Pacote de maldades deve aprofundar a recessão, por Flávio França Jr.

Publicado em 23/01/2015 14:34
Flávio Roberto de França Junior é Analista de Mercado, Consultor em Agribusiness e Diretor da França Junior Consultoria

Prezados amigos. Como está difícil falar de coisas boas nesse nosso Brasil varonil. Juro gente, que toda vez que me sento para escrever este texto semanal de opinião vou em busca de temas positivos, que possam trazer ânimo e bons sentimentos para o agronegócio brasileiro. Mas a tarefa tem se mostrado ingrata e, porque não dizer, muitas vezes até impossível. Na semana passada até consegui trazer um tema de conteúdo geral mais positivo para o nosso setor, ao abordar as linhas gerais de nossa expectativa para o câmbio em 2015 e sinalizar que a taxa tende a ficar acima da taxa média de 2014.

A certa altura do texto disse o seguinte: “na tentativa de enfrentar o elevado déficit em conta corrente e a inflação elevada, ou governo aprofunda a recessão ou solta a taxa de câmbio. Acreditamos que o caminho a ser adotado será o segundo”. E não é que o governo durante a semana que passou fez exatamente o contrário, ao lançar um pacote de maldades para conter o desajuste das contas públicas, trazendo como resultado imediato na queda da taxa de câmbio?!?!

Durma-se com um barulho desse. Não vou entrar aqui no mérito de que o governo está fazendo tudo o que disse que o candidato da oposição faria caso fosse eleito. Que está traindo os dogmas defendidos por seus eleitores. E por tentar arrumar uma casa totalmente devastada por ele mesmo após quatro anos de política econômica equivocada, enquanto tentava mostrar durante a campanha que tudo estava bem no país, e só precisávamos de alguns poucos ajustes. Até porque o ajuste nas contas públicas era uma necessidade por nós comentada desde o período pré-eleitoral e que a presidente, se fosse reeleita, teria que fazer de uma forma ou de outra. A questão que trazíamos era de quem iria pagar a conta desses anos de descalabro econômico, político e ético?

Embora soubéssemos, sempre havia aquela esperançazinha, bem pequena, lá no fundo da alma, de que um raio de luz caísse sobre o Palácio do Planalto e a opção adotada fosse a favor do país e não contra ele. A favor da população e não contra ela. A favor do setor produtivo e não contra ele. A grande reforma e o ajuste nas contas públicas que esperávamos (e ainda esperamos, mas acho que agora só daqui há quatro anos) deveriam vir através do enxugamento da máquina pública e do desaparelhamento do estado, aumentados no governo Lula, mas elevado a níveis impensáveis nos primeiros quatro anos do governo Dilma. 

Cheguei a sentir uma ponta de esperança quando na última semana de 2014, espremido entre os feriados de Natal e Ano Novo, o governo fez anúncio de mudanças em alguns benefícios sociais, tentando conter a farra do seguro-desemprego, do auxílio doença, do abono salarial e da pensão por morte (ao que a base aliada do governo classificou como punhalada nas costas de seus eleitores). Pensei comigo: “Opa! Gostei! Essas medidas são positivas e eu assinaria em baixo”. Mas nesses primeiros 23 dias de mandato, e especialmente a partir desta última semana, o governo deixou muito claro de quem irá pagar essa conta: será você, eu, o agronegócio, o setor produtivo e boa parte da população brasileira. Especialmente aqueles que pagam as contas, que pagam os impostos que sustentam essa nossa insana máquina pública e seus benefícios sociais. Exatamente a grande maioria dos que votaram pela mudança de governo nas últimas eleições.    

Mas afinal, o que veio nesse “pacote de maldades”? O ministro não gosta desse termo, porque acredita sinceramente que as medidas são necessárias, e que os danos trazidos no curto e médio prazos serão compensados pelos benefícios de longo prazo. Na segunda à noite tivemos o anúncio de um mini pacote fiscal incluindo: aumento do IOF sobre o crédito de 1,5 para 3,0% ao ano, o que irá aumentar o custo para o tomador; aumento das alíquotas de PIS/Cofins e volta da CIDE sobre os combustíveis, que na prática deverão aumentar o preço da gasolina em pelo menos R$ 0,22 e do diesel em R$ 0,15; aumento da alíquota de importação de 9,25 para 11,25%, que tornará todos os produtos importados mais caros; aumento nos juros do Banco Nacional de Desenvolvimento Social/BNDES para o setor produtivo; aumento do IPI para os automóveis, o que irá elevar o preço ao consumidor; fim do repasse público ao setor elétrico, o que na prática irá se transformar em forte aumento na conta de luz. E para coroar a semana, que faria Machiavel sentir orgulho de sua teoria, na quarta-feira à noite o Comitê de Política Monetária anunciou a elevação dá Selic, o juro básico da nossa economia, em 0,5%, passando a 12,25% ao ano.

Qual o objetivo do governo? A meta traçada pela equipe econômica é reverter o déficit primário (economia nas contas para pagamento dos juros da dívida pública) acumulado em 2014 para superávit de 1,2% do PIB em 2015. Em outras palavras, sair do vermelho e voltar para o azul, pelo menos para pagar os juros dos títulos que estão no mercado. Com essa busca do equilíbrio nas contas públicas, o governo quer passar o recado a empresários e investidores de que está atento e tomando as medidas necessárias para pavimentar um cenário de crescimento sustentável no longo prazo. Ou seja, deixem de ser pessimistas e voltem a investir e aplicar seu dinheiro no país. 

Mas qual será o impacto real? Entendemos que o caminho será diferente. Empresário investe quando tem crédito barato e a demanda está em expansão. E investidores trazem recursos produtivos para o país quando há otimismo com crescimento. Mas ao aumentar os juros e fazer ajuste fiscal tirando renda do setor produtivo (e não reduzindo os gastos com máquina pública), enxergamos o aprofundamento da recessão no país, com provável crescimento negativo da economia, diminuição de excedentes exportáveis, queda da demanda e diminuição dos investimentos. A única coisa que pode aumentar são os investimentos especulativos para aproveitar os maiores juros reais do mundo. Mas isso só traz benefício para o setor financeiro (olha o discurso de campanha sendo furado de novo). 

E no câmbio, apesar de um impacto inicial negativo, em função do provável aumento dos investimentos especulativos, vemos cenário de recuperação mais à frente, pelos problemas em nossa balança comercial, retração nos investimentos diretos e manutenção de uma administração federal de tamanho incompatível com o tamanho de nossa economia. 

Meus caros amigos, estamos fazendo tudo ao contrário novamente. A gastança pública continua livre, só que com o arrocho na sociedade, agora teremos as contas equilibradas. Infelizmente começamos o ano muito mal. E podem esperar por mais “surpresas”. Conforme comentamos após as eleições, segue o sentimento de ladeira abaixo.   

Um “AgroAbraço” a todos!!!

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Fonte: França Junior Consultoria

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