Artigo/Cepea: Expressivo aumento nas exportações brasileiras de milho impõe mudanças na dinâmica do mercado nacional
*Por André Sanches, pesquisador da área de milho do Cepea, e Carolina Sales, analista de mercado de grãos do Cepea
As exportações brasileiras de milho apresentaram vigoroso aumento nos últimos anos, impondo alterações importantes na dinâmica do mercado nacional. Enquanto na safra 2001/02 o Brasil exportou 2,5 milhões de toneladas, segundo a Secex, nesta temporada, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima que 37 milhões de toneladas sejam escoadas ao mercado internacional – vale lembrar que o País já embarcou 42,8 milhões de toneladas em 2019, um recorde.
As exportações crescentes refletem a capacidade de o agronegócio brasileiro aumentar o volume de produção em ritmo superior ao consumo interno e a preços competitivos no mercado internacional. Essa conquista só foi possível graças aos ganhos de produtividade e à expansão do cultivo do milho de segunda safra, o que, por sua vez, está associado a elevados investimentos em máquinas, na adubação e correção do solo, no melhoramento genético e a adaptações dos períodos de plantio.
Para 2022, a maior oferta brasileira, que deve ser recorde, gerará bons excedentes exportáveis em um ano de restrição da oferta na Ucrânia, diante dos ataques russos e de problemas climáticos afetando a safra de importantes produtores do Hemisfério Norte. Nos Estados Unidos, principal produtor, o clima seco e quente deve prejudicar a produtividade das lavouras – por enquanto, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) indica queda de 7,7% na produção em relação à safra 2021/22 (relatório de setembro).
Na Europa, a seca e o forte calor vêm sendo considerados uns dos piores das últimas décadas, resultando em reajustes negativos nas estimativas de rendimento de safras. No início de setembro, o USDA indicou que a produção europeia deve diminuir 17,2% frente à temporada anterior.
Na China, uma severa onda de calor no sudoeste do país tem atingido as lavouras de arroz e de milho. Quanto à região do Mar Negro, há estimativa de redução de 25,2% na produção deste ano. Além disso, apesar da retomada de embarques pontuais por parte da Ucrânia, dificuldades logísticas vêm limitando o escoamento de grãos.
Enquanto preocupações com a recessão mundial vinham pressionando as cotações desde meados de março, mais recentemente, fatores climáticos voltaram a elevar os preços. Vale considerar que os dados de início de setembro apontavam para um cenário de redução da relação estoque final/consumo, para 25,8%, uma das menores em nove anos-safras, e tudo indica que esta relação deve recuar ainda mais. Além disso, com restrição da oferta e de excedentes nos Estados Unidos, na Ucrânia e na Argentina, a presença brasileira nas exportações nos próximos meses será importante.
As estimativas da Conab apontam que, na temporada 2021/22, a produção brasileira de milho deve ser de 113,3 milhões de toneladas, gerando excedente de 46,5 milhões de toneladas, o segundo maior da história – abaixo apenas do de 2018/19, quando atingiu 51,3 milhões de toneladas. Para a próxima temporada, as estimativas apontam produção de 125,5 milhões de toneladas, o que geraria um excedente de aproximadamente 55 milhões de toneladas, possibilitando, portanto, que as exportações sigam crescentes.
Até o momento, o Brasil não exporta milho para os chineses, mas a China pode se tornar um importante parceiro comercial nos próximos anos, dado o recente interesse do país asiático no produto nacional. Para que as exportações ocorram, as negociações em relação a aspectos fitossanitários e regulação de eventos biotecnológicos da produção nacional devem avançar.
Segundo informações do USDA, as importações chinesas saltaram de 7,6 milhões de toneladas na safra 2019/20 para 29,5 milhões de toneladas e 23 milhões de toneladas nas duas temporadas seguintes, com perspectiva de importar 18 milhões de toneladas em 2022/23, se consolidando como o principal importador mundial nos últimos anos.
O maior excedente exportável em um período de oferta mundial enxuta ressalta o protagonismo da produção brasileira de milho, contribuindo, inclusive, para a segurança alimentar de outros países. Para a temporada 2022/23, a perspectiva inicial da Conab é de que sejam exportadas 44,5 milhões de toneladas, um recorde.
Por mais que o atual contexto internacional possa ser considerado uma oportunidade para as exportações nacionais, é necessário buscar compradores internacionais. A agroindústria brasileira consome cerca de 2/3 da produção nacional, ou seja, o excedente é expressivo, mas a capacidade de armazenagem é limitada.
Nesse contexto, compradores no mercado interno passam a competir com a demanda internacional via preços. Acompanhar de perto a paridade de exportação, a taxa de câmbio e o prêmio de exportação se tornou uma necessidade. Por sua vez, os preços domésticos, em especial na região dos portos, passam a refletir também o comportamento dos valores no mercado internacional, um ambiente muito diferente de 20 anos atrás, quando a exportação do cereal ocorria com menos intensidade.