Mercado de açúcar: "Receita para um mercado explosivo", por Arnaldo Luiz Correa

Publicado em 14/08/2021 14:14
Archer Consulting

Separe um fundo especulativo que ostenta uma robusta posição comprada de quase 250,000 lotes, com um lucro estimado superior a dois bilhões de dólares e, portanto, sem nenhuma pressa para realizar seus lucros. Acrescente uma boa dose de usinas do Centro-Sul que há muito estão quase que totalmente fixadas para a safra 2021/22 e não podem aproveitar os sucessivos preços altos que NY lhes mostram. Em seguida junte as casas comerciais que detém uma imensa quantidade de lotes vendidos e temem ser sufocadas pelas constantes chamadas de margem. Adicione os ajustes de deltas provenientes de operações com opções que estão ficando at-the-money (opções no dinheiro). Coloque tudo em forno alto e pronto, você acabou de criar uma tempestade perfeita.

Agora precisamos criar uma narrativa que dê um sentido fundamentalista a tudo que está acontecendo, pois não é do nosso feitio assistir atônito a um mercado que explode na nossa cara sem que tenhamos uma boa e convincente explicação. Pode ser o número de moagem da UNICA (como se esse número fosse novidade), ou a constatação de que “realmente” a seca e a geada mataram o canavial. Ou podemos dizer que as estimativas de algumas tradings que apontam para uma moagem perto de 520 milhões de toneladas de cana são a expressão máxima da verdade irrefutável.

E não vamos estragar essa narrativa tão bem construída apontando que as tradings estão pedindo para as usinas atrasarem o embarque, uma clara demonstração de que o mercado físico é fraco. Ou ainda, citar que o spread outubro/março abriu para 52 pontos, que correspondem a um desconto de 6.4% ao ano, sinalizando que seja lá quem for o detentor de açúcar para recebimento em outubro está querendo se livrar desse mico, pois não tem destino para ele nesse momento.

Enquanto isso, a Bolsa de NY aumentou o requisito de margem inicial para US$ 1,344 por contrato, o que em tese, poderia fazer com que os fundos diminuíssem a posição, mas parece-me que o aumento teve zero impacto nas cotações.

Irrefutável é o fato de que o mercado futuro de açúcar em NY assistiu a uma cobertura de posição quase beirando ao pânico, com stops de compra sendo acionados ao longo dos últimos pregões, fazendo com que o vencimento outubro/21 encerrasse a sessão de sexta-feira cotado a 20.10 centavos de dólar por libra-peso, na máxima do dia, o maior preço registrado no açúcar desde o pregão do dia 24 de fevereiro de 2017.

A safra de cana pode ser de 520 milhões de toneladas, mas ao que parece não é ela que está direcionando esse mercado para cima. Medo de não haver disponibilidade de açúcar ao mesmo tempo que spread mostra um carrego faz pouco sentido. Se a justificativa for a próxima safra, ainda assim muita água vai rolar até lá.

A memória de muitos anos em commodities e da vivência de inúmeras situações tornam-nos desconfiados com explosões de preço não devidamente acompanhadas de notícias fresquinhas no campo dos fundamentos. Veja o que aconteceu com o café recentemente: a geada que atingiu os cafezais trouxe pânico no mercado futuro em NY. Há um mês o café negociava a 150.10 centavos de dólar por libra-peso, duas semanas depois em função da “arrasadora” geada o mercado atingiu 215.20 centavos de dólar por libra-peso uma explosão de 43% que drenou o caixa dos vendidos e trouxe pânico ao mercado. Apenas uma semana depois de atingir o pico, o café batia 171.60 derretendo 20%. Ou seja, o verdadeiro impacto da geada precificado pelo mercado depois da turbulência foi de 20 centavos, mas até aí muita gente morreu no caminho. Café e cana estão em muitas áreas comuns, ambas afetadas pela seca e pela geada. Dá para acreditar que o impacto na cana foi ou será pior do que no cafezal?

Fui buscar no histórico do açúcar em NY se em algum dado momento no passado o mercado apreciou com a mesma magnitude do mercado de café nessas últimas semanas, isto é, 43% em apenas uma semana (em contratos com mesmo vencimento) e verifiquei o que aconteceu com os preços depois disso.

Ocorre que do ano 2000 para cá o açúcar nunca teve uma variação desse tamanho. O recorde ocorreu em 27 de janeiro de 2006. Naquele dia o contrato março/2006 negociara a 18.61 centavos de dólar por libra-peso, 26.43% acima do fechamento duas semanas antes a 14.72 centavos de dólar por libra-peso. O vencimento março, no mês seguinte, voltou ao nível de 15.70 centavos de dólar por libra-peso. O mercado de exportação negociava a um incrível desconto de 70 pontos, pior do que o desconto de hoje. Enfim, é sempre bom não se apaixonar pelo mercado porque ele vai te trair mais cedo ou mais tarde. Olho vivo.

Você sabia que os nossos cursos mudaram de data? Devido às alterações no nosso site que implicam no armazenamento das videoaulas, além de melhorias na qualidade de imagem e som e recursos didáticos, fomos obrigados a mudar as datas dos nossos cursos: o Curso Essencial será dado de 18 a 22 de outubro e o Curso Avançado de Opções dias 8 a 12 de novembro. Sempre às 16 horas com duas horas e meia de duração. Depois, só em 2022.

Um bom final de semana a todos

Arnaldo Luiz Corrêa

Por: Archer Consulting

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