Biochar, uma tecnologia com respostas ambientais e econômicas, por Olivier Reinaud
Reconhecida pela produção de café de alta qualidade, a região leste de Minas Gerais passou a contar com uma tecnologia inovadora neste ano: o biochar. A pesquisa científica mostra que, na produção de café, esse condicionador do solo pode reduzir em 33% a aplicação dos fertilizantes e, ainda assim, aumentar em 14% a produtividade, tornando o biochar uma alavanca fundamental para conciliar sustentabilidade e produtividade. Ainda mais porque, além da agricultura, o biochar também contribui para a remoção do carbono atmosférico e sua fixação no solo, combatendo assim diretamente as mudanças climáticas.
O biochar é produzido a partir de resíduos agrícolas, como a palha de café e o bagaço de cana, tornando-os em uma forma de carvão muito estável por meio de um processo térmico. Incorporado no solo apenas uma vez, o principal benefício do biochar é sua função de “esponja de carbono”, que ajuda terras agrícolas a reter água e nutrientes de forma duradoura.
Atualmente, o mercado de biochar é pequeno em todo o mundo, especialmente pela dificuldade histórica de tornar os projetos com o biochar lucrativos, devido aos altos custos da produção e à ausência de outros fluxos de receita. Entretanto, há alguns anos, a tecnologia está progredindo para a produção industrial, e créditos de carbono podem ser emitidos, tornando os projetos de biochar lucrativos e incentivando as empresas (já estabelecidas ou novas) a considerar o biochar como um negócio.
Dois estudos (aqui e aqui) recém publicados mostram dados sobre o biochar que merecem especial atenção. O primeiro deles aponta que o potencial de remoção de carbono do biochar é de cerca de 2 bilhões de toneladas de CO2 por ano, o equivalente a cerca de 5% das atuais emissões globais anuais de dióxido de carbono. Isso também representa cerca de 25% da capacidade global necessária de remoção de carbono até 2050 para atingir emissões líquidas zero. O segundo estudo mostra que os resíduos agrícolas representam 85% do potencial de matéria-prima para remoção de CO2 por meio do biochar. No Brasil, a cana-de-açúcar e a soja representam cerca de 70% do potencial de remoção. E terceiro: o Brasil está no topo dos países com maior potencial de produção e remoção de carbono, ou seja, podendo chegar a 250 a 500 milhões de toneladas removidas por ano por meio do biochar. São números muito animadores e promissores para o Brasil, o país onde foi descoberta a Terra Preta - precursor do biochar, inventado pelos indígenas na Amazônia.
O processo de remoção do carbono pelo biochar não é complexo: as plantas capturam o CO2 durante a fotossíntese, depois o biocarvão é extraído e estabilizado por meio da pirólise, sendo armazenado no solo por milhares de anos. Para cada tonelada de biochar produzida, são gerados créditos de carbono que são vendidos no mercado voluntário de carbono (diferente do mercado regulamentado discutido recentemente no Brasil) para empresas que adotaram metas de emissão líquida zero. Por enquanto, a maioria dessas empresas está sediada na Europa e nos Estados Unidos. No Brasil, esse tópico ainda é muito incipiente, com quase nenhuma empresa disposta a comprar créditos de carbono. No entanto, de modo geral, o mercado voluntário de carbono está crescendo muito rapidamente e está se movendo em direção a mais qualidade, o que é positivo, pois muitos projetos de crédito de carbono têm sido historicamente associados a escândalos de superestimação dos benefícios do carbono.
No caso do biochar, é possível, literalmente, pesar o carbono colocado no solo, com total rastreabilidade na cadeia de valor dos projetos, o que facilita muito a obtenção de todas as garantias de qualidade. Também é utilizado um dos mais rigorosos padrões de certificação para projetos de remoção de carbono de longo prazo, o Puro Standard da Puro.earth.
Embora o biochar represente uma tecnologia com respostas ambientais e econômicas, há uma ausência de desenvolvimento de projetos de biochar no Brasil e no mundo. Os primeiros projetos de biochar surgiram na Europa e nos Estados Unidos em meados da década de 2010, produzindo quantidades muito pequenas de biochar vendidas a um preço muito alto (já que não havia créditos de carbono naquela época), e o único mercado que podia pagar esses preços eram os mercados dos países mais desenvolvidos, daí a localização geográfica desses primeiros projetos. Desde 2020, é possível emitir créditos de carbono, o que torna os projetos de biochar mais atraentes. Porém, ainda estamos no início, portanto é normal que em países como o Brasil ainda se tenham poucos projetos de biochar.
Há, no entanto, uma perspectiva de que esses projetos se desenvolverão muito rapidamente no Brasil, dadas as condições perfeitas que o país oferece para o biochar: produção agrícola maciça; agricultores profissionais; grandes quantidades de resíduos de culturas não utilizadas e, portanto, disponíveis como matéria-prima para o biochar; ampla necessidade de descarbonizar a agricultura, mantendo os rendimentos; solos ácidos muito propícios para maximizar os efeitos do biochar; dentro outros inúmeros motivos. Felizmente, as principais instituições de pesquisa no Brasil, caso da Embrapa e de muitas universidades federais, têm estudado profundamente o biochar, e todas elas concluem sobre seu grande benefício para a agricultura e o clima.
Biochar é uma tecnologia do presente e do futuro e sinônimo de desenvolvimento e de um planeta mais sustentável. O Brasil tem um dos maiores potenciais para desenvolvê-lo e precisa aproveitar essa oportunidade estratégica!