Os focos do agronegócio mundial
Publicado em 19/04/2013 10:34
e atualizado em 09/07/2013 09:22
Por Amilcar Centeno Silva.
longo do século XX a Agricultura evoluiu de um negócio isolado na fazenda para um negócio regional, nacional e, mais recentemente, num negócio globalizado. O agricultor, que antes se preocupava apenas com o que ocorria dentro da parteira de sua fazenda agora tem que olhar para o mundo como um todo para entender como gerenciar seu negócio.
O problema é que o mundo não cabe nos olhos ou na cabeça de ninguém, o que nos leva a perguntar: onde devo concentrar minha atenção para entender a complexidade deste mercado global?
Sempre que lidamos com uma realidade complexa como esta, recomenda-se utilizar primeiro o poder da síntese para identificar o que é de fato essencial, para depois aplicarmos o poder da análise nestes poucos fatores que mais influenciam o todo.
Caso alguém tivesse a preocupação de me perguntar onde e em que concentrar o foco para entender o impacto desta economia global nos negócios de nossos produtores de grãos e algodão, minha sugestão, mesmo que óbvia, seria a de fechar o foco sobre cada uma destas regiões: Estados Unidos, China, Argentina e África.
Os Estado Unidos ainda é o grande celeiro do mundo e o principal concorrente do Brasil no mercado internacional de commodities agrícolas. É também a referência mundial de preços para estes produtos, principalmente através das bolsas de Chicago e Nova Iorque. Não é para menos que um dos fundamentos que estabelece o preço do milho e da soja é o estoque estimado para o final do próximo mês de agosto, o chamado estoque de virada, pois em setembro começa a entrar no mercado a nova safra norte-americana.
Apesar de sua imensa agricultura estar com suas fronteiras praticamente esgotadas, os EUA ainda crescem em produtividade e eficiência, porém me atrevo a dizer que o fator mais importante a acompanhar na agricultura norte-americana é o seu programa de biocombustíveis, com a produção de etanol a partir do milho. Este programa consome atualmente cerca de 40% da produção de milho do país, o que equivale a pouco mais de 130 milhões de toneladas ou 15% da produção mundial. Qualquer mudança neste programa pode afetar para cima ou para baixo a cotação mundial não só do milho como também dos demais feedgrains (grãos utilizados para a alimentação animal, como soja, milho e trigo), cujos mercados estão intimamente ligados entre si.
O que mais preocupa é que o uso de milho para a produção de etanol tem seus dias contados. De acordo com um novo estudo feito pela Bloomberg New Energy Finance e publicado pela revista Exame no mês passado, o preço do etanol produzido a partir de resíduos agrícolas, como o bagaço, palhas e outros tipos de biomassa, pode se tornar mais competitivo do que o etanol de milho já a partir de 2016. Imagine o que poderia acontecer com o preço das commodities agrícolas se os EUA voltassem a colocar no mercado mundial as 130 milhões de toneladas de milho que hoje transforma em etanol!
Outro mercado que todos os que estão envolvidos com a produção agrícola precisam acompanhar é a China. Se os EUA ainda é o celeiro, a China certamente é a boca do mundo! Só que não é uma boca que apenas está aprendendo a comer melhor; é também uma boca com uma das mais longas tradições comerciais do mundo, e que está sabendo utilizar esta habilidade muito bem para mexer a seu favor o mercado mundial de alimentos.
A China, assim como o restante do continente Asiático, que abriga 65% da população mundial, está impactando o mercado mundial de alimentos muito mais pela mudança de dieta do que pelo crescimento de sua população. Esta mudança de dieta é impulsionada principalmente pelo crescimento da economia do país e a consequente melhoria da renda per-capita desta imensa população. Por isso, o foco de nossa atenção quando olhamos para a China é o comportamento ou crescimento do seu PIB. Enquanto este indicador mantiver seu acelerado crescimento, a demanda mundial de alimentos vai continuar a pressionar para cima os preços das commodities agrícolas. Até este momento a crise mundial não afetou o crescimento do PIB chinês, mas não é preciso ficar atento ao impacto que o prolongamento desta crise possa ter na demanda mundial pelos produtos exportados pelo país. Outro fator de ruptura deste crescimento poderia ser a eclosão de um conflito regional ou mundial a partir da vizinha Coréia do Norte, fato que estamos acompanhando todos os dias em nossos noticiários. Neste caso, a queda no preço das commodities certamente não seria a pior das consequências.
A Argentina, por sua vez, quando se fala do mercado de alimentos, é mais um concorrente próximo e direto do que um parceiro de mercado comum. Costumo dizer em minhas apresentações de que a Argentina tem o melhor agronegócio e o segundo melhor futebol da América Latina! A sua alta eficiência dentro da porteira, fruto de um ambiente privilegiado e de agricultores competentes, associada ao seu desenvolvido sistema de movimentação, processamento e exportação, tem permitido que o agronegócio do país a resista tanto aos castigos de La Niña como aos desmandos de La Señora! Sentimos o peso desta eficiência quando observamos que só conseguimos exportar milho depois que a Argentina esgotou sua capacidade, e só não somos mais afetados nas exportações de soja porque o grande comprador mundial, a China, prefere comprar o grão in natura, enquanto a Argentina é um forte exportador de farelo e óleo.Assim como os vizinhos costumam olhar por cima do muro, devemos manter um olho na Argentina. Afinal são uma excelente demonstração do que poderíamos alcançar se tivéssemos toda a eficiência logística que eles desenvolveram para o seu agronegócio!
Quanto à África, esta é a região para onde devemos manter o olhar do futuro. Lá está a grande oportunidade de expansão da produção mundial de alimentos, em especial para os agricultores tropicais brasileiros. Esta região também concentra uma grande parcela da população e da fome do mundo. Quando a África resolver seus problemas políticos e econômicos, poderá se transformar num consumidor de alimentos como a China, bem como um produtor de alimentos como o Brasil. Resta saber se seremos parceiros ou concorrentes!
Portanto, caso tivesse a oportunidade de apostar apenas em quatro fatores para a análise do impacto da economia global em nosso agronegócio, meu palpite seria o programa de etanos dos EUA, o PIB da China, a eficiência da agricultura Argentina e a estabilização econômica e política do continente Africano.
E você? Onde concentraria o seu foco?
PENSE NISSO!
Fonte:
100teno Estratégia Planejamento