2018: primeiras perspectivas para o agro, por Roberta Züge

Publicado em 12/12/2017 10:10
Roberta Züge; membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS); Vice-Presidente do Sindicato dos Médicos Veterinários do Paraná (SINDIVET); Médica Veterinária Doutora pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP); Sócia da Ceres Qualidade.

Em quase todas as mídias pode-se ler a premissa: “O Brasil tem a vocação para a Agropecuária”, “O Brasil vai alimentar o mundo”, ou variações de frases com este sentido. Apesar de parecer um bocado ufanista, de fato, muito há de verdade nestas afirmações.

Recentemente estive fora do Brasil, visitando um país, que é grande produtor de trigo. Fiquei comparando o quanto fomos beneficiados em termos ambientais e climáticos. A terra de lá, muito seca e com pedras, não parecia nada atraente ao plantio. Era outubro e eles estavam arando. Na sequência iriam plantar.

O processo se inicia em outubro, arando o solo e plantando. Logo a neve cobrirá tudo. Haverá morte de insetos e outros animais. Com o degelo, que irá umedecer o solo, haverá a brota. Eles somente irão colher em junho/julho. Para quem está acostumado com o agronegócio no Brasil isto foi impactante. Primeiro o solo descoberto, arado, e os rios sem mata ciliar. Depois muito tempo improdutivo. Não tem como não se lembrar dos nossos pastos de inverno, que são semeados no de verão ainda verde.

No Brasil o ambiente se apresenta mais amistoso para o agronegócio. Neve é algo pitoresco. Há algumas geadas que causam estragos. Mas frente às paisagens todas brancas deles, fiquei até com vergonha de reclamar que temos geadas em alguns locais do Brasil.

Nosso cenário também demonstra que muita tecnologia está sendo empregada, a robotização já é realidade em muitas propriedades - desde tratores a ordenhadeiras. Nestas propriedades, as vacas saem para fazer a ordenha sozinhas e um robô estacionário as aguarda. Podem ser ordenhadas quatro vezes ao dia, caso seja necessário, conforme a fase de produção. Este processo dispensa um ordenhador, mas exige um profissional mais qualificado para operar os equipamentos, para manutenção básica, etc. Claro, também exige que a propriedade mantenha procedimentos mais especificados do processo como um todo. Não há espaços para improvisações. Ainda em relação aos rebanhos, a genotipagem (teste de DNA) já é realizada com rotina em diversas propriedades, como ferramenta para direcionar os acasalamentos. E estes são feitos com foco na melhoria da produtividade e qualidade, tanto para produção de leite, quando para o gado de corte.

As produções de frango e suínos continuam despontando em termos de volume e produtividade. A exportação de carne bovina, que pelo advento da Carne Fraca, poderia manchar imensamente a imagem, contrariando as previsões do início da operação, deve fechar o ano com um crescimento de 5% em volume em 2018, caso os embargos russos sejam sanados com brevidade.

Apesar de estas tecnologias estarem fazendo parte do cenário na pecuária nacional, e termos todo um panorama bem promissor de exportação, o Brasil esbarra em diversos pontos críticos. A questão da logística, com a sempre citada dificuldade de escoamento, que imprime altos custos pela baixa qualidade das vias.

Outro ponto tem surgido, apesar de tentarem estancar, que são os serviços veterinários. Um número imenso de profissionais está disponível no mercado, mas poucos estão alocados para os serviços de fiscalização. O contingente de médicos veterinários da fiscalização é sempre crítico nas inspeções externas. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento até fez uma contratação temporária de fiscais, mas é tapar o sol com a peneira. O volume de produção cresce anualmente e com ele os índices de exportação, mas os processos para garantir a sanidade dos produtos ficam deficitários.

Estes profissionais são imprescindíveis para a implantação dos programas sanitários. Ações que devem ser realizadas orquestradas com todos os envolvidos. Não adianta apenas o órgão fiscalizado impor os preceitos, o setor deve cumprir rigorosamente os requisitos. Burlar e “ajeitar” para parecer que se cumpre não deveriam nem ser cogitado.

Inúmeros municípios não implantaram seus sistemas de inspeção sanitária. Sem eles, pequenos produtores comercializam de forma clandestina. Apesar de parecer idílico, a aquisição de produtos artesanais sem o controle sanitário pode transmitir muitas enfermidades, causando não somente aqueles quadros diarreicos, mas também encefalites, septicemias e óbitos. A negligência na sanidade dos alimentos tem um alto custo na sociedade, infelizmente pouco evidenciada nos meios de comunicação.

Aliado a isto, há outras demandas, que apesar de parecerem pequenas, assombram os produtores. Como a falta de antígenos para diagnóstico de tuberculose e brucelose. Antes duas organizações públicas (estaduais) tinham a missão de produzir e comercializar. A que detinha a maior capacidade de produção, após diversos problemas e lotes rejeitados, parou e não retomou a produção. Por lei, não se pode comercializar leite que seja oriundo de rebanhos que não comprovem que os animais estão livres destas duas enfermidades. A importação do insumo tem sido a alternativa adotada. O ideal seria termos uma indústria forte, sem dependências do governo, que suprisse a demanda do setor, produzindo cepas que sejam as demandadas para os nossos rebanhos. Poderia citar diversas outras mazelas, que assombram o setor, mas mesmo este apanhado de problemas, não consegue abalar a força do campo.

2018 está chegando com mais energia e sentimento positivo que o início de 2017, mesmo o escorregão das fraudes na fiscalização não abalou tanto a exportação, nem o mercado interno. Há diversas iniciativas que caminham para a difusão e aplicação da tecnologia, nunca se falou tanto em start up no agronegócio. Novas formas de negócio podem surgir e, sim, o homem do campo está acessando a internet, tem buscado preços e fornecedores mais competitivos. Busca informações e questiona. Está nas redes sociais, compartilha experiências, quer fazer contatos e tem crescido o orgulho de trabalhar no campo, mesmo entre os mais jovens. E, com o advento da tecnologia, reter este filho no campo se torna mais fácil. Os desafios dos novos equipamentos são um chamariz. Muitos modificaram completamente suas propriedades quando conseguiram convencer na adoção de novas propostas.

Aliado a isto, certa aura de condenação de políticos corruptos tem elevado a estima de muitos. E, pode-se dizer, até inibir que outros tentem burlar suas obrigações, afinal se até um daqueles “magnatas” tem enfrentado as quentinhas e frio de Curitiba, imagine uns com menos recursos.

Hipoteticamente, se conseguíssemos resolver as dificuldades de estrutura logística (seguro que muito disto tem origem na imensa corrupção que assola nosso país), assim como, proporcionar que os serviços sanitários estejam de acordo com as premissas dos órgãos internacionais, sem a menor dúvida, nossa nobre vocação de alimentar grande parte do mundo, seria cumprida. Com a disponibilização de proteínas de alta qualidade, vegetais seguros, óleos, matérias primas para muitas indústrias e as maravilhosas e suculentas frutas, que tanto sentimos falta quando estamos longe do Brasil. 

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Fonte: CCAS

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