscos. Deve ter formação acadêmica em Ciencias Atuariais, ter conhecimentos em Matemática, Estatística, Direito, Economia e Finanças para atuar na área de Seguros, Previdência Complementar (aberta ou fechada), sendo capaz de analisar concomitantemente as mudanças econômicas, demográficas e sociais no Mundo. Efetua cálculos probabilísticos de eventos, avalia riscos e determina a fixação de Prêmios de Seguros e Coberturas Indenizatórias, podendo atuar também em outras áreas relacionadas ao tema Risco”. 

Cheguei a ingressar na Faculdade de Ciências Atuariais da UFRGS, mas desisti por conta do alto grau de dificuldade do curso. Por isso, tenho um misto de Frustração por não ter adquirido o refinamento Matemático exigido e outro tanto de Admiração por esses Profissionais.

Voltando ao tema, que é o que realmente importa, as variáveis que compõe a Equação de um Seguro Agrícola devem contemplar:
a) Delimitação territorial;
b) Clima (variações de temperatura, comportamento pluviométrico);
c) Ocorrências de Secas, Enchentes, Granizos, Geadas (Freqüência estatística num horizonte de tempo e Intensidade dos Eventos);
d) Características dos Solos e da Vegetação;
e) Incidência de Pragas, Doenças e Plantas Daninhas;
f) Tamanho Médio dos Módulos de Produção;
g) Localização;
h) Acessos e Meios de Escoamento;
i) Caracterização do Perfil dos Agricultores (Idade Média, Composição do Grupo Familiar, Grau de Escolaridade, etc);
j) Custos de Produção Médios;
l) Produtividade Média da Região;
m) Porcentagem entre Áreas Próprias e Arrendadas;
n) Padrão Tecnológico Médio;
o) Existência de Conflitos Agrários Potenciais (MST, Índios, Posseiros, Grileiros, etc);
p) Flutuações nos Preços dos Principais Insumos utilizados na cultura a ser coberta;
q) Flutuações nos Preços do cultivo alvo da cobertura;
r) Histórico e Propensão a Fraude por parte dos Contratantes;
s) ETC…

Sem entrar na ponderação sobre o que mais pesa nessa composição, é do senso comum o entendimento de que a Agricultura é uma atividade de Risco.

Isto posto, respeitando opiniões tecnicamente mais aprofundadas, me parece que a configuração de uma Política Agrícola que generalize o tratamento do Seguro de maneira uniforme num País como o Brasil é uma tentativa, por certo que muito nobre, mas de uma insanidade grotesca do ponto de vista Matemático e Econômico.

Vejo com estupefação as menções generalizadas acerca do “Seguro de Renda” que busca a proteção do Faturamento do Produtor. Mais boquiaberto fico quando leio e releio as cláusulas desse tipo de cobertura.
Talvez seja esse enfoque um dos motivos para o insucesso do “Seguro Rural” no País.

Novamente, com todo o respeito às opiniões divergentes que possam, eventualmente, demonstrar que estou muito equivocado, acredito que o Seguro é uma ferramenta essencial para cobertura dos Riscos e para o barateamento do financiamento do Setor.

Quando o Agricultor se dirige ao Banco para contratar uma linha de crédito para o Custeio, pressupõe-se que estará informando com certa precisão os valores que serão desembolsados na compra de Insumos (sementes, fertilizantes e defensivos), além de outros itens fundamentais como o combustível, a mão de obra, etc.

O que gera a insolvência do Agricultor não é a frustração da sua Renda, que depende de fatores exógenos como os Preços de Mercado e o Rendimento do cultivo.

Na realidade, o que quebra o Agricultor são as dívidas contraídas para desenvolver a atividade, ou seja, tudo aquilo que foi necessário e comprovado em termos de Capital de Giro.

Nesse sentido, o desafio de se estabelecer um “Prêmio Justo” ou uma “Cobertura Adequada” estão mais relacionados ao Custo de Produção que é passível de ser comprovado, do que propriamente no Faturamento Esperado.

Uma frustração de Faturamento pode não levar o Agricultor à Falência, caso ele consiga livrar-se das dívidas contraídas com terceiros numa Safra.

Os “Prêmios” são determinados com base no percentual que se pretende gerar de cobertura para um Sinistro. 

Dessa forma, ao estabelecer um percentual sobre o montante desembolsado com Insumos ou contraído através das Linhas de Crédito para o Custeio, o valor a ser pago pelo Agricultor se tornará mais preciso ou mais ajustado a sua capacidade econômica. Além de ficar menos sujeito a coletivização da Política Governamental que busca inserir a todos numa cesta.

Para mitigar os Riscos de Mercado que afetam o Lucro do Produtor (diferença entre o Faturamento e o Custo de Produção), desconheço a existência de mecanismos tão bons quanto os disponíveis no Mercado de Futuros & Opções.

Seria muito conveniente avaliar modelos alternativos que existem em diferentes países e mesmo no Brasil, como os Sistemas de Mutualismo onde Entidades Regionais comandadas por Representantes dos Agricultores instituem suas próprias regras para determinação de Prêmios e Coberturas. 

A Associação dos Fumicultores do Brasil (AFUBRA) é um exemplo muito bem sucedido que poderia ser adaptado pela APROSOJA e outras agremiações rurais no País.

Enquanto ficarmos na dependência de uma intervenção do Governo ou de Políticos, por mais bem intencionados que estejam, estaremos enfrentando dilemas que não se resolverão adequadamente em função da sua inviabilidade econômica ou se tornarão objeto de intermináveis debates coletivos, onde a maior parte dos participantes com influência decisória desconhecem os Riscos da Agricultura.

O caminho lógico parece ser a construção de sistemas descentralizados de Seguro Agrícola, que levem em conta a composição dos diferentes fatores de risco em cada região, de forma que a precificação dos Prêmios e a determinação das Coberturas estejam mais próximos da realidade dos Produtores e dos cultivos que visa proteger.

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Fonte: CustodoAgro

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