Mercado de açúcar: Brasil pode ter quebra de 4 milhões de tons. na próxima safra
O mercado futuro de açúcar em NY encerrou a semana cotado a 15.25 centavos de dólar por libra-peso (vencimento março/21), 35 pontos de alta em relação ao fechamento da semana passada. Todos os contratos de negociação obtiveram resultado positivo que na média representou uns 6 dólares por tonelada de variação na semana. O real também fechou a semana valorizado frente ao dólar em 1.25%, encerrando a R$ 5.3882 e trazendo à variação semanal dos açúcares para a safra 21/22 e 22/23 números positivos de 16 e 6 reais por tonelada respectivamente.
Intensifica-se a preocupação entre as usinas acerca de uma possível redução na produção de cana para o próximo ano consoante ao déficit hídrico que atinge boa parte das regiões canavieiras do Centro-Sul. Ainda que admita-se que muita água pode rolar por debaixo da ponte, ou muita chuva ainda pode cair sobre os canaviais até março, já se fala em uma perda de pelo menos 5% na produção de cana para a safra 2021/2022.
Esse número, se confirmado, pode ser extremamente danoso para a disponibilidade de açúcar de exportação no próximo ano e, evidentemente, terá seus reflexos de maneira vigorosa nos preços da commodity negociada no mercado futuro de açúcar em NY.
É muito difícil qualquer previsão com um mínimo de acerto a essa altura porque – como dissemos – vai depender da compensação desse déficit hídrico, dos tratos culturais e da quantidade de sacarose, entre outros fatores. Esta foi uma safra de extraordinária produtividade, mas consensualmente acredita-se que a próxima experimentará uma redução substancial na quantidade de açúcar produzido por tonelada de cana, trazendo a média do Centro-Sul mais perto dos históricos 138kg por tonelada de cana moída.
Segundo os dados da UNICA, o Centro-Sul produziu até 1º de novembro, 564,9 milhões de toneladas de cana, com um mix de 46.69% de açúcar e uma ATR média 144,89kg por tonelada, resultando em uma produção total de 36,4 milhões de toneladas de açúcar.
A produção de açúcar acumulada até o início de novembro nas últimas doze safras representou em média 89.7% da produção total daquele ano safra, mas nos últimos cinco anos essa média subiu para 91.4%. Tudo leva a crer que vamos encerrar o ano (que vivenciou uma aceleração na produção) ao redor de 38.5 milhões de toneladas de açúcar.
Voltando ao ano que vem e assumindo como factível essa propalada redução de 5% na produção de cana no Centro-Sul, com as usinas continuando a priorizar a produção de açúcar devido aos preços remuneradores observados durante toda essa safra corrente e, por fim, admitindo uma ATR média de 138kg por tonelada, a estimativa da produção de açúcar para a safra 2021/22 é de 34.5 milhões de toneladas, ou seja, o Brasil poderá produzir 4 milhões de toneladas de açúcar a menos no ano que vem !!!
O cenário acima está longe de ser fantasioso. Está, ao contrário, muito bem plantado no terreno da exequibilidade. E pode ter consequências na equação da oferta e demanda mundial de açúcar para o próximo ano. Tanto mais vigorosa poderá ser a reação dos preços do açúcar em NY quanto mais rapidamente a economia global se recuperar dos efeitos da pandemia caso uma vacina seja disponibilizada.
Isso não desdiz o que temos dito neste espaço há meses. Fixação de preços de açúcar de exportação nos níveis que temos visto são atraentes, pagam os custos de produção com larga margem e distribuem gordos dividendos aos acionistas. Várias empresas do setor têm divulgado balanços demonstrando um alto percentual de açúcar de exportação fixado para a safra 2021/22. Muitas já avançaram inclusive com fixação para a 22/23 e algumas – supreendentemente – estenderam proteções até para a longínqua safra 23/24.
Uma subida pujante nos preços pode machucar os hedges de venda via chamada de margem e estimular coberturas das posições em futuros de maneira caótica. Temos sugerido a compra de calls (opções de compra) out-of-the-money (opções fora-do-dinheiro) com preço de exercício em torno dos 16 centavos de dólar por libra-peso para atenuar as chamadas de margem e eventual participação na alta do mercado, agregando valor ao hedge inicial. O ideal é ter a sua própria conta de futuros, pois operações de balcão podem ter um custo adicional de pelo menos R$ 30 por tonelada fixada.
Temos um longo caminho até a expiração do contrato futuro de NY para março/21 e resta-nos apenas deduzir qual será o jogo do spread março/maio, há tempos em execução, a ser desempenhado pelos principais participantes do mercado (especuladores, fundos, tradings, refinarias, entre outros). Nós temos nossas pressuposições já externadas em comentários passados.
A demanda acentuada de açúcar brasileiro que elevou em 57% a exportação do produto no espaço de doze meses pode abrandar nos meses seguintes. O Brasil está ocupando espaços de consumo não preenchidos pela redução de disponibilidade de açúcar tailandês. O consumo global, embora ainda não tenhamos os dados que refletem o enxugamento provocado pela pandemia, já eram preocupantes antes dela. Um consumo que crescia 0.46% ao ano antes da pandemia, certamente será impactado quando os números forem conhecidos. Só a Índia, por exemplo, devido ao lockdown do covid-19 viu desaparecer o consumo intenso que normalmente ocorre todos os anos no mês de maio (maior incidência de festas de casamento naquele país) e durante o Ramadã (o país conta com mais de 170 milhões de muçulmanos). Juntas, o cancelamento das duas celebrações pode ter representado um encolhimento no consumo de 1.5 milhão de toneladas de açúcar.
De hoje até meados de fevereiro os fundos tem duas alternativas: podem rolar sua imponente posição comprada para o vencimento seguinte, o que implicaria em formidável pressão sobre o vencimento março/21 ou podem, simplesmente, liquidar a posição vendendo-a. E aqui, acredito, pode haver uma fagulha de vulnerabilidade. Se os fundos venderem os 257,286 contratos quem estará do outro lado comprando? Esse cenário piora se a situação da pandemia continuar assustando a economia global.
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Todos sabem da importância do RenovaBio para o setor. Não apenas porque garante a expansão da produção de um combustível renovável, mas principalmente pelo impacto ambiental positivo que ele proporciona. O CBIO é um ativo emitido por produtores e importadores de combustíveis que representa um crédito de descarbonização por tonelada de CO2. Ele representa a monetização desse impacto positivo. Esses certificados tem um valor e são negociados em balcão (os últimos saíram a R$ 45,00). Desde o início, o programa tem sofrido injustos ataques.
Agora, o representante de algumas distribuidoras de combustíveis, quer limitar as metas individuais estabelecidas pela ANP (Agência Nacional do Petróleo) e alega que o tempo que elas tem para cumprirem a meta é exíguo. Imaginem o impacto nos preços dos CBIOs quando a demanda é reduzida por uma canetada. Além disso, também, há pedidos por parte da mesma associação da limitação do valor do próprio CBIOs. Qual investidor vai colocar dinheiro num ativo cujo valor é limitado a um determinado nível de preço? Em resumo: para o mecanismo funcionar é preciso deixá-lo funcionar.
Um bom final de semana a todos
Arnaldo Luiz Corrêa